universidade federal rural do rio de janeiro instituto de - R1

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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO
INSTITUTO DE AGRONOMIA
DEPARTAMENTO DE GEOCIÊNCIAS
CURSO DE GEOLOGIA
Magmatismo e sistemas petrolíferos na Bacia do Solimões
Aluno
Adriano Guilherme da Silva
200904001-3
Orientador
Prof. Dr. Sérgio de Castro Valente
Setembro de 2013.
1 – GUILHERME, ADRIANO
Magmatismo e sistemas petrolíferos na Bacia do Solimões
Curso de Geologia/ Departamento de Geociências
Instituto de Agronomia/ Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
– UFRRJ
[Seropédica]
Ano 2013
Trabalho de Graduação
Monografia
Área de Concentração: Magmatismo e Sistemas Petrolíferos
ii
AGRADECIMENTOS
Dedico meus agradecimentos, em primeiro lugar, a minha família que sempre me deu o
suporte indispensável durantes esses anos de iniciação na vida acadêmica.
Também sou profundamente grato: ao meu orientador que além do profissionalismo
sempre ofereceu bons conselhos durante esses anos; aos colegas de turma e amigos mais
próximos, que me acompanharam lado a lado nessa jornada; e a todos que me auxiliaram direta
ou indiretamente.
iii
RESUMO
Os sistemas petrolíferos da Bacia do Solimões são tidos como não convencionais devido à
influência térmica das intrusões de diabásios do magmatismo Penatecaua. A despeito da grande
importância do magmatismo no processo de geração, ele também pode ter influenciado outros
processos e elementos dos sistemas petrolíferos da bacia, o que representa o foco desta
monografia. O sistema petrolífero da Bacia do Solimões, abordado em detalhe neste trabalho, é o
Jandiatuba-Juruá (!). Um aspecto discutido faz referência ao aumento de volume de rochas e da
densidade na bacia, diretamente relacionado à sua história de subsidência e soerguimento. Neste
último caso, anomalias térmicas regionais podem ter sido a causa da erosão de cerca de 1000 m
de sedimentos depositados acima da Formação Fonte Boa, por exemplo. Finalmente, as
influências térmicas sobre processos de dissolução vão desde controles sobre a halocinese até a
geração de estruturas de colapso. A geração de janelas de sal em decorrência da halocinese
poderia, por exemplo, levar à exudação. Por outro lado, estruturas de colapso podem gerar
antiformes que constituem o tipo de armadilha mais comum nas bacias brasileiras.
Palavras-chave: Magmatismo. Sistemas Petrolíferos. Bacia do Solimões.
iv
ABSTRACT
The petroleum systems within the Solimões basin are unconvencional or atypical as a
consequence of the thermal influence of the so-called Penatecaua magmatism. Regardeless the
major importance of the magmatism over generation, it may also have played a role on other
processes and elements of the petroleum systems, particularly in the Jandiatuba-Juruá (!) one.
Discussions were made to denote the dramatic and rapid change in volume and density values for
the Solimões basin as a consequence of the intrusion of thick diabase sills which may have
affected substantially its subsidence history. Regional thermal anomalies may also have been the
cause of the erosion of up to 1000 m sediment sequence that was set above the Fonte Boa
Formation during Permian times. Finally, dissolution processes driven by the heat of the intrusions
may have been important for halocinesis implying the possibility of some exsudation in the basin
or, alternatively, the building of antiformal-like traping structures due to collapse tectonics.
Keywords: Magmatism. Petroleum Systems. Solimões Basin.
v
ÍNDICE GERAL:
Agradecimentos
Resumo
Abstract
Índice Geral
Índice de Figuras
Índice de Tabelas
Iii
Iv
v
vi
vii
viii
CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO
1.1.
1.2.
1.3.
1.4.
1.5.
Introdução
Objetivos
Motivação
Métodos
Localização
1
1
1
2
2
CAPÍTULO 2: REVISÃO TEMÁTICA
2.1.
2.2.
2.2.1.
2.2.2.
2.2.3.
2.2.4.
2.2.5.
2.2.6.
2.2.7.
2.2.8.
2.2.9.
Geologia da Bacia do Solimões
Sistemas petrolíferos
Introdução
Rocha geradora e geração
Migração
Rocha reservatório e acumulação
Armadilhamento e rocha selante
Níveis de investigação
Extensões temporal, geográfica e estratigráfica
Nível de certeza
Diagrama de eventos
4
13
13
13
17
19
21
23
25
26
26
CAPÍTULO 3: SISTEMAS PETROLÍFEROS DA BACIA DO SOLIMÕES
3.1.
3.2.
3.3.
3.4.
Descrição geral dos sistemas petrolíferos da Bacia do Solimões
Rochas geradoras e geração
Migração primária, secundária e terciária
Rocha reservatório, armadilhamento e acumulação
27
27
29
30
CAPÍTULO 4: O MAGMATISMO PENATECAUA
4.1.
4.2.
4.3.
Introdução
Caracterização petrológica e estrutural sumária
O magmatismo Penatecaua e o sistema petrolífero Jandiatuba-Juruá
32
32
34
CAPÍTULO 5: DISCUSSÕES E CONCLUSÕES
5.1.
5.2.
Introdução
Discussões
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
37
38
43
vi
ÍNDICE DE FIGURAS:
Figura 1.1
Figura 2.1
Figura 2.2
Figura 2.3
Figura 2.4
Figura 2.5
Figura 2.6
Figura 2.7
Figura 2.8
Figura 2.9
Figura 2.10
Localização da Bacia do Solimões e suas sub-bacias. 1 – Arco de
Iquitos, 2 – Arco de Carauari, 3 – Arco de Purus. Fonte: Modificado de
Elias et al., 2004.
3
Algumas das Províncias Geocronológicas do Cráton Amazônico. As
províncias sublinhadas são aquelas sotopostas à Bacia do Solimões.
(Fonte: Modificado de Tassinari, 2004).
5
Diagrama cronoestratigráfico da Bacia do Solimões. BCO=Formação
Benjamin Constant; JUT=Formação Jutaí; BIA=Membro Biá;
UER=Formação
Uerê;
ARA=Membro Arauá
;JAN=Formação
Jandiatuba;
JAR=Membro
Jaraqui;
JUR=Formação
Juruá;
CAR=Formação Carauari; FTB=Formação Fonte Boa; ALT=Formação
Alter do Chão; SOL=Formação Solimões. (Fonte: Wanderley Filho et
al., 2007).
7
Inundação neo-emsiana / eifeliana no Brasil. Baseado em Mello (1989).
Cidades: Be – Belém; C – Caracas; L – Lima; M – Manaus; Q – Quito;
S – Salvador; Fonte: Modificado de Almeida e Carneiro, 2004.
8
Mapa com arcabouço estrutural da Bacia do Solimões. Fonte: Caputo
(2012).
11
Diagrama de Van Krevelen mostrando a composição primária dos
principais tipos de querogênio e suas mudanças em função da
maturação (aquecimento). As linhas tracejadas delimitam as
condições de geração de óleo e gás(úmido e seco) para os três
tipos de querogênio. Fonte: modificado de Bjørlykke (2010).
15
Etapas de conversão da matéria orgânica e geração de óleo e gás em
função da temperatura. Fonte: Modificado de Robelius, 2007.
16
Gotículas de óleo impedidas de fluir pelos poros em conseqüência das
forças capilares.
18
Grãos de areia envolvidos por finas camadas de água. Uma fase de
óleo contínua fluirá facilmente se a permeabilidade for relativamente
alta e os canais entre os poros forem relativamente largos.
19
Figura esquemática com os pontos de derrame de hidrocarbonetos
(spill points). Em vermelho: gás; em verde: óleo; as setas indicam o
deslocamento dos hidrocarbonetos. Fonte: Modificado de AAPG
(http://www.aapg.org/slide_resources/schroeder/2/index.cfm)
22
Alguns dos principais tipos de armadilha de petróleo. (A), (B) e (C) são
armadilhas estruturais (antiformal, falha normal com rochas selantes
justapostas e domeamento em conseqüência de diapirismo salino);
em armadilhas estratigráficas as rochas são depositadas em um
ambiente particular (D) ou por uma sequência de eventos mais
complexa
(E).
Fonte:
www.oilandgasuk.co.uk/publications/Geological_Settings/Trapping_Oil
_and_Gas.cfm
23
vii
Figura 2.11
Os quatro níveis de investigação petrolífera.
24
Figura 2.12
Seção transversal no sistema petrolífero de uma bacia do tipo foreland.
Fonte: Modificado de Magoon & Dow (1994).
25
Diagrama de eventos proposto por Mello et al. (1994) para o sistema
petrolífero Barreirinhas – Itaituba (!). Fonte: Barata e Caputo (2007).
26
Perfil geoquímico dos folhelhos ricos em matéria orgânica da Formação
Jandiatuba. Na fonte original (Mello et al., 1994), estes folhelhos (em
verde) representavam o Membro Barreirinhas da Formação Curuá.
27
Mapa de maturidade térmica da rocha geradora do Devoniano Superior
mostrando a distribuição dos estágios de alta maturação e
supermaturação no campo de gás de Juruá e no campo de óleo de
Urucu. Fonte: Mello et al. (1994).
28
Influência das soleiras na maturação de matéria orgânica no campo de
gás de Juruá (esquerda) e de óleo e condensado do Rio Urucu (direita).
Fonte: modificado de Clark, 2002.
29
Modelo de acumulação de hidrocarboneto na região de Urucu na Bacia
do Solimões (sistema Jadiatuta-Juruá (!)). O selo é representado pela
Formação Carauari; uma associação cíclica de folhelhos, calcilutitos e
sais (anidrita e halita). A terceira soleira de diabásio, mais profunda,
não está representada na seção. Fonte: Mello et al., 1994; Clark,
2002.
30
Diagrama de eventos proposto para o sistema petrolífero JandiatubaJuruá na Bacia do Solimões (Barata e Caputo, 2007).
31
Mapa de localização dos campos de óleo e gás da Bacia do Solimões.
Os principais lineamentos são mostrados na figura. Fonte: Barata e
Caputo, 2007.
37
Figura 2.13
Figura 3.1
Figura 3.2
Figura 3.3
Figura 3.4
Figura 3.5
Figura 5.1
ÍNDICE DE TABELAS:
Tabela 2.1
Tabela 2.2
Tabela 2.3
Tabela 2.1: Valores típicos de porosidade para reservatórios de óleo
(Hyne, 2001).
20
Tabela 2.2: Porosidade de vários tipos de rocha. Fonte: Modificado de
http://www.edumine.com/xtoolkit/tables/sgtables.htm
<acesso
em:
30/05/2013>
21
Tabela 2.3: Valores de permeabilidade típicos de reservatórios de óleo
(Hyne, 2001).
21
viii
CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO
1.1 Introdução
A Bacia do Solimões está inserida numa área de mais de 600,000 km2 na região
amazônica, norte do Brasil. Seus pacotes paleozóicos não são aflorantes e compõem cerca de
dois terços da área total da bacia.
O Arco de Carauari, uma estrutura proeminente de direção NW-SE, divide a bacia em duas
sub-bacias, quais sejam; Juruá, a leste, e Jandiatuba, a oeste. Este arco controlou o fornecimento
de sedimentos clásticos para o preenchimento da Bacia do Solimões.
Atividades exploratórias têm sido desenvolvidas na Bacia do Solimões desde a década de
1950, com poços sendo perfurados às margens dos rios (Milani & Araújo, 2003). Em 1975,
ocorreu a primeira campanha de levantamento de dados sísmicos e três anos depois foi
encontrada a primeira acumulação de gás nas proximidades do Rio Juruá. A província de óleo e
gás do Rio Urucu foi descoberta na década de 1980.
De acordo com dados da Agência Nacional do Petróleo (ANP; www.anp.gov.br), em 2001
foram descobertas onze acumulações de gás e três campos de óleo e gás na bacia, com reservas
de 132 milhões de barris de óleo e 44 bilhões de m3 de gás. Dados mais recentes (2011), também
da ANP, revelam que os campos terrestres do Rio Urucu e Leste do Urucu, ocuparam a primeira e
a segunda posição, respectivamente, na relação de maiores produtores de gás natural no Brasil, e
são os únicos campos terrestres entre os vinte maiores produtores em barris de óleo equivalente.
Seis poços terrestres estão entre os trinta com maior produção de gás natural no país, sendo
quatro do campo do Rio Urucu e dois do campo de Leste do Urucu. Esse potencial de recursos
(principalmente as concentrações de gás) pode ter relação com a existência de um evento
magmático de grande magnitude que intrudiu a bacia em forma de diques e soleiras entre o
Triássico e o Jurássico.
1.2 Objetivos
O foco deste trabalho é a avaliação dos sistemas petrolíferos propostos para a Bacia do
Solimões sob o ponto de vista da atuação dos processos magmáticos e, em que nível, aqueles
podem ser considerados sistemas atípicos ou não convencionais.
1.3 Motivação
As bacias paleozóicas, dentre as quais a Bacia do Solimões, oferecem um grande
potencial de recursos que não foi completamente explorado. No segundo semestre de 2012, por
1
exemplo, uma empresa de exploração descobriu novos poços de gás a aproximadamente 30 km
ao sul do Campo de Juruá, o que pode indicar a existência de um novo alinhamento para
hidrocarbonetos
na
bacia
(http://br.reuters.com/article/businessNews/idBRSPE89N02O20121024) e é provável que haja
novas descobertas com as pesquisas que buscam transpor as chamadas fronteiras exploratórias.
