0 UNINGÁ – UNIDADE DE ENSINO SUPERIOR INGÁ FACULDADE INGÁ CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM ORTODONTIA GISELE DEGGERONI MATTIAZZI CONSIDERAÇÕES SOBRE A MOVIMENTAÇÃO ORTODÔNTICA DE DENTES VITAIS E DENTES TRATADOS ENDODONTICAMENTE PASSO FUNDO 2012 1 GISELE DEGGERONI MATTIAZZI CONSIDERAÇÕES SOBRE A MOVIMENTAÇÃO ORTODÔNTICA DE DENTES VITAIS E DENTES TRATADOS ENDODONTICAMENTE Monografia apresentada à Unidade de Pós-Graduação da Faculdade Ingá – UNINGÁ – Passo Fundo-RS como requisito parcial para obtenção do título de Especialista em Ortodontia. Orientadora: Prof. Dra. Giovana Casaccia PASSO FUNDO 2012 2 GISELE DEGGERONI MATTIAZZI CONSIDERAÇÕES SOBRE A MOVIMENTAÇÃO ORTODÔNTICA DE DENTES VITAIS E DENTES TRATADOS ENDODONTICAMENTE Monografia apresentada à Unidade de Pós-Graduação da Faculdade Ingá – UNINGÁ – Passo Fundo-RS como requisito parcial para obtenção do título de Especialista em Ortodontia. Aprovada em ____/____/_______. BANCA EXAMINADORA: ______________________________________ Prof. Dr. Giovana Casaccia _______________________________________ Prof. Ms. Marcel Farret ________________________________________ Prof. Dr. José Roberto Vanni 3 Dedico este trabalho ao meu filho Carlos Eduardo, tesouro da minha vida, é por ti que tento me superar a cada dia, buscando o aprimoramento profissional tanto quanto o pessoal, és a minha maior motivação! 4 AGRADECIMENTOS À Deus, pela vida e por tudo de bom que tem me proporcionado; À minha família, por todo o carinho, amor, apoio e auxílio, principalmente nos momentos em que tive de me ausentar; À minha orientadora, Prof. Dr. Giovana Casaccia, pela dedicação, disponibilidade e paciência na orientação deste trabalho; A todos os professores do curso de Ortodontia do CEOM, pelo brilhantismo e profissionalismo com que nos transmitem seus conhecimentos; Aos queridos colegas, com quem pude desfrutar de um convívio adorável; Às minhas queridas amigas do coração, Patrícia e Roberta, não tenho palavras para agradecer tudo o que fizeram por mim, foi maravilhoso poder conviver com pessoas como vocês, certamente esta amizade perdurará pelos anos afora; A todos os funcionários do CEOM, pela atenção e disponibilidade em todos os momentos. ...o meu muito obrigada!!!!!! 5 “De tudo ficam três coisas: a certeza de que sempre estamos começando, a certeza de que precisamos continuar, a certeza de que seremos interrompidos antes de terminar. Portanto, devemos fazer da interrupção, um caminho novo; da queda, um passo de dança; do sonho, uma ponte; da procura, um encontro.” (Fernando Pessoa) 6 RESUMO A movimentação ortodôntica provoca efeitos periodontais e pulpares considerados normais e reversíveis quando os dentes e tecidos subjacentes se apresentem íntegros e as forças não forem excessivas. Porém, quais os danos que a movimentação ortodôntica pode causar em dentes e periápice que já sofreram as mais variadas injúrias, ainda não foram totalmente compreendidos. O presente estudo realizou uma análise de pesquisas científicas sobre a movimentação ortodôntica de dentes tratados endodonticamente e de dentes vitais. Foram avaliadas as possibilidades de tais dentes apresentarem diferentes reações do periápice ao tratamento ortodôntico, influenciados pela presença ou não do órgão pulpar; e ainda levar em consideração se fatores como o tipo, a intensidade e o tempo de tratamento ortodôntico tem relevância no surgimento de reações adversas do periodonto e raiz dentária, e se o tipo de injúria pulpar e a presença de lesão periapical anterior à movimentação ortodôntica podem tornar o dente mais suscetível quanto ao desenvolvimento da reabsorção radicular. Concluiu-se que a movimentação de dentes com tratamento endodôntico pode apresentar risco ao periápice dependendo da causa do tratamento pulpar e da qualidade do mesmo e a polpa pode influenciar no surgimento de lesões periapicais. Palavras-chave: Movimentação dentária. Endodontia. Tecido periapical. Polpa dentária. 7 ABSTRACT The orthodontic movement causes periodontal and pulpal effects considered normal and reversible when the teeth and underlying tissues are presented intact and the forces are not excessive. But what damage they can cause orthodontic movement of teeth and periapex who have suffered the most varied injuries, are not yet fully understood. This study performed an analysis of scientific research on orthodontic movement of teeth endodontically treated and vital teeth. We assessed the possibilities of such teeth periapex have different reactions to orthodontic treatment, influenced by the presence or absence of pulp organ, and also take into account such factors as the type, intensity and duration of orthodontic treatment is important in the occurrence of adverse reactions periodontium and tooth root, and if the type of injury pulp and periapical lesion prior to orthodontic movement can make the teeth more susceptible for the development of root resorption. It was concluded that the movement of teeth with root canal therapy may present a risk to the periapical region depending on the cause of treatment and quality of pulp and the pulp that may influence the development of periapical lesions. Key-words: Tooth movement. Endodontics. Periapical tissue. Dental pulp. 8 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS cN centi Newton FCE Fator de crescimento epitelial ou epidérmico FLD Fluxometia Laser Doppler gF h mm N gramas-Força hora(s) milímetros Newton NiTi Níquel-Titâneo REM Restos Epiteliais de Malassez 9 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO 10 2 REVISÃO DE LITERATURA 13 2.1 POLPA DENTAL 13 2.2 MOVIMENTAÇÃO ORTODÔNTICA 15 2.2.1 Teoria do Movimento Dental 15 2.2.2. Reações Periodontais 17 2.2.3 Reações Pulpares 21 2.2.3.1 Laserterapia 26 2.2.4 Magnitude de Forças 28 2.2.5 Tipo de Movimento, Tipos de Força e Duração 30 2.3 TRATAMENTO ENDODÔNTICO 33 2.3.1 Reações do Periápice 33 2.3.2 Tendências Atuais 35 2.4 DENTES TRAUMATIZADOS 37 2.5 MOVIMENTAÇÃO DE DENTES COM TRATAMENTO 41 ENDODÔNTICO 3 2.6 REABSORÇÃO RADICULAR APICAL EXTERNA 47 CONCLUSÃO 52 REFERÊNCIAS 53 10 1 INTRODUÇÃO A movimentação ortodôntica provoca efeitos periodontais e pulpares considerados normais e reversíveis contanto que os dentes e tecidos subjacentes se apresentem íntegros e as forças não excedam os níveis de oxigenação pulpar e fluxo sangüíneo (REITAN; RYGH, 1996). No entanto, ainda não foi totalmente compreendido pela ciência todos os danos que esta movimentação pode causar em dentes desvitalizados, fragilizados por restaurações extensas, com lesões periapicais e problemas periodontais. O impacto da movimentação dentária induzida em dentes vitais, o potencial de reabsorção sobre os mesmos e se dentes tratados endodonticamente estariam mais suscetíveis a tais injúrias em comparação aos dentes vitais são assuntos de diversas pesquisas (DRYSDALE; GIBBS; PITTFORD, 1997; HAMILTON; GUTMANN, 1999; CONSOLARO, 2002). Contudo, atualmente, as opiniões são controversas a respeito da diferença na resposta biológica/patológica de dentes vitais e não vitais frente ao tratamento ortodôntico (KREIA et al.,2005; ESTEVES et al., 2007; VENKATARAMA et al., 2010) . Autores como Consolaro (2002) e Rego et al. (2004) acreditam que os estudos que apresentaram índices diferentes de reabsorções periapicais para dentes vitais e dentes com tratamento endodôntico não teriam seguido critérios metodológicos de forma adequada. É fato que existe influência da polpa dental na resposta biológica dos tecidos periapicais às forças empregadas na mecânica ortodôntica, pois há comunicação tanto embriológica quanto física entre os tecidos pulpar e o periodontal e pode acarretar em transporte de toxinas e bactérias de uma estrutura lesada para outra (FACHIN; LUISI; BORBA, 2001). Além disso, estudos mostraram que a movimentação ortodôntica provoca alterações teciduais pulpares compatíveis com processo inflamatório, que podem ser reversíveis se a agressão não ultrapassar o limite de tolerância do tecido (SANTAMARIA Jr, 2004) Alguns dentes que são submetidos ao movimento ortodôntico podem estar comprometidos por cárie, procedimento operatório ou material restaurador. Neste caso, o nível de mudanças no padrão de oxigenação pode 11 ser extremamente significativo, resultando em mudanças pulpares que podem culminar em pulpites irreversíveis ou necrose pulpar e sua possível seqüela de reabsorção radicular interna ou externa. Outro fato importante é que a realização de um adequado tratamento endodôntico para recuperar a saúde periapical e manter a integridade radicular e periodontal é essencial para o prognóstico de um dente a ser movimentado. A grande maioria das bactérias infectantes é removida durante os procedimentos endodônticos de instrumentação e irrigação do canal radicular, porém a total eliminação de espécies patogênicas, nem sempre é atingida na prática clínica, fazendo-se necessária a constante pesquisa por alternativas de soluções, medicações e tratamentos auxiliares (PARADELLA et al., 2007; CÂMARA; ALBUQUERQUE; AGUIAR, 2010). A causa de um dente tratado endodonticamente muitas vezes pode estar associada ao traumatismo dentário. Além disso, a sua prevalência nos dentes permanentes de crianças e jovens em idade escolar é alta (KUGEL; ZEH; MÜSSIG, 2006; PEREIRA, 2008; ANDREASEN; VINDING; CHRISTENSEN, 2008, XAVIER et al., 2011). Dessa forma é importante o estudo da resposta de tais elementos ao uso das forças ortodônticas, já que esta é a idade onde se encontram a maioria dos pacientes ortodônticos (GOMES, 2003). O conhecimento acerca dos efeitos da carga ortodôntica sobre o ligamento periodontal e osso alveolar, o que é transmitido à polpa dentária através do forame apical e se há diferença na resposta biológica de dentes vitais ou não vitais, ainda são objetivos de muitos pesquisadores a desenvolverem novas e avançadas técnicas de estudo científico (KUHLBERG; NANDA, 2007). A laserterapia vem se destacando pelos seus efeitos histologicamente comprovados, como aumento da microcirculação e da diferenciação celular, tanto na polpa quanto no periodonto de sustentação, além do aumento do número de osteoclastos e da remodelação óssea, mostrando uma otimização do tratamento ortodôntico, devido à aceleração do reparo dos tecidos pulpar e periodontal (YUSSEF et al., 2008; CRUZ et al., 2010; YAMAGUCHI et al., 2010). A tecnologia laser também apresenta-se como a boa alternativa de redução bacteriana intra-canal (NEVES, 2001), assim como a terapia fotodinâmica (AMARAL et al., 2010), e mostram-se 12 excelentes coadjuvantes ao tratamento endodôntico, na tentativa de eliminar microorganismos persistentes ao preparo químico-mecânico (PARADELLA et al., 2007). Esta pesquisa bibliográfica foi delimitada no período de 1990 a 2012, para que o trabalho em questão tivesse um caráter atual e contemporâneo. Deu-se preferência principalmente por trabalhos clínicos e pesquisas com animais, além de revisões de literatura e sistemáticas para que o estudo pudesse se aproximar da realidade vivida na clínica ortodôntica com embasamento científico. A proposição deste trabalho é descrever quais os riscos da movimentação ortodôntica em dentes com tratamento endodôntico e os fatores envolvidos nas respostas biológicas periodontais, comparando dentes vitais e não-vitais. Além disso, são consideradas questões como a influência da polpa na movimentação ortodôntica e os fatores predisponentes a formação de injúrias aos tecidos periapicais como o traumatismo dentário. Além disso, avalia-se as medidas que devem ser adotadas para o movimento ortodôntico ocorrer sem danos aos tecidos envolvidos. 