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REVISTA BRASILEIRA DE
MEDICINA DO TRABALHO
Disponível em iPad e Android
Vo l u m e 1 4 • N ú m e r o 1 • 2 0 1 6
ISSN 1679-4435
Endereço on-line: www.anamt.org.br
Revista Brasileira de Medicina do Trabalho
ARTIGOS ORIGINAIS
» Medicina do Trabalho e doenças emergentes, reemergentes e negligenciadas: a conduta no caso das
febres da dengue, do Chikungunya e do Zika vírus
» Afastamento do trabalho por pacientes gestantes: principais causas de absentismo
» Determinação dos níveis de exposição de metais em trabalhadores da construção naval: impactos
e desafios
» A aplicação da arquitetura de informação na gestão dos riscos das doenças crônicas em trabalhadores:
uma análise preliminar
Volume 14 • Número 1 • 2016
» Patologias osteomusculares como causa de aposentadoria por invalidez em servidores públicos do
município de São Luís, Maranhão
REVISÕES DE LITERATURA
» Silicose e esclerose sistêmica (síndrome de Erasmus): a importância do reconhecimento da associação
entre doenças
» O controle estatal em saúde e segurança no trabalho e a auditoria do Programa de Controle Médico de
Saúde Ocupacional
» Ocorrência de espécies fúngicas isoladas a partir de mãos e unhas de trabalhadores
DIRETRIZ TÉCNICA ANAMT
» Diretriz Técnica da ANAMT (DT nº 01/2015) — Epilepsia e Trabalho: Rastreamento
CALENDÁRIO DE EVENTOS
PUBLICAÇÃO OFICIAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL
DE MEDICINA DO TRABALHO – ANAMT
DIRETORIA ANAMT 2013–2016
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VICE-PRESIDENTE NACIONAL
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VICE-PRESIDENTE DA REGIÃO NORTE
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VICE-PRESIDENTE DA REGIÃO CENTRO-OESTE
Luiz Garcia de Oliveira Lima (MS) (In Memoriam)
VICE-PRESIDENTE DA REGIÃO SUDESTE
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DIRETOR ADMINISTRATIVO
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DIRETORA DE ÉTICA E DEFESA PROFISSIONAL
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INDEX
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EDITORES ADJUNTOS – ASSOCIATE EDITORS
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EDITORA-ASSISTENTE – ASSISTANT EDITOR
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ORIGINAL ARTICLES
1
Occupational Medicine and emerging, reemerging and
neglected diseases: the conduct in the case of dengue,
Chikungunya and Zika virus
Marcelo Pustiglione
13 A pregnant employee absence: the main causes
of absenteeism
Carolina Trovão dos Santos Baima, Flávio Américo Lopes Barroso,
Juliana Lucena, Caroline Silva Costa de Almeida,
Ana Paula Silva de Azevedo dos Santos
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Faculdade de Ciências Médicas de
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Universidade Federal de São Paulo – SP – BR
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Pontifícia Universidade Católica
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Institut National de Santé Publique
Universidade Federal de Pernambuco – PE – BR
du Quebec – Montreal – Canadá
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Fellow of the Canadian Board of Occupation
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Legal – Porto – Portugal
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Universidade Federal da Bahia – BA – BR
Faculdades de Ciências Médicas da Santa Casa
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de São Paulo – SP – BR
Pontifícia Universidade Católica
Julizar Dantas
do Paraná – PR – BR
Universidade Federal de Minas Gerais – MG – BR
Volume 14
Number 1
2016
19 Determining levels of exposure to metals in shipbuilding
employees: impacts and challenges
Maria de Fátima Ramos Moreira, Aldo Pacheco Ferreira,
Ulisses Cesar de Araújo
29 The information architecture to manage the risks of
chronic diseases in workers: a preliminary analysis
Adriano Hyeda, Élide Sbardellotto Mariano da Costa,
Fides Sbardellotto, Jean Carlo Camargo Ferreira
37 Musculoskeletal pathology as a cause of disability
retirement for public servants in the municipality of São
Luís, Maranhão
Graça de Fátima Pereira Almeida, Maria Hilda Araújo Ribeiro,
Marcos Antonio Custódio Neto da Silva, Rebeca Costa Castelo
Branco, Flávia Coelho Mohana Pinheiro, Maria do Desterro Soares
Brandão Nascimento
LITERATURE REVIEWS
45 Silicosis and systemic sclerosis (Erasmus syndrome):
the importance of the recognition of the association
between diseases
Juliana Augusta Spinelli da Silva Teles
52 State control in health and safety at work and the audit
of the Control Program Occupational Health Medical
Felipe Rovere Diniz Reis, Satoshi Kitamura
60 Occurrence fungal species isolated from hands and nails
of workers
Milena Araújo Ferreira, Daiane Martins
TECHNICAL GUIDELINES OF ANAMT
71 TECHNICAL GUIDELINES OF ANAMT (DT no 01/2015) Epilepsy and Work: Screening
Fernando Akio Mariya, José Domingos Neto, Diego Nozaki,
Eduardo Myung, Mario Bonciani, Flavia de Almeida
I
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ARTIGO
ORIGINAL
Recebido: 07/12/2015
Aceito: 02/02/2016
Fonte de financiamento: nenhuma
Medicina do Trabalho e doenças
emergentes, reemergentes e negligenciadas:
a conduta no caso das febres da dengue,
do Chikungunya e do Zika vírus
Occupational Medicine and emerging, reemerging and neglected
diseases: the conduct in the case of dengue, Chikungunya and Zika virus
Marcelo Pustiglione1
RESUMO | Contexto: Doenças epidêmicas vetoriais emergentes, como as febres do Chikungunya (CHIKV) e do Zika vírus (ZIKAV),
e reemergentes e/ou negligenciadas, como a febre da Dengue (sorotipos DENV-1, DENV-2, DENV-3 e DENV-4), têm sido objeto
de muita preocupação da população e das autoridades sanitárias no Brasil, particularmente nos últimos cinco anos. A Medicina do
Trabalho, como um dos braços da Saúde Pública e da Medicina Preventiva, tem papel importante nas ações de vigilância, prevenção e
controle das doenças ocupacionais ou não, incluindo as coletivas epidêmicas transmitidas por vetores, como é o caso. Objetivo: Fazer
uma breve atualização dessas doenças infecciosas e apontar as ações do Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em
Medicina do Trabalho (SESMT), contextualizando-as de acordo com as peculiaridades das doenças estudadas. Método: Para a realização deste estudo foi feita revisão da literatura e dos boletins oficiais referentes aos casos dessas viroses no Brasil nos últimos dois
anos. Resultados: São apresentados perfis e quadros comparativos enfocando as características e diferenciais de cada uma das três
doenças estudadas. Conclusão: A Medicina do Trabalho como ramo da Saúde Pública tem um papel preponderante no controle das
doenças infecciosas, estejam elas relacionadas ou não com a atividade laboral do grupo de trabalhadores-alvo.
Palavras-chave | medicina do trabalho; epidemiologia; dengue; vírus Chikungunya; Zika vírus.
ABSTRACT | Context: Emerging vector epidemic diseases such as fever Chikungunya (CHIKV) and Zika virus (ZIKAV), and
reemerging and/or neglected ones, such as the Dengue fever (DENV-1 serotypes DENV-2, DENV-3 and DENV-4 ) have been
the subject of much concern in the population and health authorities in Brazil, particularly in the last five years. The Occupational
Medicine, as one arm of the Public Health and Preventive Medicine, has an important role in surveillance, prevention and control of
diseases, occupational or not, including collective epidemic transmitted by vectors, as is the case. Objective: To make a brief update
of these infectious diseases and to point the actions of Occupational Medicine Services, contextualizing them according to the peculiarities of these diseases. Methods: Literature and official reports concerning cases of these viruses in Brazil in the last two years
were reviewed. Results: Profiles and comparative tables focusing on the features and advantages of each one of the three conditions
studied are shown. Conclusion: The Occupational Medicine as a branch of Public Health has a major role in the control of infectious
diseases whether they are related or not with the labor activity of the target group workers.
Keywords | occupational medicine; epidemiology; dengue; Chikungunya virus; Zika virus.
Trabalho realizado no Departamento de Medicina Legal, Ética Médica, Medicina Social e do Trabalho da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
(USP) – São Paulo (SP), Brasil.
Divisão Técnica de Vigilância Sanitária do Trabalho (DVST-CEREST Estadual) do Centro de Vigilância Sanitária da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo; Disciplina
de Medicina do Trabalho do Departamento de Medicina Legal, Ética Médica, Medicina Social e do Trabalho da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
(USP) – São Paulo (SP), Brasil.