A influência térmica das intrusões nos sistemas petrolíferos da Bacia do Solimões é,
naturalmente, um dos fatores explorados pelos pesquisadores, pois afeta diretamente os
processos de geração dos hidrocarbonetos. Todavia, o magmatismo ocorrido na bacia pode ter
influenciado outros processos e elementos de seus sistemas petrolíferos além da própria geração.
A rigor, o grande volume do magmatismo pode ter influenciado, por exemplo, nos processos de
subsidência e o tipo de magmatismo (plutonismo) pode ter originado rotas de migração, selantes e
armadilhas que merecem tanta atenção quanto o próprio processo de geração no estabelecimento
de sistemas petrolíferos.
1.4 Métodos
Os métodos utilizados para a execução deste trabalho incluem os seguintes itens:
1. Revisão temática com leitura de textos relativos à geologia e sistemas petrolíferos da
Bacia do Solimões.
2. Compilação de dados petrográficos e geoquímicos relacionados às intrusões.
3. Análise e interpretação dos dados.
4. Elaboração da monografia e publicações.
1.5 Localização
Completamente posicionada sob a cobertura da floresta amazônica, no Estado do
Amazonas, a Bacia do Solimões, tem uma área aproximada de 600000 km² posicionada entre os
paralelos 2º e 8º S, meridianos 62º e 72º W e seus limites são, respectivamente, o Escudo das
Guianas, a norte, o Escudo Brasileiro, a leste, o Arco de Purus (limite com a Bacia do Amazonas;
oeste) e o Arco de Iquitos, a sul (Figura 1.1). Este último separa as Bacias Subandinas de
Pastaza (Peru) e Acre (Brasil). A Bacia do Solimões subdivide-se em duas sub-bacias (Juruá, a
leste e Jandiatuba, a oeste) por uma feição estrutural proeminente de direção NW-SE denominado
Arco de Carauari. Este arco teve controle decisivo na distribuição de fácies e espessuras
sedimentares na Bacia do Solimões, principalmente durante o pré-Pensilvaniano.
A província produtora de Juruá está a cerca de 750 km a oeste da cidade de Manaus e o
Polo de Urucu, a cerca de 650 km da mesma cidade e a leste de Juruá.
2
Figura 1.1: Localização da Bacia do Solimões e suas sub-bacias. 1 – Arco de Iquitos, 2 – Arco de Carauari,
3 – Arco de Purus. Fonte: Modificado de Elias et al., 2004.
3
CAPÍTULO 2: REVISÃO TEMÁTICA
2.1. Geologia da Bacia do Solimões
A história geológica da Bacia do Solimões remonta à formação da Plataforma
Sulamericana no final do Ciclo Orogenético Brasiliano/Pan-Africano. A crosta sobre a qual as
sequências foram depositadas foi estabilizada entre 725 e 500 Ma, (Almeida & Carneiro, 2004)
quando do declínio dos eventos geológicos (magmáticos, sedimentares, metamórficos e
deformacionais) associados à sutura de blocos remanescentes de Rodínia em cinturões móveis,
dando origem ao território de Gondwana. Somente no Neo-Cretáceo, a Plataforma Sulamericana
foi destacada de Gondwana e individualizada.
A sedimentação da bacia desenvolveu-se sobre o Cráton Amazônico, mais precisamente
acima de duas províncias geocronológicas, quais sejam: Rio Negro-Juruena e Rondoniana-San
Ignácio (figura 2.1).
A Província Rio Negro-Juruena (1,80 – 1,55 Ga), com estruturas NW-SE, se estende em
cerca de 2000 km por 600 km de largura nos territórios do oeste do Brasil, Venezuela e Colômbia.
As rochas do embasamento desta província são granito gnaisses e granitoides, principalmente
granodioritos e tonalitos. Na parte norte ocorre, predominantemente, biotita titanita monzogranitos,
enquanto na parte sul as rochas do embasamento constituem terrenos granito migmatíticos e
gnaisses de composição tonalítica (Tassinari, 2004). Em geral, as rochas são metamorfisadas em
facies anfibolito, embora também ocorram em facies granulito. A Província Rondoniana-San
Ignácio (1,55 – 1,30 Ga), localizada na porção SW do Acre, tem embasamento metamórfico
constituído de terrenos granito gnaisse migmatíticos e rochas granulíticas. Em geral, o
metamorfismo é de fácies anfibolito ou granulito. Algumas intrusões granulíticas estão dispersas
pela província (Tassinari, 2004).
A Bacia do Solimões é dividida em duas sub-bacias limitadas pelo Alto de Carauari (figura
1.1).
Na sub-bacia Juruá, a leste, há uma cobertura Pré-Cambriana entre o embasamento
(Província Rio Negro - Juruena) e o pacote sedimentar fanerozóico.
Esta sequência sedimentar foi depositada sobre um sistema de riftes do Paleoproterozóico,
possivelmente precursor da Bacia do Solimões. Estes depósitos sotopostos aos da Era
Paleozóica constituem as formações Prosperança, Acari e Prainha, todas pertencentes ao Grupo
Purus, cuja deposição ocorreu, provavelmente, no Mesoproterozóico (Eiras et al., 1994). As
formações Prosperança e Prainha incluem arenito caulinítico avermelhado de granulação fina a
grossa, siltito avermelhado, folhelho avermelhado e níveis conglomeráticos de origem fluvial com
influência marinha. A Formação Acari constitui-se de dolomito esbranquiçado e acastanhado
(Eiras et al., 1994).
4
Figura 2.1: Algumas das Províncias Geocronológicas do Cráton Amazônico. As províncias sublinhadas são
aquelas sotopostas à Bacia do Solimões. (Fonte: Modificado de Tassinari, 2004).
Na sub-bacia Jandiatuba, a oeste do Alto de Carauari, não há registro sedimentar PréCambriano. No entanto, as primeiras deposições paleozóicas da Bacia do Solimões se
restringiram a esta sub-bacia.
A estratigrafia do Fanerozoico da Bacia do Solimões é dividida em seis sequências de
segunda ordem. Quatro sequências foram depositadas no Paleozóico e duas no Meso-cenozóico
(figura 2.2). As idades, em ordem crescente, das deposições e suas respectivas discordâncias
são as seguintes (Eiras, 1994; Becker, 1997; Barata, 2007):
1.
Eo-ordoviciano/Meso-ordoviciano;
2.
Neosiluriano/Eodevoniano;
3.
Mesodevoniano/Eocarbonífero;
4.
Neocarbonífero/ Eopermiano;
5.
Eocretáceo/ Neocretáceo; e
6.
Terciário/ Quaternário.
Vale ressaltar que Wanderley Filho, et al (2007) falam em cinco sequências com a última
delas equivalendo ao pacote pós-paleozóico (Grupo Javari) como um todo e não mais dividido em
duas sequências.
5
Os pacotes sedimentares juntamente com as soleiras de diabásio conferem 3.800 m e
3.100 m de profundidade nas sub-bacias de Juruá e Jandiatuba, respectivamente.
Durante o intervalo de tempo que compreende o Cambriano e Ordoviciano, a Plataforma
Sulamericana passou por uma fase de transição na qual ocorreram os arqueamentos percursores
da sinéclise do Solimões. A fase rifte da bacia se instalou depois de um longo hiato relacionado à
deposição do Grupo Purus, o que parece inviabilizar o modelo rifte-subsidência térmica de
formação de bacias (Wanderlei Filho & Costa, 1991; Wanderlei Filho et al., 2007). Além disso,
a orientação NW-SE dos riftes proterozóicos, quase perpendicular à orientação da Bacia do
Solimões, também desfavorece aquele mesmo modelo.
A partir do Ordoviciano, com a primeira ingressão marinha em uma bacia cratônica
paleozóica brasileira, registrada na Formação Benjamin Constant (Almeida & Carneiro, 2004),
tiveram início os ciclos transgressivo-regressivos (T-R; Catuneanu, 2008) registrados na Bacia do
Solimões. Esses ciclos encerram unidades sedimentares depositadas durante o início de um
evento transgressivo e o início do próximo com a condição de os dois eventos serem de escala
similar. Também no Ordoviciano se iniciaram as sinéclises, gerando espaço de acomodação e,
em conseqüência delas, o soerguimento dos arcos regionais como mecanismo de compensação
isostática.
A transgressão que depositou os sedimentos da Formação Benjamin Constant (BCO;
figura 2.2), a partir do Eo-ordoviciano, veio do lado oeste da bacia (Almeida & Carneiro, 2004) e
não ultrapassou o Arco de Carauari, limitando a sedimentação à sub-bacia Jandiatuba. A
deposição ocorreu em onlap sobre o flanco oeste do Arco de Carauari e suas variações
faciológicas retratam bem os ambientes de alta energia, possivelmente transicional ou marinho
raso, dominado por ondas. A sequência é composta por arenito mal selecionado cinza
esbranquiçado, com estratificação plano paralela e cruzada de baixo ângulo, bem como por
folhelho cinza escuro a preto.
Novas ingressões marinhas do Neossiluriano ao início do Devoniano também não
atingiram a sub-bacia Juruá e, a exemplo do evento anterior, a sedimentação que gerou a
Formação Jutaí (discordantemente à Benjamin Constant no contato inferior; JUT, figura 2.2)
também se deu em onlap sobre o flanco oeste de Carauari, com as fácies distais argilosas e as
proximais arenosas. São encontrados folhelho cinza escuro e acastanhado, com intercalações de
arenito fino branco e siltito cinzento. O membro Biá representa a sedimentação proximal da
formação e é composto por arenito grosso, siltito micáceo e folhelho preto, ambos intercalados
com delgadas camadas de dolomito creme claro.
6
Figura 2.2: Diagrama cronoestratigráfico da Bacia do Solimões. BCO=Formação Benjamin Constant;
JUT=Formação Jutaí; BIA=Membro Biá; UER=Formação Uerê; ARA=Membro Arauá ;JAN=Formação
Jandiatuba; JAR=Membro Jaraqui; JUR=Formação Juruá; CAR=Formação Carauari; FTB=Formação Fonte
Boa; ALT=Formação Alter do Chão; SOL=Formação Solimões. (Fonte: Wanderley Filho et al., 2007).
No Mesodevoniano, com mais um evento transgressivo (figura 2.3), foi depositado o
Grupo Marimari, desta vez nas duas sub-bacias, com o mar epicontinental novamente se
7
estabelecendo pelo território peruano (lado oeste da bacia) e alcançando a área plataformal da
sub-bacia Juruá, que passou a ter um comportamento francamente subsidente. Esta sequência,
em Juruá, veio a depositar a maior variedade faciológica registrada na Bacia do Solimões, pois a
sedimentação foi bastante controlada pelos fatores tectônicos, climáticos e ambientais. Em
contrapartida, na sub-bacia Jandiatuba predominou uma sedimentação essencialmente argilosa
em ambiente marinho relativamente mais profundo com alternância de sedimentos arenosos e
argilosos ricos em espículas de esponjas silicosas, e sedimentos essencialmente argilosos ricos
em matéria orgânica, às vezes associados a lentes de seixos mal selecionados e suportados por
matriz (Wanderley Filho et al., 2007).
No Mesodevoniano, o continente Gondwana estava em alta latitude, no polo sul, e o clima
era frio. No auge da transgressão, as condições eram de alta anoxia, o que favoreceu a
preservação de matéria orgânica em algumas camadas argilosas.
O Grupo Marimari pode ser dividido em duas formações, quais sejam: Uerê e Jandiatuba.
Figura 2.3: Inundação neo-emsiana / eifeliana no Brasil. Baseado em Mello (1989). Cidades: Be – Belém; C
– Caracas; L – Lima; M – Manaus; Q – Quito; S – Salvador; Fonte: Modificado de Almeida e Carneiro, 2004.
A Formação Uerê (Silva, 1987; 1988; Eiras et. al., 1994) é composta por rochas
predominantemente siliciclásticas, como silexito, arenito com espículas de esponja e folhelho
8
silicoso cinza escuro a preto. O ambiente deposicional interpretado para esta unidade é marinho
raso e transicional.
O Membro Arauá, pertencente a essa formação, corresponde a arenito
caulinítico fino a grosso e branco acinzentado com raras (ou desprovido de) espículas de
esponjas. Estas espículas representam sedimentação em condições de inframaré, possivelmente
na borda de barras ou bancos costeiros (Wanderley Filho et al., 2007). As rochas da Formação
Uerê repousam discordantemente sobre a formação Jutaí na sub-bacia Jandiatuba, sobre o
Membro Biá, no Arco de Carauari e sobre o Grupo Purus e o embasamento na sub-bacia de
Juruá. A Formação Uerê é interpretada como de idade Mesodevoniana a Neodevoniana (Grahn,
1989; Eiras et al., 1994).
A Formação Jandiatuba, de acordo com Eiras et al. (1994), caracteriza-se, na sub-bacia
de mesmo nome, por folhelho cinza escuro a preto com intervalos muito ricos em matéria orgânica
(elevados teores de carbono orgânico total - COT) intercalado com siltito e arenito fino com
espículas. Na sub-bacia de Juruá, a Formação Jandiatuba é composta por arenitos silicificados
intercalados com silexitos (com espículas de esponjas) e camadas de folhelho, siltito e diamictito.
