URBANISMO E ARTES VISUAIS NO PALÁCIO DE LA LUZ DE ROMÁN FRESNEDO SIRI 1 2 URBAN PLANNING AND VISUAL ARTS AT PALACIO DE LA LUZ OF ROMÁN FRESNEDO SIRI Nathália Bichinho Corrêa Oliveira PROPAR, Faculdade de Arquitetura, UFRGS [email protected] Resumo Román Fresnedo Siri, arquiteto uruguaio nascido no ano de 1903, graduado pela Facultad de Arquitectura no ano de 1930, foi também artista plástico, músico, fotógrafo, designer de móveis e chegou a desenhar barcos e iates. Com a sua produção arquitetônica percorreu as mais diversas tipologias e escalas projetuais como casas, hospitais, hipódromos, edifícios institucionais e também a Faculdade de Arquitetura de Montevidéu. Este estudo de caso analisa o projeto de urbanização Arroyo Seco, onde o Palácio de la Luz está inserido como edifício principal. O texto também estuda o edifício em si e as obras de artistas plásticos presentes na edificação. Desenvolvido pelo arquiteto como funcionário da UTE (Administración Nacional de Usinas y Trasmisiones Eléctricas), o projeto foi da escala urbana aos detalhes de acabamento e desenho de mobiliário. O plano urbano acabou não sendo executado, somente o Palácio de la Luz, edifício de escritórios, foi construído, entre os anos de 1943-1948. A integração entre arquitetura e artes plásticas pode ser observada no interior da edificação, onde participaram os escultores Eduardo Yepes e Olímpia Torres, com o mural Energia no hall do pavimento térreo, Pablo Serrano, que esculpiu a porta do salão de atos, e o pintor José Cuneo. Palavras-chave: Fresnedo Siri. Palacio de La Luz. Uruguai. UTE. Abstract Román Fresnedo Siri, uruguayan architect born at 1903, alumnus of the Montevideo School of Architecture at 1930, was also artist, musician, photographer, furniture designer and even designed boats and yachts. Román's architecture production went through different typologies and scales such as houses, hospitals, hippodromes, institutional buildings and also the Montevideo School of Architecture. This paper presents the Arroyo Seco’s city planning project, in which La Luz's Palace is the main building. It also observe the palace itself and the masterpieces of artists exhibited there. Built-up by the architect as an employee of UTE (National Administration of Power Plants and Electrical Transmission), the city plan explained details since the urban scale as the finishing and furniture design. The city planning itself was not accomplished, only La Luz's Palace and office buildings were developed between 1943 to 1948. The integration between architecture and fine arts can be seen inside the building, where the sculptors Eduardo Yepes and Olímpia Torres participated with the Energy Wall in the hall of ground pavement, Pablo Serrano carved the door of the hall acts, and the painter José Cuneo. Keywords: Fresnedo Siri. Palacio de La Luz. Uruguay. UTE. 1 INTRODUÇÃO Monsieur Joseph Carré, arquiteto francês formado pela École des Beaux-Arts de Paris foi contratado para dar aulas de Arquitetura no Uruguai no ano de 1907, quando o curso ainda fazia parte da Faculdade de Matemática. Após a separação do curso em 1915, a Faculdade de Arquitetura tornouse independente e Carré foi figura predominante dentro do ensino da arquitetura, descrito por Nudelman (2013) como professor de enorme prestígio, baseado na sua qualidade como professor e 1 OLIVEIRA, Nathália Bichinho Corrêa. Urbanismo e Artes Visuais no Palácio de La Luz de Román Fresnedo Siri. In: 11° SEMINÁRIO NACIONAL DO DOCOMOMO BRASIL. Anais... Recife: DOCOMOMO_BR, 2016. 