1
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):1-12
1
Pustiglione M
inexoravelmente acompanhados de aglomeração de casas
semiconstruídas, geralmente sem telhados e com caixas
d’água desprotegidas e saneamento básico inexistente ou
inadequado, acúmulo de lixo, entre outras condições indesejáveis do ponto de vista da saúde pública. “Estes fatores
criam as condições adequadas para a proliferação e disseminação de determinados agentes, seus vetores e reservatórios”1. Os surtos de dengue e a emergência das febres
do Chikungunya (CHIKV) e ZIKAV transmitidos pelo
Aedes aegypti e albopictus (Ae. aegypti ou albopictus) configuram exemplo lapidar da influência dos determinantes
demográficos, incluindo a política de urbanização (ou a
falta dela).
Do ponto vista socioeconômico, os movimentos migratórios externo e interno, impulsionados pela busca de
mercados de trabalho, geralmente em grandes centros,
acabam agravando o cenário relatado, pois “os viajantes
podem transportar os agentes infecciosos, seus vetores e,
ainda, hábitos e tecnologia que podem propiciar a emergência de doenças”1. Nessa linha de raciocínio deve ser
considerada a globalização do trabalho, pela qual milhares
de trabalhadores se deslocam para (ou através de) zonas de
risco, potencializando a possibilidade de reemergência ou
emergência de doenças.
Além disso, essa heterogeneidade social, cultural e
econômica acaba expondo as classes menos favorecidas
e, portanto, mais distantes das melhores informações e
recursos, a condição de maior exposição à doença e, consequentemente, a todo cortejo clínico e sequelas decorrentes.
A relação ZIKAV e microcefalia, se confirmada, reflete bem
essa situação, uma vez que o vetor está mais próximo das
mulheres que têm menos informação e recurso para evitar
a gravidez.
Ainda associado a determinantes econômicos, devem
ser consideradas as atividades de transporte nacional ou
internacional de cargas. É relatada a disseminação do
Aedes albopictus (o segundo vetor em importância na
transmissão da dengue) pelo comercio de pneus usados1,5.
Deve ser considerada também a ocupação agrícola de áreas
de floresta desequilibrando o ecossistema, expondo trabalhadores a vetores dessas doenças, transformando-os em
hospedeiros de vírus em ambiente com alta densidade de
mosquitos. Não podemos esquecer que o humano portador
desses vírus, sintomático ou não, sendo picado pelo Aedes
não contaminado, o contamina, possibilitando a expansão
INTRODUÇÃO
Luna1 considera como doenças infecciosas emergentes
e reemergentes aquelas cuja incidência em humanos vem
aumentando ou ameaça aumentar. Levi2 refere-se às “doenças
negligenciadas” como doenças infecciosas de grande importância na saúde pública que deixaram de receber atenção
adequada por parte da ciência como um todo. Qualquer que
seja o enfoque dado, as três doenças objeto deste artigo se
enquadram perfeitamente. Atualmente, a febre do Zika vírus
(ZIKAV), mais por suas sequelas do que por sua clínica, tem
sido objeto de maior interesse. A perspectiva de sua associação com microcefalia congênita vem, literalmente, aterrorizando as mulheres em idade fértil e especialmente as
gestantes, impulsionando as pesquisas sobre a transmissão
vertical e as providências de controle do vetor. Podemos dizer
que algo parecido também aconteceu com a febre da Dengue
(Dengue clássica), a partir do momento em que surgiram
evidências de que uma segunda infecção por um vírus de sorotipo distinto do responsável pela infecção anterior aumenta
o risco de formas mais graves da doença, como por exemplo
a febre hemorrágica ou a síndrome do choque3.
O surgimento de novos problemas de saúde, incluindo
novos agentes infecciosos, em vários países e variadas
regiões, independentemente de seu grau de desenvolvimento socioeconômico, vem fragilizando muito a “teoria
da transição epidemiológica” como justificativa dos movimentos de emergência e reemergência de doenças1. Fica cada
vez mais difícil sustentar que esses fenômenos são apenas
resultado do deslocamento das doenças infecciosas do
lugar de principais causas de mortalidade pelas doenças
degenerativas e “produzidas pelo homem”, decorrentes da
melhoria na qualidade de vida e aumento da expectativa
de vida da população4.
Os determinantes de emergência e reemergência de
doenças infecciosas
Na determinação da emergência e reemergência das
doenças infecciosas em geral, além da negligência das autoridades científicas e sanitárias, muitos outros fatores são
arrolados. Considerando as doenças em estudo, podemos
apontar os determinantes (1) demográficos; (2) sociais e
políticos; (3) econômicos; (4) ambientais; e (5) os dependentes do desempenho dos serviços de saúde1.
O crescimento da população e a forte tendência à urbanização, especialmente nos países subdesenvolvidos, vêm
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):1-12
2
Medicina do Trabalho – Dengue, Chikungunya e Zika
da epidemia. Enfoque análogo associa outros determinantes
ambientais à emergência e reemergência de doenças, como o
caso de projetos de engenharia, tais como frentes de trabalho
para construção de represas e rodovias1,5.
Como os serviços de saúde disponíveis à população estão
organizados acaba representando um determinante muito
particular. Quando aparelhados com recursos pessoais e
tecnológicos para atendimento e diagnóstico (como, por
exemplo, as técnicas de biologia molecular), evidenciam mais
rápida e eficientemente doenças, fazendo-as “emergir” ou
“reemergir”. Por outro lado, as falhas acabam contribuindo
para a disseminação de doenças. A propósito, entre as hipóteses da denominada “epidemia de microcefalia” observada
no Brasil desde o último trimestre de 2015, além do ZIKAV
e da consanguinidade, estão sendo consideradas falhas no
programa de vacinação contra rubéola, doença tradicionalmente associada à microcefalia congênita6.
de transmissão do vírus. Entretanto, existem relatos de
transmissão da doença através de exposição acidental
(ocupacional) com material biológico (sangue) contaminado, perinatal e até sexual8. A fêmea contaminada ao
picar uma pessoa infectada mantém o vírus na saliva e o
retransmite através da picada. Após a ingestão de sangue
infectado, o mosquito torna-se apto a transmitir o vírus
e assim permanece durante toda a vida 7. A fêmea do
Aedes aegypti pode viver cerca de 30 a 45 dias, sendo capaz
de contaminar até 300 pessoas. Em sua fase de acasalamento, ela pica o homem por que precisa de sangue para
garantir o desenvolvimento dos ovos. O ciclo de vida do
Aedes aegypti é composto por quatro fases: ovo, larva, pupa
e adulto. As larvas necessitam de água parada, limpa ou
suja, preferivelmente em locais sombreados e no peridomicílio para se desenvolverem7. Os ovos são extremamente
resistentes, podendo sobreviver vários meses de seca, até
que a chegada de água propicie a incubação.
Desta forma, a regra de ouro para evitar a transmissão
da dengue é a eliminação do mosquito transmissor, eliminando focos de acúmulo de água, locais propícios para a
criação do mosquito transmissor da doença. E essa é uma
ação que compete a todos os cidadãos. No Quadro 1 apontamos os potenciais criadouros de Aedes e as ações mínimas
que devem ser adotadas.
Em janeiro de 2016 a Fundação Oswaldo Cruz
(FIOCRUZ) alertou que a casca do caramujo africano
pode ser também um criadouro do Aedes aegypti porque,
após a morte do molusco, “a concha que ele carrega nas
costas demora muito para se degenerar e pode acumular
água de chuva”9. Enfim, todos os elementos naturais ou
artificiais capazes de acumular água são potenciais criadouros do mosquito.
PARTICULARIDADES DO VETOR
Além do quadro sintomático muito parecido, o que
agrupa essas doenças é o fato dos vírus se valerem dos
mesmos vetores, o Ae. aegypti e o Ae. albopictus, mosquitos
da família Culicidae, conhecidos popularmente como
“pernilongo rajado”. Assim, para desenvolvimento de ações
preventivas e de controle, é fundamental conhecermos esse
“grande inimigo” para sabermos reconhecer sua presença e
como combatê-lo.
O Ae. aegypti mede menos de 1 centímetro, é preto
com manchas brancas no corpo e nas pernas (Figura 1A),
é mais ativo durante o dia e não faz praticamente nenhum
som audível antes de picar. Quem pica é a fêmea,
tendo o homem como vítima preferencial 7. O ciclo
homem-Aedes aegypti-homem é a forma mais frequente
A
B
Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Aedes_aegypti [Acessado em: 27 jan. 2015]
Figura 1. Aedes aegypti: formas adulta (A) e larvária (B).
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):1-12
3
Pustiglione M
MÉTODO
• Mecanismo de transmissão: através da picada da fêmea
Para a realização deste estudo foi feita revisão da literatura, incluindo os boletins oficiais do Ministério da
Saúde e das Secretarias Estaduais de Saúde referentes
aos casos destas viroses no Brasil nos últimos nos anos
de 2015 e 2016.