O Membro Jaraqui reúne os diamictitos cinza escuros a pretos, aleatoriamente distribuídos. O
ambiente deposicional interpretado é marinho costeiro, transgressivo até o Frasniano (cerca de
380 Ma) e regressivo para a seção superior. Os diamictitos Jaraqui podem ser o resultado da ação
de geleiras. As rochas da formação são discordantes, na base, com a Formação Jutaí e o
embasamento cristalino, além de interdigitar-se lateralmente com a Formação Uerê. No topo, a
Formação Jandiatuba é discordante com a Formação Juruá, detalhada a seguir.
Com a Orogenia Eo-Herciniana, o mar regrediu e expôs a bacia a mais de 20 Ma de
erosão até o Mesocarbonífero, quando, devido à mudança de latitude, o clima havia variado
radicalmente de frio para quente e árido (Wanderley Filho et al., 2007). Predominou, assim, a
sedimentação continental, dando origem às rochas da Formação Juruá do Grupo Tefé. A partir de
então, a Transgressão Permo-carbonífera (Almeida e Carneiro, 2004), proveniente de oestesudoeste como suas antecessoras, depositou mais duas formações, nomeadas de Carauari e
Fonte Boa, que representariam o restante do Grupo Tefé. Esta foi a última transgressão da
história deposicional da Bacia do Solimões.
A formação Juruá compõe-se por uma seção essencialmente arenosa, com pelitos
subordinados. São encontrados arenitos de granulação muito fina a grossa com cor branca e
cinza e estratificação cruzada de grande e pequeno porte, associados a siltito, folhelho cinza e
castanho, calcário e anidrita. Seus contatos inferiores são discordantes com os folhelhos
Jandiatuba ou os arenitos Uerê. O contato superior é transicional para a Formação Carauari
(Eiras et al.,1994). Os ambientes correspondentes a essas rochas foram, a partir da base da
unidade, fluvio-deltaico sobreposto por um ambiente de sabkha costeiro com intenso
retrabalhamento eólico e gradativo aumento de influência marinha. A associação de depósitos
eólicos e evaporíticos permite inferir que o clima era quente e seco. Os arenitos dessa formação
são considerados os melhores reservatórios da Bacia do Solimões (Elias et al., 2004). São
9
encontradas, ainda, K-bentonitas intercaladas com as demais rochas, em espessuras variando de
1cm a 15 cm, o que indica atividade vulcânica (ainda pouco conhecida) no carbonífero. Estas
rochas funcionam como excelentes marcos estratigráficos para correlações locais e regionais
devido a abrangência da distribuição das cinzas vulcânicas (Alves & Vaz, 2006).
Como foi citado, a influência marinha aumentou na bacia a partir do Permo-Carbonífero,
retrabalhando os sedimentos continentais mais próximos do topo. Mas, ainda assim, muitos
depósitos eólicos foram preservados, principalmente na região do Rio Urucu. Pela primeira vez, o
mar recobriu o Arco de Purus, interligando a Bacia do Solimões com a do Amazonas (Wanderley
Filho et al., 2007). Este evento transgressivo-regressivo foi extremamente pulsativo, em que cada
ciclo de menor ordem era controlado pelo Arco de Iquitos, a oeste. É nesse contexto geológico
que foram depositados os sedimentos carbonáticos e evaporíticos da Formação Carauari.
A Formação Carauari distribui-se por toda a bacia, inclusive sobre os altos estruturais, e é
composta por uma associação cíclica de folhelho castanho e cinza escuro, calcilutito cinzento
recristalizado, anidrita nodular e maciça branca e halita hialina fina a grossa. Dois de seus
contatos, um superior e outro inferior, são transicionais com as formações Fonte Boa e Juruá,
respectivamente. Nas bordas da bacia, o contato inferior é discordante com o Grupo Purus ou
sobre o embasamento e o contato superior, discordante com a Formação Alter do Chão (Eiras et
al., 1994).
A Formação Fonte Boa é uma seqüência tipicamente regressiva com sedimentação
marinha rasa, representada por siltito e folhelho vermelho e castanho, intercalados com arenito
muito fino branco, na sub-bacia Jandiatuba, para continental desértica, representada por camadas
vermelhas e depósitos de sabkha continental associados. Os evaporitos teriam se depositado à
beira de lagos remanescentes da regressão ou poderiam ter se formado por infiltração na zona
vadosa e ascensão capilar do lençol freático enriquecido em sulfatos em condições áridas. Já a
origem dos siltitos maciços intercalados com folhelhos foi atribuída a depósitos de loess formados
sob as mesmas condições (Caputo. 1984; Eiras et al.,1994). Os limites estratigráficos da
formação são, acima, em discordância angular e erosiva com a Formação Alter do Chão e abaixo,
transicional no topo dos calcáreos ou evaporitos da Formação Carauari (Eiras et al., 1994).
Um período de exposição e erosão intensa sucedeu a regressão do último mar a invadir a
bacia. Além disso, no Triássico, por volta de 205,7 Ma (Wanderley Filho et al., 2007), intrusões
de diques e soleiras de diabásio e os dobramentos resultantes do tectonismo Juruá soergueram a
bacia e intensificaram os processos erosivos. Este magmatismo, chamado Penatecaua,
preferencialmente básico, está relacionado à separação dos continentes Sulamericano e Africano
(Almeida 1986, Thomaz Filho et al, 2000; Thomaz Filho et al., 2008). As soleiras intrudem a
Formação Carauari em três corpos com grande uniformidade química ao longo de grandes áreas
na bacia, impossibilitando datações radiométricas tão precisas a ponto de se distinguir o corpo
mais novo do mais antigo. Os métodos de datação K/Ar e Ar/Ar não apontaram variação de idade
entre as três soleiras. Talvez a distinção mais marcante entre esses corpos seja um
10
enriquecimento de cromo e níquel na chamada 3ª soleira, que é a mais inferior. A espessura
somada das soleiras na Bacia do Solimões pode alcançar até 1038m e a composição
mineralógica inclui plagioclásio, piroxênio, quartzo, biotita e hornblenda, com textura subofítica
dominante (Wanderley Filho et al., 2005).
As soleiras foram deformadas por um evento tectônico transpressivo do pré-Albiano
relacionado com a fase de abertura do Oceano Atlântico Sul e Equatorial (Caputo, 1988; 1991),
mas que não afetou as camadas sedimentares mais recentes do Grupo Javari (o qual será
detalhado a frente). É possível, assim, concluir que o evento tectônico tenha ocorrido entre o
Mesojurássico e o Eocretáceo. Esse evento deformacional, conhecido como Megacisalhamento
Solimões (Caputo, 1991), é caracterizado por uma megaestrutura com 1300 km de extensão e de
70 km a 100 km de largura, estendendo-se da Bacia do Acre até o Arco de Purus (figura 2.4). Ao
longo de tal estrutura estão presentes falhas subparalelas, trançadas e de alto ângulo, dobras
escalonadas (en echelon) e dobras falhadas e sistematicamente organizadas em trends típicos de
padrões tectônicos transpressivos. São observadas três famílias de falhas em linhas sísmicas,
sendo a primeira (A) com tendência N70º-80°E, coalescendo de forma anastomosada em planta e
vinculando-se a estruturas em flor positiva. A segunda (B), com tendência N65°E a N30°E, está
associada a falhas escalonadas e dobras falhadas com baixo ângulo (10° a 45°). A terceira família
(C) consiste em falhas subverticais subsidiárias com tendência N45°W a N70°W. Esse evento
resultou na formação de dobras anticlinais responsáveis pelo trapeamento de hidrocarbonetos nas
províncias do Juruá e Urucu (Wanderley Filho et al., 2007).
Figura 2.4: Mapa com arcabouço estrutural da Bacia do Solimões. Fonte: Caputo (2012).
A partir do Neocretáceo, a bacia volta a subsidir e, discordantemente ao Grupo Tefé, tem
lugar a deposição de um sistema fluvial de alta energia que perdurou até o final do Cretáceo. O
11
aporte de água para a implantação de tal sistema foi controlado por nova mudança climática,
desta vez de clima árido para úmido com a bacia se estabelecendo próximo a linha do Equador.
Mapas faciológicos e de isópacas da correlação com as unidades equivalentes na Bacia do Acre e
nas demais bacias subandinas, bem como a análise da evolução estrutural da Bacia do Solimões,
permitem concluir que as águas dessa bacia fluvial eram drenadas para o pretérito oceano
pacífico até o início do soerguimento da Cadeia Andina no Paleógeno (Wanderley Filho et al.,
2007). Esses sedimentos pertencem à Formação Alter do Chão e são identificados como arenitos
grossos, friáveis e de cores variadas. Algumas bandas ferrosas podem indicar períodos de
formação de lateritas sob as condições sazonais mais úmidas (Eiras et al., 1994).
Com a formação da Cadeia Andina, a sobrecarga deslocou o depocentro da sedimentação
para a região subandina, no Terciário. Formaram-se, então, grandes lagos de água rasa e doce
pouco movimentados e alimentados por um sistema fluvial meandrante de baixa energia. Nesse
contexto, formaram-se argilitos vermelhos ou cinzas com camadas de conchas e de linhito da
Formação Solimões. A partir do Mioceno, a bacia passou a ser alimentada abundantemente por
sedimentos provenientes do Cinturão Andino e a rede de drenagem foi direcionada rumo ao
Oceano Atlântico. No Quaternário, ainda como resultado da construção andina, alguns rios
tiveram seu gradiente potencializado, aumentando a competência do transporte sedimentar.
Foram depositados sedimentos essencialmente arenosos na região entre os rios Jutaí e Negro.
Na área do Rio Urucu, a parte superior da unidade é composta por arenito grosso variegado
(Eiras et al., 1994, Wanderley Filho et al., 2007).
12
2.2. Sistemas petrolíferos: conceitos fundamentais
2.2.1. Introdução
Magoon & Dow (1994) e Bjørlykke (2010) definem vários termos que serão utilizados
nesta monografia. Os termos petróleo, hidrocarboneto e óleo e gás são equivalentes. Petróleo,
originalmente se refere a óleo cru, mas sua definição foi expandida para incluir todos os
hidrocarbonetos de ocorrência natural, sejam gasosos, líquidos ou sólidos.
Hidrocarbonetos são compostos apenas por hidrogênio e carbono tais como os saturados
ou aromáticos. Além dos hidrocarbonetos, os quais predominam, outros componentes contendo
nitrogênio, oxigênio e enxofre são encontrados em óleo cru e gás natural. Quando o termo
hidrocarboneto é inserido no texto, usualmente significa petróleo; quando o termo óleo e gás é
utilizado, refere-se coletivamente a óleo cru e gás natural em qualquer proporção. Condensados
são substâncias que estão em fase gasosa na acumulação e líquida em superfície, mas em
ambos os casos o termo também é sinônimo de petróleo, assim como hidrocarbonetos sólidos
(betume, areias betuminosas e asfalto natural).
Um sistema petrolífero (Magoon & Dow, 1994) é definido como um sistema natural
constituído por uma rocha geradora, todo o óleo e gás a ela relacionados, e inclui todos os
elementos essenciais e os processos necessários para que a acumulação de óleo e gás exista.
Os elementos essenciais são a própria rocha geradora, a rocha reservatório, a rocha
selante e as rochas capeadoras (sequências sobrepostas à rocha geradora). Os processos
incluem geração, migração, acumulação e o armadilhamento de petróleo. Todos os elementos
devem ser organizados no tempo (sincronia) e no espaço de tal modo que os processos
requeridos para a formação de uma acumulação de petróleo ocorram.
Quando a rocha geradora é maturada em função do gradiente geotérmico na profundidade
atingida durante o soterramento, o sistema pode ser classificado como típico.
Um sistema petrolífero é considerado atípico quando os hidrocarbonetos são gerados de
outra maneira como, por exemplo, a formação de gás biogênico a baixas profundidades por
atividade biológica ou a rocha geradora sendo termalmente maturada por intrusões magmáticas.
2.2.2. Rocha geradora e geração
A rocha geradora é tipicamente sedimentar, com granulação fina e associada a ambiente
lacustre ou marinho. O depósito sedimentar deve ser rico em matéria orgânica (comumente restos
de fitoplancton) e deve ter sido soterrado a tal profundidade que o sujeitou a determinada
temperatura por um intervalo de tempo suficiente para que houvesse a geração (Railsback,
2011).
13
O termo rocha geradora matura indica que uma porção ou volume contíguo de matéria
orgânica gera petróleo, tanto por atividade biológica quanto por aquecimento num tempo
específico. O volume de rocha geradora matura é determinado pelas características geoquímicas
da fácies orgânica (quantidade, qualidade e maturidade térmica), podendo ela ser considerada
ativa ou inativa. Uma rocha geradora é matura quando gera petróleo ao passo que uma rocha
geradora inativa foi, no passado, uma rocha geradora matura e agora está exaurida. A partir do
momento em que o petróleo é criado, o sistema petrolífero existe (Magoon & Dow, 1994).
O processo de geração ou maturação de hidrocarbonetos é dividido em três estágios de
alteração consecutivos, progressivos e irreversíveis de mudança composicional da matéria
orgânica, conhecidos como diagênese, catagênese e metagênese.
A diagênese é o estágio de alteração mais precoce da matéria orgânica em que os restos
de organismos aquáticos e/ou terrestres são alterados e/ou degradados por processos biológicos
e de transformação química de baixa temperatura (até aproximadamente 80°C) desde o momento
da deposição. Esta alteração começa na coluna de água e se estende a sedimentos
inconsolidados e algumas rochas sedimentares compactadas.