2 Este artigo integra a investigação do projeto de pesquisa Modernidade e Figuração. Estudos na arquitetura moderna Latino-americana. Coordenado pela Arq. Profa. Dra. Cláudia Piantá Costa Cabral e financiado pelo CNPq. 1 na sua tolerância e foco à inovação. Foram alunos de Carré os arquitetos Julio Vilamajó, Maurício Cravotto e Juan Antonio Scasso. Román Fresnedo Siri, que cursou a Faculdade de Arquitetura de 1923 a 1930 e também foi aluno de Carré, estava nas últimas gerações de arquitetos que receberam formação acadêmica com conceitos na escola de Beaux-Arts, já em transição para ideais modernistas e que desenvolveram projetos que buscaram elementos da arquitetura moderna para conciliar com sua formação clássica. Entre seus contemporâneos estão os arquitetos Mario Payseé Reyes e Carlos Gómez Gavazzo. Nascido em 4 de fevereiro de 1903 na cidade de Salto, Fresnedo Siri foi também artista plástico, músico, fotógrafo, designer de móveis e chegou a desenhar barcos e iates3. Vivendo no Paraguai durante sua infância e adolescência, se formou em Agrimensura, técnica de medir terras, antes de voltar ao Uruguai e iniciar os estudos na faculdade de arquitetura. Ganhador da Medalha de Ouro ao final de sua graduação em arquitetura lhe é oferecida uma bolsa para realizar uma viagem à Europa ainda em 1930. Trabalhou como professor nas faculdades de arquitetura e agronomia, funcionário público concursado e como arquiteto independente ganhador de muitos concursos de projeto. Com a sua produção arquitetônica percorreu as mais diversas tipologias e escalas projetuais como casas, hospitais, hipódromos, edifícios institucionais e também a Faculdade de Arquitetura de Montevidéu. Seu vínculo com a UTE (Administración Nacional de Usinas y Trasmisiones Eléctricas) começa no ano de 1932, segundo conta de Betolaza (2004), quando foi aprovado em concurso para trabalhar como gestor de obra, cargo vinculado aos aspectos administrativos relativos às execuções de obra, sem se envolver na concepção dos projetos. Nos anos seguintes o arquiteto obteve muitos êxitos profissionais fora da empresa, sendo ganhador do concurso de projetos para o edifício da Faculdade de Arquitetura, juntamente com o colega, também funcionário da UTE, arquiteto Mario Muccinelli. Ganhou também, em 1941, um dos quatro primeiros prêmios no concurso internacional Organic Furniture Design, promovido pelo Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA) onde o prêmio era uma passagem de ida e volta para Nova York e o pagamento de mil dólares. Fresnedo solicitou então uma licença da empresa para realizar a viagem, a qual a Diretoria da UTE aceita e concede licença extraordinária de 6 meses e meio, com o pagamento normal de seu salário. Além de ser um reconhecimento pela companhia das conquistas recentes do arquiteto, surge a proposta de que Fresnedo realize um estudo nos Estados Unidos sobre edifícios administrativos de empresas similares à UTE. Na metade dos anos 40, Fresnedo Siri estava envolvido então, com projeto e construção de quatro edifícios institucionais, sendo eles: Faculdade de Arquitetura da Universidad de la República, fruto da parceria com o Arq. Mario Muccinelli e ganhadora do concurso realizado no ano de 1938, com obra finalizada em 1946 e declarada Monumento Histórico Nacional desde o ano 2000; Sanatório Americano, de 1945 a 1948, um dos melhores exemplos de arquitetura hospitalar realizado por Fresnedo; Hipódromo de Maroñas, de 1938 a 1945, onde foram projetadas as tribunas, fruto de concurso; Palacio de la Luz, de 1943 a 1948, objeto de análise deste trabalho, declarado Bem de Interesse Municipal desde 1995. 2 URBANIZAÇÃO ARROYO SECO No ano de 1943 Fresnedo apresenta os anteprojetos de sua proposta à diretoria da UTE. Mais que projetar um edifício para abrigar os escritórios da empresa, que àquela época estavam espalhados por mais de 20 lugares na cidade, o arquiteto também propunha um projeto de ordenamento urbano 3 ROMÁN FRESNEDO SIRI. Catálogo para exposición intinerante dedicada al Arq. Román Fresnedo Siri. Textos de: Cecília Ortíz de Taranco, Arq. Laura Cesio, Arq. Andrés Mazzini, Mg.Arq. Laura Alemán, Dr. Arq. Aníbal Parodi. FARQ, IHA. 2013. 