• Prevalência: significativamente maior nos países tropi-
do mosquito Ae. aegypti e Ae. albopictus.
cais e subtropicais, onde as condições ambientais favorecem o desenvolvimento e a proliferação do vetor: o
Ae. aegypti e o Ae. albopictus
• Transmissibilidade: são referidos dois ciclos; um ocorre
no ser humano (que vai do dia anterior ao surgimento
da febre até o sexto dia da doença) e o outro, no vetor
(de 8 a 12 dias após ter sido infectado até o final da vida
do mosquito, em torno de seis a oito semanas).
• Imunidade: a homóloga, ou seja, para o mesmo sorotipo,
é permanente, enquanto que a heteróloga ou cruzada
dura de dois a três meses.
• Magnitude do problema: em 2015, em nosso país, foram
notificados cerca de 1,5 milhão de casos prováveis de
dengue. No período de 04/01/2015 a 14/11/2015,
a região sudeste notificou o maior número de casos
(63% do total notificado no país). No mesmo período
os estados de Goiás e de São Paulo apresentaram as
maiores incidências (cerca de 2.300/100 mil habitantes
e cerca de 1.600/100 mil habitantes, respectivamente)10.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
DENGUE (FEBRE DE QUEBRA-OSSOS, FEBRE
DA DENGUE)
• Agente: um vírus RNA, arbovírus do gênero Flavivírus,
pertencente à família Flaviviridae. Até hoje foram identificados quatro sorotipos: DENV-1, DENV-2, DENV-3
e DENV-4. Em 2015, no Brasil, cerca de 90% dos casos
foram infectados pelo DENV-1, responsável pela dengue
clássica, seguido pelos sorotipos DENV-4 (5%), DENV-2
e DENV-3 (menos de 1% cada)10, responsáveis pelos
casos mais graves.
Quadro 1. Potenciais criadouros de Ae. aegypti e Ae. albopictus e providências mínimas a serem adotadas.
Potencial criadouro
Providências
Caixas d’água, tanques e recipientes que armazenam água
abertos ou mau tampados.
Mantê-los sempre bem tampados; lavá-los semanalmente com
água, sabão e escova.
Água de chuva represada em calhas entupidas e lajes.
Vistoriar sempre após precipitação de chuva e remover poças
e elementos que estejam obstruindo a drenagem da água.
Pratinhos de vasos de planta.
Se possível eliminá-los, caso contrário preenchê-los com areia.
Vasos de plantas aquáticas.
Trocar a água semanalmente e lavar interna e externamente o
vaso com água, sabão e escova.
Garrafas, latas e embalagens rígidas vazias armazenadas a céu
aberto com o gargalo ou “bocas” para cima.
Quando absolutamente necessário seu armazenamento, garrafas e latas devem ser depositadas com os gargalos para baixo
e nunca a céu aberto.
Pneus armazenados a céu aberto.
Quando absolutamente necessário seu armazenamento,
devem depositados em locais protegidos da chuva
e nunca a céu aberto.
Acúmulo de lixo a céu aberto no quintal,
na rua e em terrenos baldios.
Todo lixo de qualquer natureza jamais deve ser
armazenado a céu aberto; sempre em sacos depositados
em lixeiras tampadas.
Resíduos de água em bebedouros de animais (cães, pássaros,
etc.), bandejas de geladeira e de filtros d’água.
Os recipientes devem ser lavados diariamente
com água, sabão e escova.
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):1-12
4
Medicina do Trabalho – Dengue, Chikungunya e Zika
Foram confirmados 1.488 casos de dengue grave, 18.832
casos de dengue com sinais de alarme e 811 óbitos, sendo
a maioria dos casos notificados no estado de São Paulo.
Quando comparados com os dados de 2014, observase aumento considerável em todos os indicadores.
• Clínica: a infecção pelo DENV pode ser assintomática ou causar uma doença infecciosa febril aguda
epidêmica, autolimitada na maioria dos casos, que
pode apresentar um amplo e variado espectro clínico,
desde formas oligossintomáticas até quadros graves
de choque com ou sem hemorragia, podendo evoluir
para óbito. A maioria dos pacientes se recupera após
evolução clínica leve, enquanto que uma pequena
parte pode evoluir para doença grave11. O período de
incubação varia de 4 a 10 dias, sendo em média de 5
a 6 dias. A doença tende a ser mais grave em crianças
pequenas, idosos e portadores de asma brônquica,
diabetes mellitus, anemia falciforme e infecção secundária. Via de regra, a primeira manifestação clínica
da dengue é febre alta (39 a 40°C) súbita, que pode
durar de dois a sete dias, acompanhada por cefaleia,
mialgia, artralgia, prostração, astenia, dor retrorbital,
exantema e prurido cutâneo11. Pela semelhança com
outras doenças febris, é recomendado realizar a “prova
do laço”, que resultando positiva aumenta a probabilidade da doença. Podem ocorrer hemorragias leves
em mucosas e petéquias. Entre o 3º e o 7º dia a febre
diminui, podendo haver alterações hematológicas com
aumento do hematócrito, leucopenia e plaquetopenia,
podendo caminhar para o choque, geralmente precedido por sinais de alarme. O choque pode levar ao
óbito em 12 a 24 horas ou à recuperação rápida após
tratamento adequado. O choque prolongado resulta
em falência de múltiplos órgãos, acidose metabólica
e coagulação intravascular disseminada, com hemorragias graves. Nessa fase crítica pode haver manifestações neurológicas como convulsões e irritabilidade.
• Casos suspeitos: toda pessoa que viva ou trabalhe em
áreas onde esteja ocorrendo casos de dengue, ou tenha
Ae. aegypti ou Ae. albopictus, ou tenha viajado nos últimos
14 dias para regiões de risco e que apresente febre com 2
a 7 dias de duração e 2 ou mais das seguintes manifestações: (1) náuseas/vômitos; (2) exantema; (3) mialgia/
artralgia; (4) cefaleia/dor retrorbital; (5) petéquias/
prova do laço positiva; ou (6) leucopenia.
• Sinais de alarme: todo caso de dengue que, no período
de diminuição da febre, apresente um ou mais das
seguintes manifestações: (1) dor abdominal intensa/
dor à palpação do abdômen; (2) vômitos persistentes;
(3) ascite/derrame pleural e/ou pericárdico; (4) sangramento de mucosas; (5) letargia e irritabilidade; (6) lipotímia; (7) hepatomegalia; e (8) aumento progressivo do
hematócrito.
• Sinais de dengue grave: todo caso de dengue que apresente um ou mais das seguintes manifestações: (1) choque
(taquicardia/extremidades frias/pulso fraco ou indetectável/pressão diferencial convergente/evoluindo para
hipotensão e insuficiência respiratória); (2) sangramento grave (hematêmese/melena/metrorragia, etc.);
(3) comprometimento grave de múltiplos órgãos (fígado,
sistema nervoso central, coração, etc.).
• Confirmação: através de sorologia para detecção de anticorpos do tipo IgM e IgG contra os quatro sorotipos; nos
primeiros dias da doença é recomendada a realização da
pesquisa do dengue antígeno NS1 que tem maior sensibilidade e especificidade do que os demais12,13.
CHIKUNGUNYA (FEBRE DO CHIKV)
• Agente: um vírus RNA, arbovírus do gênero Alphavirus,
pertencente à família Togaviridae.
• Mecanismo de transmissão: através da picada da fêmea
do mosquito Ae. aegypti ou Ae. albopictus.
• Prevalência: significativamente maior nos países tropicais e subtropicais, onde as condições ambientais favorecem o desenvolvimento e a proliferação do vetor: os
Ae. aegypti e Ae. albopictus.
• Transmissibilidade: muito provavelmente ocorre da
mesma forma relatada para a dengue.
• Imunidade: os indivíduos expostos ao vírus Chikungunya
adquirem imunidade duradoura7,11.
• Magnitude do problema: no Brasil, em 2015, até o
mês de novembro, foram notificados cerca de 17 mil
casos autóctones suspeitos de febre do CHIKV.
Desses, cerca de 7 mil foram confirmados, 95% por
critério laboratorial; cerca de 9 mil casos continuam
sob investigação. Quando comparados com os dados
de 2014, observa-se aumento considerável em todos
os indicadores.
• Clínica: após um período de incubação intrínseco
médio de três a sete dias a partir da picada por mosquito
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):1-12
5
Pustiglione M
infectado com o CHIKV, a infecção se manifesta como
uma doença aguda mais comumente caracterizada
por febre de início súbito (tipicamente maior do que
38,5°C e que dura geralmente de três a dez dias) e dor
articular intensa (particularmente tornozelos, punho
e articulações da mão; as articulações maiores como o
joelho, ombro e a coluna também podem ser afetadas).
