título do resumo

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FOGO DE (NO) CHÃO: PINHÃO, QUIRERA E CHIMARRÃO – A COMIDA
COMO BASE CULTURAL DA REGIÃO DO CONTESTADO
Heitor Matos da Silveira, Nilson Cesar Fraga, e-mail:
[email protected]
Universidade Estadual de Londrina/Centro de Ciências
Exatas/Departamento de Geociências
Área e sub-área do conhecimento: Geografia/Geografia Humana.
Palavras-chave: Geografia Humanista. Geografia dos Sabores. Região do
Contestado.
Resumo
O presente resumo tem como escopo apontar os resultados obtidos durante a
pesquisa “Fogo de (no) chão: pinhão, quirera e chimarrão - a comida como
base cultural da Região do Contestado” a partir da dimensão do sabor na
Geografia introduzida pelos geógrafos humanista. Foram realizados trabalhos
de campo para a região de forma a entender os processos de preparo e os
sabores da quirera com porco, da erva mate e do pinhão sapecado. Esses
alimentos demarcam a paisagem do Contestado, sendo esta marcada pelos
caboclos e tendo como matriz a floresta de araucárias, base de sustento da
população e dos porcos que servirão para os alimentos. Sabor e saber são
dimensões inseparáveis e indissociáveis no estudo do sabor e da experiência
geográfica, construindo paisagens e lugares e identidades regionais.
Introdução e objetivo
O estudo do sabor é relativamente recente, tendo os geógrafos humanistas
passado a se debruçar sobre a temática, buscando compreender a experiência
geográfica de forma completa, colocando o paladar em evidência, permitindo
que a geografia humanista se desenvolva nos estudos do ser, da existência e
da experiência do ser-no-mundo.
A primeira aproximação feita ao estudo da alimentação é apontada por
Paul Claval, ao indicar a importância da alimentação para os estudos culturais.
Os alimentos são retirados da natureza ou da atividade da agricultura que, por
alguns alimentos serem impróprios para o consumo, requerem que sejam
cozinhados ou que suas partes sejam retiradas, fazendo com que o homem
passasse a criar técnicas de cozinha e de cozimento (CLAVAL, 1999).
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Esse processo transforma os alimentos, não apenas em seus aspectos
físico-químicos mas, também, transforma-o em cultura. As teorias advindas da
Antropologia da Alimentação indicam que o processo de se alimentar
transcende as fronteiras meramente fisiológicas, representando uma cultura,
um povo, uma nação. O ato de se alimentar é um ato estritamente cultural, pois
reflete de forma única as técnicas de transformação dos produtos da natureza
em alimento, que são diferentes em cada cultura, em cada lugar (MACIEL,
2004; CLAVAL, 1999).
O desenvolvimento do pensamento geográfico humanista se deu com a
decadência dos estudos culturais onde os geógrafos passaram a se embrenhar
pelas sendas fenomenológicas e humanistas da ciência, colocando o ser no
espectro da ciência geográfica, o que o positivismo e o neopositivismo tinham
afastado das ciências humanas. Essa aproximação foi feita com maior
espessura, primeiramente, por Eric Dardel e, a partir de sua obra, Edward
Relph deu ares mais concretos ao debate existencial e fenomenológico na
geografia a partir do lugar, paralelo aos estudos acerca do mundo-vivido e do
habitar desenvolvidos por Anne Buttimer e os estudos fundamentalmente
humanistas acerca da experiência dos espaços e dos lugares de Yi-Fu Tuan
(HOLZER, 1992).
A recente pesquisa se debruça sobre os sabores e saberes da região do
Contestado, tendo como norte o pinhão, a quirera e o chimarrão, bases
alimentares da cultura cabocla. Partimos da ideia de paisagem oriunda de
Augustin Berque, onde a paisagem é tanto marca como matriz (BERQUE,
2012). Foram realizados trabalhos de campo para a região buscando
compreender os processos de cozimento e preparo (saberes) e saborear e
experienciar os sabores do Contestado.
Procedimentos metodológicos
Para o desenvolvimento da pesquisa, foram feitos levantamentos bibliográficos
acerca da temática central do projeto, principalmente no que concerne ao sabor
e a geografia e ao desenvolvimento da geografia cultural. A partir do
levantamento, foi possível compreender o papel seminal que a paisagem
exerce, fazendo com que buscássemos o conceito de paisagem em Augustin
Berque.