2 para os quarteirões adjacentes, denominado então Arroyo Seco, nome da região da cidade onde se localiza a área de intervenção (Figura 1). O terreno já pertencia à companhia estatal e a área concentrava alguns edifícios importantes para o funcionamento da empresa. Além disso, a diretoria da empresa entendia, como registrado em documento de antecedentes da obra, que esta atitude traria também benefícios econômicos a UTE, que deixaria de pagar aluguel de salas e aumentaria o rendimento dos funcionários, evitando deslocamentos entre as diversas instâncias da companhia. Figura 1 – Localização na cidade de Montevidéu Fonte: Google Maps, 2016. O complexo deveria abrigar além do edifício de escritórios, que era a peça central, uma unidade produtora de energia elétrica, uma unidade de combustíveis, armazéns, imprensa, administração, serviços gerais, escola primária e escola técnica, habitação para os empregados e centro comercial. Chamada por Articardi (2004) de “cenografia urbana”, a proposta (Figura 2) desenhada por Fresnedo criava um eixo no sentido leste-oeste (na figura de cima para baixo), ligando a avenida Agraciada, via mais importante da zona, com o edifício de escritórios, requalificando os espaços de acesso ao Palácio e ressaltando a presença do volume do edifício. O eixo de 200 metros de extensão por 40 metros de largura seria ladeado por edifícios de alturas e fachadas iguais, estabelecendo uma escala intermediária com a torre principal, produzindo um efeito de preparação visual e dando ao pedestre um ponto de fuga de perspectiva monumental. Nestes edifícios o andar térreo seria ocupado por comércio e os demais pavimentos por apartamentos. A quadra triangular, primeira a ser acessada desde a avenida Agraciada, foi projetada como uma praça, com previsão de espaço de exposições, tanto para artistas como para comunicação da empresa com a população. Revistas da época descrevem esta parte do projeto como um centro cívico. Foi proposto também um túnel de ligação exatamente ao lado do edifício de escritórios, para facilitar o acesso de pessoal e veículos para a zona industrial do complexo, localizada entre a linha do trem e a água. 3 Tanto para Articardi (2004) como para de Betolaza (2004), mais que um plano de urbanização, o projeto de Arroyo Seco era uma maneira da empresa estatal se apresentar perante a sociedade, materializando a sua imagem em direção à cidade, como paradigma de progresso. Figura 2 – Plano Urbano Fonte: Instituto de Historia de la Arquitectura (IHA), FArq/UdelaR. De Betolaza (2004) acredita que é possível comparar o plano de Arroyo Seco com o Rockfeller Center de Nova York, tendo sido uma das obras visitadas por Fresnedo durante sua viagem aos Estados Unidos. Sendo também um conjunto urbano que se espalha por alguns quarteirões, tem uma edificação de maior importância e altura e depois é ladeada por edifícios de menor altura e com tratamento de fachadas uniforme, criando uma escala de aproximação da cidade com o complexo. A maior similitude percebida por esta autora é a visual criada pelos Channel Gardens em direção à torre RCA, onde o eixo proposto por Fresnedo desde a avenida Agraciada (Figura 3) faz com que o Palácio seja visto da mesma maneira que o proposto por Raymond Hood em seu projeto (Figura 4). Figura 3 – Visual projetada por Fresnedo Figura 4 – Visual existente no Rockefeller Fonte: Instituto de Historia de la Arquitectura (IHA), FArq/UdelaR. Fonte: Dan Beards. Flickr. 