A esses sintomas podem associar-se: cefaleia, dor difusa
nas costas, mialgia, náusea, vômito, poliartrite, erupção
cutânea e conjuntivite; não é rara a ocorrência de exantema maculopapular, que se inicia entre o 2º e o 5º dia
e se mantém até o 10º dia de sintoma. A maioria dos
indivíduos apresenta doença sintomática, estima-se
que apenas 3 a 28% das pessoas com anticorpos para
CHIKV apresentam infecção assintomática, mas estes
indivíduos também podem transmitir o vírus para os
mosquitos, mantendo o ciclo14. A maioria dos pacientes
se recupera depois de sete a dez dias, porém, alguns
indivíduos podem apresentar dores articulares por
meses ou anos. Em alguns casos a artrite pode evoluir
com dor articular crônica incapacitante e poliartrite,
tenossinovite e síndrome de Raynaud.
• Casos suspeitos: toda pessoa que viva ou trabalhe em
áreas onde estejam ocorrendo casos de chikungunya,
ou tenha Ae. aegypti ou Ae. albopictus, ou tenha viajado
nos últimos 14 dias para regiões de risco e que apresente
febre com 2 a 7 dias de duração e 2 ou mais das manifestações relatas.
• Sinais de gravidade: todo caso de febre do CHIKV que
apresente uma ou mais das seguintes manifestações:
meningoencefalite, mielite, paralisia facial, GuillainBarré, lesões cutâneas bolhosas e hiperpigmentação
da pele; outras formas graves incluem fenômenos
hemorrágicos, uveíte, retinite, miocardite, hepatite
e nefrite.
• Confirmação: em amostras colhidas até o 3º dia do início
dos sintomas está indicada a pesquisa de ácidos nucléicos
virais por RT-PCR em Tempo Real e RT-PCR convencional; em amostras colhidas até o 8º dia do início dos
sintomas está indicada sorologia IgM e IgG por ELISA14.
•
•
•
•
•
ZIKA (FEBRE DO ZIKAV)
• Agente: um vírus RNA, arbovírus do gênero Flavivírus,
pertencente à família Flaviviridae, filogeneticamente próximo ao vírus da encefalite de Saint Louis.
Foram identificadas duas linhagens: uma asiática e
outra africana (subdividida em linhagem do leste e
do oeste)7.
Mecanismo de transmissão: através da picada da fêmea
do mosquito Ae. aegypti ou Ae. albopictus. Existem
relatos de transmissão ocupacional, vertical e sexual
do ZIKAV, mas para fins de prevenção e controle da
doença a transmissão vetorial deve ser a principal a ser
considerada7. O risco de aquisição do ZIKAV aumenta
pela grande quantidade de doentes assintomáticos
(cerca de 80%) e se a possibilidade de transmissão por
transfusões for confirmada.
Prevalência: o ZIKAV é considerado endêmico particularmente no leste e oeste da África; há evidências que,
a partir de 1966, o vírus tenha se expandido ao continente asiático7. Em fevereiro de 2015, sete meses após
a realização da copa do mundo de futebol no Brasil,
foram registrados casos caracterizados por exantema
maculopapular, prurido e febre baixa ou ausente; alguns
doentes queixavam-se de cefaleia, hiperemia conjuntival e dor e edema em punhos e tornozelos. A possibilidade de tratar-se de uma arbovirose foi aventada e o
ZIKAV passou também a ser investigado7. Dados mais
recentes têm evidenciado a circulação desse vírus em
várias regiões do Brasil.
Transmissibilidade: muito provavelmente ocorre da
mesma forma relatada para a dengue.
Imunidade: ainda não existem dados suficientes para
determinar a imunidade ao ZIKAV.
Magnitude do problema: no Brasil, em 2015 foi confirmada transmissão autóctone de febre do ZIKAV a partir
do mês de abril; até novembro de 2015, 18 unidades da
federação confirmaram laboratorialmente a autoctonia
da doença10. A gravidade da infecção por esse vírus está
mais associada à ocorrência da síndrome de GuillainBarré em locais com circulação simultânea do DENV e
com um aumento desproporcional de casos de microcefalia congênita em regiões com registro de casos de
ZIKAV do que com sua manifestação clínica. Até 28
de novembro de 2015 foram notificados à Secretaria de
Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde 1.248 casos
suspeitos de microcefalia, identificados em 311 municípios distribuídos em 14 unidades da federação. Entre o
total de casos ocorreram sete óbitos suspeitos, todos na
região nordeste13. Esse cenário coloca no olho do furacão
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):1-12
6
Medicina do Trabalho – Dengue, Chikungunya e Zika
•
•
•
•
•
as mulheres em idade fértil e as gestantes, e a microcefalia passou a ser praticamente a única preocupação da
infecção pelo ZIKAV.
Clínica: a infecção pelo ZIKAV em sua total abrangência
ainda é pouco conhecida devido à carência de descrição
e caracterização clínica e à história natural ainda fundamentada a um número limitado de relatos de casos e
investigações de surtos8. A maioria das infecções são
assintomáticas (estima-se que apenas cerca de 20% das
infecções humanas apresentam manifestações clínicas),
quando ocorrem, a doença se caracteriza como uma
doença febril aguda autolimitada geralmente não associada a complicações graves, sem registro de mortes e
com baixa taxa de hospitalização. A febre é baixa, sendo
acompanhada por exantema maculopapular, artralgia,
mialgia, cefaleia, hiperemia conjuntival e, mais raramente,
edema, odinofagia, tosse seca e vômitos13. Na febre pelo
ZIKAV predominam o exantema e a hiperemia conjuntival, havendo menos alteração nos leucócitos e trombócitos. Os sintomas desaparecem cerca de três a sete
dias após seu início, porém a artralgia pode persistir por
até um mês.
Casos suspeitos: toda pessoa que viva ou trabalhe em
áreas onde esteja ocorrendo casos de zika, ou tenha
Ae. aegypti ou Ae. albopictus, ou tenha viajado nos últimos
14 dias para regiões de risco e que apresente o quadro
clínico descrito.
Sinais de alarme: caso ou indivíduo exposto seja gestante.
Sinais de gravidade: todo caso de febre do ZIKAV que
comece a apresentar fraqueza muscular que começa
na parte inferior do corpo e se espalha para cima (sinal
patognomônico da polirradiculoneuropatia desmielinizante15 inflamatória aguda) ou paralisia dos olhos e andar
instável (presentes na Síndrome de Miller Fisher)16.
Devem também ser observados casos de microcefalia
em gestantes infectadas pelo ZIKAV.
Confirmação: O diagnóstico laboratorial específico de
ZIKAV baseia-se principalmente na detecção de RNA
viral a partir de espécimes clínicos. Acredita-se que o
período virêmico seja curto, o que permitiria a detecção
direta do vírus até quatro a sete dias após o início dos
sintomas, sendo ideal até o terceiro dia. Até o momento,
a disponibilidade para realização de isolamento viral e
RT-PCR estão restritos aos Laboratórios de Referência
da FIOCRUZ8,16.
O diferencial sintomático entre as febres do DENV,
CHIKV e ZIKAV pode ser observado no Quadro 2.
SOBRE A MISSÃO
DA MEDICINA DO TRABALHO
A Medicina do Trabalho tem por objetivo a “promoção
e preservação da saúde do conjunto dos seus trabalhadores”17. Para atingir seu objetivo o médico do trabalho
deve elaborar e implementar um programa que “considere
as questões incidentes sobre o indivíduo e a coletividade
de trabalhadores, privilegiando o instrumental clínico-epidemiológico na abordagem da relação entre sua saúde e
o trabalho”17. Legalmente conhecido como Programa de
Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), esse
programa deve ser concebido e aplicado baseado “nos riscos
à saúde dos trabalhadores”17, identificados nas avaliações
previstas no conjunto das normas regulamentadoras (NR) e
na observação criteriosa, ética, moral e técnica dos processos
e ambientes de trabalho in loco (o “chão da fábrica”): o “risco
ocupacional”. É ponto pacífico que o controle da saúde dos
trabalhadores, de acordo com os riscos a que estão expostos,
é uma exigência legal prevista no art. 168 da Consolidação
das Leis do Trabalho (CLT)18, respaldada na Convenção
161 da Organização Internacional do Trabalho (OIT)19.
Dessa maneira, podemos afirmar que a missão da Medicina
Quadro 2. Comparação da frequência dos principais sinais e
sintomas ocasionados pelos vírus da Dengue, Chikungunya e Zika.
Sinais e sintomas
Dengue
Chikungunya
Zika
Febre
++++
+++
+++
Mialgia/artralgia
+++
++++
++
Edema de
extremidades
0
0
++
Exantema
maculopapular
++
++
+++
Dor retrorbital
++
+
++
Hiperemia
conjuntival
0
+
+++
Linfadenopatia
++
++
+
Hepatomegalia
0
+++
0
Leucopenia/
trombocitopenia
+++
+++
0
+
0
0
Hemorragia
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Pustiglione M
do Trabalho, como parte integrante da equipe interdisciplinar especializada que compõe os Serviços Especializados
de Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho
(SESMT)20, é proteger e prevenir riscos e danos à vida e à
saúde dos trabalhadores, através de uma política focada na
segurança e saúde no trabalho (considerando a organização,
o processo e o ambiente), fundamentando programas de
vigilância da saúde e ações clínico-epidemiológicas proativas. Nesse contexto, entendemos que o médico do trabalho
deve almejar, na sua essência, ser um “conservador da saúde,
conhecendo as causas que perturbam a saúde, originando
as doenças, e sabendo afastá-las das pessoas sadias”21.