13 2 REVISÃO DE LITERATURA 2.1 POLPA DENTAL A polpa dental é um tecido mesenquimal altamente especializado e caracterizado pela presença de células diferenciadas, como os odontoblastos, e infiltrada por uma rede de vasos sangüíneos e feixes nervosos que emanam de um forame na região apical. Diversas funções são desempenhadas pela polpa, sendo a principal a formação de dentina, e outras secundárias, como a sensibilidade dentinária, hidratação e defesa do complexo dentino-pulpar. Porém, devido ao seu arranjo anatômico desfavorável, a possibilidade de regeneração do tecido pulpar é muito restrita, já que se encontra rodeada por um tecido rígido mineralizado e inelástico (figuras 1 e 2), comprometendo o fornecimento sangüíneo da polpa e sua capacidade de combater infecções (DEMARCO et al., 2011). Além deste fator em particular, algumas condições podem facilitar o estabelecimento de quadros patológicos pulpares, como a ausência de circulação colateral, presença de dentina reparadora e o estágio da rizogênese, se completa ou incompleta. No entanto, apesar da polpa apresentar limitações, possui alguns mecanismos de defesa, como a esclerose dentinária, a dentina reparacional e a inflamação, que se manifestam de acordo com a ação de diferentes agentes agressores (ESTRELA et al., 1996). A polpa apresenta também uma íntima relação com o ligamento periodontal, cujas interações endodôntico-periapicais existem graças às vias de comunicação de ambos os tecidos, através do forame apical, dos canais laterais e/ou acessórios e túbulos dentinários. Existe uma comunicação tanto embriológica quanto física entre os tecidos pulpar e o periodontal, podendo ocorrer transporte de toxinas e bactérias de uma estrutura lesada para outra, provocando uma reação que dependerá da intensidade da infecção, da região anatômica envolvida e da condição de saúde do tecido (FACHIN; LUISI; BORBA, 2001). 14 Figura 1: Anatomia Pulpar Fonte: Lemos, 2011. Figura 2: Histologia do Complexo Dentino-Pulpar Fonte: Lahoud et al, 1999. 15 2.2 MOVIMENTAÇÃO ORTODÔNTICA 2.2.1 Teoria do Movimento Dental Conceitualmente, a Ortodontia caracteriza-se por movimentar o dente dentro do tecido ósseo, assim, incluindo também as estruturas periodontais, sendo que o êxito do tratamento ortodôntico depende do entendimento da biologia do periodonto de sustentação (PROFFIT; FIELDS; 2000). Os pesquisadores Reitan e Rygh (1996), sugerem a existência de dois mecanismos responsáveis pela movimentação ortodôntica: a teoria da pressão-tensão e a teoria bioelétrica. Segundo a teoria da pressão-tensão, durante a aplicação de forças, a raiz comprime o ligamento periodontal por um intervalo de tempo e o osso alveolar é reabsorvido, no lado de pressão, e deposita-se novo osso no lado onde o ligamento está sendo tracionado pela raiz, lado de tensão (REITAN; RYGH, 1996; PROFFIT; FIELDS, 2000; BECKER de OLIVEIRA, 2002). E então, o dente move-se através do osso levando toda a estrutura de suporte, como se a cavidade onde se insere migrasse junto com ele e desse modo, como a resposta óssea é mediada pelo ligamento periodontal, o movimento dentário é um fenômeno ligado ao mesmo. Estes fenômenos se dão pelo desencadeamento de uma cascata de mediadores químicos responsáveis pela inflamação dos tecidos periapicais após a aplicação de forças ortodônticas sobre o elemento dental (PROFFIT; FIELDS; 2000). O fenômeno da bioeletricidade está relacionado a deformação óssea, onde a distorção das células e da raiz extracelular seria associado a alteração e formação de um potencial elétrico. A deformação mecânica da estrutura cristalina da hidroxiapatita e do colágeno induz a migração de elétrons que produzem campos elétricos locais, conhecidos por piezoeletricidade, ou seja, um aumento do fluxo de íons através das membranas celulares. Esta influência mecânica também apresenta certo controle sobre a aposição e reabsorção óssea (RYGH; MOYERS,1991). 16 Porém, Roberts (1996) questiona a teoria bioeletrica, argumentando que as mudanças no potencial elétrico podem dirigir as respostas osteogênicas e osteoclásticas do ligamento periodontal ou meramente serem manifestações físicas da intensa atividade celular desencadeadas pelo estímulo ortodôntico da pressão-tensão gerada na interface raiz dentária e osso alveolar. A aplicação do método dos elementos finitos vem sendo amplamente utilizada a fim de avaliar e quantificar as deformações e tensões recebidas pelos tecidos que compõem o periodonto e o sistema de forças aplicado. Utilizando-se o conceito da força ótima, em que tensões na superfície radicular devem ser levemente superiores a exercida pelo sangue nos vasos capilares, pode-se obter as tensões axiais sofridas pelas fibras periodontais nas simulações tridimensionais do movimento ortodôntico. Assim, observou-se que nas áreas da superfície radicular onde a magnitude das forças supera as tensões capilares é que irá ocorrer a remodelação óssea e onde as tensões são menores não será desencadeado o processo de remodelação. Com as tensões axiais, pode-se classificar os tipos de movimentos dentários em função dos esforços aplicados à coroa dentária e da localização do centro de rotação do dente, conforme figura 3 (PENEDO et al., 2010). A B C Figura 3: Método dos Elementos Finitos. A= tensões axiais obtidas para forças de 0,39N; B e C= verificação do centro de rotação e deslocamento. Fonte: Penedo et al, 2010. 17 2.2.2 Reações Periodontais O início da movimentação dentária dá-se a partir do estresse celular, que é a quebra da homeostasia, tirando-a do seu equilíbrio natural. Em certas circunstâncias, a nova situação ou sobrecarga funcional causa uma adaptação celular e tecidual, debilitando-a de forma reversível ou ainda, de forma irreversível, dependendo da intensidade da agressão. No movimento ortodôntico, as forças aplicadas sobre a coroa dental são transmitidas ao periodonto através da raiz, com a conseqüente compressão dos vasos do ligamento periodontal, gerando hipóxia, e causando deformação celular, também conhecida por mecanotransdução (CONSOLARO, 2005). Quando as alterações na circulação local resultam em hipóxia, ocorrem degeneração e morte celular e a matriz extracelular passa por alterações bioquímicas e organizacionais com formação de áreas de hialinização. A compressão mecânica do aparelho ortodôntico é responsável pela deformação do citoesqueleto e perda da tensigridade, o que resulta na liberação de mediadores que induzem fenômenos como a diferenciação ou proliferação celular, síntese de colágeno e de matriz orgânica. O objetivo destes eventos é eliminar a força, dissipando-a através da remodelação do osso alveolar, com conseqüente mudança da posição dental (REYTAN; RYGH, 1996). A pressão que é exercida no periodonto por meio de cargas ortodônticas é influenciada não só pela intensidade da força, mas também pela altura da crista óssea, como demonstrou Geramy (2002). Numa análise tridimensional do elemento finito (forma numérica que identifica as pressões e deslocamentos) para quantificar a alteração e distribuição da pressão que surge no ligamento periodontal, através da aplicação de força transversa e vertical equivalentes a 1N, foi comparada altura óssea alveolar normal e reduzida em 1, 2.5, 5, 6.5 e 8mm. Verificou-se que a pressão aumentou gradualmente com o aumento da reabsorção óssea alveolar em todos os pontos da amostragem no movimento de inclinação, e na intrusão, somente perdas ósseas acima de 5mm causaram aumento significativo desta pressão. Na força de inclinação, o nível mais elevado de pressão foi detectado na região cervical, sendo que a pressão na região sub-apical dos dentes com altura 18 óssea normal foi equivalente a 37,5% da região cervical. No movimento intrusivo, a concentração de pressão ocorreu nas regiões apical e sub-apical e a reabsorção óssea resulta no aumento desta pressão em todos os pontos da amostragem. No momento em que ocorre a reabsorção óssea associada às alterações locais do ligamento periodontal, não se observam alterações nos cementoblastos (ROBERTS, 1996). Evidências revelaram que estas células não apresentaram receptores de superfície para os mediadores químicos da reabsorção, mantendo a integridade da raiz dentária e protegendo-a da reabsorção radicular. Na presença de forças excessivas, a hipóxia provocada nos vasos do ligamento periodontal causou a necrose do revestimento de cementoblastos, ou migração dos mesmos, deixando o cemento radicular desnudo. Então os osteoblastos, osteoclastos e macrófagos ali se instalaram e a reabsorção radicular externa se iniciou, sendo esta reabsorção classificada como inflamatória (CONSOLARO, 2005). Porém, fenômenos de colapso vascular e hiperemia compensatória não estão restritos apenas aos tecidos periodontais adjacentes à compressão, mas também tem sido descritos várias trocas circulatórias em espaços adjacentes a medula óssea e na polpa dental (HUANG; KING; KAPILA; 2007). Ramalho e Bozzo (1990) realizaram um estudo experimental em ratos, para avaliar ao nível de movimentação ortodôntica a cronologia das alterações do sistema periodontal após a aplicação de forças e interpretar biologicamente os padrões de mobilidade horizontal e suas conseqüências sobre as estruturas periodontais. A força ortodôntica foi aplicada utilizando um fio de aço colocado no ponto de contato entre primeiro e segundo molares inferiores esquerdos, ficando o lado direito para controle. Os animais foram sacrificados após 30 minutos, 1, 2, 6, 12, 24, 48, 72, 96, e 168 horas após a aplicação de forças. Ao exame das lâminas, observaram intensa atividade metabólica em todos os períodos analisados, com uma evolução gradual dos fenômenos da remodelação óssea. Nos períodos iniciais após a aplicação de forças – 30 e 60 minutos – houve rompimento das fibras colágenas do ligamento, desencadeando uma readaptação do periodonto a nova situação. Após 2 horas, acentuaram-se os processos de pequenas zonas de hialinização e acúmulo de novas células conjuntivas, indicando o início da remodelação 19 óssea. Entre 6 e 12 horas, constatou-se maior atividade osteoclástica – reabsorção óssea – e entre 24 e 48 horas ocorreram mais remodelações com formação de novos capilares. Nos últimos períodos, de 72, 96 e 168 horas ocorreu uma substituição tecidual demonstrando o processo de reparação do tecido ósseo. As alterações do lado de pressão mostraram-se mais lentas, com degenerações localizadas e necrose, enquanto no lado de tensão as estruturas periodontais responderam dentro dos limites fisiológicos com intensificação dos fenômenos formativos, o que corrobora com a afirmação de Consolaro (2007) de que as áreas do ligamento periodontal comprimidas predominam as forças de pressão e fenômenos reabsortivos e nas áreas de tensão predomina a aposição óssea, a fim de restabelecer rapidamente a conformação do ligamento periodontal (figura 4). A LP OA A= raiz dentária e relação com estruturas vizinhas, força no sentido distomesial (setas). OA=osso alveolar LP=ligamento periodontal H=áreas de hialinização B C H OA LP LP OA B= área de pressão, com hialinização e reabsorção óssea (círculo azul). C= aposição óssea (círculo amarelo) no lado de tensão. Figura 4: Avaliação histológica de raízes e periodonto após movimentação induzida (A, B, C). Fonte: Consolaro, 2007. 