4 3 PALACIO DE LA LUZ Nos primeiros estudos do edifício Fresnedo trabalhava com a concepção de torre com base, fazendo o uso de linhas horizontais nas fachadas, elementos que funcionariam como brises segundo comenta o arquiteto em seu Estudo Plástico número 3 “para evitar la incidencia directa del sol sobre los vidrios”. Somente no estudo de número 7 é que surge a forma volumétrica de bloco único, culminando no estudo de número 10 (Figura 5), onde o edifício aparece com nervuras verticais nas fachadas e porta de entrada marcada por um pórtico, porém com uma esbeltez maior do que foi de fato construída (Figura 6). Figura 5 – Estudo nº 10 do Palácio Figura 6 – Palácio de la Luz Fonte: Instituto de Historia de la Arquitectura (IHA), FArq/UdelaR. Fonte: Autora, Junho/2015. Do projeto à execução houve muitas mudanças, tendo sido construído somente o edifício principal de escritórios e com número de pavimentos menor do que a proposta inicial. De planta praticamente quadrada, com medidas de 54,40 metros por 52,20 metros, foi concebida como planta livre, inspirada nos escritórios norte americanos visitados por Fresnedo também em sua viagem aos Estados Unidos. O desenvolvimento em 11 pavimentos com 4 metros de pé direito livre mais 42 centímetros para a passagem de instalações e espessura de laje, faz com que a altura da edificação seja de aproximadamente 55 metros, compondo desta maneira um prisma de proporções quase cúbicas. Os serviços e as circulações verticais estão localizados no centro do edifício, deixando todo o perímetro livre para os escritórios. Com esse gesto projetual, todos os escritórios tem contato com o exterior, evitando assim a necessidade de criar poços de iluminação e ventilação, atitude exaltada na Revista Arquitectura nº 217 de 1947. Apresenta atitude tipicamente moderna ao propor critérios higienistas nos locais de trabalho, estudando também a climatização artificial da edificação. Ainda assim, para não depender do bom funcionamento das instalações mecânicas, renuncia-se à condição de espaço hermeticamente fechado, sendo projetadas algumas esquadrias móveis na composição das faixas envidraçadas. Com a solução centralizada de escadas e elevadores também diminuía o número de circulações internas na edificação, tornado os percursos mais racionais. 5 A estrutura, calculada pelo engenheiro Miguel Curbelo, distribui os pilares internos em uma grelha com intervalos de aproximadamente 6,60 metros, tendo somente o módulo central rompido, com maior espaçamento entre as colunas. Na fachada o intercolúnio é menor, sendo acrescidos entre dois pilares estruturais mais dois pilares que não cumprem função alguma. Desta forma as aberturas acabam sendo marcadas no sentido vertical, não mais horizontal como as primeiras propostas de Fresnedo. Devido à grande dimensão das lajes foi necessário dispor juntas de dilatação, que segundo análise de de Betolaza (2004), são divididas em cinco partes que formam um moinho, sendo o centro a área das circulações verticais e quatro retângulos de 39,60 x 13,20 metros. O pavimento térreo, de acesso público, tem pé direito duplo em forma de U, sendo a parte central ocupada por um entre piso que abriga serviços, tesouraria e um hall com caixas de cobrança. Do 2º ao 8º pavimento estão as plantas tipo com escritórios. No 9º pavimento está localizado o salão de atos, que se desenvolve com pé direto duplo, ocupando também parte do 10º andar. O último andar está ocupado pelos escritórios da diretoria da empresa. Com essa organização o arquiteto também buscava a representação hierárquica da empresa, tendo os diretores acima de todos, como está descrito em texto na Revista Arquitectura nº 226 de 1953. Além disso, por ter os serviços abertos ao público no térreo e primeiro pavimento, os cidadãos eram convidados a adentrar a edificação, sem barreiras e com o pórtico e escadaria em granito preto destacando o acesso. O uso de materiais nobres em todo o edifício reforça a ideia de monumento que o Palacio deveria ter frente à sociedade. De origem uruguaia, os granitos, mármores e madeiras foram utilizados nos acabamentos de escadas, hall de elevadores e revestimentos de paredes. O corrimão metálico das escadas internas também foi desenhado por Fresnedo, demonstrando a preocupação do arquiteto com a imagem geral da edificação. 