A atividade microbiana é muita alta na interface água-sedimento e nos sedimentos mais
rasos, o que degrada em altas proporções a matéria orgânica originalmente depositada em
moléculas simples como CO2, N2 e H2O (em condições aeróbicas) e depois NH3, H2S e CH4 (em
condições anaeróbicas).
As macromoléculas mais resistentes à degradação microbiana como os ácidos fúlvicos e
ácidos húmicos ou humina, são potenciais precursoras de querogênio ( um sólido insolúvel em
ácidos não oxidantes, bases e solventes orgânicos comuns). Algumas das moléculas insolúveis
resistentes à reciclagem e à diagênese, apesar da perda de alguns de seus grupos funcionais,
atuam como fósseis geoquímicos (biomarcadores) que podem ser correlacionados a organismos
viventes ou seus ancestrais, e usados, por exemplo, em correlações entre uma rocha reservatório
e sua respectiva geradora. O modo de formação e, por conseguinte, o tipo de querogênio
formado, exerce uma forte influência no potencial da rocha geradora para formar óleo e/ou gás
(Horsfield & Rullkötter, 1994).
O querogênio é normalmente dividido em três tipos principais (figura 2.5) de acordo com a
fonte original de material orgânico. É útil, na geologia do petróleo, identificar o tipo de querogênio
para discriminar o ambiente deposicional da rocha geradora. O tipo de querogênio depende do
tipo de matéria orgânica preservada em cada ambiente sedimentar e cada tipo de querogênio
matura-se sob diferentes condições de soterramento, controlando o momento de geração de
petróleo e sua expulsão da rocha geradora. Além disso, cada querogênio produz diferentes
agregados de petróleo em proporções também distintas. Os tipos de querogênio podem ser
reconhecidos com base em propriedades ópticas como cor, fluorescência e reflectância.
O tipo I (liptinita, ou querogênio sapropélico) tem uma alta razão de hidrogênio por carbono
(1,5 < H/C < 2,0), e uma baixa razão oxigênio por carbono (O/C ~ 0,15). É propenso à geração de
14
óleo com alto rendimento (mais de 80%). É derivado de uma fonte algal, rica em lipídios, formada
em ambientes lacustrinos e/ou lagunares. Este tipo de querogênio fluoresce sob luz ultravioleta
(UV) e é relativamente raro.
O tipo II (exinita) tem razões intermediárias H/C (~ 1,4) e O/C (~ 0,2). É propenso a gerar
óleo e gás com rendimentos entre 40% e 60%. A fonte deste tipo de querogênio é principalmente
representada por fragmentos de plantas membranosas (esporos, pólens e cutículas), além de
fitoplanctons e microorganismos bacterianos em sedimentos marinhos. Este tipo de querogênio
também fluoresce sob luz UV e é o mais abundante. Alguns querogênios ricos em exinita contêm
uma alta proporção de enxofre e são chamados de querogênio tipo H-S. A presença de enxofre
influencia o momento e a taxa de maturação do querogênio.
O tipo III (vitrinita ou querogênio húmico) tem uma baixa razão H/C (1,0 – 0,5) e uma alta
razão O/C (~ 0,3) e, portanto, forma um querogênio de baixo rendimento, principalmente gerando
gás. Sua fonte primária são detritos de plantas superiores encontradas em carvões e/ou
sedimentos ricos em carvão. A vitrinita é um tipo de maceral, derivada do carvão mineral e não
fluoresce sob luz UV. No entanto, sua reflectância aumenta em altos níveis de maturação e,
assim, pode ser usado como um indicador de maturidade da rocha geradora.
Figura 2.5: Diagrama de Van Krevelen mostrando a composição primária dos principais tipos de
querogênio e suas mudanças em função da maturação (aquecimento). As linhas tracejadas delimitam
as condições de geração de óleo e gás(úmido e seco) para os três tipos de querogênio. Fonte:
modificado de Bjørlykke (2010).
15
Alguns autores reconhecem, ainda, um quarto tipo de querogênio, a inertinita. Trata-se de
um produto não fluorescente de qualquer dos outros querogênios. É rico em carbono, pobre em
hidrogênio e frequentemente chamado de dead-carbon (carbono morto), tendo potencial
ineficiente para rendimentos de óleo e gás. (Gluyas & Swarbrick, 2004).
A catagênese é o principal estágio da formação de óleo e ocorre entre 80ºC e 150ºC a
depender do grau geotérmico ao longo de um período tipicamente entre um e cem milhões de
anos. Quando temperaturas entre 80ºC e 90ºC são atingidas, normalmente entre 2km e 3km de
profundidade, o processo de conversão de matéria orgânica em hidrocarbonetos se inicia
lentamente com rompimento das moléculas de querogênio, resultando em outras menores,
características do óleo e a variação de temperatura ideal para conversão de querogênio em óleo
(maturação) está entre 100ºC e 150ºC, o que corresponde a uma profundidade entre 3km e 4km
com um gradiente geotérmico normal (cerca de 25°C/km). Este estágio de alteração da matéria
orgânica pode ser dividido em: zona de geração de óleo, correspondente à “janela de óleo” (onde
a produção de óleo líquido é acompanhada pela formação de gás); e na zona mais matura de gás
úmido (onde hidrocarbonetos leves são produzidos por craqueamento). A janela de gás
corresponde ao intervalo do topo da zona de gás úmido até a base da zona de gás seco (figuras
2.5 e 2.6).
Em regiões com atividade magmática, a matéria orgânica pode maturar a menores
profundidades em consequência dos altos gradientes geotérmicos. Vale ressaltar que a
condutividade de calor paralela às camadas, tem mais de 70% de eficiência em relação a
condutividade no sentido perpendicular às camadas de uma bacia sedimentar (Bjørlykke, 2010a).
Figura 2.6: Etapas de conversão da matéria orgânica e geração de óleo e gás em função da temperatura.
Fonte: Modificado de Robelius, 2007.
Conforme a temperatura aumenta, ultrapassando os 150ºC, ainda mais ligações químicas
se rompem, tanto no querogênio quanto no hidrocarboneto já formado. Este craqueamento leva à
16
formação de hidrocarbonetos mais leves. A remoção de gás, principalmente o CH4, deixa o
querogênio residual relativamente enriquecido em carbono. Trata-se da metagênese, que
corresponde à zona de gás seco na “janela de gás”. Acima de cerca de 220°C, a conversão do
querogênio gera grafita.
2.2.3. Migração
Migração é o transporte de petróleo da rocha geradora até a rocha reservatório. O
transporte de petróleo ocorre, principalmente, como uma fase separada num processo dirigido
pela flutuabilidade do petróleo com relação à água. A solubilidade do óleo em água é muito baixa
para a maior parte dos componentes. Já a solubilidade de gás (particularmente metano) é muito
maior tanto em água quanto em óleo e aumenta com a profundidade em condições de maior
pressão.
A expulsão de petróleo da rocha geradora para as rochas adjacentes (não
necessariamente a rocha reservatório) é chamada de migração primária. A migração primária é
controlada pela taxa de geração de petróleo. A rocha geradora pode ter permeabilidade suficiente
para a expulsão do petróleo através de sua matriz ou pode sofrer hidrofraturamento produzindo
permeabilidade suficiente para a expulsão primária. Se os hidrocarbonetos fluidos gerados a partir
do querogênio durante a maturação não forem expelidos imediatamente, esse processo
incrementa o volume da fase fluida em relação a fase sólida (que normalmente não é maturada
por completo), comparativamente ao volume original da fase sólida (querogênio) na rocha
geradora.
Tem sido usualmente assumido que há expansão do querogênio durante sua maturação,
pois a densidade dos derivados deve ser menor que a do querogênio primário. Mesmo que não
houvesse uma expansão volumétrica, a própria geração de óleo contribui para produção de
sobrepressão, desde que o fator principal seja a mudança no índice de vazios (void ratio) quando
parte do querogênio sólido é alterado para petróleo fluido. O índice de vazios é a relação entre o
volume da fase fluida (porosidade) e a fase sólida, sendo apresentado pela equação: Vr = φ / (1 φ), onde Vr significa o índice de vazios e “φ” corresponde à porosidade.
As rochas geradoras podem incluir camadas delgadas de siltito ou arenito que são
utilizadas como rota de migração para os hidrocarbonetos. Se, no entanto, tais camadas não
existirem, a permeabilidade da matriz do folhelho é, na maioria dos casos, pequena o suficiente
para o desenvolvimento de pressão de fluidos onde o petróleo é gerado até que a pressão de
fraturamento seja alcançada. A rocha geradora deve consistir de querogênio em uma matriz rica
em argila, de granulação fina e assim a expulsão do óleo é inibida pela elevada pressão capilar e
a baixa permeabilidade. Em tais casos, o óleo não pode ser expelido pela matriz. Mas, se a
pressão de fluidos alcança a pressão de fraturamento começa a ocorrer a abertura de fraturas
muito finas permitindo a expulsão do petróleo. A pressão de fraturamento é controlada pelo stress
17
horizontal (σh) que é, na maioria dos casos, menor do que o stress vertical (σv) causado pela
pressão de soterramento.
O querogênio não é normalmente distribuído de forma homogênea na rocha geradora.
Lamas ricas em matéria orgânica depositadas sob condições redutoras tendem a ser laminadas
em consequência da falta de bioturbação e algumas laminações podem consistir de querogênio
quase puro. Se essas camadas de querogênio forem então maturadas e o petróleo não for
expelido, este terá que suportar toda a pressão vertical (σv). A pressão de fraturamento,
correspondente a σh será excedida. No entanto, o stress vertical será alcançado antes desse
ponto produzindo fraturas verticais (perpendiculares a direção de menor stress). Mesmo que o
querogênio seja distribuído mais uniformemente na rocha geradora, a produção de petróleo fluido
aumenta o volume da fase fluida. Camadas com 10% de COT (carbono orgânico total) produzem
cerca de 20% do volume. Se a porcentagem de água na rocha geradora é de 10%, a maturação e
fluidização de 50% de querogênio poderia aumentar o conteúdo de fluidos (porosidade) em 100%
caso a expulsão não ocorra. O excesso de fluido deve, portanto, ser expelido durante a
maturação, pois um folhelho com alta porosidade poderia compactar mecanicamente e assim
expelir o óleo.
O fluxo de petróleo da rocha geradora à rocha reservatório é chamado de migração
secundária e deve ser entendido como um fluxo de duas fases e em alguns casos até três fases.
A permeabilidade relativa para óleo ou gás é crítica. A uma baixa saturação de óleo ou gás, os
hidrocarbonetos irão ocorrer apenas como pequenas gotículas na água, as quais, não irão fluir em
conseqüência da resistência capilar (figura 2.7) e pelo efeito de flutuabilidade ser muito fraco. A
força capilar é uma resistência ao fluxo da fase separada de hidrocarboneto. A permeabilidade
relativa para hidrocarbonetos é, então, muito pequena, resultando em pouca migração. Se houver
um gradiente de pressão na fase fluida, a água flui sem as gotículas de petróleo que fica retida
pela força capilar.
H2O
Grão
Fluxo de água
Gotícula de
óleo
Figura 2.7: Gotículas de óleo impedidas de fluir pelos poros em conseqüência das forças capilares.
Uma vez que a migração primária ocorra, as fases de óleo e gás fluem de forma
ascensional dirigidas pela flutuabilidade ao longo de rotas onde o petróleo é concentrado. Assim,
uma alta saturação de óleo pode ser localmente alcançada aumentando a permeabilidade relativa.
A migração secundária requer que uma rota contínua com saturação de petróleo seja
estabelecida. Onde o fluxo for impedido pela alta pressão de entrada capilar ou baixa
18
permeabilidade, o petróleo pode ser armadilhado em becos sem saída (dead ends) de pequena
ou grande escala.
A redução da pressão confinante em conseqüência de soerguimento e erosão pode
separar a fase gasosa da solução em água ou óleo e forma acumulações separadas de gás. Este
gás pode então preencher as estruturas e deslocar o óleo para fora das armadilhas de modo que
o óleo migre para outra armadilha mais próxima à superfície.
A migração, tanto de óleo quanto de gás, ocorre em sua maior parte como uma fase
separada e a força que dirige esse processo é a flutuabilidade da fase hidrocarboneto em água. A
densidade do petróleo (ρw) varia de 0,5 a 1,0 g/cm3. A fase aquosa tem densidade (ρw) em torno
de 1,00 e 1,20 g/cm3 dependendo da salinidade. A força de flutuabilidade é então: F1 = (ρw –
ρo).H, onde H equivale à altura da coluna contínua de petróleo.
Essa diferença de pressão entre as fases de óleo e água é o que supera as forças
capilares que resistem à migração. Essas forças capilares dependem das propriedades
superficiais dos grãos em relação aos fluidos. A maioria dos grãos de arenitos, por exemplo, são
superficialmente úmidos (figura 2.8). Assumindo essas condições, a força resistência capilar
corresponde a F2 = (2γ cos σ)/R, onde γ é igual a tensão interfacial (entre uma fase liquida e outra
sólida), σ o ângulo da superfície embebida em água (grão) e R, o raio do canal intersticial por
onde o petróleo deve passar.
