A INTERLOCUÇÃO ENTRE SAÚDE E EDUCAÇÃO NO PROCESSO DE INCLUSÃO ESCOLAR Construindo possibilidades entre a escola e o hospital Vania Loureiro Pedagoga do Hospital Sarah/BH A Rede Sarah de Hospitais do Aparelho Locomotor é uma Rede de hospitais públicos, que prestam serviços de ortopedia e de reabilitação. Atualmente, é constituída por seis unidades hospitalares localizadas em Brasília ( DF ), Salvador ( BA ), São Luís ( MA ), Belo Horizonte ( MG ) , Fortaleza ( CE ) e Rio de Janeiro ( RJ ). O atendimento pedagógico é realizado por professores hospitalares, de artes e de educação física. Em se tratando de um Centro de Reabilitação, a Rede Sarah de Hospitais do Aparelho Locomotor se norteia por alguns princípios, a saber: • “atuar na sociedade para prevenir a incapacidade e a deformidade, combatendo, ao mesmo tempo, preconceitos quanto à deficiência física, pois o que caracteriza a vida é a infinita variação da forma que no tempo muda” e • “defender o princípio de que nenhum homem pode ser discriminado por ser diferente da média em sua forma física ou maneira própria de realizar uma atividade”. Partimos do conceito de reabilitação como sendo o desenvolvimento de uma pessoa até o mais completo potencial físico, psicológico, social, profissional e educacional. Na reabilitação, busca-se aumento da independência, melhora da qualidade de vida e integração familiar e social. No que diz respeito às crianças, a integração social está associada à inserção escolar. Em relação à escolarização, o compromisso dos educadores no contexto hospitalar não é apenas com a inserção e reinserção escolar, mas, fundamentalmente, com o sucesso escolar de nossos pacientes. A especificidade de um paciente em reabilitação marca uma mudança na sua forma de interagir no mundo e não na sua potencialidade humana. Essa diferença pode implicar uma singularidade na sua forma de comunicação e no seu processo de aprendizagem. Trabalhar afirmando o que os pacientes são capazes de realizar, ou seja, investir nas suas potencialidades contribui para RESSIGNIFICAR essas diferenças. Através de intervenções psicopedagógicas, os educadores podem contribuir na descoberta e no desenvolvimento das potencialidades dos pacientes e para que a diferença seja percebida como mais uma possibilidade no universo plural da existência humana e não como a marca da falta, da desvalorização e do preconceito. Sendo assim, a função do educador no hospital é oportunizar diferentes situações significativas de aprendizagem que contribuam no processo de reabilitação e consequentemente no desenvolvimento dos pacientes. Na história da educação das pessoas com necessidades educativas especiais, pode-se identificar quatro fases: exclusão, segregação, integração e inclusão. Atualmente, a educação discute e aprofunda a concretização da inclusão dos alunos com necessidades educativas especiais na escola regular. Esta proposta preconiza a educação para todos, propondo uma escola adaptada para todas as diferenças humanas. A educação inclusiva situa-se no contexto da sociedade inclusiva, uma sociedade centrada nas pessoas, que respeita a dignidade e as diferenças de todos os seres humanos. A Declaração de Salamanca, elaborada na Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais: acesso e qualidade, ocorrida na Espanha em 1994, constitui-se como um marco para a educação inclusiva. Suas orientações apontam para uma reformulação da escola, que deve adaptar-se a todas as crianças sem exceção, inspirando-se no princípio de que todas as diferenças humanas são normais. As escolas devem reconhecer as diferenças, acolher todos, promover aprendizagens e atender as necessidades de cada um. Considerando este contexto da inclusão, a parceria educação/saúde se reafirma como meta indispensável, possibilitando a articulação entre as equipes de saúde e educação. Sendo assim, os programas de reabilitação infantil do Hospital Sarah/BH vêm atuando junto às escolas e às Secretarias de Educação, buscando contribuir para o processo de inserção e reinserção escolar das crianças e para a formação dos professores. Nestes encontros, as estratégias utilizadas são seminários, discussões de casos, reuniões pedagógicas com toda a escola, acompanhamento de atendimentos no hospital, visitas escolares, grupos de estudo e fórum de saúde mental. Essa parceria entre a saúde e a educação, ou seja, entre o Hospital e a escola vem acontecendo de duas formas : - Atendimento pedagógico durante o período de internação dos pacientes envolvendo atividades de acompanhamento escolar, hora do conto, recreação, jogos, artes, etc. Estas atividades objetivam minimizar os efeitos da hospitalização, na medida em que atendem as necessidades básicas de desenvolvimento das crianças hospitalizadas, possibilitando, também, que a criança mantenha o vínculo com sua vida, sua rotina fora do hospital. Em relação às atividades escolares, a possibilidade da criança estudar no hospital evita a defasagem de conteúdos e uma possível exclusão escolar. Algumas vezes, precisamos esclarecer famílias e escolas sobre o direito legal das crianças estudarem no seu período de hospitalização. Muitas crianças perdem o ano pelas faltas e, algumas vezes, a escola não libera o material do aluno para que ele possa estudar no hospital. Algumas escolas chegam a estimular que a criança desista daquele ano e que só recomece os estudos quando liberada do tratamento clínico. Por ser um hospital de reabilitação, algumas crianças irão retornar à escola após um trauma (medular ou cerebral) e, portanto, às vezes, serão necessárias algumas adaptações da escola para estar recebendo a criança. Estas adaptações (mobiliário, escrita, locomoção, AVDS, etc.) serão orientadas, na escola, pela equipe que acompanha a criança. - Acompanhamento pedagógico para as crianças que são atendidas em sistema ambulatorial. Nestes atendimentos, a equipe orienta a família sobre a importância da inserção escolar da criança, o mais cedo possível. Consideramos que a escola, através de suas atividades, estará solicitando as estruturas cognitivas da criança e, portanto, contribuindo para seu desenvolvimento. Também, reafirmamos para a família a importância das crianças conviverem com as diferenças humanas desde cedo, como fator fundamental para a formação da sua cidadania. Um dos objetivos deste trabalho é acompanhar a criança na sua escolarização, oferecendo suporte para a equipe escolar em relação ao esclarecimento do diagnóstico, prognóstico, orientação quanto às adaptações e aos materiais necessários e sugestões de intervenções psicopedagógicas adequadas às suas necessidades. Temos atuado junto às Secretarias de Educação e escolas buscando contribuir no processo de formação dos professores neste contexto da escola inclusiva. Como educadores, consideramos fundamental esta parceria entre saúde e educação para contribuirmos na concretização de uma escola de qualidade, igualitária, justa, acolhedora para todos, uma escola, assim, adaptada à humanidade real. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BELIZÁRIO FILHO, José Ferreira. Inclusão. Uma revolução na saúde. Rio de Janeiro: WVA, 1999. 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