4 ARTES VISUAIS NO PALACIO DE LA LUZ Estão presentes no edifício as obras de quatro artistas plásticos que, segundo consta na Revista Arquitectura nº 226 de 1953, foram locadas em locais previstos pelo arquiteto. Tal prática estava sendo utilizada no Uruguai em meados do século XX e, como sugere Marques (2015), “grupo explorou o conceito de integração plástica, a composição da arquitetura e artes plásticas compreendidas como uma obra única, a ser concebida desde o princípio como a justaposição de seus elementos, arquitetônicos e artísticos”. Algumas fontes sugerem que o atelier de Joaquín Torres Garcia, que regressou ao Uruguai no ano de 1944, exerceu influência sobre a arquitetura nacional desta época. Porém o fenômeno de associação entre arquitetura e artes não é de exclusividade uruguaia e menos ainda uma inovação. Cláudia Cabral (2009) evoca exemplos de diversas tentativas de obra de arte total, entre eles “Wagner utilizou o termo em meados do século XIX para referir-se à ópera, gênero artístico em que todas as artes envolvidas - música, literatura, teatro, canto, dança, artes plásticas” e as posições de Le Corbusier, Giedion e Sert no CIAM, que reivindicavam um papel central para a integração entre as artes. De Betolaza (2004) ainda lembra o Manifesto de Fundação da Bauhaus, escrito por Gropius em 1919, que trazia a ideia do edifício como obra coletiva onde colaboram artistas, artesões e arquietos. Todas essas leituras históricas confirmam o valor e relevância da atitude de Fresnedo e da UTE em se aproximar dos artistas e compor espaços únicos no interior do Palacio. A primeira obra a ser descrita é também a primeira em contato com os usuários do Palácio, tanto visitantes quanto funcionários, um mural no hall de entrada do edifício. Realizada por dois artistas no fim dos anos 60, que já tinham sido chamados para realizar o trabalho desde 1952. Eduardo Yepes era um escultor espanhol nascido em 1910 e casado com Olimpia Torres, a segunda autora do mural e filha de Joaquín Torres Garcia, motivo pelo qual Yepes se mudou pra Montevidéu no ano de 1934, 6 onde ele e Olivia permaneceram até o ano de 1936, quando foram viver na Espanha, retornando ao Uruguai somente em 1947. Entre as tratativas com a UTE, retomadas em 1955, e a definitiva contratação de Eduardo e Olimpia para a realização do mural em 1967, o casal esteve envolvido com Eladio Dieste na construção da Igreja de Atlántida. Amigos pessoais do engenheiro, acompanhavam a obra a pedido do amigo4 e foi encomendado a Yepes que esculpisse o crucifixo da igreja. O resultado foi a obra Cristo, banhada a ouro e posicionada no centro do altar. Quando o aceite final para o mural do Palácio chega em 30 de novembro de 1967, Eduardo começa a trabalhar nos ensaios para a obra com a colaboração de Olimpia no desenho do mosaico. O mural é composto por quartzos e ametistas de origem uruguaia e coladas com resinas de poliéster, uma experiência que estava sendo explorada por Yepes há alguns anos, buscando uma melhor forma de fixação sem interferir no brilho e transparência das pedras (Figura 7). Concluído em 1970, se estende por 27 metros e tem no seu centro a escultura “El Rayo” de Eduardo. Modelada em cimento e recoberta por folhas de ouro, que segundo descrição5 do autor “[...] De esta manera ligo el amor humano a una de las expresiones más violentas, más tremendas de la naturaleza, que es la expresión del rayo [...]”