Grão de
areia
Fluxo de
óleo
Óleo
H2O
Figura 2.8: Grãos de areia envolvidos por finas camadas de água. Uma fase de óleo contínua fluirá
facilmente se a permeabilidade for relativamente alta e os canais entre os poros forem relativamente largos.
Em arenitos de granulação grossa, com poros relativamente largos, a resistência capilar é
baixa e a migração sofre pouca resistência.
2.2.4. Rocha reservatório e acumulação
Qualquer rocha pode atuar como um reservatório com a condição de ter duas propriedades
adequadas: porosidade (a capacidade de reter fluidos) de tipos variados de aberturas, tais quais,
poros intergranulares em rochas sedimentares, cavidades em rochas fossilizadas como calcários
19
oolíticos, rochas fraturadas e juntas formadas por solução; e permeabilidade (capacidade de
transmitir fluidos). As rochas sedimentares, como arenitos e carbonatos são o tipo de reservatório
mais comum e uma vasta maioria dos campos de petróleo conhecidos tem reservatórios
sedimentares (Robelius 2007; Assaad, 2009).
Reservatório de petróleo é a porção da rocha que contém o poço e consiste de quatro
elementos essenciais: a rocha reservatório; a porosidade ou porosidade efetiva (a porção da
rocha reservatório disponível para migração, acumulação e armazenamento); o conteúdo de
fluidos (água, óleo e gás) ocupado pelo espaço efetivo de poros; e a armadilha do reservatório
que retém óleo e gás no lugar do poço (Assaad, 2009).
A porosidade absoluta corresponde ao volume total não ocupado por sólidos (poros) e a
porosidade efetiva refere-se aos poros interconectados. Poros em conexão com outros poros
contribuem para o movimento de fluidos no reservatório. Quanto maior a porosidade de uma
formação maior sua capacidade de armazenar fluidos. A porosidade usualmente diminui a
grandes profundidades em conseqüência da compactação. Um reservatório com porosidade muito
baixa tem menos que 5% enquanto um de excelente porosidade tem em torno de 20% (tabela
2.1).
Tabela 2.1: Valores típicos de porosidade para reservatórios de óleo (Hyne, 2001).
Valor de porosidade
(%)
0–5
Classificação
5–10
Pobre
10–15
Regular
15–20
Bom
> 20
Excelente
Insignificante
Segundo Hine (2001), por ser relativamente simples de se obter dados de porosidade, é
estabelecido um termo conhecido por porosidade de corte (porosity cutoff). Este valor pode ser
decisivo para a perfuração de um poço. Para arenitos, um valor típico de porosidade de corte seria
entre 8% e 10%. Para calcários é utilizado um valor entre 3% e 5%. Esses valores podem variar
em função da profundidade e do valor econômico do poço.
A porosidade pode ser ainda classificada em primária e secundária. A porosidade primária
forma-se durante a deposição dos sedimentos e diminui com o soterramento como resultado de
compactação mecânica e dos processos diagenéticos. A porosidade secundária é formada
posteriormente à deposição por fraturamento ou pela dissolução de minerais, sendo mais comum
em carbonatos. As fraturas podem aumentar a conectividade dos poros e qualquer rocha fraturada
pode ser reservatório. Folhelhos, cherts e até rochas do embasamento podem ser reservatórios. A
tabela 2.2 mostra os valores típicos de porosidade primária para vários tipos de rocha.
20
Tabela
2.2:
Porosidade
de
vários
tipos
de
rocha.
Fonte:
http://www.edumine.com/xtoolkit/tables/sgtables.htm <acesso em: 30/05/2013>
Tipo de Rocha
Porosidade (%)
Granito
0,5 – 1,5
Diabásio
0,1 – 0,5
Arenito
5,0 – 25,0
Folhelho
10,0 – 30,0
Calcário
5,0 – 20,0
Dolomita
1,0 – 5,0
Quartzito
0,1 – 0,5
Modificado
de
A relação entre porosidade e permeabilidade é diretamente proporcional, isto é, quanto
maior a porosidade, maior a permeabilidade e vice-versa. A lei de Darcy é a equação que
descreve o fluxo de fluido através de um material poroso sob uma queda de pressão e que define
também a permeabilidade. A unidade para a permeabilidade é Darcy (D), mas uma vez que é a
permeabilidade em reservatórios de óleo é geralmente inferior a um Darcy, o milidarcy (mD) é
comumente utilizado. A lei de Darcy é dada pela equação: Q = 0,001127 · k · (A/µ) · (∂P/∂L), onde
Q = taxa de fluxo de fluido; k = permeabilidade; A = área da seção por onde há fluxo; ∂P/∂L =
gradiente de pressão; e µ = viscosidade do fluido (Robelius, 2007).
De acordo com Selley (1998), a permeabilidade em reservatórios está frequentemente
num intervalo entre 5 e 500 mD, mas existem valores maiores (tabela 2.3). Vale ressaltar que a
permeabilidade pode variar em diferentes direções, sendo, em geral, maior na horizontal do que
na vertical. Na Bacia do Solimões, por exemplo, a permeabilidade pode variar em função do
caráter tridimensional irregular das soleiras estratigraficamente acima dos reservatórios da
Formação Juruá. Possivelmente, os reservatórios mais permoporosos estão localizados onde a
espessura das soleiras for menor.
Tabela 2.3: Valores de permeabilidade típicos de reservatórios de óleo (Hyne, 2001).
Valor de
Permeabilidade (mD)
1–10
10–100
100–1000
Classificação
Baixa
Boa
Excelente
2.2.5. Armadilhamento e rocha selante
A armadilha geralmente consiste de uma cobertura impermeável, sobrejacente que sela a
rocha reservatório, como certos tipos de folhelhos, sal ou depósitos de anidrita e rochas ígneas.
21
Pode-se pensar numa armadilha como um balde invertido (de “cabeça para baixo”) que pode ser
preenchido com petróleo que ascende. O ponto em que o petróleo pode vazar dessa estrutura é
chamado de ponto de derrame (spill point) e o fechamento (closure) é a coluna máxima de óleo
que a estrutura pode suportar antes do vazamento (figura 2.5).
As rochas selantes podem não ser totalmente efetivas em evitar o fluxo vertical de
hidrocarbonetos, mas estes ainda se acumularão se as taxas de vazamento forem menores que
as de suprimento. Rochas selantes não são usualmente impermeáveis à água, mas podem ser
em relação ao óleo e gás pela resistência capilar em poros estreitos como já foi discutido.
Figura 2.9: Figura esquemática com os pontos de derrame de hidrocarbonetos (spill points). Em vermelho:
gás; em verde: óleo; as setas indicam o deslocamento dos hidrocarbonetos. Fonte: Modificado de AAPG
(http://www.aapg.org/slide_resources/schroeder/2/index.cfm)
As armadilhas podem ser classificadas de acordo com o seu processo de formação (figura
2.10), tais como:
1. Armadilhas estruturais: formadas por deformação (dobras, domos ou falhas) de rochas.
Podem ser armadilhas como domos antiformais, domos salinos, antiformais de crescimento,
falhas (normais, transcorrentes, inversas e de crescimento), antiformais rollover (dobras de
compensação), entre outras.
2. Armadilhas estratigráficas: estão relacionadas com feições primárias nas sequências
sedimentares e não necessitam de deformação estrutural. Os principais tipos formam-se em: (1)
arenitos de canais fluviais, pois estes tendem a ser isolados e circundados por sedimentos
impermeáveis ricos em argila e ainda podem ser dobrados combinando uma armadilha
estratigráfica com uma estrutural (armadilha mista); (2) canais submarinos e arenitos turbidíticos
em estratos ricos em folhelho; (3) estruturas de recifes que são frequentemente circundados por
folhelhos; (4) discordâncias angulares entre arenitos ou outras rochas porosas e folhelhos ou
outras rochas com baixa porosidade formando uma armadilha abaixo da discordância; (5) altos
topográficos no embasamento recobertos com folhelhos também podem ser boas armadilhas em
22
rochas fraturadas do embasamento. Vale ressaltar que o óleo pode migrar para cima em rochas
estratigraficamente inferiores.
Figura 2.10: Alguns dos principais tipos de armadilha de petróleo. (A), (B) e (C) são armadilhas estruturais
(antiformal, falha normal com rochas selantes justapostas e domeamento em conseqüência de diapirismo
salino); em armadilhas estratigráficas as rochas são depositadas em um ambiente particular (D) ou por
uma
sequência
de
eventos
mais
complexa
(E).
Fonte:
www.oilandgasuk.co.uk/publications/Geological_Settings/Trapping_Oil_and_Gas.cfm
É importante estabelecer quando as armadilhas se formaram em relação ao período em
que houve migração. Estruturas formadas posteriormente à fase principal de maturação da rocha
geradora tendem a ser ineficientes podendo, em alguns casos, coletar gás que é gerado depois
do óleo.
Em contrapartida, armadilhas estratigráficas se formam antes e, assim, o momento da
migração não é um fator tão importante. Essas armadilhas devem, no entanto, depender de uma
inclinação dos estratos envolvidos.
2.2.6. Níveis de investigação
Magoon e Dow (1994) dividiram didaticamente a investigação dos sistemas petrolíferos
em quatro níveis separados (figura 2.11) em que cada um é necessário para um melhor
entendimento de gênese e locação do hidrocarboneto. A etapa inicial de investigação abrange
toda a bacia em questão e o último nível fica centrado em uma determinada acumulação.
O primeiro nível consiste na investigação de bacias sedimentares com análise de suas
sequências estratigráficas e estilos estruturais. O segundo, diz respeito aos estudos de sistemas
petrolíferos e descrevem a relação genética entre uma rocha geradora especificamente e o
23
petróleo geneticamente relacionado. A prova de uma bacia sedimentar são rochas sedimentares;
a prova de um sistema petrolífero é a presença de hidrocarbonetos, por menor que seja a
quantidade. O nível três investiga plays descrevendo uma série de armadilhas; e o quarto e último
nível, investiga os prospectos, descrevendo uma armadilha determinada. Os dois últimos níveis
definem, também, se tal(is) armadilha(s) tem valor econômico e sua viabilidade exploratória com a
tecnologia e as ferramentas disponíveis. Um prospecto é conceitual por que quando é bem
sucedido torna-se um campo de óleo e/ou gás quando perfurado ou, quando mal sucedido,
desaparece.
Figura 2.11: Os quatro níveis de investigação petrolífera.
Considerações econômicas não têm importância nos dois primeiros níveis, mas são
essenciais nos dois últimos. Sem economia favorável um play ou prospecto inexistem Ao
contrário, uma bacia sedimentar ou um sistema petrolífero existem indiferentemente de fatores
econômicos, pois são fenômenos baseados em processos naturais. Além disso, como o foco na
investigação da ocorrência de hidrocarbonetos parte do nível investigativo de bacia sedimentar até
o prospecto, o custo de investigação geralmente aumenta por unidade de área em superfície. A
investigação de bacias sedimentares requer uma grade de baixa densidade de informações que
cubra uma área grande tais como as linhas sísmicas amplamente espaçadas, alguns poços
exploratórios estrategicamente localizados e mapas geológicos de pequena escala. Em
contraposição, a avaliação de prospectos requer uma grade de alta densidade de informações
que cubra uma pequena área assim como linhas sísmicas pouco espaçadas num mapa de larga
escala. Eventualmente, os custos para se adquirir os direitos de perfuração e para perfurar os
poços também devem ser incluídos nos aspectos econômicos de um prospecto.
24
2.2.7. Extensões temporal, geográfica e estratigráfica
As extensões temporal, geográfica e estratigráfica de um sistema petrolífero são
específicas.
O momento crítico é o ponto no tempo selecionado pelo investigador que melhor
representa a ocorrência conjunta dos processos (geração, migração e acumulação) da maior parte
dos hidrocarbonetos num sistema petrolífero. Um mapa ou um perfil desenhado para mostrar o
momento crítico oferece a melhor representação da extensão geográfica e estratigráfica de um
sistema (figura 2.12).
Geologicamente, geração, migração e acumulação de petróleo num dado local ocorrem em
um curto período. Quando inseridos na curva da história de soterramento, os elementos
essenciais mostram a função de cada unidade rochosa e litológica no sistema petrolífero.
A extensão geográfica de um sistema petrolífero no momento crítico é definida pela linha
que circunscreve a parte da rocha geradora que esteve ativa e inclui todo o petróleo descoberto,
infiltrações e demais acumulações associadas.
Figura 2.12: Seção transversal no sistema petrolífero de uma bacia do tipo foreland. Fonte: Modificado de
Magoon & Dow (1994).
O sistema petrolífero inclui, estratigraficamente, elementos essenciais e as unidades
rochosas inseridos na extensão geográfica, tais quais: rocha geradora de petróleo, rocha
reservatório, rocha selante e rochas sobrepostas ao sistema no momento crítico. As funções das
três primeiras unidades de rocha são óbvias. Porém a das rochas sobrepostas é mais sutil pois
25
além de proporcionar o pacote de rochas necessário para a maturação térmica da rocha geradora,
elas podem ter considerável impacto na geometria do caminho da migração subjacente e o
armadilhamento.
2.2.8. Nível de certeza
Um sistema petrolífero pode ser identificado em três níveis de certeza: conhecido,
hipotético ou especulativo. Tais níveis indicam grau de confiança para uma acumulação de
hidrocarbonetos ter sido gerada de uma determinada rocha geradora matura. Em um sistema
conhecido, existe uma boa correspondência entre as acumulações de óleo e gás e a rocha
geradora matura.