20 A espessura média do ligamento periodontal é de 0,25mm, variando de 0,2 e 0,4mm ao longo das faces radiculares, e por ser constituído em 50% do seu volume por vasos, a viscoelasticidade do ligamento periodontal também é variável ao longo dos vários pontos da superfície radicular, provocando variações na intensidade dos fenômenos induzidos em áreas diferentes de um mesmo dente (CONSOLARO, 2007). A determinação do módulo de elasticidade do ligamento periodontal é possível através da aplicação do método dos elementos finitos, como comprovaram Penedo et al. (2010), permitindo avaliar a relação entre movimento dentário e forças ortodônticas e as diferentes áreas do ligamento que responderão a remodelação óssea. Na biologia óssea, sabe-se que os mediadores indutores da reabsorção óssea promovem-na ao se apresentarem em níveis elevados, porém, níveis discretos induzem fenômenos de neoformação óssea. Portanto, o nível de mediadores determina se a resposta será neoformadora ou de reabsorção óssea. Então, quando nas áreas de pressão ou estresse do ligamento ou compressão periodontal se determina uma elevada concentração de mediadores que influenciam na remodelação óssea, predominarão os fenômenos reabsortivos. Mas quando o estresse celular se reduzir, o nível de mediadores também reduzirá e induzirá fenômenos de aposição óssea. Assim explicam-se os binômios diretos de pressão-reabsorção e tensão-aposição quando considera-se o uso de forças ideais, onde no lado de tensão há uma deformação por estiramento, que é mais leve. Porém, com uso de forças excessivas, haverá rompimento de fibras e morte celular, com formação de áreas extensas de hialinização e fenômenos predominantemente reabsortivos nas superfícies ósseas e até dentárias nos primeiros dias, mesmo nas áreas de tensão (CONSOLARO, 2007). Entremeio às fibras, fibroblastos, vasos e nervos do ligamento periodontal, encontra-se uma rede de cordões e ilhotas epiteliais, conhecidas como Restos Epiteliais de Malassez (REM), e que tem demonstrado função importante na manutenção da normalidade periodontal e radicular, inclusive durante o movimento ortodôntico. Os REM atuam na manutenção do espaço periodontal, evitando a anquilose alvéolodentária pela liberação continuada de fator de crescimento epitelial ou epidérmico (FCE) e participam do processo de 21 reorganização do ligamento periodontal. A movimentação dentária induzida estimula a proliferação dos REM, aumentando sua capacidade proliferativa e seu tamanho, favorecendo o deslocamento dentário por estimular a reabsorção óssea e auxiliam na reparação das áreas radiculares reabsorvidas e na cementogênese (CONSOLARO, 2010). 2.2.3 Reações Pulpares Além de todos os eventos verificados no periodonto, alterações teciduais podem ser transmitidas à polpa através dos forames apical e acessórios. Portanto, pode-se afirmar que a movimentação ortodôntica pode causar degeneração e/ou respostas inflamatórias na polpa dental de dentes com formação apical completa. O impacto do movimento dentário na polpa é localizado primeiramente no sistema neurovascular, nos quais a liberação de neurotransmissores específicos (neuropeptídeos) pode influenciar fluxo sanguíneo e metabolismo celular. A resposta induzida nestas polpas causa impacto na iniciação e/ou perpetuação da remodelação ou reabsorção radicular durante o movimento dental, sendo que a incidência e a severidade destas mudanças podem ser influenciadas por prévios ou posteriores insultos à polpa dental, tal qual como trauma ou cáries. Polpas de dentes com forame apical incompleto têm um risco muito reduzido para estas respostas, mesmo não estando imunes a seqüelas adversas durante movimento dentário (HAMILTON; GUTMANN, 1999). Santamaria Jr (2004) pesquisou as alterações teciduais e eventos celulares que ocorreram na polpa de dentes que sofreram movimentação ortodôntica. Foram utilizados 25 ratos, divididos em 5 grupos: 1 controle (não teve movimentação dentária – figura 5), e 4 grupos submetidos à movimentação ortodôntica do 1º molar superior direito (mesialização) com força de 0,4N, com variação do tempo de aplicação de forças para cada grupo em 6, 12, 24, 72h. Os resultados mostraram hipertrofia da camada odontoblástica, principalmente na região mesial da polpa coronária; edema do tecido conjuntivo na região central da polpa; alteração vascular, principalmente 22 na raiz mesial (figuras 6 e 7); sendo que todas essas alterações foram pouco evidentes no grupo que foi avaliado após 72h . Com isso, o autor sugere que o movimento dentário provoca alterações teciduais pulpares compatíveis com processo inflamatório, que podem ser reversíveis se a agressão não ultrapassar o limite de tolerância do tecido. Figura 5: fotomicrografia histológica da polpa sem movimentação ortodôntica. A= camada odontoblástica; B= zona livre de células de Weil, C= zona rica em células; D= área central da polpa. Fonte: Santamaria Jr, 2004. A B Figura 6: A= fotomicrografia da camada odontoblástica do grupo 6h; B= áreas de hemorragia pulpar e edema (setas) no centro da polpa no grupo de 6h. Fonte: Santamaría Jr, 2004. 23 A B Figura 7: A= aumento de 200x, seta indicando um canal acessório, mostrando a íntima relação entre polpa e ligamento periodontal; B= aumento de 400x PL: ligamento periodontal, D: dentina, P: polpa. Fonte: Santamaría Jr, 2004. Vários são os efeitos adversos resultantes das forças ortodônticas relatados e intimamente relacionados a alterações da microcirculação, como as reabsorções radiculares, formação de dentina secundária e necrose pulpar (SALLES, 2006). Estudos vêm correlacionando esforços mecânicos com o fluxo vascular do dente e dos seus tecidos de suporte através da Fluxometria Laser Doppler (FLD), técnica que permite medir o fluxo da polpa humana intacta e dos tecidos de suporte dentário, permitindo o estudo em tempo real de situações clínicas, sem oferecer riscos aos pacientes (NOGUEIRA, 2003). Em 2006, Salles investigou alterações no fluxo sangüíneo pulpar de incisivos centrais permanentes em humanos pela FLD, antes e durante a aplicação de forças ortodônticas que promoveram movimentos de inclinação e translação, dentro de condições clínicas reais. Foram monitorados dois grupos de voluntários: um com doze pacientes em fase de nivelamento dos arcos e outros treze pacientes na fase de retração dos dentes anteriores. Ambos os grupos eram compostos de pacientes com a mesma maloclusão (Classe II, primeira divisão de Angle) e foram submetidos à ortodontia fixa pela técnica 24 Edgewise. A medição foi realizada no elemento 21, hígido, antes da aplicação de forças e 20 minutos, 48h, 72h e um mês depois da aplicação. Os resultados mostraram que no grupo da fase de nivelamento predominou a diminuição progressiva de fluxos nas medições até 72h, e em um mês após a aplicação de forças os valores tornaram-se muito próximos aos iniciais (antes da aplicação de forças). No grupo em fase de retração, houve diminuição do fluxo nas primeiras 72h após a ativação das forças, permanecendo abaixo do valor inicial em um mês e sem evidências de retornarem aos valores iniciais. Estes resultados foram verificados tanto para medida do fluxo sangüíneo pulpar quanto para os tecidos subjacentes. Confrontando os resultados encontrados em ambos os grupos, os autores concluíram que, na fase de nivelamento, o retorno do fluxo sangüíneo pulpar a níveis próximos dos iniciais após um mês de aplicação das forças, sugere que o período de reativação das forças a cada 30 dias é adequado; enquanto na fase de retração, apesar da queda crescente do fluxo, a avaliação de um mês após a ativação das alças mostrando o fluxo abaixo do nível controle sugere que a polpa ainda não estava recuperada, e deve-se reavaliar a ativação destas forças a cada 30 dias. O baixo fluxo encontrado na medição do grupo da fase de retração nos 30 dias após a aplicação de forças pode também ser entendido pela compressão de vasos na região apical, já que a técnica utilizou-se de um fio rígido e calibroso (aço 0.019”x 0.022”) com direção de movimento radicular para região palatina e apical (movimento de translação), em comparação a fase de nivelamento que se utilizou de um fio flexível e de baixo calibre (NiTi 0.014”) e que apenas realizou movimentos de inclinação. Do mesmo modo, Yamaguchi e Kasai (2007) pesquisaram os efeitos da mecânica ortodôntica sobre a polpa dental humana, através de avaliações histológicas, e encontraram evidências de que o sistema nervoso sensorial periférico pode induzir alteração pulpar na forma de inflamação neurogênica que causam alteração do fluxo sangüíneo levando ao desenvolvimento de processos inflamatórios agudos e crônicos, sendo que forças aplicadas em excesso, podem causar distúrbios de oxigenação pulpar por diminuição ou congestionamento da circulação sangüínea, causando danos iatrogênicos à polpa, que podem se manifestar desde uma simples necrose até uma reabsorção radicular severa. Os autores ainda sugeriram que mais estudos 25 são necessários para confirmar as reações pulpares às diferentes forças mecânicas utilizadas na terapia ortodôntica. O nível de aumento ou diminuição na oxigenação pulpar pode de fato não ter significância clínica quando o tratamento ortodôntico envolve dentes íntegros. Entretanto, alguns dentes que são submetidos ao movimento ortodôntico podem estar comprometidos por cárie, procedimento operatório ou material restaurador. Neste caso, o nível de mudanças no padrão de oxigenação pode ser extremamente significativo, resultando em mudanças pulpares que podem culminar em pulpites irreversíveis ou necrose pulpar e sua possível seqüela de reabsorção radicular interna ou externa, principalmente em dentes com ápice totalmente formado e fechado. Já os dentes com forame apical aberto, apresentaram melhores condições de recuperação tecidual, pois as alterações de fluxo sangüíneo e pressão vascular podem se restabelecer facilmente pela ausência de constrição dos vasos que adentram pelo forame principal, o que permite uma boa regulação da microcirculação e drenagem do exsudato inflamatório (AMODEO, 2007). Fonseca e Guzmán (2010) apresentaram dois casos de pacientes tratados ortodonticamente, um com extravasamento hemorrágico pulpar e outro com necrose e ambos sem traumatismo prévio. O primeiro, tratava-se de um canino retido que foi tracionado ortodonticamente e o paciente relatou sentir dores intensas no mesmo nos períodos de ativação; e o segundo, um incisivo lateral que tinha uma posição vestibularizada e foi posicionado em apenas 2 meses, sendo que o paciente relatou dor imediata na primeira ativação do aparelho. Com isto os autores puderam observar que a aplicação de forças ortodônticas pode gerar dano pulpar em diferentes graus, e até de maneira similar a um traumatismo agudo, sendo de fundamental importância realizar um bom diagnóstico de vitalidade pulpar de dentes que apresentem sintomatologia diferenciada durante o tratamento ortodôntico, a fim de evitar eventos iatrogênicos. 