. Figura 7 – Mural de Eduardo Yepes e Olimpia Torres Fonte: Autora, Junho/2015. Outra participação a ser destacada é a do também escultor Pablo Serrano. Nascido em 1908, era espanhol e se mudou para Montevidéu em 1930, onde viveu durante 25 anos e recebeu prêmios de destaque, sendo vencedor por pelo menos três vezes da Medalha de Ouro do Salão Nacional de Artes Plásticas do Uruguai. Na Espanha, para onde retornou em 1955, recebeu outros prêmios, incluindo o Grande Prêmio de Escultura, na III Bienal Hispano-americana de Arte. Teve exposição 4 Segundo Olimpia Torres em entrevista para László Erdélyi no jornal El País. Disponível em http://historico.elpais.com.uy/Especiales/eladio_dieste/5.asp. 5 Relato transcrito em Arte y arquitectura en Uruguay. 1930-1970. Rafael Lorente Mourelle. 2015 7 individual na Tate Gallery, em Londres, e em outras cidades da Europa. De exposições coletivas em que participou destacam-se aqui a New Spanish painting and sculpture, no MoMA em 1960, Musée Rodin em Paris (1961), Guggenheim International Exhibition, Nova York (1967) e Museo Nacional Centro de Arte Reina Sofia, Madri (1973). Sua primeira aproximação com a arquitetura acontece já no ano de 1930, em Rosário, na Argentina, onde esculpe portas em bronze para a cripta do Colégio San José. No Palacio de la Luz também esculpe uma porta, desta vez em mogno, no ano de 1952 (Figuras 8 e 9). Localizada no nono andar, era a porta de entrada do salão de atos, fazendo o fechamento do hall de elevadores, de pé direito simples, com o foyer do salão, de pé direito duplo. Descrita como imponente6, eram observadas formas abstratas, creditadas à convivência do escultor com o pintor Torres Garcia. Acabou sendo destruída em um incêndio ocorrido nos últimos pavimentos do edifício no ano de 1993 e foi substituída. Figura 8 – Porta esculpida em madeira Figura 9 – Fresnedo e Pablo diante da porta Fonte: Cortesia do funcionário da UTE, Arq. Néstor Raul Quintero. Fonte: Pablo Serrano. Instituto Aragonés de Arte y Cultura Comtemporáneos. Disponível em http://www.iaacc.es/ckfinder/userfiles/files/PABLO%20SERRA NO%20OBRAS.pdf. José Cúneo Perinetti, pintor uruguaio nascido no ano de 1887 também teve obras incluídas no edifício, na antessala da Sala de Sessões. Com grande produção e estudo em diversos ateliers de arte na Europa, tem sua obra reconhecida internacionalmente somente nos anos 60, quando já tinha 50 anos de carreira e acabava de incorporar a pintura abstrata. Nesta época passou a assinar os seus quadros como Perinetti, seu sobrenome materno. No Palacio de la Luz seus dois quadros adentravam as paredes de mármore, trazendo notas de cor ao ambiente predominado por tons ocre. As pinturas faziam parte da série “Lunas” que Cúneo 6 BORONAT, Yolanda J. Román Fresnedo Siri, um arquitecto uruguayo. Montevidéu. Ed. 1984. 8 desenvolveu durante muitos anos, juntamente com a série “Ranchos”, onde os traços diagonais eram expressos com muita força. As cores eram em tons brancos e cobre, rodeados de azuis e verdes intensos. Não foram encontradas imagens coloridas das obras ocupando seu lugar no edifício, por isso estão aqui representadas por outra pintura da série (Figura 10), já que as telas do Palacio também foram destruídas no incêndio de 1993. Figura 10 – Luna con dormilones, 1944 Fonte: Museo Nacional de Artes Visuales, Montevideo, Uruguay. Disponível em http://mnav.gub.uy/cms.php?o=1670. Mais que analisar a cuidadosa escolha dos artistas envolvidos é de mesma importância perceber o local onde as obras foram posicionadas. Todas estavam em locais considerados importantes dentro da hierarquia proposta para o edifício. O mural de Eduardo e Olímpia no térreo (Figura 11) localizada em um espaço de pé direito duplo, estando no foco visual de qualquer pessoa que adentre a edificação. A porta de Pablo Serrano no foyer do Salão de Atos (Figura 12), local de grande concentração de pessoas e de confraternização, tendo dimensões para ser percebida mesmo com o ambiente cheio. Já as pinturas de José Cúneo estavam localizadas nas dependências da Diretoria, na Sala de Sessões, onde provavelmente são tomadas importantes decisões em relação à companhia. Figura 11 – Planta do pavimento térreo com localização do mural Figura 12 – Planta do nono pavimento com a localização da porta esculpida Fonte: Instituto de Historia de la Arquitectura (IHA), FArq/UdelaR. Fonte: Instituto de Historia de la Arquitectura (IHA), FArq/UdelaR. 