Num sistema hipotético a informação geoquímica identifica a rocha geradora mas não há
correspondência entre esta e a acumulação de petróleo.
Por fim, num sistema petrolífero especulativo, a existência da rocha geradora ou do
petróleo são postulados inteiramente com base em evidências geológicas e geofísicas. No final do
nome do sistema o nível de certeza é indicado por (!) para conhecido, (.) para hipotético e (?) para
especulativo.
2.2.9. Diagrama de eventos
Um diagrama de eventos (figura 2.13) mostra a relação temporal dos elementos
essenciais e os processos de um sistema petrolífero. Também é mostrado o tempo de
preservação e o momento crítico para o sistema. Com este tipo de diagrama é possível comparar
os momentos em que os processos ocorreram com o tempo de formação dos elementos.
Figura 2.13: Diagrama de eventos proposto por Mello et al. (1994) para o sistema petrolífero Barreirinhas –
Itaituba (!). Fonte: Barata e Caputo (2007).
26
CAPÍTULO 3: Sistemas petrolíferos da Bacia do Solimões
3.1. Descrição geral
O primeiro sistema petrolífero elaborado para a Bacia do Solimões com base nos conceitos
de Magoon & Dow (1994) foi proposto por Mello et al. (1994). Neste modelo, os autores
basearam-se numa nomenclatura estratigráfica (capítulo 2.2.8) para reconhecer o sistema
petrolífero Barreirinhas – Itaituba (!). Posteriormente, Eiras (1998, 1999) propôs dois sistemas
petrolíferos de acordo com os conceitos definidos por Magoon & Dow (1994). O mais importante,
com mais de 99% do óleo, gás e condensado explorados na Bacia do Solimões, é o sistema
Jandiatuba – Juruá (!). O outro é nomeado Jandiatuba – Uerê (.). Devido à pouca espessura do
pacote sedimentar, parece não ter havido calor suficiente para a maturação em grande parte da
bacia até a ocorrência das intrusões básicas, o que caracteriza estes sistemas como atípicos
(Capítulo 2.2).
3.2 Rochas geradoras
Os folhelhos radioativos devonianos (Frasniano Superior) da Formação Jandiatuba são as
principais rochas geradoras do sistema petrolífero Jandiatuba – Juruá (!) e equivalem ao Membro
Barreirinhas do antigo sistema petrolífero Barreirinhas – Itaituba (!) (figura 3.1).
Figura 3.1: Perfil geoquímico dos folhelhos ricos em matéria orgânica da Formação Jandiatuba. Na fonte
original (Mello et al., 1994), estes folhelhos (em verde) representavam o Membro Barreirinhas da Formação
Curuá.
27
Mello et al. (1994) utilizaram análises geoquímicas detalhadas e a integração desses
dados teria mostrado que a rocha geradora para a acumulação de óleo do Rio Urucu foram os
folhelhos pretos radioativos do Devoniano Superior (Membro Barreirinhas da Formação Curuá
pela nomenclatura estratigráfica antiga). Esta camada teria espessura média de 50m, com
conteúdo de carbono orgânico total (COT) de mais 6% (em peso). Informações mais recentes
sobre as rochas geradoras (Clark, 2002) colocam os valores de COT máximo em 8,25% para os
folhelhos pretos da Formação Jandiatuba.
A falta de fonte potencial de hidrocarboneto (< 3,5mg HC/g rocha) combinada com baixos
índices de hidrogênio (IH < 50mg HC/g COT) indicaram que os folhelhos barreirinhas expeliram a
maior parte de seus hidrocarbonetos. Tal interpretação é consistente com os valores observados
de reflectância da vitrinita que estariam num estágio maturo (0,6<Ro<1,35%). Esse elevado grau
de maturidade termal parece estar relacionado com as muito espessas intrusões de diabásio do
Triássico-Jurássico comparativamente às finas camadas sedimentares paleozóicas.
Mello et al. (1994) criaram um mapa no qual foi possível associar os campos de gás de
Juruá com as áreas onde as rochas geradoras foram supermaturadas (Ro > 1,35), e o campo de
óleo e condensados de Urucu com áreas maturas (Ro ~ 1,35) (figura 3.2).
Figura 3.2: Mapa de maturidade térmica da rocha geradora do Devoniano Superior mostrando a
distribuição dos estágios de alta maturação e supermaturação no campo de gás de Juruá e no campo de
óleo de Urucu. Fonte: Mello et al. (1994).
28
A ocorrência das atividades magmáticas promoveu uma modificação na estrutura termomecânica da bacia e contribuiu para a maturação das rochas geradoras ou craqueamento de
depósitos de óleo e gás já existentes na sub-bacia Jandiatuba e na parte oriental da sub-bacia
Juruá (figura 3.3). Na área de Juruá, as soleiras estão próximas à seção geradora e a matéria
orgânica encontra-se senil. Na área de Urucu, as soleiras estão mais distantes e a matéria
orgânica permanece na janela de preservação de óleo (Brazil,1989; Muniz, 2009).
De acordo com Eiras (1998), há ainda o sistema Jandiatuba – Uerê (.). As rochas
geradoras desse sistema petrolífero (secundárias) são os folhelhos e diamictitos devonianos do
Membro Jaraqui (Formação Jandiatuba), com teores de carbono orgânico total (COT) variando de
0,65% a 1,45%, e os folhelhos silicosos da Formação Uerê com COT variando de 1,48% a 3,07%
(Clark, 2002).
Figura 3.3: Influência das soleiras na maturação de matéria orgânica no campo de gás de Juruá (esquerda)
e de óleo e condensado do Rio Urucu (direita). Fonte: modificado de Clark, 2002.
3.3 Rochas Reservatório, Selantes e Armadilhas
As principais rochas reservatório conhecidas na Bacia do Solimões são os arenitos eólicos
e flúvio-deltaicos da Formação Juruá (antes conhecida como Formação Itaituba), integrante do
sistema petrolífero Jandiatuba – Juruá (!), com até 50m de espessura.
Esse reservatório pode ser dividido em uma seção basal (arenitos flúvio-deltaicos), com
porosidade de 9% a 11% e permeabilidade de 1 mD a 350 mD, e uma seção superior (arenitos
eólicos), com porosidade de até 22,5% e permeabilidade de 100 mD a 320 mD (Clark, 2002).
Devido a estas características, a seção superior representa os melhores reservatórios da
Formação Juruá.
29
Com relação ao sistema petrolífero hipotético Jandiatuba – Uerê (.), os reservatórios da
Formação Uerê são importantes prospectos exploratórios na Bacia do Solimões. Estes
reservatórios são caracterizados pela grande continuidade deposicional com porosidade (até 28%)
distribuída heterogeneamente (Barata & Caputo, 2007). Ainda de acordo com estes autores, os
evaporitos (halita e anidrita) e folhelhos inseridos na própria Formação Juruá e na base da
Formação Carauari representam as rochas selantes da bacia. Os depósitos de sabkha nodulares
que se intercalam com os sedimentos flúvio-eólicos, juntamente com os calcarenitos e calcilutitos,
são responsáveis por formar selos e armadilhas estratigráficas de hidrocarbonetos na região de
Urucu. As acumulações ocorrem em armadilhas mistas, formadas em paleoaltos ou linhas de
charneira, armadilhas estratigráficas, em discordâncias angulares, pinch outs ou onlaps (Eiras,
1998) e principalmente armadilhas estruturais formadas pelo Megacisalhamento Solimões no
Jurocretáceo. Estas armadilhas consistem nos blocos altos de falhas reversas e dobras anticlinais
assimétricas escalonadas formando trends de direção NE-SW (figura 3.4). As falhas onde se
encontram os prospectos ocorrem em trends diagonais à zona principal destral do
megacisalhamento. Segundo Barata & Caputo (2007), são conhecidos cinco trends escalonados:
Jandiatuba, Jutaí, Ipixuna, Juruá e Urucu.
Figura 3.4: Modelo de acumulação de hidrocarboneto na região de Urucu na Bacia do Solimões (sistema
Jadiatuta-Juruá (!)). O selo é representado pela Formação Carauari; uma associação cíclica de folhelhos,
calcilutitos e sais (anidrita e halita). A terceira soleira de diabásio, mais profunda, não está representada na
seção. Fonte: Mello et al., 1994; Clark, 2002.
3.4 Geração, migração e acumulação
Reconstruções da história de soterramento (Mello et al., 1994) mostraram que as rochas
sotopostas à geradora no final do Paleozóico eram insuficientes para explicar o estado de
maturação termal observado nas rochas e nos hidrocarbonetos. Assim, houve um consenso de
que calor adicional foi fornecido por uma anomalia térmica térmica na área associada com
intrusões de soleiras entre o Triássico e o Jurássico.
30
Barata & Caputo (2007) propõem uma carta de eventos (figura 3.5) em substituição à que
foi proposta por Mello et al. (1994) (figura 2.9). Na carta mais recente, estão sumarizadas duas
fases de geração.
A primeira fase teria ocorrido restritamente a locais (baixos estruturais) onde o fluxo
térmico era mais elevado no Neopermiano-Eotriássico. A migração secundária teria ocorrido por
camadas devonianas e carboníferas. Grande parte desse óleo teria se dissipado e parte teria se
acumulado por armadilhas estratigráficas e/ou mistas.
Figura 3.5: Diagrama de eventos proposto para o sistema petrolífero Jandiatuba-Juruá na Bacia do
Solimões (Barata & Caputo, 2007).
A segunda fase de geração teria ocorrido em conseqüência das intrusões de diques e
soleiras no Neotriássico. Esta fase fez com que houvesse geração não somente em áreas
restritas aos baixos, mas também nos altos da bacia (Bender et al., 2001). A migração secundária
da segunda fase de geração e o armadilhamento do petróleo teriam sido similares à primeira fase.
Um fato novo seria o craqueamento do óleo já acumulado com sua transformação em gás e
condensado e a geração de gás diretamente das rochas geradoras.
Entre o Neojurássico e o Eocretáceo, o Megacisalhamento Solimões remodelou e/ou
destruiu as trapas pré-existentes ocasionando remigração pelos planos de falha armadilhando os
hidrocarbonetos nos anticlinais formados pelo evento. No Cenozóico, reativações tectônicas
teriam remobilizado e acumulado petróleo tanto em armadilhas resultantes deste evento quanto
em armadilhas pré-existentes. O momento crítico ocorreu há cerca de 200 Ma quando a maior
parte dos hidrocarbonetos já havia se acumulado. A preservação passou a ser considerada a
partir da segunda fase de geração.
31
CAPÍTULO 4: O MAGMATISMO PENATECAUA
4.1. Introdução
O momento crítico do sistema petrolífero Jandiatuba-Juruá (!) foi associado ao
magmatismo Penatecaua (Issler et al., 1974) por diferentes autores (Figura 3.5). Trata-se de
processos magmáticos ainda pouco estudados, seja sob o ponto de vista petrográfico, geoquímico
ou geocronológico. Este magmatismo, predominantemente básico, tem sido relacionado à
separação dos continentes sulamericano e africano (Almeida, 1986; Thomaz Filho et al., 2000;
Thomaz Filho et al., 2008).
Neste capítulo será apresentada uma revisão temática sobre esse magmatismo, com
descrição de suas principais características petrológicas e suas possíveis relações com os
processos evolutivos da Bacia do Solimões.
4.2. Caracterização petrológica e estrutural sumária
O magmatismo Penatecaua tem sido associado, por alguns autores, à Província
Magmática do Atlântico Central (CAMP; Coffin & Eldholm, 1994), relacionada à abertura do
Atlântico Equatorial (p.ex.: Marzolli et al., 1999). Este magmatismo promoveu a intrusão de várias
chaminés, principalmente ao longo das ombreiras do Gráben Purus, além das soleiras e diques
que ocorrem nas bacias. Derrames basálticos não são conhecidos na região e isto se deve
ao fato do extenso período erosivo atuante desde o Permiano Inferior até o Cretáceo Superior,
que precedeu a deposição da Formação Alter do Chão (Muniz, 2009). Assim, o Penatecaua
é caracterizado, predomimantemente, por diques, soleiras e, subordinadamente, derrames de
composição basáltica (Wanderley et al., 2005; Costa, 2011; Figueira et al., 2012).
De modo geral, as rochas aflorantes são, predominantemente, diabásios cinza escuro de
textura afanítica e gabros acinzentados, com textura fanerítica inequigranular a equigranular
porfirítica, composta por piroxênio, plagioclásio e biotita, e eventualmente olivinas. Há também
porções com textura glomeroporfirítica de piroxênio contornados por massa fanerítica grossa, com
cristais ripiformes de plagioclásio formando textura ofítica. Trata-se de rochas com estruturas
originais isotrópicas, dada pela homogeneidade na constituição e distribuição mineralógica.
Eventualmente, observa-se, nos afloramentos, diáclases resultantes de disjunção colunar; porém,
em geral, o aspecto é maciço (Figueira et al., 2012).