26 2.2.3.1 Laserterapia Nas últimas décadas, a odontologia vive uma explosão de pesquisas sobre a aplicação de lasers de baixa intensidade, como os lasers diodo, e sua eficácia na bioestimulação para aplicações específicas na prática clínica odontológica. Enquanto a maioria das aplicações de laserterapia são direcionadas para cicatrização e tratamento de tecidos moles, tem havido um crescente interesse aos efeitos do laser de baixa intensidade no tratamento de tecidos duros e de suporte dental, como a dentina e o periodonto (YAMAGUCHI, 2010). Pesquisas contemporâneas têm focado a aceleração da regeneração óssea através da laserterapia, onde a irradiação estimula a proliferação e diferenciação celular de osteoblasos, osteoclastos e demais células comprometidas com a neoformação e remodelação óssea e traz grandes benefícios na abreviação dos longos períodos de tratamento ortodôntico (KAWASAKI; SHIMIZU, 2000). Outros estudos enfatizaram que, além da aceleração na movimentação ortodôntica, a redução dos níveis de dor também tem apresentado um bom resultado com terapia a laser e pode ser um valioso aliado na prática ortodôntica, diminuindo o desconforto do paciente (YOUSSEF et al., 2008). Estudos experimentais em ratos, com diferentes métodos de aplicação e avaliação do efeito da irradiação com laser de baixa intensidade, vêm demonstrando bons resultados (KAWASAKI; SHIMIZU, 2000; ABI-RAMIAA et al., 2010; YAMAGUCHI et al., 2010) embora ainda não esteja bem definido as corretas dosagens e protocolos mais apropriados para o uso da laserterapia por períodos prolongados, o que exige mais estudos para aperfeiçoamento das técnicas e aprofundar o conhecimento dos efeitos colaterais (MARQUEZAN; BOLOGNESE; ARAÚJO, 2010). Kawasaki e Shimizu (2000) realizaram um estudo experimental em dentes de ratos para verificar o efeito do laser de baixa intensidade sobre a movimentação dentária, comparando um grupo de irradiação de laser diodo com grupo controle e após 12 dias realizaram a medição. Nos grupos irradiados a quantidade de movimento dentário foi de 1,3 vezes maior que o grupo controle, também a formação óssea e a proliferação celular no lado de 27 tensão e o número de osteoclastos no lado de pressão foram significativamente aumentados no grupo de aplicação do laser, o que levou os autores a concluírem que a laser terapia pode acelerar o movimento dentário acompanhado pela remodelação óssea. Abi-Ramiaa et al. (2010) procuraram descrever as reações pulpares microscópicas observadas com o uso do laser de baixa intensidade na movimentação dentária ortodôntica induzida em ratos. Verificaram que os achados histológicos encontrados no grupo irradiado demonstraram significativas alterações pulpares em relação aos grupos não irradiados, sendo que a principal diferença foi a vascularização mais intensa, justificada pela aceleração da neovascularização induzida pelo laser de baixa intensidade, além da presença de mais células diferenciadas, fibroblastos e fibras de colágeno. Os resultados deste estudo mostraram uma otimização do tratamento ortodôntico, devido à aceleração do reparo do tecido pulpar. Yamaguchi et al. (2010) pesquisaram o efeito do laser na velocidade da movimentação dentária induzida em ratos e em alguns fatores desencadeantes da osteoclastogênese, como matriz de metaloprotease-9, catepsina K e alfa (α) beta (β) integrina. Ao final da experiência, o grupo laser irradiado apresentou quantidade de movimento significativamente maior do que no grupo nãoirradiado, principalmente no terceiro dia, o número de osteoclastos foi maior no grupo do laser assim como um número mais elevado dos fatores desencadeantes da osteoclastogênese observados neste estudo. Concluíram, então, que é possível acelerar o processo de remodelação óssea por estimulação a laser da diferenciação de osteoclastos e osteoblastos durante a movimentação ortodôntica. O efeito bioestimulador do laser de baixa potência tem sido amplamente estudado e comprovado, mas muitos destes trabalhos que são publicados apresentam variações metodológicas e a omissão de dados importantes ou diferença na descrição dos parâmetros referentes ao laser, criando um problema que dificulta a comparação entre os estudos e a reprodução de experimentos. Estudos com laser terapêutico deveriam fornecer em detalhes do protocolo de irradiação, descrevendo o aparelho utilizado, caracterizar a dose, a energia total fornecida, o modo de irradiação, o tempo de aplicação, 28 além da descrição minuciosa do número e localização dos pontos de aplicação e do intervalo entre irradiações (MARQUEZAN et al., 2009). Entretanto é importante salientar seus efeitos histologicamente comprovados como aumento da microcirculação e da diferenciação celular, tanto na polpa quanto no periodonto de sustentação além do aumento do número de osteoclastos e da remodelação óssea, mostrando uma otimização do tratamento ortodôntico, devido à aceleração do reparo dos tecidos pulpar e periodontal (YOUSSEF et al., 2008; YAMAGUCHI et al., 2010). 2.2.4 Magnitude de Forças As forças ortodônticas são energias ou intensidades desencadeadas por dispositivos ortodônticos para movimentar ou induzir a mudança no posicionamento dentário. Na prática, os dentes nunca são movidos por uma simples força, mas o movimento final é determinado pela resultante de várias forças que atuam nos dentes, pois deve-se levar em conta a magnitude, o ponto de aplicação e a direção da força e por essa razão, as forças são determinadas por vetores, tendo como resultante a soma dos mesmos (RYGH; MOYERS, 1991). O conhecimento das variáveis mecânicas e biológicas envolvidas na movimentação ortodôntica permite um melhor entendimento das reações resultantes da compressão do periodonto de proteção e sustentação (ROBERTS, 1996; REGO et al., 2004; KUHLBERG; NANDA, 2007). Quanto mais pesada for a força aplicada maior será a redução no fluxo sanguíneo nas áreas comprimidas do ligamento periodontal até o ponto em que os vasos se tornem completamente colapsados e sem fluxo, levando a formação de áreas avasculares de necrose estéril, evento este conhecido como hialinização que causa atraso no movimento dentário (REITAN; RYGH, 1996; PROFFIT et al., 2007). Evidenciam-se três momentos no deslocamento dental: tensão inicial, fase de estagnação e movimento dentário progressivo. Primeiramente, existe um pequeno deslocamento dentro do alvéolo, em seguida há compressão das 29 fibras periodontais até a paralisação do movimento (é quando ocorre a hialinização), e então, posteriormente, o osso subjacente ao tecido hialinizado é eliminado pela reabsorção óssea a distância (ROBERTS, 1996). A duração desta reabsorção óssea que ocorre na fase de estagnação, será mais ou menos proporcional à extensão da zona hialinizada, por isso é importante que se aplique as forças iniciais de tal maneira que se evite a formação de zonas acelulares demasiadamente extensas, já que a magnitude da força é que determinará a duração da hialinização (REITAN; RYGH; 1996). Deve-se levar em conta que as pequenas distâncias inter-bráquetes podem ocasionar forças pesadas mesmo com o uso de fios leves, entretanto é possível aumentar a distância inter-bráquetes pela incorporação de alças, dobras ou hélices no arco, suavizando este efeito e desta maneira, conseguir uma liberação de forças mais suaves (RYGH; MOYERS, 1991). A aplicação de forças iniciais leves tem o propósito de aumentar a atividade celular sem causar inconveniente compressão do tecido e preparar os tecidos para mudanças posteriores, sendo necessária uma pequena variação na magnitude de força dependendo do tipo de movimento e do tamanho dos dentes. Para isso, deve-se observar dois aspectos importantes do problema força: a quantidade desta força inicial e a extensão de trabalho desta força, pois um arco pesado pode ser ajustado de maneira a distribuir uma força pequena com a qual o dente se moverá somente uma curta distância, combinando força leve e extensão de trabalho favorável (REITAN; RYGH, 1996). No entanto, a relação entre movimento dental e a magnitude de forças ainda é controversa. Algumas linhas de pesquisas sugerem a existência de uma força ótima, onde haveria uma relação direta aos níveis de baixa força e inversa aos de forças altas, porém os estudos clínicos que tentam abordar este conceito apresentam técnicas bastante complexas devido a dificuldade de medidas exatas do movimento dental, da magnitude das forças e sua distribuição no meio clínico (HUANG; KING; KAPILA, 2007). 30 2.2.5 Tipo de movimento,Tipos de Força e Duração Tanto a quantidade de força liberada num dente quanto a área de ligamento periodontal sobre a qual a força será distribuída são importantes para determinar o efeito biológico do movimento ortodôntico sobre o dente e seus tecidos adjacentes, como ocorre nos movimentos de inclinação, rotação e translação, onde a resultante destas forças vai depender da soma dos vetores e a distância destes em relação ao centro de resistência do dente (HUANG; KING; KAPILA; 2007; PROFFIT et al., 2007). O segredo para se produzir movimento dentário ortodôntico pode estar na aplicação de uma força adequada, o que não significa que a força deva ser absolutamente contínua. Experiências clínicas já demonstraram que existe um limiar para a duração de forças em humanos em torno de 4 a 8 horas e que é produzido movimento dentário realmente eficaz se a força for mantida por um longo período. A duração das forças foi classificada segundo a sua decomposição, em forças contínuas, interrompidas e intermitentes, sendo que as forças contínuas pesadas devem ser evitadas enquanto as forças intermitentes e interrompidas pesadas podem ser clinicamente aceitáveis devido as características de declínio das forças, o que permite ao ligamento periodontal uma adequada recuperação entre as ativações (PROFFIT et al., 2007). As forças que causam movimentos interrompidos normalmente são produzidas por aparelhos fixos, enquanto que as intermitentes estão mais associadas ao uso de aparelhos removíveis. Apesar disto, alguns tipos de mecânicas utilizadas em aparelhos fixos podem periodicamente produzir forças que são em parte intermitentes. Na clínica ortodôntica, os movimentos dentários interrompidos e intermitentes apresentam certas vantagens em relação ao movimento contínuo, já que permite aos tecidos periapicais e pulpares um período de descanso e recuperação, resultando numa circulação melhorada, diminuindo os riscos de uma perturbação pulpar e de uma extensa zona de hialinização (REITAN; RYGH, 1996). A área do ligamento periodontal sobre a qual a força será distribuída, influencia no tipo de movimento que o dente irá apresentar, devendo-se ter 31 amplo conhecimento sobre a localização do centro de resistência do dente, a fim de selecionar a técnica adequada ao movimento desejado. Este local é equivalente ao centro de massa para corpos restritos, é o ponto de equilíbrio do dente e quando aplicado uma força cujo vetor resultante coincidir com este ponto, promoverá o movimento linear do mesmo. O centro de resistência de um dente dependerá do tamanho e morfologia da raiz, número de raízes e nível de inserção óssea alveolar e pode ser descrito nos vários planos espaciais (KUHLBERG; NANDA, 2007). As forças que causam o movimento de translação são aquelas cujos vetores resultantes passam pelo centro de resistência do dente e levam coroa e raiz para a mesma direção, num movimento paralelo à superfície interna do alvéolo (RYGH; MOYERS, 1991). Este