Considerando as doenças infecciosas em estudo e anteriormente descritas, e a missão da Medicina do Trabalho, este artigo
tem como objetivos: (1) elencar os desafios para a Medicina do
Trabalho como um dos braços da Saúde Pública e da Medicina
Preventiva responsável pela detecção, diagnóstico, terapêutica,
prevenção e controle de doenças em conjuntos específicos de
pessoas; e (2) propor formas de enfrentar esses desafios.
(3) aos programas de informação, orientação e capacitação
de trabalhadores;
(4) às medidas de controle e redução da circulação dos vírus
para a prevenção da emergência e reemergência dessas
doenças infecciosas;
(5) à disponibilidade e facilitação de acesso dos casos ao
tratamento, o “antídoto” da negligência;
(6)à identificação de atividades e situações de risco de exposição ocupacional aos vírus e ações preventivas;
(7) à importância da notificação de casos suspeitos e confirmados.
No Quadro 3 são apontadas propostas de enfrentamento
aos agentes de riscos envolvidos nas doenças estudadas a
serem desenvolvidas pela equipe interdisciplinar do SESMT.
O Quadro 4 contém orientações sobre medidas de
proteção ambiental; o Quadro 5 orienta a busca ativa de
criadouros do mosquito.
Os Quadros 6 e 7 abordam medidas de proteção coletiva e individual recomendadas.
O Quadro 8 aborda questões relacionadas à capacitação
de profissionais do SESMT e de trabalhadores.
PROBLEMAS E DESAFIOS:
PROPOSTAS DE ENFRENTAMENTO
PARA A MEDICINA DO TRABALHO
As propostas serão expostas considerando os elementos
da cadeia epidemiológica agente, meio e hospedeiro quanto:
(1) às particularidades dos agentes de risco biológico;
(2) ao vetor do DENV, CHIKV e ZIKAV como o “principal
inimigo a ser combatido”;
Quadro 4. Proteção do ambiente de trabalho.
Colocação de telas nas janelas e portas
Aplicação de repelentes e inseticidas ambientais (consultar
lista de produtos autorizados pela ANVISA)
ANVISA: Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
Quadro 3. Particularidades dos agentes de risco biológico.
Problemas e desafios
Propostas de enfrentamento
•
DENV, CHIKV e ZIKAV são microrganismos acelulares que,
como todo agente biológico, ao contrário dos agentes físicos
e químicos, têm “vida” e consequentemente se reproduzem,
se adaptam e se movimentam (por si ou através de ouros elementos do ecossistema). Do ponto de vista ocupacional, eles
podem: (1) fazer parte do processo de trabalho (no caso de trabalhadores de serviços de saúde, por exemplo); (2) ter o seu
habitat natural invadido por trabalhadores (trabalhadores em
obras de engenharia para construção de estradas ou barragens, por exemplo); ou (3) invadir o ambiente de trabalho (através de hospedeiros nas epidemias urbanas, por exemplo)
•
•
A equipe interdisciplinar do SESMT deve analisar a organização, os processos e o ambiente de trabalho periódica
e sistematicamente a fim de antecipar, reconhecer, avaliar
e, consequentemente, controlar a ocorrência de DENV,
CHIKV e ZIKAV entre os agentes de risco ocupacional existentes ou que venham a existir considerando inclusive a
proteção do meio ambiente e dos recursos naturais
A possibilidade do trabalhador ser deslocado a serviço da
empresa para zona endêmica deve ser relatada ao SESMT
para as devidas providências de prevenção
No caso de ocorrência de epidemia na região em que se
localiza a empresa, a equipe interdisciplinar do SESMT deve
implementar programa de proteção do ambiente de trabalho
(Quadro 4) e de busca ativa de criadouros do vetor (Quadro 5)
DENV: vírus da dengue; CHIKV: vírus Chikungunya; ZIKAV: Zika vírus; SESMT: Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina
do Trabalho.
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Medicina do Trabalho – Dengue, Chikungunya e Zika
O Quadro 9 trata do acesso dos casos suspeitos e confirmados a serviços de saúde para esclarecimento diagnóstico
e tratamento.
Atividades e situações ocupacionais com risco de exposição ao DENV, CHIKV e ZIKAV dependem da avaliação
técnica dos processos e ambientes de trabalho. No Quadro 10,
apontamos as de maior risco.
Finalmente, algumas palavras sobre a notificação de
casos como estratégia de controle das epidemias.
O SESMT, particularmente no caso de atividades e regiões
de risco, pode estruturar um sistema de vigilância sentinela
na empresa, estimulando os trabalhadores a informar a ocorrência de casos suspeitos, fornecendo todas as orientações
de encaminhamento (guias e material impresso); além
disso, pode instalar um “painel da saúde” em mídia física
ou eletrônica para divulgação das informações.
O Ministério da Saúde publicou em 2014 a Lista Nacional
de Notificação Compulsória23, na qual só encontramos
Quadro 5. Busca ativa de criadouros.
Deve ser realizada dentro e fora da empresa*
Pela equipe transdisciplinar do SESMT apoiada por membros da CIPA ou equivalente, quando houver
É aconselhado incluir grupos de trabalhadores a fim
de capacitá-los para reproduzir essa ação nas suas
comunidades
*O Ae. aegypti tem autonomia de voo de até 100 metros 22 , daí a
busca ativa no entorno; ganho assessório: prestação de serviço
socioambiental à comunidade; SESMT: Serviços Especializados em
Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho; CIPA: Comissão
Interna de Prevenção de Acidentes.
Quadro 6. Aedes aegypti: o “principal inimigo a ser combatido”.
Problemas e desafios
Propostas de enfrentamento
Reduzir a densidade do mosquito vetor na empresa e
seu entorno
De acordo com o Quadros 4 e 5
Proteger trabalhadores potencialmente expostos ao
vetor fora do ambiente da empresa (viajantes, p.ex.) ou
em trabalhos ao ar livre (frentes de trabalho, trabalhador rural, p.ex.)
Uso obrigatório de:
• roupas que minimizem a exposição da pele
• repelente na pele exposta e na roupa
• mosquiteiros e telas nas janelas e portas (quando for o caso) nos
locais de repouso e acampamentos
Quadro 7. Medidas de controle e redução da circulação dos vírus (prevenção da emergência e reemergência).
Problemas e desafios
Migração da força de
trabalho
Propostas de enfrentamento
•
•
•
Disponibilizar local de trabalho mais próximo do lócus social e cultural do trabalhador.
No caso de absorção de mão-de-obra migrante, programar períodos de observação (“quarentena”) e aculturação/adaptação ao novo ambiente biopsicossocial
Atenção especial para trabalhadores vindos da Ásia, África, áreas tropicais e subtropicais
Trabalhadores itinerantes
(viajantes, de frentes de
trabalho, safreiros, p.ex.)
Durante o período de trabalho, uso obrigatório de:
• roupas que minimizem a exposição da pele;
• repelente na pele exposta e na roupa;
• mosquiteiros e telas nas janelas e portas (quando for o caso) nas hospedagens ou
acampamentos
Acompanhamento clínico de trabalhador vindo de zona endêmica da doença ou habitat do
Ae. aegypti ou Ae. albopictus, por no mínimo 14 dias
Realização de grandes
eventos de massa nacionais e internacionais
Elaboração de programas de vigilância e informação de casos
Casos em regiões com alta
densidade do vetor (prevenção da transmissão
homem-Aedes).
• Isolamento do doente em ambiente com tela nas janelas e portas, e utilização de mosquiteiro
• Circular sempre com roupas que minimizem a exposição da pele
(Período mínimo de isolamento: do primeiro até o sexto dia do início da doença; período de viremia
no homem)
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Pustiglione M
Quadro 8. Programas de informação, orientação e capacitação dos especialistas dos Serviços Especializados em Engenharia de
Segurança e em Medicina do Trabalho e dos trabalhadores.
Problemas e desafios
Profissionais do SESMT
não capacitados
Trabalhadores não
informados/orientados
Associação infecção pelo
ZIKAV e microcefalia
congênita
Propostas de enfrentamento
Capacitar os especialistas clínicos para identificar casos suspeitos e iniciar a investigação diagnóstica, etiológica, epidemiológica, eventual nexo com o trabalho e notificação
• Informar/orientar os trabalhadores sobre essas infecções através de palestras, cartazes, folhetos, etc.