A idade do magmatismo Penatecaua ainda é discutida, mas parece haver consenso entre
autores que os primeiros pulsos datam do Neotriássico, por volta de 220 Ma (Eiras, 1998; Barata
e Caputo, 2007). Idades mais jovens ficam em torno de 190 ± 20 ma (Mizusaki et al. 1992) e 180
Ma (Costa, 2011). Alguns autores (Thomaz Filho et al., 2008) admitem que o magmatismo
32
Penatecaua pode ter tido duração de 50 myr, do final do Permiano ao início do Triássico, estando,
assim, relacionado à abertura do Atlântico Equatorial (250-230-200 Ma, predominante na porção
oriental da bacia). O magmatismo mais recente, registrado em outras bacias paleozoicas do
Brasil, relacionado à abertura do Atlântico Sul, entre 170 Ma e 140 Ma, não foi reconhecido na
Bacia do Solimões.
Um estudo detalhado de uma soleira de diabásio relacionada ao magmatismo Penatecaua
foi realizado na região de Medicilândia, no Pará (Costa, 2011; Costa et al., 2012). A soleira, de
300 km2, é constituída de diabásios e gabros toleíticos, com evidências de diferenciação in situ,
envolvendo piroxênio, mas não plagioclásio. A série varia desde basaltos a andesitos, com valor
médio de SiO2 de 52%peso. A presença de textura granofírica atesta o caráter relativamente
evoluído da maioria das rochas. Os autores dividiram a intrusão em quatro grupos distintos, sendo
dois grupos de baixo-TiO2, menos evoluídos e localizados nas bordas da soleira, e dois grupos de
alto-TiO2, mais evoluídos e concentrados às partes centrais da intrusão. As suítes de baixo-TiO2 e
alto-TiO2 foram atribuídas a diferentes quantidades de fusão parcial a partir de uma mesma fonte
mantélica peridotítica. Anomalias negativas de Nb e razões La/Yb entre 2 e 4 indicam derivação
do manto litosférico subcontinental. Valores elevados e baixos de isótopos de Sr e Nd,
respectivamente, foram interpretados como evidência de contaminação crustal.
Dados geofísicos (até 1 km de profundidade) mostram que soleiras e diques do
magmatismo Penatecaua variam de espessura, desde poucos centímetros até 200 m, sendo os
diques, em geral, menos espessos (5-25 m) que as soleiras (Caputo, 1984). Estudos mais
recentes (Marzolli et al., 1999) relatam espessura média de 500 m, para as soleiras, com um
volume de magma em torno de 400.000 km3. No sul da Bacia do Amazonas, diques e soleiras
resultaram em atitudes em torno de N25°E e N40°E. De um modo geral, o magmatismo
Penatecaua parece controlado por altos estruturais formados preteritamente. Por isso, as soleiras
mais espessas estão localizadas próximo ao depocentro da Bacia do Solimões, e as menos
espessas, nos altos estruturais (Costa et al., 2012). Há indicações de que as soleiras mais
profundas são as menos evoluídas (Ni ~ 200 ppm), enquanto que as soleiras menos profundas
são mais evoluídas (Ni ~ 40 ppm) (Wanderley Filho et al., 2005).
Na região de Monte Alegre (PA), soleiras e diques são cortados por estruturas rúpteis,
caracterizadas por falhas, estrias, steps, ocorrência de tectonitos e outras, que possibilitaram a
análise e a interpretação das direções das paleotensões atuantes após o citado evento magmático
(Figueira et al., 2012). Estes mesmos estudos mostraram que, em função da homogeneidade
reológica dos gabros Penatecaua, e também pelo fato deles terem sido originados no mesmo
período de ocorrência (Jurássico), a estruturação rúptil superimposta a este corpo rígido pode ter
ocorrido a partir do Eo-Cretáceo. Os eventos tectônicos foram denominados F1 e F2, sendo
relacionados à cataclase e cominuição das rochas. O sistema de fraturas do evento F2 é
representado por falhas planares, lisas a rugosas, também métricas a decamétricas, porém
menos densas que aquelas do evento F1. Em geral, as fraturas F2 são abertas e, em muitos
33
casos, estão preenchidas por minerais euédricos de calcita, calcopirita e quartzo, cujo crescimento
é fibroso orientado de forma perpendicular ao plano da fratura (Figueira et al., 2012). Na Bacia do
Solimões, as soleiras foram deformadas por um evento tectônico transpressivo do pré-Albiano
relacionado com a fase de abertura do Oceano Atlântico Sul e Equatorial (Caputo, 1991), mas
que não afetou as camadas sedimentares mais recentes. É possível, assim, concluir que o evento
magmático tenha ocorrido entre o Mesojurássico ao Eocretáceo. Esse evento deformacional é
conhecido como Megacisalhamento Solimões (Caputo, 1991),
4.3. O magmatismo Penatecaua e o sistema petrolífero JandiatubaJuruá
As soleiras intrudem a Formação Carauari em três corpos ao longo de grandes áreas na
bacia. Os métodos de datação K/Ar e Ar/Ar não apontaram variação de idade entre as três
soleiras. Talvez a distinção mais marcante entre esses corpos seja um enriquecimento de Cr
(maior que 2.000 ppm) e Ni (até cerca de 550 ppm) na chamada terceira soleira, que é a mais
inferior. A espessura das soleiras na Bacia do Solimões pode alcançar até 1038 m, não estando
claro se trata-se de uma intrusão única ou de várias intrusões consecutivas (Wanderley Filho et
al., 2005).
Arbitrariamente, as três principais soleiras da Bacia do Solimões foram denominadas de
primeira, segunda e terceira, de cima (menor profundidade) para baixo (maior profundidade). A
primeira soleira localiza-se na porção mediana da Formação Fonte Boa (na seção clástica).
Ela foi dividida em dois corpos, sendo o mais raso localizado entre cerca de 700 m e 1000 m de
profundidade, e o menos raso entre cerca de 1000 m e 1500 m (Wanderley Filho et al., 2005). Já
a segunda soleira (entre cerca de 1800 m e 2100 m de profundidade) localiza-se na porção
mediana da Formação Carauari na sub-bacia do Juruá e Alto do Carauari e na porção basal da
Formação Fonte Boa na sub-bacia do Jandiatuba, geralmente nas camadas de anidritas e
carbonatos. Finalmente, a terceira soleira localiza-se, também,
na
porção
mediana
da
Formação Carauari, em níveis de halita (Silva, 1987; Pietrobon, 2006).
Resultados do modelamento quantitativo realizado na Bacia do Amazonas indicaram que
não houve nenhum evento termal significativo, ao nível regional, para formação e preservação de
grandes ocorrências de óleo ou gás associado com o magmatismo Penatecaua (Gonzaga et al.,
2000). Segundo esses autores, o calor trazido pelos corpos intrusivos provocou a vaporização da
água
contida
nos
poros
das
rochas
encaixantes,
desidratação,
descarbonização
e,
conseqüentemente, diminuição do teor de carbono (COT) nas rochas geradoras. Concluíram
ainda que vários fatores, como profundidade e espessura da intrusão, diferença de temperatura
com a rocha encaixante, mineralogia dos fluidos e da rocha encaixante, entre outros, são
decisivos para o resultado final, sendo que os efeitos locais sobre as rochas encaixantes são
proporcionais à espessura dos corpos intrusivos, podendo ser potencializados no caso de
intrusões múltiplas. Na Bacia do Solimões, a fonte supridora das soleiras não foi tão imponente
34
em tamanho e quantidade de calor. A bacia era menos profunda e as intrusões se deram
preferencialmente na seqüência evaporítica. Como a bacia é pouco profunda, o calor suprido
pelas soleiras foi fundamental na formação do óleo em Urucu e do gás em Juruá. Ademais, como
mostram Wanderley Filho et al. (2005), os arenitos nas proximidades de soleiras podem
mais facilmente se fraturar, aumentando a porosidade e formando melhores reservatórios
(Muniz, 2009).
A segunda fase de geração (figura 3.5), a mais importante, teria ocorrido durante
o
evento magmático Penatecaua, onde o petróleo teria migrado através das “avenidas”
abertas pela tectônica intrusiva, se acumulando em trapas estratigráficas (por exemplo, em
arenitos do Membro Jaraqui) e estruturais, estas formadas também pela atividade ígnea
(Barata, 2007).
Os aspectos mais relevantes referentes ao magmatismo Penatecaua na Bacia do Solimões
(a não ser quando indicados) são listados abaixo:
1. As soleiras mais espessas estão localizadas próximo ao depocentro da bacia, e as menos
espessas, nos altos estruturais;
2. As intrusões se deram preferencialmente na seqüência evaporítica do Grupo Tefé
(Neocarbonífero/ Eopermiano);
3. Há três soleiras principais, arbritariamente chamadas de primeira, segunda e terceira
soleiras, do topo para a base;
4. A primeira soleira foi dividida em dois corpos, sendo o mais raso localizado entre cerca de
700 m e 1000 m de profundidade, e o menos raso entre cerca de 1000 m e 1500 m. Estes
dois corpos localizam-se na porção mediana da Formação Fonte Boa (na seção
clástica, tipo marinha rasa, com siltito e folhelho intercalados com arenito na sub-bacia
Jandiatuba).
5. A segunda soleira (entre cerca de 1800 m e 2100 m de profundidade) é bem representada
na porção mediana da Formação Carauari (selante) na sub-bacia do Juruá (intercalada
com metasiltitos, calcarenitos e anidrita) e na porção basal da Formação Fonte Boa, na
sub-bacia do Jandiatuba, geralmente nas camadas de anidritas e calcarenitos.
6. A terceira soleira localiza-se, em geral, na porção mediana da Formação Carauari,
intercalada com níveis de halita, anidrita e metasiltito.
7. Idades variam desde 220 Ma a 180 Ma, posicionando o Penatecaua entre o Neo-Triássico
e Eo-Jurássico;
8. Na Bacia do Amazonas, o Magmatismo Penatecaua foi estudado mais detalhadamente,
tendo sido relatadas as seguintes características principais (talvez extensivas à Bacia do
Solimões, onde estudos deste tipo ainda não foram realizados):
a. Série toleítica expandida (de basaltos a andesitos), mas com predominância de
membros evoluídos, sem evidência de composições primárias (valores médios de
35
SiO2~52%peso; 40<Ni<200ppm, mas Cr>2000ppm e Ni>500ppm na base da
terceira soleira; ~3.000 m).
b. Duas suítes reconhecidas, sendo uma de baixo-TiO2 (menos evoluída) e outra de
alto-TiO2 (mais evoluída);
c. Processos evolutivos envolvendo câmaras magmáticas com longo tempo de
residência (cristalização fracionada, possivelmente acompanhada de assimilação)
possivelmente localizadas no embasamento, preenchidas por magmas quentes
(1000°C-1200°C), secos e pouco viscosos; e
d. Fonte mantélica geradora do tipo enriquecida, envolvendo pelo menos uma
contribuição do manto litosférico subcontinental.
9. Na Bacia do Solimões, as soleiras foram deformadas por um evento tectônico
transpressivo do pré-Albiano relacionado com a fase de abertura do Oceano Atlântico Sul
e Equatorial (Megacisalhamento Solimões).
36
CAPÍTULO 5: DISCUSSÕES E CONCLUSÕES
5.1. Introdução
A Bacia do Solimões é produtora de óleo, condensado e gás (Figura 5.1). A bacia é
preenchida por cerca de 2500 m de sedimentos, principalmente do Devoniano e Carbonífero,
intrudidos por soleiras de diabásio, totalizando cerca de 3800 m na sub-bacia Juruá e 3100 m na
sub-bacia Jandiatuba. Estas rochas são separadas de rochas sedimentares do Cretáceo e
Terciário por uma discordância. O pacote magmático e sedimentar subjacente à discordância foi
deformado
entre
o
Mesojurássico
e
Eocretáceo,
tendo
como
principal
estrutura
o
Megacisalhamento Solimões, de direção geral N78°E e mais de 100 km de extensão. Um conjunto
de estruturas transpressionais, especialmente antiformes associados à falhas reversas (N65°E,
com mergulhos para NW e, subordinadamente, SE) e dobras escalonadas (em ângulos entre 10°
e 45° com o eixo principal do megacisalhamento) é relacionado à esta megaestrutura. Na subbacia de Juruá, estas dobras escalonadas formam as armadilhas para o petróleo (Figura 5.1).
Apesar de serem reconhecidos dois sistemas petrolíferos na Bacia do Solimões, quais
sejam, Jandiatuba-Uerê (.) e Jandiatua-Juruá (!), este último responde por cerca de 99,8% das
acumulações comerciais de petróleo na bacia, tendo, por isso, sido o foco do presente trabalho de
graduação.
Figura 5.1: Mapa de localização dos campos de óleo e gás da Bacia do Solimões. Os principais
lineamentos são mostrados na figura. Fonte: Barata e Caputo, 2007.