9 5 CONCLUSÕES Román Fresnedo Siri demonstrou em seu projeto de urbanização Arroyo Seco e no projeto arquitetônico do Palacio de la Luz um grande domínio do ofício de arquiteto. Respondendo a uma demanda real da empresa estatal da qual era funcionário concursado, Fresnedo brindou a empresa com um edifício inovador e eficiente, utilizado ainda hoje para as mesmas funções propostas há mais de 70 anos. O mesmo acontece com a Faculdade de Arquitetura de Montevidéu, inaugurada no ano de 1946 e em pleno funcionamento. Tal resultado demonstra habilidade e bom projeto, além do compromisso com as instituições públicas de seu país e de outros países nos quais tem obra construída. O Palacio de la Luz como estudo de caso possibilita a análise da integração de diversos campos do conhecimento em um só projeto, validando a teoria retomada durante diferentes períodos históricos de que a arquitetura deve trabalhar em conjunto com todas as artes. Já a sua proposta urbana, assim como todos os outros projetos urbanísticos de Fresnedo, não foi completamente implantada. Isso não diminui, contudo, a importância e a virtude das propostas já que, como muito bem descreve Articardi (2004) “Su estrategia de apropriación del sitio, le permitió generar propuestas arquitectónicas y urbanas, que por encima de los resultados, lograban interactuar con las condicionantes del lugar, para enriquecer el espacio de la ciudad y del territorio.”. É possível detectar a formação acadêmica do arquiteto, porém Fresnedo desenvolveu uma lógica própria, capaz de articular contribuições de ensinamentos das Belas Artes com as modernas concepções de arquitetura difundidas pelos CIAM, imprimindo uma marca única e facilmente reconhecível. Longe de ser um arquiteto teórico, e por isso todas as análises são feitas a partir de obras construídas, documentos pessoais e projetos publicados, Fresnedo teve a grande capacidade de absorver novas visões de arquitetura e transmitir as suas interpretações através de sua obra. AGRADECIMENTOS Aos integrantes do Instituto de História de La Arquitectura (IHA) da Universidad de La Republica, principalmente à Arq. Mariana Alberti. Ao Arq. Néstor Raul Quintero, por me receber no Palacio de la Luz, aportar o seu conhecimento e sanar todas as minhas dúvidas. Ao futuro arquiteto Matias Vico pela incansável transmissão de documentos Uruguai – Brasil. À colega de projeto de pesquisa Arq. Valentina Martins Marques por compartilhar conhecimento e bibliografia valiosa para este trabalho. REFERÊNCIAS ARTICARDI, Juan. “Propuestas urbanas de Fresnedo Siri". Tesina del Programa de Doctorado de la Universidad Politécnica de Madrid, 2004 (inédito). CABRAL, Cláudia Piantá Costa. Arquitetura moderna e escultura figurativa: a representação naturalista no espaço moderno. 8º Seminário DOCOMOMO Brasil. Rio de Janeiro, setembro, 2009. DE BETOLAZA, Alberto E. "La representación moderna de las instituciones hacia 1940: el aporte de Román Fresnedo Siri". Tesina del Programa de Doctorado de la Universidad Politécnica de Madrid, 2004 (inédito). EL PALACIO DE LA LUZ. Revista Arquitectura. S.A.U. Montevideo, n. 217, 1947. MARQUES, Valentina Martins. Casa Julio Gimeno: integração plástica e introversão. Cadernos de pósgraduação em Arquitetura e Urbanismo. V. 15, n. 2 (2015). p. 152-167. NUDELMAN, Jorge. “Corbusians” in Uruguay: a contradictory report. Separata de: Latin American modern architectures: ambiguous territories/[edited by] Patricio del Real and Helen Gyger. 2013. PALACIO DE LA LUZ. ARQ. ROMAN FRESNEDO SIRI. Revista Arquitectura. S.A.U. Montevideo, n. 226, agosto 1953. 10