• Formar multiplicadores para disseminar o conhecimento em sua casa e em sua comunidade
(função educadora da empresa)
(Essas ações devem ser estruturadas e implementadas pelo SESMT).
Orientar trabalhadoras em idade fértil ou gestantes e trabalhadores com esposas na mesma condição, sobre medidas de proteção:
• usar roupas que minimizem a exposição da pele
• aplicar repelente na pele exposta e na roupa
• instalar mosquiteiro na cama e telas nas janelas e portas
(Estudos indicam que o uso tópico de repelentes a base de n,n-Dietil-meta-toluamina (DEET) por
gestantes é seguro11)
SESMT: Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho; ZIKAV: Zika vírus.
Quadro 9. Disponibilidade e facilitação de acesso dos casos a serviços de saúde.
Problemas e desafios
Falta de informação sobre
procedimento no caso de
aparecimento de sintomas
suspeitos
Dificuldade de acesso a
serviços de saúde
Serviços de saúde pouco
ou não capacitados
Propostas de enfrentamento
•
Informar/orientar os trabalhadores sobre essas infecções através de palestras, cartazes,
folhetos, etc.
•
Facilitar o acesso para o trabalhador e seus familiares
Definir/credenciar serviços de saúde de referência escolhidos pela capacidade de atendimento
rápido e eficiente e aparelhado para agilizar a definição do diagnóstico
Quadro 10. Identificação de indivíduos, atividades e situações de risco de exposição ocupacional aos vírus da dengue, Chikungunya e Zika.
Situação crítica
Indivíduos de
risco
Presença do agente/vetor
Possível
Trabalho em zona endêmica dessas infecções viróticas ou onde
haja Ae. aegypti ou albopictus
Atividades
e
situações de
risco
Trabalho em serviços de saúde
com exposição a material biológico e ao Ae. aegypti ou albopictus
Trabalho em petshop, floriculturas
e zoológicos
Trabalho no transporte e armazenamento de cargas
Trabalho na construção civil e canteiros de obra
Trabalho de limpeza e realizado
ao ar livre.
Exemplos
Trabalhadores idosos (acima de 60 anos) e portadores de doenças crônicas, como as cardíacas e o diabetes
(mortalidade 12 vezes maior do que nas faixas etárias menores)
Trabalhadoras em idade fértil e grávidas
(pela associação infecção pelo ZIKAV e microcefalia)
Viajantes; trabalhadores de frentes de trabalho, na construção e conservação de estradas, barragens, usinas, represas, ferrovias, etc.; trabalhador
rural, extrativista e safreiros; militares de fronteiras, policiais florestais; religiosos missionários; caçadores; pesquisadores e geólogos, entre outros
Pessoal técnico dos setores de coleta de sangue de laboratórios clínicos e de pesquisa e bancos de sangue; de laboratórios de pesquisa
com potencial contato com o mosquito; e agentes comunitários de
saúde, entre outros
Tratadores; jardineiros; e vendedores, entre outros
Containers em caminhões, depósitos e portos que podem proporcionar
condições de criadouro; caminhoneiros atravessando zona endêmica
ou onde haja Ae. aegypti ou albopictus, p.ex.
Os trabalhadores do setor, especialmente os que realizam suas atividades em zonas de risco
Em dragagem de rios e canais; limpeza de ruas; coleta de lixo, entre
outras, especialmente os que realizam suas atividades em zonas de risco
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Medicina do Trabalho – Dengue, Chikungunya e Zika
referência à dengue. Porém, diante da possibilidade de
associação ente o ZIKAV e a microcefalia congênita, o
Ministério da Saúde tem orientado para que os casos confirmados de ZIKAV sejam comunicados/notificados em até
24 horas, conforme Portaria MS nº 1.271, de 6 de junho
de 2014; e reforça que “a notificação realizada pelos meios
de comunicação não isenta o profissional ou serviço de
saúde de realizar o registro dessa notificação nos instrumentos estabelecidos, utilizando a Classificação Estatística
Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com
a Saúde — CID A92.8”24. A ficha está disponível no endereço eletrônico: http://www.cve.saude. sp.gov.br/htm/
outros/fichas/NOTCONCLU_NET.pdf. A notificação
compulsória é obrigatória para os médicos, outros profissionais de saúde ou responsáveis pelos serviços públicos
e privados de saúde, que prestam assistência ao paciente,
em conformidade com o art. 8 da Lei nº 6.259, de 30 de
outubro de 1975.
CONCLUSÃO
A Medicina do Trabalho, como ramo da Saúde Pública,
tem um papel preponderante no controle das doenças infecciosas estejam elas relacionadas ou não com a atividade
laboral do grupo de trabalhadores-alvo.
REFERÊNCIAS
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20. Brasil. Ministério do Trabalho. Norma Regulamentadora nº 4 –
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21. Pustiglione M. O organon da arte de curar de Samuel Hahnemann
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22. Combate à dengue. Principais dúvidas. [Acessado em: 30 jan.
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23. Brasil. Portaria nº 1.271, de 6/05/2014. Define a Lista Nacional de
Notificação Compulsória de doenças, agravos e eventos de saúde
pública nos serviços de saúde públicos e privados em todo o
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24. Orientação para notificação de casos. {Acessado em: 30 jan. 2016]
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Endereço para correspondência: Marcelo Pustiglione – Rua dos Ingleses,
222, apto. 91 – Morro dos Ingleses – CEP: 01329-000 – São Paulo (SP), Brasil –
E-mail: [email protected]
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):1-12
12
Recebido: 13/01/2014
Aceito: 30/07/2014
Fonte de financiamento: Fundação de Amparo a Pesquisa Científica e
Inovação Tecnológica do Maranhão (FAPEMA).
ARTIGO
ORIGINAL
Afastamento do trabalho por pacientes gestantes:
principais causas de absentismo
A pregnant employee absence: the main causes of absenteeism
Carolina Trovão dos Santos Baima1, Flávio Américo Lopes Barroso2, Juliana Lucena3,
Caroline Silva Costa de Almeida3, Ana Paula Silva de Azevedo dos Santos2
RESUMO | Contexto: A inclusão da mulher no mercado de trabalho é fato, entretanto, aspectos fisiológicos relacionados ao gênero ainda
são vistos pelos empregadores como um aspecto negativo, dentre eles, a gravidez. Nesse sentido, pouco se sabe sobre fatores relacionados à
gestação como causa de absentismo e se essas condições realmente constituem um fator que reduz a produtividade de uma mulher trabalhadora. Objetivo: Avaliar as principais causas de afastamento do trabalho por pacientes gestantes atendidas no ambulatório especializado
de Obstetrícia da Maternidade Marly Sarney e relacionar com as características socioeconômicas e culturais. Método: Neste estudo descritivo qualitativo, os dados foram coletados no período de março a junho de 2013. Por meio de um questionário estruturado em entrevista,
aplicado durante as consultas, foi realizado um levantamento dos dados socioeconômicos e culturais das pacientes atendidas no pré-natal,
relacionando causas de absentismo na atividade profissional. Os dados obtidos foram tabulados e utilizados para estudos de frequência e
associação pelo teste do χ2 ou exato de Fisher. Resultados: A maioria das trabalhadoras gestantes entrevistadas apresentaram idade entre 25
e 35 anos (62%), com ensino médio completo (70%), casadas ou com união estável (63%), no terceiro trimestre de gestação (49%) e com
renda familiar entre 1 e 2 salários mínimos (41%). As trabalhadoras que possuem vínculo empregatício apresentam associação com maior
grau de escolaridade e renda, enquanto que as trabalhadoras domésticas tiveram associação com menor escolaridade e renda. As gestantes
economicamente ativas que relataram maior absentismo tiveram uma distribuição proporcionalmente maior nas trabalhadoras de maior
renda. Conclusão: Os sintomas relacionados à gravidez são fatores que indubitavelmente levam ao absentismo. Contudo, o presente estudo
levanta dados inéditos e relevantes sobre o perfil e comportamento das mulheres em atividade laboral, no contexto da gestação, ilustrando
que a qualificação profissional influencia diretamente no comportamento da gestante. Assim, a atenção ao perfil dessas mulheres durante
o atendimento pode ser importante para melhorar a efetividade do acompanhamento pré-natal das pacientes gestantes e trabalhadoras.
Palavras-chave | gravidez; trabalho; absenteísmo.
ABSTRACT | Context: The inclusion of women in the labor market is a fact, however, physiological aspects related to gender are still viewed
by employers as a negative aspect, among them, pregnancy. Accordingly, little is known about factors related to pregnancy as a cause of absenteeism and whether these conditions actually constitute a factor that reduces the productivity of a working woman. Objective: To evaluate
the main causes of sick leave for pregnant patients seen in the outpatient clinic of Obstetrics Maternity Marly Sarney and to relate them to
socio-economic and cultural characteristics. Method: In this qualitative descriptive study, the data were collected from March to June 2013.
