SOMOS TODOS “PALHAÇO” DO CIRCO QUE CONSTRUÍMOS. O PALHAÇO – Selton Mello A representação da felicidade que não alcançamos. O filme O Palhaço do roteirista e diretor Selton Mello, apresenta questões filosóficas que nos permitem perguntar: - Foi intencional a mensagem de tristeza de Benjamim? Aos que viram ao filme pergunto se lembram de como se chamava o circo, e aos que não assistiram prestem atenção neste detalhe, pois é essencial para entender não só a busca pela felicidade, mas a tristeza que Benjamim vivenciou. A esperança é um sentimento que só o homem possui, mas até que ponto devemos “esperá-la”? Nos bastidores do circo enxergamos o que não é apresentado no picadeiro, um exemplo é o olhar esperançoso da menina Guilhermina. O principal foco do filme é Benjamim, é ele que está à procura da felicidade, ou melhor, de três felicidades: o ventilador que é colocado na primeira fala do filme “Cê devia ter um ventilador”, o documento de identidade, e Ana, a moça do Aldo Auto Peças. Todo enredo está colocado nestas três utopias. Sobre Benjamim: Por que a demora em deixar o circo? Por que não contar ao pai a traição de Lola? Por que ninguém o faz rir? São estas questões que não são respondidas diretamente no filme, mas nos fazem refletir filosoficamente o sentido de cada uma delas. A vontade de “encontrar” a felicidade fez com que Benjamim deixasse o circo. Podemos perguntar: - A felicidade nunca pode ser plena? Depois de um espetáculo que o palhaço Pangaré aparece bêbado em cena e não consegue atuar, seu pai lhe diz o seguinte: “O gato bebe leite, o rato come queijo, e eu toco meu trabalho”, ou seja, o que sabe fazer é ser o palhaço Puro Sangue. Por que ele fala isso ao seu filho? Simplesmente, porque percebe há algum tempo a tristeza de seu filho e principalmente, a dúvida do que fazer e qual caminho seguir. “To cansado, cansado de tudo, cansado de fazer o que faço”, estas são as palavras de Pangaré antes de deixar o circo e ir à busca de seus sonhos. Depois de perder o filho, Valdemar se desfaz de sua mulher que o traía. Precisou perder seu filho para abandonar a mulher? O primeiro sonho que Benjamim realiza é o documento de identidade, é como se agora fizesse parte da sociedade, portanto, a partir de agora ele se considera um cidadão. Quando parte para sua nova busca, a Ana do Aldo Auto Peças, descobre que seus sonhos não são tão fáceis de realizá-los como desejava. Aqui podemos perceber a inocência de Benjamim, talvez sua primeira paixão. Com a decepção ao ver Ana com seu noivo, o mundo fora do circo que Benjamim acreditava começa a ser visto da maneira como ele realmente é. Em um jantar com seu patrão e parceiros de trabalho, Benjamim vê literalmente o que sabe fazer. A cena em que todos estão rindo de piadas sem graça, faz com que renasça o palhaço Pangaré dentro do Benjamim, pois neste momento ele entende qual sua missão no circo. No dia seguinte Benjamim realiza o que era seu primeiro sonho, comprar um ventilador. A expressão de felicidade está estampada em sua face no trajeto todo de volta ao circo, na motocicleta e no ônibus ainda é Benjamim que está retornando, mas na carroceria do caminhão o palhaço Pangaré já está vivo novamente fazendo suas graças para uma moça que realizava a mesma viagem. O retorno de Pangaré ao circo se dá por dois principais motivos, a falsa felicidade (um pequeno instante entre dois grandes momentos de tristeza) e a solidão. A solidão é apresentada em uma cena de comédia que pode passar despercebido, na oficina dos “irmãos gêmeos” Beto e Deco, não é difícil de ver o que o retiro fez com eles, não sabemos quem criou quem, pois perdidos na imensidão da distancia e na solidão do sertão, a única saída foi criar um amigo imaginário para assim superar o isolamento ali existente. Quando Pangaré chega ao circo, é possível ver a felicidade do palhaço Puro Sangue ao rever o filho, mas esta ainda não é a felicidade maior apresentada no filme, e sim, a da menina Guilhermina assumindo seu papel no picadeiro, e depois disso, correr feliz entre as cordas e toldos do circo com um grande sorriso. Felicidade esta na infância, pois quando a idade adulta chegar, novas “felicidades” irão surgir e junto às decepções da realidade. A última imagem do filme é o ventilador, penso que não poderia ser outra, afinal, é a única felicidade concreta que se pôde mostrar no filme, até que o mesmo se quebre. Mas continuamos nossa caminha rumo à felicidade, pois o espetáculo tem seu nome, “CIRCO – ESPERANÇA”. Sidnei de Oliveira - Músico, compositor e instrumentista. Graduado em filosofia (UNIFRAN), Mestre em Filosofia com ênfase em filosofia da música (UNIFESP) e atualmente doutorando em filosofia (UNICAMP).