seria o método de deslocamento mais favorável, porém o movimento de translação puro dificilmente pode ser reproduzido na prática ortodôntica (REITAN; RYGH, 1996). Como as forças são aplicadas através de dispositivos ortodônticos fixados á coroa dental, estas forças passam a uma certa distância do centro de resistência causando o momento da força que resulta em certa rotação dentária (KUHLBERG; NANDA, 2007). Quando uma força é aplicada contra um dente tendo um único ponto de contato, produzirá a inclinação, com a coroa se movimentando na direção oposta da raiz. Este é o movimento mais simples de se produzir, mas normalmente não é desejado, pois as tensões não são uniformes e se cria muita tensão no vértice da raiz, estas forças compressivas geradas no ápice podem causar extensa hialinização (RYGH; MOYERS, 1991). Na polpa, surgem alterações no fluxo sangüíneo, aumentando a pressão vascular e diminuindo a oxigenação pulpar, pela compressão dos vasos que nutrem o tecido pulpar através do forame apical (AMODEO, 2007). Estas alterações teciduais são compatíveis com processo inflamatório, que pode ser reversível em poucos dias, se as forças aplicadas não forem excessivas (SANTAMARIA Jr, 2004). Com o uso de fios retangulares, é possível movimentar a raiz mantendo a coroa estável, movimento este conhecido como torque. Este movimento requer aumento na magnitude de forças e causa considerável tensão no ápice radicular, pois usa de forças que tendem a causar rotação (KUHLBERG; 32 NANDA, 2007). Pesquisas realizadas com a Fluxometria Laser Doppler, comprovaram que os movimentos de translação e torque, realizados para retração de incisivos superiores, mantiveram o fluxo sangüíneo pulpar abaixo do nível normal, mesmo após 30 dias da aplicação da mecânica, sugerindo que a polpa ainda não encontrava-se recuperada e que a aplicação de tais forças continuavam a exercer compressão considerável nos vasos da região apical, necessitando a reavaliação da possibilidade de aumentar o prazo de ativação das forças para 45 ou 60 dias (SALLES, 2006). O movimento puro de rotação ocorre com o uso de forças circulares em volta do longo eixo do dente, numa perspectiva da vista oclusal, uma força é aplicada pela vestibular e outra pela lingual em sentidos opostos, com um movimento paralelo entre a raiz e a superfície óssea. Na prática a maioria dos dentes ao girar criará dois lados de tensão e dois lados de pressão (REITAN; RYGH, 1996). Num estudo experimental para avaliação histológica das alterações no tecido pulpar de dentes humanos submetidos a aplicação de forças de intrusão in vivo, utilizou-se 12 pré-molares superiores com indicação ortodôntica de extração. Aplicaram-se forças de intrusão de 60gF em 6 dentes durante 21 dias, e os 6 dentes homólogos não receberam força para comporem o grupo controle. Após as extrações, preparo das peças e avaliação microscópica, verificou-se a presença de vasos sangüíneos mais dilatados e deformados no grupo experimental, além de calcificações pulpares mais intensas nos dentes homólogos (dobro ou triplo) aos do grupo controle que já apresentavam nódulo pulpar. Alguns dentes do grupo controle apresentaram aumento da matriz extra-celular, podendo caracterizar edema, enquanto outros formaram um tecido conjuntivo mais fibroso. Assim, concluiu-se que o movimento de intrusão provocou alterações pulpares que podem causar danos variados a polpa, desde uma inflamação até uma calcificação parcial do tecido pulpar (FERNANDES, 2011). 33 2.3 TRATAMENTO ENDODÔNTICO O tratamento endodôntico visa devolver ao dente e tecidos subjacentes uma condição de normalidade e reparo dos danos sofridos, sendo realizado em várias etapas interdependentes e contínuas, objetivando a sanificação, modelagem e selamento dos canais radiculares e permitindo a recuperação do periápice (CERQUEIRA et al., 2007). O sucesso do tratamento endodôntico de dentes com necrose pulpar e lesões periapicais visíveis radiograficamente vai depender da associação de diversos fatores, tais como uso de técnicas adequadas de instrumentação e irrigação para controle e eliminação dos microorganismos do sistema de canais radiculares, uma obturação hermética e com um limite adequado (FACHIN; LUISI; BORBA, 2001; ESPÍNDOLA et al., 2002; NASSRI; LIA; BOMBANA, 2003; ESTRELA et al, 2007). 2.3.1 Reações Periodontais A importância da realização de um adequado tratamento endodôntico para recuperar a saúde periapical e manter a integridade radicular e periodontal, traduz a necessidade da abordagem deste tema. A saída de agentes irritantes de polpas necrosadas para os tecidos periapicais leva a uma resposta inflamatória que pode incluir além da destruição do ligamento periodontal, a reabsorção do osso, cemento e até mesmo da dentina (FACHIN; LUISI; BORBA, 2001; ESPÍNDOLA et al., 2002; NASSRI; LIA; BOMBANA, 2003). Baseado nestes princípios, Dovigo et al. (2006) realizaram um estudo a fim de relacionar o sucesso clinico e radiográfico de dentes com necrose pulpar e lesão periapical ao limite apical de obturação, onde sugerem que com a padronização de técnicas e materiais obturadores e restauração adequada da coroa dental, o índice de sucesso no tratamento destas afecções é alto, tendo atingido um número de 83 sucessos para 88 casos estudados, 34 independente do limite de obturação efetuado, o qual apresentou variância desde extravasamento de material, até limite de mais de 2 mm aquém do forame periapical. A técnica endodôntica pode ocasionar repercussões indesejáveis no periodonto e que comprometem o pleno restabelecimento da saúde do periápice, pois durante o esvaziamento e instrumentação do canal radicular pode-se empurrar resíduos além do forame apical, ocorrer sobrepasse de limas ou extravazamento de material obturador (FACHIN; LUISI; BORBA, 2001). Até mesmo o uso de soluções, medicações intra-canais e cimentos endodônticos demasiadamente irritantes aos tecidos periapicais podem promover lesões teciduais extensas, prejudicando a reparação desta região e causando interferências negativas no tratamento endodôntico (ROLDI; LEONARDO; LIA, 1998; NASSRI; LIA; BOMBANA, 2003; CÂMARA; ALBUQUERQUE; AGUIAR, 2010). Nas biopulpectomias são recomendadas soluções irrigadoras biologicamente compatíveis, com o objetivo de respeitar a vitalidade do coto pulpar, matriz da mineralização apical e da obturação biológica do canal, reduzindo a irritação química e a injúria das ramificações do delta apical e periodonto periapical (ROLDI; LEONARDO; LIA, 1998). Espíndola et al. (2002) realizou uma pesquisa em 19 dentes submetidos ao tratamento endodôntico por pelo menos mais de 2 anos, através da interpretação radiográfica realizada por 3 especialistas, com o objetivo de avaliar o grau de sucesso do tratamento endodôntico, tendo como resultado que 78,9% dos tratamentos obtiveram sucesso por apresentarem-se sem lesão periapical. Sugeriu também, que muitas falhas atribuídas à obturação inadequada do canal podem ter origem no preparo incorreto, ressaltando a importância da tríade limpeza, modelagem e obturação na obtenção do sucesso endodôntico. Revisões sistemáticas de estudos longitudinais avaliaram a influência do cimento obturador no sucesso endodôntico e concluíram que os cimentos contendo óxido ou hidróxido de cálcio mostraram um bom desempenho no processo de reparo clínico-radiográfico, obtendo elevadas taxas de sucesso em relação aos cimentos a base de óxido de zinco e eugenol. A observação de tais pesquisas comprova que o repouso oferecido aos tecidos periapicais por meio de uma adequada obturação favorece a osteogênese, a reparação do 35 ligamento periodontal e a neoformação de osteocemento. (ESTRELA et al., 2007). Nas últimas décadas a endodontia experimentou grande avanço tecnológico simplificando tecnicamente muitas etapas operatórias. Porém, devido à natureza difusa da infecção endodôntica pelos túbulos dentinários, canais secundários e acessórios e áreas de reabsorção cementária apical, o preparo biomecânico e a imediata obturação do canal radicular ainda geram dúvidas sobre a qualidade da reparação periapical após tratamento em sessão única de dentes com lesão periapical crônica. Pesquisas realizadas para avaliação da eficácia de tal procedimento demonstraram que embora o sucesso a curto prazo seja constatado pela ausência de sinais e sintomas clínicos, a médio prazo o percentual de sucesso radiográfico pode apresentarse reduzido (SOARES; CÉSAR, 2001). Porém, nem todos os trabalhos apresentam uma metodologia adequada e/ou uso de técnicas padronizadas, o que dificulta a comparação dos mesmos. Estudos demonstraram que mais importante que o número de sessões é a realização de limpeza desinfecção e preparo adequado dos canais radiculares, e o cumprimento destas normas permite o tratamento endodôntico em sessão única (VIANNA, 2006; RAMPAZZO, 2012). 2.3.2 Tendências atuais no Tratamento Endodôntico A permanência de microorganismos no canal radicular mesmo após o preparo químico-cirúrgico e o uso da medicação intra-canal, deve-se à complexidade anatômica do canal radicular, dificuldade de acesso de instrumentos e soluções, além da complexa interação entre diferentes espécies bacterianas e seus fatores de virulência e patogenecidade, podendo comprometer o sucesso da terapia endodôntica (NEVES, 2001; VIANNA, 2006; AMARAL et al., 2010). O papel das bactérias e seus subprodutos no estabelecimento e perpetuação das infecções pulpares e periapicais é bem conhecido. A grande maioria das bactérias infectantes é removida durante os procedimentos 36 endodônticos de instrumentação e irrigação do canal radicular, porém a total eliminação de espécies patogênicas, nem sempre é atingida na prática clínica, fazendo-se necessária a constante pesquisa por alternativas de soluções, medicações e tratamentos auxiliares (PARADELLA et al., 2007; CÂMARA; ALBUQUERQUE; AGUIAR, 2010). A tecnologia laser apresenta-se como a uma recente alternativa de tratamento e a literatura mostra que a irradiação pode promover a redução bacteriana intra-canal. Estudos in vitro tem avaliado o efeito da irradiação laser na desinfecção de canais radiculares de dentes humanos extraídos, inoculando bactérias nos mesmos e aplicando protocolos de laserterapia, tendo encontrados altos índices de sucesso na descontaminação, com até 99% de redução bacteriana. (NEVES, 2001). A terapia fotodinâmica também se apresenta como um novo coadjuvante ao tratamento endodôntico na tentativa de eliminar microorganismos persistentes ao preparo químico-mecânico. Esta técnica envolve um corante fotossensibilizador ativado por luz específica na presença de oxigênio, formando espécimes químicas altamente reativas que danificam células microbianas. As fontes de energia para sensibilizar os corantes podem ser lasers de Hélio-neon, laser diodo de baixa intensidade ou os LEDs e embora muitos trabalhos comprovem a eliminação de microorganismos nos sistemas de canais, ainda não foram estabelecidos protocolos em relação a luz, fotossensibilizadores e tempo de exposição (AMARAL et al., 2010). Experimentos vêm buscando inserir novas tecnologias no dia a dia da prática clínica, com objetivo de aprimorar técnicas convencionais e oferecer alternativas eficientes de tratamento. Apesar deste tipo de terapêutica ser bastante conservadora e atender aos anseios da odontologia moderna, ainda é pouco conhecida e pesquisada pela odontologia brasileira e por isso deve ser amplamente estudada e difundida entre os profissionais da área (NEVES, 2001). 