37
5.2. Discussão
Existem alguns modelos propostos para os sistemas petrolíferos da Bacia do Solimões
(p.ex.: Mello et al., 1994; Eiras, 1998, 1999; Barata & Caputo, 2007; Barata, 2007), em especial
o Jandiatuba-Juruá (!) que foi tratado mais detalhadamente neste trabalho, sendo, também, o
mais importante da bacia propriamente dita. Talvez, os dois modelos mais contrastantes sejam o
de Mello et al. (1994) e o de Barata e Caputo (2007), muito embora os autores concordem com
alguns momentos associados aos elementos e processos dos seus sistemas petrolíferos
propostos. Ambos os modelos reconhecem as mesmas rochas geradoras, selantes e
reservatórios (Capítulo 3). Os modelos também coincidem no tocante à existência de uma
primeira etapa de geração, no Neopermiano-Eotriássico, por soterramento e fluxo térmico, e à
uma segunda etapa (principal) de geração, no Neotriássico-Eojurássico, associada às intrusões
de diques e soleiras do Magmatismo Penatecaua. A divergência fundamental entre os modelos
parece residir sobre os processos de formação de trapas e acumulação. Vários autores
reconhecem o Megacisalhamento Solimões, do Mesojurássico-Eocretáceo, como uma importante
estrutura trapeadora na Bacia do Solimões. No entanto, Mello et al. (1994) consideram que boa
parte da geração, migração e acumulação ocorreu preteritamente à formação desta
megaestrutura, associadamente à armadilhas estratigráficas e/ou estruturais do Permiano. Uma
remigração subordinada, entretanto, é admitida por aqueles autores devido à instalação do
megacisalhamento. Em oposição, Barata e Caputo (2007) reconhecem uma importante etapa de
destruição de antigas armadilhas e remigração e acumulação em novas armadilhas relacionadas
ao Megacisalhamento Solimões. A discussão de diferenças entre modelos de sistemas
petrolíferos propostos para a Bacia do Solimões, tais como processos mais recentes, do
Cenozoico e processos associados ao sistema Jandiatuba-Uerê (.) não fazem parte do escopo
desta monografia.
Como exposto anteriormente, parece haver um consenso geral sobre a caracterização
atípica do sistema petrolífero Jandiatuba-Juruá (!) da Bacia do Solimões, em função do
Magmatismo Penatecaua. No entanto, estes processos magmáticos não podem se restringir à
história de geração de hidrocarbonetos devido ao aporte térmico das intrusões e das fontes
geradoras subcrustais do magmatismo. Obviamente, o grande volume de soleiras espessas
intercalado às sequências sedimentares deve ter imposto condicionantes estruturais relevantes
aos processos de migração primária e secundária, de subsidência e de transformações
petrofísicas de selantes.
Várias das características petrológicas descritas anteriormente para o Magmatismo
Penatecaua (Capítulo 4) são típicas de Províncias Basálticas Continentais, onde o maior volume
de magma é gerado num curto intervalo de tempo (1-2 myr; p.ex.: Thiede & Vasconcelos, 2008).
A existência de suítes de alto-TiO2 e baixo-TiO2 tem sido associada à provincialidade geoquímica,
38
como em Paraná Etendeka, por exemplo, onde a suíte de alto-TiO2 predomina a norte e a de
baixo-TiO2 predomina a sul (Belieni et al., 1984). Há duas possibilidades para explicar a formação
destas suítes: origem a partir de fontes distintas ou origem a partir de uma mesma fonte com
diferenças na quantidade de fusão parcial. A primeira se aplica, em geral, aos casos em que há
provincialidade geoquímica comprovada sobre amplas regiões, como no caso de ParanáEtendeka. No entanto, as duas suítes foram encontradas numa mesma soleira na região de
Medicilândia, no Pará (Costa et al., 2012). Muito embora, esta área não esteja inserida na Bacia
do Solimões, fica difícil atribuir essa coexistência, numa escala tão localizada, à origens a partir de
diferentes composições do manto subjacente. Logo, como propõem os autores, as duas suítes
coexistentes numa mesma soleira devem ter resultado de diferentes graus de fusão parcial a partir
de uma mesma fonte. Isso só pode ocorrer por aumento de temperatura ou descompressão
adiabática. Grandes variações de temperatura em curtos intervalos de tempo são difíceis de
ocorrer associadamente a processos geológicos. No entanto, a descompressão adiabática
acontece de modo relativamente rápido se a litosfera continental estiver sob estiramento acima de
uma anomalia térmica sublitosférica. Quanto maior a quantidade de estiramento, maior a
quantidade de fusão parcial, resultando numa mudança de magmatismo toleítico de alto-TiO2 para
baixo-TiO2. Os magmas primários, formados a partir da fusão do manto litosférico subcontinental
e/ou sublitosférico, tendem a segregar em câmaras magmáticas na crosta, ao atingirem densidade
semelhante às rochas encaixantes. Em geral, estas rochas encaixantes correspondem ao
embasamento das bacias sedimentares. Nestas câmaras, os magmas primários se diferenciam,
gerando magmas mais evoluídos que podem preencher as fraturas geradas nas rochas menos
profundas da bacia sedimentar sobrejacente ao embasamento. Vale notar que a participação do
manto litosférico subcontinental requer a presença de uma grande anomalia térmica sob a litosfera
continental e, portanto, sob a bacia durante o tempo de magmatismo. Em termos regionais, isso
pode implicar em valores elevados de gradiente térmico no Neotriássico e Eojurássico na Bacia do
Solimões.
Há duas abordagens distintas que podem ser feitas com relação à influência do
magmatismo Penatecaua e o sistema petrolífero Jandiatuba-Juruá (!). Uma trata do tema sob
escala regional e outra em escala local.
Muito embora não haja estudos petrológicos sistemáticos sobre o magmatismo
Penatecaua na Bacia do Solimões, as suas características foram investigadas em detalhe na área
contígua, na Bacia do Amazonas (Capítulo 4). Considerando-se a hipótese do magmatismo
Penatecaua ter ocorrido num tempo curto (1-2 myr), conforme comentado anteriormente, e que a
espessura média das soleiras seja de cerca de 500 m (para uma espessura média de cerca de
2000 m de rochas sedimentares), haveria um aumento de volume de rochas da ordem de 25%
dentro da bacia. Vale lembrar, também, que, em média, os diabásios são aproximadamente 20%
mais densos que a densidade média das rochas sedimentares existentes na bacia. Alguns autores
(Bender et al., 2001; Wanderley Filho et al., 2007) sugerem que deveria existir cerca de 1.000 m
39
de sedimentos paleozóicos-mesotriássicos que teriam sido soerguidos e erodidos por causa das
intrusões das soleiras de diabásio no Neotriássico. No entanto, a adição de massa e densidade à
bacia em função do magmatismo é difícil de associar com processos de soerguimento. A rigor, a
geração de grandes volumes de magma basáltico tem sido relacionada, tanto no caso de
províncias basálticas continentais quanto em hotspots ativos (p.ex.: Islândia e Havaí) a baixos
gravitacionais associados à regiões anomalamente quentes no manto sublitosférico. Muito embora
seja difícil saber com exatidão o tempo de residência destas anomalias térmicas sublitosféricas,
deve-se esperar, como efeito direto da compensação isostática, um soerguimento da porção
litosférica acima da anomalia, o que poderia ter elevado a Bacia do Solimões entre o
Mesotriássico e Neotriássico e contado para a erosão da sequência sedimentar depositada entre
274 e 240 Ma. Considerando-se as idades mais antigas obtidas para o magmatismo Penatecaua
(c.a. 220 Ma), o soerguimento pode ter tido início há cerca de 240 Ma. Com a bacia elevada, a
partir de cerca de 200 Ma (ápice do magmatismo), ela pode ter passado por um lento processo de
subsidência em função do fim da anomalia térmica sublitosférica, com retomada dos processos de
deposição há cerca de 94 Ma.
Em escala mais localizada, como já foi dito antes, as soleiras intrudiram preferencialmente
camadas clásticas e evaporíticas do Grupo Tefé. Dentre os sais, destacam-se principalmente
halita e anidrita. De acordo com Garcia (2008), o calor e massa das intrusões poderiam ter
fluidizado a halita, uma vez que a temperatura dos magmas básicos (em torno de 1000-1200°C)
está acima do ponto de fusão daquele sal. As intrusões promovem um fluxo de fluidos que pode
ser síncrona à movimentação dos evaporitos fluidizados na Bacia do Solimões. O efeito dessa
fluidização sobre a halocinese ainda não está bem estudada na bacia.
Halitas e silvinitas têm alta condutividade térmica podendo, assim, atingir temperaturas de
equilíbrio próximo das temperaturas iniciais das intrusões (entre 800°C e 1000°C). Como
consequência, camadas com poucas dezenas de metros de espessura (até 50 m) fundem-se
próximo às intrusões e tornam-se plásticas a distâncias relativamente grandes (várias dezenas de
metros), resultando na formação de estruturas de fluxo. Apesar do sal fundir, não há assimilação
do mesmo pelo magma intrusivo, conforme relatado por Garcia (2008). O calor das intrusões
também promove a dissolução dos sais pela ação de uma frente de vapor e água aquecida,
mobilizada a partir dos siltitos e arenitos intercalados às camadas de sal. O mesmo autor
referencia que este é um mecanismo importante na geração de espaço para as intrusivas, pois a
frente dissolve volumes de sal que passam a ser ocupados pelo magma. A capacidade de
dissolução desta frente de vapor e água aquecida só diminui quando a solução fica saturada e o
sal se deposita. Isto pode ter tido alguma influência na permoporosidade das rochas siliciclásticas
que constituem os reservatórios, não só do sistema Jandiatuba-Juruá (!), mas, também, do
sistema Jandiatuba-Uerê (.). Muito embora este último não seja o foco desta monografia, é
importante ressaltar que os reservatórios da Formação Uerê constituem importantes prospectos
de óleo na Bacia do Solimões. A convecção de fluidos quentes associada ao magmatismo pode
40
ter precipitado quartzo durante a cimentação mesogenética dos arenitos da Formação Uerê em
diferentes proporções, o que poderia explicar a grande variabilidade de porosidade de seus
reservatórios (Lima & DeRos, 2003). A rigor, os efeitos da dissolução dos sais sobre outros
processos importantes para os sistemas petrolíferos da Bacia do Solimões ainda estão mal
estudados. Exemplos são o papel da dissolução, bem como da sobrecarga dos diabásios dentro
das camadas de sal, sobre a halocinese. Na Bacia do Amazonas, contígua ao Solimões, a
complexidade estrutural da sequência permocarbonífera é atribuída, predominantemente, às
deformações relacionadas às intrusões combinadas com a movimentação do sal (Costa &
Wanderley Filho, 2008). Similarmente, estruturas de colapso associadas à dissolução do sal já
foram identificadas na Bacia do Amazonas, mas não na Bacia do Solimões. O processo pode
gerar estruturas armadilhadoras em camadas próximas do sal, que é o selante do sistema
petrolífero.
5.3. Conclusões
O objetivo deste trabalho foi a avaliação dos sistemas petrolíferos propostos para a Bacia
do Solimões, sob o ponto de vista da atuação dos processos magmáticos e, em que nível, aqueles
podem ser considerados sistemas atípicos ou não convencionais.
A compilação de dados bibliográficos mostrou haver consenso quanto à importância do
magmatismo no processo de geração, o que já implica processos não convencionais na
construção dos sistemas petrolíferos da Bacia do Solimões. Aceito o consenso, a abordagem do
trabalho foi voltada para as relações do magmatismo Penatecaua com outros processos e
elementos de sistemas petrolíferos, além da geração. Mesmo a geração, abordada por diferentes
autores, desconsidera a possibilidade, aventada neste trabalho, da existência de um gradiente
térmico elevado (maior que 30°C/km) desde o início do Neotriássico (ou, até mesmo, no
Mesotriássico) até o Eojurássico na Bacia do Solimões devido ao magmatismo. Esse item é
importante porque baliza as janelas de geração de óleo e gás e constitui um parâmetro essencial
na modelagem de bacias.
Um aspecto discutido faz referência ao aumento de volume de rochas na bacia estimado
em 25% num curto intervalo de tempo (1-2 myr), acompanhado de aumento considerável de
densidade (cerca de 20%). Esta variação de volume e densidade da bacia deve ter influenciado os
processos de subsidência e soerguimento que, por sua vez, controlam a sua história de evolução.
O magmatismo Penatecaua parece estar associado à presença de uma anomalia térmica
sublitosférica que poderia ter sido a principal causa do soerguimento no Triássico e erosão das
sequências permianas sotopostas à Formação Fonte Boa. Neste caso, ao contrário do proposto
por alguns autores (Bender et al., 2001; Wanderley Filho et al., 2007), o soerguimento não teria
41
sido causado pelo magmatismo, mas sim pelo aquecimento do manto subjacente à bacia que
precede, necessariamente, a produção de grandes volumes de magma basáltico.
A petrofísica (permoporosidade) de selantes e reservatórios também podem ter sido
afetadas pelo magmatismo devido à existência de frentes hidrotermais. O hidrotermalismo é um
processo esperado como consequência do magmatismo basáltico, devido às suas altas
temperaturas. Neste caso, os fluidos não são de origem magmática, dada a escasses de voláteis
neste tipo de magma. No entanto, os fluidos, principalmente aquosos, podem existir em
abundância nos poros das rochas sedimentares próximas às intrusões, especialmente quando a
sequência é pouco espessa, como no caso da Bacia do Solimões, retardando a devolatização
decorrente da mesodiagênese. Vale salientar o posicionamento raso das sequências siliciclásticas
do Grupo Tefé dentro da Bacia do Solimões, o que implica a maior probabilidade de
disponibilidade de fluidos para o disparo de processos hidrotermais.
Finalmente, pode haver uma relação entre os processos de dissolução, mencionados
anteriormente, e a construção ou destruição de armadilhas. As influências vão desde controles
sobre a halocinese até a geração de estruturas de colapso. A geração de janelas de sal em
decorrência da halocinese poderia, por exemplo, levar à exudação. Por outro lado, estruturas de
colapso podem gerar antiformes que constituem o tipo de armadilha mais comum nas bacias
brasileiras.
42
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