Through a structured interview questionnaire administered during the consultations, a survey of socio-cultural data from patients treated
prenatally was performed by relating the causes of absenteeism. Data were tabulated and used for studies of frequency and association by χ2
or Fisher’s exact tests. Results: The majority of the working women interviewed were aged between 25 and 35 years (62%), had completed
high school (70%), were married or in a stable relationship (63%), were in the third trimester of pregnancy (49%), and with family income
between 1 and 2 minimum wages (41%). Workers who have employment are associated with higher levels of education and income, while
domestic workers were associated with lower education and income. Economically active women who reported higher absenteeism had a
proportionally greater distribution in higher-income workers. Conclusion: Related pregnancy symptoms are factors that undoubtedly lead
to absenteeism. However, this study raises novel and relevant information about the profile and behavior of women in labor activity, in the
context of pregnancy, illustrating that the qualification directly influences the behavior of pregnant women. Thus, attention to the profile of
these women during the service may be important to improve the effectiveness of prenatal care of pregnant patients and workers.
Keywords | pregnancy; work; absenteeism.
Instituto Laboro, Faculdade Estácio de Sá – São Luís (MA), Brasil.
1
Universidade Federal do Maranhão (UFMA) – São Luís (MA) , Brasil.
2
Faculdade de Medicina da UFMA – São Luís (MA), Brasil.
3
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):13-8
13
Baima CTS et al.
Dessa forma, o presente trabalho propôs desenvolver um
estudo na principal maternidade pública do estado, ilustrando dados que possam colaborar com a melhoria do
serviço de atendimento e orientação dessas gestantes que
estão inseridas no mercado de trabalho.
INTRODUÇÃO
Por muito tempo, o trabalho feminino era limitado à
procriação e ao cuidado com os filhos. Contudo, com a
evolução histórica, as crises econômicas e a industrialização, a mulher foi inserida no mercado de trabalho1. Assim,
o trabalho assalariado feminino tornou-se uma conquista
mundial, sendo aprovado na Conferência Internacional da
Mulher, que ocorreu na cidade do México, em 1975, sendo
esse o primeiro plano de ação, cujas recomendações eram
dirigidas aos países integrantes da Organização das Nações
Unidas2,3. Entretanto, apesar disso, a mulher ainda é considerada com potencial de trabalho inferior quando comparada ao homem3.
Mulheres trabalhadoras, especialmente aquelas que têm
filhos, são mais atingidas pela informalidade e também pela
discriminação no ambiente de trabalho, seja pelo menor
acesso a cargos de chefia, seja por receberem, em média,
salários menores4. Segundo Carraro3, “além dos salários
inferiores, a gravidez ou a possibilidade de engravidar faz
parte do rol de discriminações, que dificultam o acesso das
mulheres ao mercado de trabalho”. Apesar de legalmente a
gravidez não ser impedimento para admissão ou causa para
demissão, essa condição é vista pelos empregadores como
desvantagem devido aos sintomas associados à gravidez.
Conforme a Classificação Estatística Internacional de
Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (CID)5, a
gravidez pode apresentar afecções específicas como exaustão
e fadiga. Outro sintoma relatado pelas mulheres grávidas
são náuseas e vômitos, principalmente entre a quarta e a
sexta semana gestacional e hiperêmese gravídica (HG) como
forma mais grave6-8. Segundo Von Dadelszen9 e Lacasse et al.10,
mulheres que possuem baixas condições socioeconômicas estariam mais propensas a ter náuseas e vômitos no
primeiro trimestre de gravidez. Estudos mostram também
que os sintomas relacionados à gravidez afetam a qualidade de
vida dessas mulheres. O’Brien e Naber11, Mazzotta et al.12 e
Kuo et al.13 mostraram que sintomas como náuseas e vômitos
exercem um impacto significativo na vida familiar das gestantes
estudadas, bem como na sua capacidade de realizar atividades
diárias, laborais e sociais. O nível de estresse durante a gestação
prejudica até mesmo a intenção de ter outra criança.
No Brasil, e principalmente no Maranhão, não existem
relatos sobre a frequência dos sintomas da gravidez e sua
relação com dados socioeconômicos e produtividade laboral.
MÉTODOS
O trabalho foi desenvolvido com mulheres gestantes,
residentes na cidade de São Luís, Maranhão, que foram atendidas no ambulatório de ginecologia e obstetrícia do Hospital
e Maternidade Marly Saney, sendo a principal unidade de
saúde do estado no atendimento a gestantes. Foram incluídas
no estudo pacientes gestantes, que apresentavam uma atividade laboral, não diagnosticadas com gravidez de risco e que
estavam em concordância com a participação, por meio da
assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido,
sob a aprovação da Comissão de Ética em Estudos Humanos
CEP-UFMA nº 472.942. O estudo prospectivo descritivo
foi realizado através da coleta de dados por meio de um
questionário estruturado com questões abertas, fechadas,
binárias, escalonadas e/ou relacionadas. As perguntas foram
feitas pelo entrevistador de forma objetiva e as respostas
apresentadas ao entrevistado para escolha. No questionário
foram levantados dados relacionados a: faixa etária, tempo
de gestação, queixas ou outras afecções específicas relacionadas à gravidez (CID 10 – O26.8), tempo e condições de
trabalho, absentismo, relação com empregador e conhecimento da legislação trabalhista para gestante. O cálculo
amostral foi definido em 100 pacientes, considerando um
universo de atendimentos médico, entre maio e junho de
2013, com um intervalo de confiança de 95% e erro amostral
de 5%. Para a análise, os dados foram tabulados utilizando
o programa Microsoft Office Excel 2003 e apresentados em
valores absolutos ou relativos. Na análise de associação foi
aplicado o teste exato de Fisher para tabelas que apresentaram valores nulos ou teste do χ2 para valores maiores ou
iguais a um, considerando o valor p inferior a 5%.
RESULTADOS
Conforme observado na Tabela 1, a maioria das trabalhadoras gestantes entrevistadas apresentaram idade entre
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):13-8
14
Afastamento do trabalho por pacientes gestantes: principais causas de absentismo
25 e 35 anos, com ensino médio completo, casadas ou com
união estável, no terceiro trimestre de gestação e com renda
familiar entre 1 e 2 salários mínimos.
Entre as ocupações laborais, as mais frequentes
foram de vendedora, professora, auxiliar administrativa, técnica em enfermagem, empregada doméstica,
recepcionista, serviços gerais, operadora de caixa e
manicure. Para avaliar a associação da escolaridade e
renda com as diversas profissões citadas, essas foram
categorizadas de forma que as ocupações com vínculo
empregatício foram agrupadas no grupo 1 (65%); as
que atuavam como consultora e/ou vendedora ou se
declararam autônoma, no grupo 2 (22%); e no grupo 3
(13%) as ocupações relacionadas ao trabalho doméstico.
O estudo mostrou que existe diferença entre as categorias profissionais e o grau de escolaridade, mostrando
maior probabilidade das trabalhadoras da categoria 1
terem nível superior e das profissionais da categoria 3
terem concluído apenas o ensino fundamental (Tabelas 2 e 3).
Os dados mostraram uma ocorrência significativa de
trabalhadoras gestantes com salários de até um salário
mínimo na categoria 3 (Tabela 4).
Sobre as queixas relacionadas à gravidez, apenas
30% das entrevistadas relataram ausência de sintomas.
A maioria relatou enjoo, cansaço, dor lombar, dor
de cabeça e sangramento, como os sintomas mais
frequentes. Quando questionadas sobre absentismo
causado pela gestação, além dos sintomas, o comparecimento a consultas e/ou exames pré-natais foi outro
motivo citado. A Tabela 5 mostra a frequência das
entrevistadas que relataram ter faltado e sua relação
com o tempo de gestação, renda, satisfação com o
empregador ou emprego, conhecimento sobre leis
trabalhistas e registro no Instituto Nacional do Seguro
Social (INSS). Os dados mostraram associação entre
as trabalhadoras que relataram ter faltado ao trabalho
e a renda, as que relataram ter renda menor igual a um
salário mínimo tiveram menor absentismo, enquanto
que as que mostraram maior renda apresentaram uma
proporção significante de falta no emprego (Gráfico 1).
Tabela 1. Perfil socioeconômico por frequência relativa das
100 trabalhadoras gestantes entrevistadas entre 01/05/13 e
30/06/2013 no ambulatório de ginecologia e obstetrícia do Hospital
e Maternidade Marly Sarney em São Luís, Maranhão (n=100).
Tabela 2. Distribuição do número de profissionais da categoria
1 segundo o grau de escolaridade superior (n=100).