37 2.4 DENTES TRAUMATIZADOS Devido a importância destas injúrias, que acometem principalmente pacientes em idade própria ao tratamento ortodôntico ou prévia a ele, vê-se a necessidade de citar pesquisas relacionadas ao tema de prevalência/incidência dos traumatismos alvéolo-dentários e a influência destes no planejamento e tratamento ortodôntico (GOMES, 2003; KUGEL; ZEH; MÜSSIG, 2006; PEREIRA, 2008; XAVIER et al., 2011). A anamnese, o exame clínico detalhado e uma criteriosa avaliação radiográfica são de extrema importância para verificar a existência de casos de dentes com história de trauma e indicação de tratamento ortodôntico, para realizar um correto diagnóstico e um plano de tratamento mais adequado possível (BORTOLOTTI et al., 2011). Autores confirmam a crescente prevalência de lesões traumáticas, cada vez mais comuns em crianças e adolescentes, relatadas em vários estudos nas últimas décadas (BASTONE; FREER; MACNAMARA, 2000; GOMES, 2003; KUGEL; ZEH; MÜSSIG, 2006; PEREIRA, 2008; ANDREASEN; VINDING; CHRISTENSEN, 2008, XAVIER et al., 2011). Foi constatada, também, a dificuldade de comparar os resultados das várias investigações de lesões dentárias, em parte, porque as informações são imprecisas ou baseiamse em grupos específicos. Porém a principal razão é que a classificação de trauma, a terminologia e os dados aferidos diferem substancialmente de um estudo para outro, o que dificulta a obtenção de dados epidemiológicos representativos (XAVIER et al., 2011). O número, o tipo e a gravidade das lesões dentárias, diferem de acordo com a idade do paciente, da causa do acidente e a presença de fatores predisponentes e de risco, como overjet acentuado e selamento labial inadequado; e os incisivos centrais superiores foram os dentes mais acometidos por trauma, seguidos dos incisivos laterais superiores (BASTONE; FREER; MACNAMARA, 2000). A prevalência de traumatismos alvéolo-dentários também apresenta variações de acordo com a localização geográfica em que é estudada, como foi possível verificar nos trabalhos de Porto et al. (2003), Moura et al. (2008) e Xavier et al. (2011). Porto et al. (2003) avaliaram a prevalência de trauma na 38 clínica de urgência odontopediátrica da Faculdade de Odontologia da UFRGS, com levantamento de uma amostra de 129 prontuários de crianças atendidas, com idade entre 0 a 14 anos, podendo-se observar o maior acometimento de traumas em permanentes na faixa etária de 8 a 10 anos, maior freqüencia no sexo masculino (62,01%), e com maior prevalência de injúrias traumáticas aos tecidos duros (59,25%). Moura et al. (2008), objetivaram determinar a prevalência das injúrias traumáticas alvéolo-dentárias em pacientes assistidos na clínica odontológica infantil da Universidade do Piauí, avaliando uma amostra de 260 prontuários de crianças na faixa etária de 8 meses a 14 anos, sendo que a diferença estatística encontrada entre sexo masculino e feminino não foi considerada significante (53,3% - meninos e 46,7% - meninas), as lesões foram mais freqüentes na dentição decídua e as fraturas coronárias foram o tipo de lesão predominante. Já os pesquisadores Xavier et al. (2011), realizaram um levantamento epidemiológico para identificar o perfil, tipo de trauma e os dentes mais acometidos dos pacientes atendidos no Serviço de Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Pelotas, com avaliação de 308 prontuários clínicos de amostragem, numa faixa etária de 7 a 29 anos; verificaram o predomínio de traumas na idade de 13 a 19 anos (32,7%) eno sexo masculino (relação 3:1), prevalência dos traumas de avulsão e fratura coronária, e com incisivos centrais superiores mais acometidos. Apesar das diferenças estatísticas apresentadas nas pesquisas, há que se levar em consideração o grande número de pacientes que vai procurar por tratamento ortodôntico posterior a estas injúrias e quais os cuidados que as mesmas implicam. O conhecimento sobre o efeito do trauma nos dentes e tecidos de suporte é que vai determinar o sucesso ou as seqüelas da injúria sofrida, bem como o adequado tratamento e proservação do mesmo (BUSATO, 2009, BORTOLOTTI et al., 2011). As respostas pulpares aos ferimentos traumáticos serão afetadas de acordo com o grau de lesão ao fornecimento neurovascular e a presença ou não de bactérias no interior do canal radicular, com isto, três resultados são esperados: cicatrização pulpar, necrose ou calcificação pulpar, sendo que as três respostas podem ocorrer em diferentes momentos, como num primeiro diagnóstico inicial de vitalidade pulpar pode ser seguido por obliteração do canal e, posteriormente, necrose 39 pulpar (ANDREASEN; VINDING; CHRISTENSEN, 2008; BUSATO, 2009). Em caso de uma luxação com fratura de coroa, pode ocorrer a contaminação do canal radicular pelo acesso facilitado a entrada de bactérias, levando a uma necrose pulpar, que por sua vez apresenta o risco de infecção relacionada a reabsorção radicular inflamatória, o que demonstra a importância do monitoramento cuidadoso das respostas pulpares às lesões traumáticas. O efeito sobre o ligamento periodontal será observado nos casos onde ocorrem as reabsorções radiculares, que podem apresentar-se de três maneiras: relacionadas à reparação (reabsorção parcial de superfície, que é reversível), a reabsorção por substituição (anquilose) e com a infecção (inflamatória), sendo esta última o tipo mais agressivo e normalmente está associada com a infecção do canal radicular, sendo que o tratamento endodôntico oportuno pode deter o processo da reabsorção quando detectado no início (BAKLAND; ANREASEN, 2004; ANDREASEN; VINDING; CHRISTENSEN, 2008). O planejamento e tratamento ortodôntico podem ser complicados devido às variáveis no diagnóstico, tratamento e prognóstico de longo prazo dos dentes traumatizados (ANDREASEN; VINDING; CHRISTENSEN, 2008; BUSATO, 2009). Estima-se que em muitos casos a ortodontia pode ser utilizada para melhorar os resultados no tratamento protético e restaurador do elemento envolvido (KUGEL; ZEH; MÜSSIG, 2006, BORTOLOTTI et al., 2011). Danos ao crescimento da raiz, como a dilaceração radicular, atraso na irrupção ou localização ectópica podem ser decorrentes de traumas em diferentes fases do desenvolvimento dental, e exigem intervenção ortodôntica a fim de reposicionar o dente adequadamente assim que for diagnosticado o problema (ANDREASEN; VINDING; CHRISTENSEN, 2008). Em casos de fraturas corono-radiculares, uma extrusão ortodôntica pode melhorar a situação préprotética via reposição supra-gengival da margem gengival da coroa. Dentes que sofreram algum tipo de luxação devem ser observados por um período de 6 meses a 1 ano antes de alguma intervenção ortodôntica, dependendo a extensão da lesão e do grau de mobilidade e deslocamento ocorrido, sabendose do risco deste elemento apresentar anquilose, o que pode impedir a movimentação dentária (KUGEL; ZEH; MÜSSIG, 2006). È importante também, salientar quais danos o trauma dento-alveolar pode causar aos tecidos periapicais e a freqüência com que pode levar ao 40 desenvolvimento de injúrias dos mesmos. Muitos estudos demonstraram que lesões mínimas no ligamento periodontal, tais como ruptura de fibras é geralmente seguido por uma regeneração completa do tecido, incluindo sua arquitetura normal e função (BAKLAND; ANREASEN, 2004; KUGEL; ZEH; MÜSSIG, 2006; ANDREASEN; VINDING; CHRISTENSEN, 2008; PEREIRA, 2008; BUSATO, 2009). Em lesões mais graves, no entanto, com compressão significativa ou esmagamento do ligamento periodontal, incluindo ou não o tecido ósseo subjacente, o dano tecidual irá estimular a remoção do tecido lesado através de uma reparação que pode ser localizada e transitória ou definitiva, como a anquilose e a reabsorção radicular inflamatória (ANDREASEN; VINDING; CHRISTENSEN, 2008). A reabsorção radicular em dentes traumatizados é muito fortemente relacionada com a presença de bactérias no ligamento periodontal ou na polpa e na qualidade do tratamento endodôntico-restaurador do elemento traumatizado. Outra relação existe no estágio de desenvolvimento radicular – ápice aberto ou fechado – e a idade do paciente (ANDREASEN; VINDING; CHRISTENSEN, 2008). A anquilose alvéolodentária pode ocorrer quando traumatismos moderados e severos levam a perda extensa de áreas do ligamento periodontal por necrose, inclusive levando ao desaparecimento de boa parte da rede epitelial de Malassez, que são as células responsáveis pela liberação de mediadores como o FCE e prostaglandinas, os principais auxiliares na recuperação do tecido periodontal lesado, e também lesões irreversíveis nos cementoblastos. Na prática clínica, os dentes que apresentarem anquilose durante ou após o tratamento ortodôntico terão diagnóstico de traumatismo dentário como causa desta injúria e não como conseqüência da movimentação dentária em si, conforme fundamenta a literatura (CONSOLARO, 2010). Portanto, o traumatismo dentoalveolar não contra-indica o tratamento ortodôntico, desde que os tecidos periodontais voltem a apresentar-se organizados e seja feito acompanhamento radiográfico periódico durante a movimentação dentária (BAKLAND; ANREASSEN, 2004; KUGEL; ZEH; MÜSSIG, 2006; PEREIRA, 2008; BUSATO, 2009; BORTOLOTTI et al., 2011). 41 2.5 MOVIMENTAÇÃO DE DENTES COM TRATAMENTO ENDODÔNTICO A literatura apresenta-se modesta com relação aos efeitos da movimentação dentária em dentes tratados endodonticamente e artigos que associem a movimentação ortodôntica à presença de lesões periapicais são raros (SOUZA, 2003). Spurrier et al. (1990) verificaram a probabilidade de dentes tratados endodonticamente sofrerem menor reabsorção radicular quando submetidos à movimentação ortodôntica, em comparação a dentes vitais num estudo radiográfico retrospectivo. Com uma amostra de 43 pacientes (21 do sexo masculino e 22 do feminino), que apresentavam um ou mais dentes anteriores tratados endodonticamente antes do tratamento ortodôntico, com mais de um ano de movimentação ortodôntica e presença de lesões de reabsorção radicular apical e utilizando o dente contralateral vital como controle, puderam constatar que os dentes vitais sofreram mais reabsorção do que os desvitalizados, com diferença estatisticamente significante (figura 7). Os dentes vitais dos pacientes do sexo masculino apresentaram mais reabsorções em comparação aos dentes vitais femininos e não houve diferença estatística entre os gêneros para os dentes desvitalizados. A B Figura 8: RX de acompanhamento, ilustrando reabsorção maior nos dentes vitais em comparação ao dente com endodontia. A= antes da retração B= após retração de incisivos. Fonte: Prof. Dr. Giovana Casaccia. 