A partir disso, foram feitos três trabalhos de campo para a região do
Contestado, em agosto de 2014 e maio e junho de 2015, buscando desvelar os
saberes e sabores. Os trabalhos de campo foram fundamentais para pensar o
sabor na geografia, tendo como esteio teórico-metodológico a Geografia
Humanista. Os processos observados e coletados durante o campo foram
sistematizados e analisados, buscando que o fenômeno do sabor se manifeste.
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Resultados e discussão
O desenvolvimento da pesquisa se deu com três trabalhos de campo
realizados para a Região do Contestado, em SC/PR, nos municípios de
Canoinhas, Calmon e Timbó Grande. Os trabalhos de campo permitiram
compreender a dimensão do sabor e como a paisagem do Contestado ainda é
marcada pelos caboclos e por esses processos de preparo secular, bem como
a vida dos caboclos é regida pela floresta de araucária e pela produção de
porcos soltos.
Os três alimentos estão presentes na alimentação do caboclo,
principalmente a quirera com porco, servida em conjunto com a couve refogada
ou separa-se a carne do porco e ela é servida separada da quirera. Os porcos
utilizados são criados em confinamento, o que lhe confere um sabor diferencial
para a carne, já o porco criado solto possui um sabor mais forte e robusto.
Geralmente, em tempos gélidos, o pinhão entra na composição da
alimentação. Este era preparado, em tempos de guerra, dentro da mata, onde
a Araucária servia os caboclos da pinha e do pinhão e da grimpa, elemento
fundamental para preparação da fogueira para sapecar o pinhão. Esta
atividade ainda se faz presente, mas a forma mais usual de se comer o pinhão
é ele tostado e assado no fogão a lenha.
No entremeio, a erva-mate e o chimarrão são elementos essenciais
tanto da cultura cabocla quanto da cultura do sul do Brasil. A erva-mate foi vital
para o desenvolvimento econômico do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande
do Sul; todavia, na região foi possível encontrar apenas alguns ervais na
Região, principalmente em Canoinhas, no Faxinal Grein. Os processos de
preparo da erva mate envolvem o sapeco, secagem, quebramento, peneiração
e ensaque. Esses procedimentos e sabores podem ser visualizados na figura 1
abaixo.
Figura 1 - Sabores do Contestado. 1a) Preparo da quirera com porco; 1b) Prato
de quirera com porco e couve; 1c) Pinhão já sapecado após grimpa apagada
Fonte: os autores, 2015
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Conclusão
A fissura causada na geografia pelos geógrafos humanistas ao propor um
estudo geográfico dos sabores é fundamental para se pensar numa geografia
realmente humanista que, de fato, incorpore as questões relativas à
experiência geográfica, não subjugando os demais sentidos e tomando-os
como dimensões fundamentais da experiência geográfica.
Ao se debruçar sobre o sabor, imprime-se a necessidade de se resgatar
esses saberes locais e regionais que fundamentam identidades e paisagens,
buscando superar a intensa industrialização da alimentação e a possível perda
destes referenciais seculares de preparo e cozimento dos alimentos, que são
peculiares da região e lhe conferem uma identidade de “cozinha cabocla”.
Agradecimentos
Agradeço ao meu orientador Nilson Cesar Fraga pelas viagens de campo,
discussões e elaborações dos artigos científicos e pela oportunidade da
pesquisa. À Naibi Souza Jayme e Edna Pereira da Silva, pela companhia nos
campos, pelo auxílio na conversação com as pessoas e pela contribuição com
o desenvolvimento da pesquisa. Ao CNPq pela concessão da bolsa de
Iniciação Científica que permitiu o desenvolvimento da pesquisa.
Referências
BERQUE, Augustin. Paisagem-marca, paisagem-matriz: elementos da
problemática para a geografia cultural. In: ROSENDAHL, Zeny; CORRÊA,
Roberto Lobato. (Org.). Geografia Cultural: uma antologia (1). Rio de Janeiro:
EdUERJ, 2012. p. 239-244.
CLAVAL, Paul. A Geografia Cultural. Florianópolis: Ed. UFSC, 1999. 453 p.
HOLZER, Werther. A Geografia Humanista – sua trajetória de 1920 a 1990.
1992. 550f. Dissertação (Mestrado em Geografia) – Universidade Federal do
Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.
MACIEL, Maria Eunice. Uma cozinha à brasileira. Estudos Históricos, Rio de
Janeiro, n. 33, p. 25-39, jan./jun. 2004.
MARANDOLA JR., Eduardo. Sabor enquanto experiência geográfica: por uma
geografia hedonista. Geograficidade, Niterói, v. 2, n. 1, p. 42-52, verão 2012.
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