42 Mah, Holland e Pehowich (1996) realizaram um estudo experimental em 12 furões, os caninos inferiores unilaterais sofreram terapia endodôntica prévia ao tratamento ortodôntico e os caninos contralaterais permaneceram vitais. Em 6 animais, foi induzido movimento bilateral dos caninos com molas de NiTi presas aos molares, com forças de 150 a 175g por 90 dias, os outros 6 furões receberam o mesmo protocolo endodôntico mas sem movimento ortodôntico, formando 4 grupos experimentais. A avaliação ocorreu em modelos de gesso, radiografias e cortes histológicos. Os resultados mostraram que nos grupos tratados ortodonticamente os dentes movimentaram-se na mesma distância, nas radiografias a reabsorção radicular só foi estatisticamente significativa entre o grupo tratado endodonticamente e movimentado e o grupo tratado endodonticamente e não movimentado, com mais reabsorção no primeiro grupo. Na avaliação histológica do comprimento radicular não foi encontrada diferença estatística em nenhum dos 4 grupos. O grupo tratado endodonticamente e não movimentado mostrou mais lacunas reabsortivas comparado ao grupo com vitalidade e não movimentado. Os dentes tratados endodonticamente apresentaram maior perda de cemento após a movimentação dentária que os dentes vitais, mas sem diferenças significativas no comprimento radiográfico radicular, e, segundo os autores, isto ocorreu pela presença de inflamação na região periapical. Drysdale, Gibbs e PittFord (1997) realizaram uma pesquisa literária com o objetivo de oferecer uma orientação no planejamento, em relação ao prognóstico de dentes tratados endodonticamente, antes do início do tratamento ortodôntico. Os autores ressaltaram a importância de averiguar o histórico sobre as causas do tratamento endodôntico, e no caso da ocorrência de trauma, saber o tipo de trauma sofrido pode ter um forte efeito no prognóstico. Em casos de fratura horizontal na metade apical da raiz, o dente terá um bom prognóstico e pode ser movimentado ortodonticamente, diferentemente de dentes com fratura na parte mais cervical da raiz, que tem prognóstico desfavorável, assim como o prognóstico para dentes com reabsorção inflamatória cervical. Em dentes com radioluscência periapical grande ou trauma recente, o tratamento ortodôntico deve ser postergado por 6 meses, até haver evidência radiográfica de cicatrização. Dentes com tratamento endodôntico há mais de um ano que ainda apresentam alguma 43 lesão periapical ou persistência de algum sinal/sintoma, deve-se considerar a necessidade de um novo tratamento endodôntico antes de iniciar a aplicação de forças. Estes autores também concluíram que, considerando-se que o ligamento periodontal esteja normal, os dentes tratados endodonticamente respondem às forças ortodônticas da mesma maneira que os dentes com polpa sadia/vital. Em 1997, Bender, Byers e Mori descreveram 2 casos de apicificação de incisivos centrais que foram movimentados ortodonticamente. No primeiro caso, o incisivo central esquerdo foi traumatizado quando o paciente tinha 7 anos, com imediata realização da terapia endodôntica com hidróxido de cálcio no canal radicular para estimular a apicificação, com obturação do canal após 9 meses. Aos 10 anos foi iniciado o tratamento ortodôntico fixo, e em 3 anos foi observado radiograficamente reabsorção radicular do incisivo central direito e dos incisivos laterais, enquanto que o incisivo central tratado endodonticamente não apresentou reabsorção radicular. Após 6 anos do término do tratamento ortodôntico, as raízes reabsorvidas sofreram arredondamento, e o dente tratado endodonticamente apresentou somente uma pequena área de reabsorção. O segundo caso, era de um paciente de 15 anos que apresentou o incisivo central superior direito não completamente formado devido a um trauma aos 7 anos. Radiograficamente o dente apresentou radiolucência no ápice, razão pela qual efetuou-se o tratamento do canal com hidróxido de cálcio e 3 meses após, instalou-se o aparelho ortodôntico. Os autores verificaram que a apicificação ocorreu após 10 meses do início do tratamento ortodôntico, e que o movimento ortodôntico não interferiu no processo da apicificação. Por outro lado, o controle radiográfico de 4 e de 8 anos após, evidenciou que o incisivo central contralateral apresentou reabsorção radicular. Concluíram os autores que a reabsorção radicular por movimentação ortodôntica é substituída por tecido ósseo, diferente da reabsorção por problemas endodônticos, onde o reparo do ápice acontece na maioria das vezes. Estes autores, com evidências encontradas na literatura, teorizaram que alguns neuropeptídeos presentes na polpa dental poderiam regular o fluxo sanguíneo na polpa e no periodonto, sendo eles um dos responsáveis pela reabsorção radicular. Por isso, um dente tratado endodonticamente teria menor possibilidade de sofrer reabsorção radicular por 44 movimentação ortodôntica. Outro fator considerado pelos autores, é o de que o dente tratado endodonticamente possui menos reabsorção radicular devido ao contato do hidróxido de cálcio com a porção apical da raiz, promovendo a alcalinização do meio, diminuindo a inflamação local. Os pesquisadores Hamilton e Gutmann (1999) comprovaram que dentes traumatizados podem ser movimentados ortodonticamente com mínimo risco de reabsorção, quando a polpa não foi severamente comprometida, e se for o caso, faz-se necessário o procedimento endodôntico previamente a ortodontia. Dependendo da severidade do traumatismo, como a intrusão e avulsão dentária, o elemento dental poderá apresentar maior incidência de reabsorção com o movimento induzido, independente de ter ou não endodontia prévia. Em 2003, Souza realizou uma pesquisa experimental em cães para avaliar a influência da movimentação ortodôntica no processo de reparo de dentes com lesão periapical e endodontia prévia a ortodontia. Foram utilizados 30 dentes incisivos e pré-molares de cães que tiveram os canais radiculares acessados e mantidos expostos ao meio bucal por 6 meses, a fim de induzir lesões periapicais crônicas. Foram preparados biomecanicamente 20 canais e mantidos com pasta de hidróxido de cálcio e água destilada por 14 dias e depois foram obturados. As 10 raízes restantes permaneceram com os canais expostos por 6 meses, não recebendo nenhum tipo de tratamento, servindo apenas como grupo controle. Imediatamente após a conclusão da terapia endodôntica, 10 dentes foram movimentados ortodonticamente com aplicação de 200gF, e os outros 10 dentes com endodontia não receberam tratamento ortodôntico. A aplicação de forças era reativada a cada 21 dias, por período de 5 meses e 15 dias. O exame histomorfológico das peças, demonstrou que os dentes com lesão periapical crônica movimentados ortodonticamente apresentaram respostas semelhantes dos tecidos periapicais aos dentes com lesão periapical crônica não movimentados e a análise estatística global demonstrou que os dentes com lesão periapical crônica não movimentados ortodonticamente apresentaram melhor resposta dos tecidos periapicais do que os dentes com lesão periapical crônica movimentados, embora esta diferença seja estatisticamente insignificante. O autor sugere ainda que a manutenção do curativo de demora com hidróxido de cálcio durante a 45 movimentação ortodôntica até a cicatrização das lesões periapicais, comprovadas radiograficamente, poderiam acelerar o processo de reparo do periápice. Rego et al. (2004) encontraram evidências de que o tratamento endodôntico não interferiu no grau de reabsorção radicular durante tratamento ortodôntico em pesquisa bibliográfica recente; levando em consideração que alguns estudos que levantaram a hipótese dos dentes não vitais terem mais suscetibilidade à reabsorção apresentaram metodologia questionável e reabsorções excessivas ocorridas durante a movimentação ortodôntica de dentes com endodontia poderiam estar mais associadas ao insucesso da terapia endodôntica e ao diagnóstico de dentes traumatizados. Fazendo uma avaliação quantitativa do grau de reabsorção radicular em dentes com tratamento endodôntico e dentes vitais, Kreia et al. (2005) utilizaram uma amostra de 20 pacientes (homens e mulheres), que apresentavam um incisivo superior com endodontia prévia ao tratamento ortodôntico (G1) e o homólogo com vitalidade (G2-controle) e detectou que os dentes não vitais apresentaram um grau de reabsorção levemente menor que os dentes vitais, porém sem significância estatística. Ao comparar estes resultados a outros trabalhos encontrados na literatura científica, deparou-se com algumas pesquisas controversas e inconclusivas, sugerindo a realização de novos estudos com amostras representativas, idade e maloclusão dos indivíduos semelhantes, com padronização da técnica ortodôntica e, se possível, realizada pelo mesmo profissional. Esteves et al. (2007) fizeram uma avaliação criteriosa de 16 pacientes, selecionados por apresentarem as seguintes características: um incisivo central superior vital (controle) e o homólogo com endodontia prévia (ao menos 1 ano antes de iniciar a ortodontia) e todos utilizaram terapia com bráquetes por no mínimo 20 meses. A realização das radiografias e medições foram rigorosamente padronizadas para evitar erros. Os resultados apontaram reabsorções radiculares evidentes em ambos os grupos, porém não houve diferença estatisticamente significante entre os dentes vitais e não vitais, embora os dentes vitais tenham mostrado um leve aumento no grau médio de reabsorção radicular (0,22mm). Dos 32 dentes analisados, apenas 2 (1 vital e 46 1 não vital) não apresentaram reabsorção radicular, confirmando a grande incidência da mesma nos tratamentos ortodônticos. Noronha (2008) realizou um estudo experimental com cães, a fim de determinar histologicamente, pelo método estereológico, a incidência de lesões de reabsorção radicular em dentes com lesão periapical induzida, tratados endodonticamente e movimentados ortodonticamente. Foram utilizados 80 prémolares de 5 cães e divididos em 5 grupos: grupo 1 – dentes com indução de lesões periapicais e movimentação ortodôntica 40 dias após realização de terapia endodôntica, grupo 2 – dentes com indução de lesões periapicais no mesmo dia do primeiro grupo e sem movimentação ortodôntica, grupo 3 – dentes com indução de lesões periapicais e movimentação ortodôntica imediata à terapia endodôntica, grupo 4 - dentes com indução de lesões periapicais no mesmo dia do grupo 3 e sem movimentação ortodôntica, grupo 5 – dentes hígidos (controle). Todos os tratamentos endodônticos utilizaram curativo de demora com hidróxido de cálcio por 15 dias e foram obturados com gutapercha e cimento AH plus. A movimentação ortodôntica foi realizada nos grupos 1 e 3, com uso de molas de NiTi e força de 100cN, durante 60 dias e posteriormente mantidos em contenção por mais 60 dias. Após o período experimental, foram realizadas as avaliações estereológicas: com a comparação das áreas de reabsorção dos grupos 1, 2 e 5, o primeiro apresentou maiores áreas de lesões; comparando o grupo 3, 4 e 5, o grupo 3 apresentou maiores lesões; e na comparação dos grupos 1 e 3 não houve diferenças estatisticamente significantes. Com isso, a autora concluiu que os dentes movimentados imediatamente após a terapia endodôntica apresentaram reabsorções radiculares semelhantes àqueles que aguardaram o período de 40 dias pós-endodontia, e a movimentação ortodôntica induziu um aumento das áreas de reabsorções radiculares apicais. A importância da interação endodontia-ortodontia no plano de tratamento e seu prognóstico foram abordados por Venkataramana et al. (2010). Ao confrontar estudos com diferentes conclusões sobre a reabsorção radicular apresentada em dentes vitais e dentes tratados endodonticamente, destacaram-se três linhas distintas de pesquisa: a que justificava a maior reabsorção em dentes não vitais, devido à reabsorção expor túbulos dentinários que podem abrigar toxinas e material necrótico e também expor o 47 material obturador, que agem como corpo estranho e ambas aumentariam a reabsorção; outra justificava a menor incidência de reabsorção em dentes não vitais devido a estes dentes não liberarem neuropeptídios estimuladores da inflamação em dentes vitais e de um tratamento endodôntico asséptico; e por último, a linha de pesquisas que demonstrava não haver diferenças estatisticamente significantes no processo de reabsorção radicular. Porém todos os estudos revisados concordavam que os dentes tratados endodonticamente eram passíveis de movimentação dentária induzida, tais quais os dentes vitais. Na conclusão, destacou que, como o tratamento ortodôntico depende diretamente da saúde periodontal, dentes idealmente tratados e obturados não apresentam diferenças em relação aos dentes vitais no que diz respeito à presença de reabsorções e nem mesmo de movimentação ortodôntica, porém dentes severamente traumatizados aumentam as chances de reabsorções consideráveis com ou sem tratamento endodôntico. A maioria dos trabalhos revisados apresentam diferenças metodológicas importantes, o que dificulta a comparação entre os mesmos ou ainda se apresentam inconclusivos. A criação de parâmetros se faz necessária para dar mais qualidade às pesquisas científicas e tornar seus resultados mais fidedignos. 2.6 REABSORÇÃO RADICULAR APICAL EXTERNA Na movimentação dentária induzida a freqüência da reabsorção dentária é elevada, embora passageira ou temporária, e sua ocorrência pode ser aceitável clinicamente após o cálculo da relação risco/benefício, e para tal, o profissional deve ter amplo conhecimento dos fatores de risco da terapêutica adotada (CARVALHO, 2004; CONSOLARO, 2005; KRISHNAN; DAVIDOVITCH, 2006; ESTEVES et al., 2007; MELO, 2008; WELTMAN, 2010). A reabsorção radicular apical externa ocorre devido à aplicação de forças mecânicas compressivas no periodonto e leva á perda de tecido dentário radicular (cemento e dentina), tendo pouca previsibilidade a tendência 48 individual ou a extensão das possíveis lesões. De um modo geral, no princípio do tratamento ortodôntico os dentes possuem reabsorção radicular em menor ou maior grau, porém, concomitantemente a estas lesões, ocorrem reações de reparo das mesmas, ou seja, há um remodelamento do ápice radicular durante o tratamento ortodôntico que pode ou não ter sintomatologia clínica se os princípios forem respeitados (BECKER de OLIVEIRA, 2002). A movimentação ortodôntica tem sido a principal e mais freqüente causa desta injúria, e sua predisposição estaria relacionada principalmente com a morfologia radicular e da crista óssea, variabilidade hereditária individual e mecânica empregada (MIRABELLA; ARTUN, 1995; REGO et al., 2004; CONSOLARO, 2005; HAN, 2005; LOPATIENE; DUMBRAVAITE, 2008; TEIXIERA, 2008) . Portanto, a reabsorção radicular apical pode ser uma resultante da combinação desfavorável de uma série de fatores em que a identificação dos pacientes de risco assume grande importância (REGO et al., 2004). Os principais fatores de risco para reabsorção radicular pesquisados na literatura são: formato atípico das raízes (dilacerações, afilamentos apicais), dentes que sofreram maior movimento ortodôntico (fechamento de espaços, intrusões/extrusões), uso de elásticos (MIRABELLA; ARTUN, 1995; REGO et al., 2004; KRISHNAN; DAVIDOVITCH, 2006; MELLO, 2008; WELTMAN et al., 2010), formato retangular das cristas ósseas, proximidade com osso cortical (HUANG; KING; KAPILA; 2007), dentes com histórico de traumatismo (REGO et al., 2004; MELO, 2008). Vários autores têm pesquisado sobre a predisposição de certos dentes e sua maior suscetibilidade a reabsorção radicular frente à movimentação ortodôntica, sendo sugerido, na grande maioria das pesquisas o incisivo superior (MIRABELLA; ARTUN ,1995; REGO et al., 2004; CONSOLARO 2005; ARMSTRONG et al., 2006; KRISHNAN; DAVIDOVITCH, 2006; CARVALHO, 2007; MELO, 2008; BAREA, 2009; WELTMAN et al., 2010). A maioria das pesquisas utiliza radiografias panorâmicas para avaliação das alterações de tamanho e forma destes dentes, porém estas podem apresentar distorções próprias da técnica (DUDIC et al., 2009), como: ampliações diferentes em cada tipo de máquina; posicionamento incorreto do paciente; além das limitações das imagens bidimensionais, pois os incisivos geralmente são vestibularizados durante o 49 tratamento ortodôntico e quando radiografados podem apresentar a raiz mais curta no final do tratamento, devido a projeção da imagem na panorâmica ficar diminuída com a sua inclinação aumentada (ARMSTRONG et al., 2006). Outro fator de suscetibilidade a reabsorção radicular são raízes que apresentam sinais de reabsorção na fase inicial do tratamento ortodôntico. Os autores ressaltam a importância do controle radiográfico a cada 6 meses para uma reavaliação da mecanoterapia, e a verificação do intervalo de tempo entre ajustes e a necessidade de finalização em menor tempo (REGO et al., 2004; ARTUN et al., 2005; LOPATIENE; DUMBRAVAITE, 2008; MELO, 2008). Consolaro (2005) enfatiza que a coroa dentária representa uma alavanca no sistema de forças ortodônticas e o braço oposto a ela é a raiz, que concentra estas forças no ápice; por isso raízes com formato triangular sofrem mais reabsorções por concentrarem mais força numa menor área e o mesmo vai ocorrer com ápices em forma de pipeta ou com dilacerações, com conseqüente arredondamento e encurtamento destas raízes. Além disso, a proporção entre coroa-raiz também influencia no processo de reabsorção, pois quanto maior a coroa em relação à raiz, maior a alavanca e maior a concentração de forças na porção radicular. Para comparar a reabsorção radicular de dentes que sofreram aplicação de forças intrusivas e extrusivas num mesmo indivíduo, Han et al. (2005) realizaram movimento de intrusão e extrusão aleatoriamente nos primeiros prémolares de 9 pacientes, com uma força média de 100cN durante 8 semanas. Seis pacientes ortodônticos, selecionados aleatoriamente, serviram como grupo controle. A reabsorção radicular foi determinada e quantificada por microscopia de varredura e avaliada por inspeção visual. A diferença mais significativa foi encontrada entre o grupo controle e os movimentos intrusivos, sendo insignificante a comparação do controle com os movimentos extrusivos. No entanto, houve ainda uma diferença significativa na comparação das reabsorções das superfícies radiculares mesiais e distais dos dentes intruídos (5.78 +- 3.86%) com os extruídos (1.28 +- 1.24%), levando os autores a concluírem que a intrusão provocou cerca de 4 vezes mais reabsorção que a extrusão. Na tentativa de determinar a correlação entre a reabsorção radicular apical com o tipo de aparelho utilizado, a direção e a quantidade de 50 movimentação dentária, Armstrong et al. (2006) selecionaram o registro de 114 pacientes do Departamento Ortodôntico da Universidade de Sydney e os distribuíram em grupos de acordo com aparelho, gênero, idade no início do tratamento, duração do tratamento e tipo de má oclusão. Avaliaram suas radiografias panorâmicas iniciais e finais, feitas pela mesma máquina, e compararam o comprimento radicular dos incisivos superiores e inferiores de ambas e ainda compararam as telerradiografias de perfil iniciais e finais, e concluíram que a maioria dos incisivos inferiores estavam mais curtos após o tratamento, com diferenças significativas no grupo que usou aparelhos préajustados em relação a técnica Edgewise. Para verificar a eficiência do diagnóstico clinico da reabsorção radicular em radiografias de rotina, Dudic et al. (2009) compararam as radiografias panorâmicas com tomografias computadorizadas, usando a técnica conebeam, na avaliação das reabsorções ortodonticamente induzidas. Com uma amostra de 275 dentes de 22 pacientes, finalizando tratamento ortodôntico fixo, 2 examinadores calibrados avaliaram cegamente a presença ou ausência de reabsorção e a gravidade das lesões, nas panorâmicas e nas tomografias. Os resultados apresentaram diferenças significativas na comparação dos dentes que não demonstraram reabsorção na panorâmica (56,5%) e na tomografia (31%), sendo 33,5% e 49 % de reabsorção leve e 8% e 19% moderada, na panorâmica e tomografia, respectivamente. A reabsorção severa só foi encontrada em dois dentes através da cone-beam. Isto demonstrou que a tomografia pode ser um exame complementar útil quando da necessidade de decisão sobre a continuação ou modificação do tratamento ortodôntico, já que a radiografia panorâmica pode subestimar a reabsorção radicular moderada/severa. A demanda de tratamento ortodôntico em adultos aumentou consideravelmente nas duas últimas décadas e estes pacientes apresentam um somatório de particularidades, como doenças periodontais, perdas dentárias, muitas restaurações, tratamentos endodônticos, seqüelas de traumatismos e até mesmo tratamentos ortodônticos prévios iatrogênicos. A necessidade de um diagnóstico preciso é essencial para as decisões de um plano de tratamento adequado a cada caso. As imagens em 3D podem identificar lesões camufladas pela limitação bidimensional de exames 51 convencionais, como a tomografia computadorizada de feixe cônico (cone beam), facilitando não só a visualização de lesões de reabsorção dentária, mas também de patologias como anquilose e deiscência óssea (CASTRO; ESTRELA; VALLADARES-NETO, 2011). Dentes com história de traumatismos anteriores a movimentação ortodôntica podem apresentar durante o tratamento ortodôntico áreas de reabsorção mais extensas comparados com dentes não-traumatizados, por isso é importante o uso de forças suaves e intermitentes, evitando tratamentos prolongados. Todos os dentes a serem movimentados ortodonticamente sofrerão algum tipo de reabsorção/remodelamento radicular, detectado radiograficamente ou não, e o traumatismo pode acentuar esta condição (BORTOLOTTI et al., 2011). 52 3 CONCLUSÃO 1 – A movimentação ortodôntica de dentes com tratamento endodôntico pode apresentar risco ao periápice dependendo da causa do tratamento endodôntico (como histórico de trauma e a presença de lesões periapicais) e da qualidade deste tratamento (qualidade da instrumentação e desinfecção dos canais, uso de medicação intra-canal, solução irrigadora eficaz, e selamento adequado); 2 – A polpa influencia no surgimento de lesões periapicais, pois é um tecido ricamente vascularizado e repleto de neuropeptídeos e limitada anatomicamente, o que pode prejudicar a cicatrização ou adaptação do tecido periodontal e do próprio tecido pulpar frente à movimentação ortodôntica; 3 – Fatores como forças excessivas e prolongadas, pouco tempo entre ativações da mecânica ortodôntica, raízes dilaceradas e afiladas, crista óssea de formato retangular, movimentos de inclinação e intrusão e a predisposição individual podem aumentar o risco de desenvolver lesões no periápice e polpa. 4 – Vários cuidados podem ser tomados a fim de diminuir os riscos de lesão aos tecidos periapicais e pulpares, como: - uso de forças leves e intermitentes; - realização de radiografias periodicamente durante o tratamento ortodôntico; - diagnosticar traumas prévios para um planejamento ortodôntico adequado; - em casos específicos, o uso de imagens tridimensionais pode auxiliar o diagnóstico e plano de tratamento. 53 REFERÊNCIAS ABI-RAMIA, L.B.P. et al. 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