%
Idade em anos
14 a 24
25 a 35
Mais de 35
Escolaridade
Fundamental
Médio
Superior
Estado civil
Solteira
Casada ou união estável
Divorciada
Tempo de gestação
1º trimestre
2º trimestre
3º trimestre
Renda familiar em salários mínimos
Menos de 1
1a2
Mais de 2
Categoria 1
Outras
Total
28
62
10
Ensino superior
Sim
Não
17
48
3
32
20
80
Total
65
35
100
Valor p<0,05 (teste do χ2: aderência)
Tabela 3. Distribuição do número de profissionais da categoria 3 segundo o grau de escolaridade fundamental (n=100).
10
70
20
Categoria 3
Outras
Total
37
63
–
Ensino fundamental
Sim
Não
4
9
6
81
10
90
Total
13
87
100
Valor p<0,05 (teste do χ2: aderência)
Tabela 4. Distribuição do número de profissionais da categoria
3 conforme a renda menor igual a 1 salário mínimo (n=100).
14
37
49
Categoria 3
Outras
Total
26
41
33
Salário mínimo ≤ 1
Sim
Não
7
6
19
68
26
74
Valor p<0,05 (teste do χ2: aderência)
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):13-8
15
Total
13
87
100
Baima CTS et al.
DISCUSSÃO
Tabela 5. Distribuição das entrevistadas (n=100) que relataram
ter faltado ou não ao emprego, relacionado ao tempo de
gestação, à renda familiar, à satisfação com empregador/
emprego, ao conhecimento das leis trabalhistas para gestantes
e à inscrição no Instituto Nacional do Seguro Social.
Falta no emprego
Sim
Nao
Tempo de gestação
1º trimestre
2º trimestre
3º trimestre
Total
Renda (salários mínimos)
Menos de 1*
1a2
Mais de 2*
Total
Satisfação
Sim
Não
Total
Conhecimento
Sim
Não
Total
INSS
Sim
Não
Total
Na década de 1970, as mulheres tornaram-se presentes
no mercado de trabalho brasileiro de forma efetiva, colaborando para o crescimento da economia. O nível da taxa de
atividade em 1997 foi de 73,9% para os homens e 47,2% para
as mulheres, sendo que essas apresentaram níveis crescentes
desde de 1992, principalmente na população feminina entre
20 e 59 anos14. O crescimento das mulheres no mercado de
trabalho trouxe também a necessidade de adequação das leis
trabalhistas no que concerne às particularidades das trabalhadoras como, por exemplo, art. 391 da Consolidação das Leis
do Trabalho (CLT) aprovada pelo Decreto-lei nº 5.452, de
1º de maio de 1943, que trata dos direitos das trabalhadoras
gestantes. Contudo, apesar da regulamentação trabalhista, o
Brasil acompanha a tendência mundial de globalização, em
que ocorre transição de uma sociedade industrial para uma
sociedade de informação, a qual exige que os empregados
tenham novas habilidades e se dediquem praticamente em
tempo integral à atividade laboral15. É nesse contexto, então,
que as gestantes trabalhadoras se sentem prejudicadas, já que
a gravidez leva invariavelmente à redução da carga horária
trabalhada, seja por sintomas relacionados à gravidez ou
por motivo de consulta/exame médico. Atualmente, pouco
se sabe sobre a realidade de mulheres gestantes dentro da
população economicamente ativa, entretanto, a gravidez
ou a possibilidade de engravidar tornam-se características
desvantajosas para as mulheres no mercado de trabalho3.
O presente trabalho buscou levantar dados relacionados a
mulheres produtivas e gestantes, além de correlacionar as
queixas relacionadas à gravidez como motivo de ausência
no trabalho. Inicialmente, os dados mostraram que a maioria
das entrevistadas (62%) apresentaram idades ente 25 e 35
anos. Esses dados concordam com a faixa etária da população feminina produtiva no Brasil (20 a 59 anos)14 e com
trabalhos que estimam a idade reprodutiva da mulher entre
15 e 45 anos16,17. Quanto à qualificação, 70% das entrevistadas apresentaram o ensino médio completo, em comparação com 20% que apresentavam nível superior e 10%
com ensino fundamental. Esses dados concordam com
estimativa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), que demostraram uma melhoria na qualificação
do trabalhador, já que o nível da população ocupada no
Brasil em 1997 era de ensino fundamental (1º grau) incompleto, tanto na população masculina quanto na feminina14.
Total
5
26
31
62
8
13
17
38
13
39
48
100
8
27
27
62
18*
14
6**
38
26
41
33
100
51
11
62
31
7
38
82
18
100
44
18
62
25
13
38
69
31
100
44
18
62
20
18
38
64
36
100
*p<0,05; **p<0,01; INSS: Instituto Nacional do Seguro Nacional; Valor
p<0,05 (teste do χ2: aderência)
Gráfico 1. Distribuição do absentismo causado pela gravidez
em relação à renda das trabalhadoras (em salários mínimos).
Dados coletados na entrevista com trabalhadoras gestantes
(n=100) atendidas no ambulatório de ginecologia e obstetrícia
do Hospital Maternidade Marly Sarney.
50
Absentismo
40
*
30
*
Não
Sim
20
10
0
Menor
do que 1
1a2
Maior
do que 2
Análise dos dados feita pelo teste do χ2 com significância para valor
p<0,05; *p<0,05
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):13-8
16
Afastamento do trabalho por pacientes gestantes: principais causas de absentismo
A maioria das entrevistadas se declarou como casada ou
com união estável (63%), tendo renda familiar entre 1 e 2
salários mínimos (41%).
Para melhor avaliar a ocupação das gestantes estudadas,
essas foram separadas em categorias com base nas leis trabalhistas em funcionárias com vínculo empregatício, autônomas
e trabalhadoras domésticas. Mesmo tendo uma melhora da
renda nos últimos anos, o rendimento da população masculina foi superior ao da feminina, tanto no país como nas
grandes regiões, no período de 1992 a 1997. Entretanto, o
crescimento do rendimento, no mesmo período, foi maior
na população feminina (54,2%) associada à sua qualificação, considerando que no mesmo período as mulheres
concluíram mais o ensino superior do que os homens14.
Neste trabalho, os dados mostraram melhor qualificação
nas trabalhadoras gestantes que apresentavam vínculo
empregatício, enquanto que as trabalhadoras domésticas
apresentaram maior associação com ensino fundamental.
Somado a esse dado, na relação entre as categorias e a renda,
os dados mostraram que as trabalhadoras domésticas apresentavam maior proporção de renda igual ou inferior a um
salário mínimo. Esses dados concordam com as diretrizes
do Plano Nacional de Qualificação (PNQ), que coloca a
importância da qualificação do trabalhador como uma ferramenta de inclusão social e melhoria de renda18,19.
Segundo dados da Previdência Social, 711.164 acidentes
e doenças do trabalho foram registrados em 2011, entre os
trabalhadores assegurados da Previdência Social, excluindo
os trabalhadores autônomos e as empregadas domésticas.
Desses, aproximadamente 2% se afastaram das atividades,
provocando enorme impacto social, econômico e sobre a
saúde pública no Brasil20. Sabendo que a gravidez, mesmo
não sendo uma condição patológica provoca sintomas
que podem interferir na capacidade laboral, neste estudo
foi descrita a relação da gravidez com o motivo de falta ao
trabalho. Os dados mostraram que 62% das trabalhadoras
entrevistadas relataram ter faltado em decorrência de
sintomas relacionados à gravidez, como enjoo, cansaço,
dores na região lombar ou cefaleia, entre outras, ou por
motivo de consulta/exame médico. Os dados analisados
não mostram associação com o absentismo e tempo de
gestação, satisfação com emprego, conhecimento da CLT
ou registro no INSS. Entretanto, uma associação com a
renda revelou que as trabalhadoras que apresentavam
melhor renda apresentaram maior proporção de falta,
enquanto que as que tiverem menor renda tiveram menos
proporção de falta. Segundo Reis 21 no Brasil tem-se
observado que o trabalhador menos qualificado tem
sido mais atingido com o aumento do desemprego21-23.
As associações encontradas neste trabalho sugerem
que as trabalhadoras de maior renda, que também apresentam melhor qualificação, teriam mais oportunidades
e mais estabilidade no mercado de trabalho, comparado
com as que apresentam menor renda. Nesse contexto, as
trabalhadoras qualificadas teriam como priorizar a saúde
durante a gestação, mesmo que isso ocasione maior absentismo, enquanto que as menos qualificadas estariam menos
propensas a faltar ao trabalho, mesmo relatando ter conhecimento da CLT. O presente trabalho levanta dados inéditos
e relevantes sobre o perfil e comportamento das mulheres
em atividade laboral, no contexto da gestação, ilustrando
que a qualificação profissional influencia diretamente no
comportamento da gestante. Assim, a atenção ao perfil dessas
mulheres durante o atendimento pode ser importante para
melhorar a efetividade do acompanhamento pré-natal das
pacientes gestantes e trabalhadoras.
AGRADECIMENTOS
Ao Hospital e Maternidade Marly Sarney pelo suporte
na coleta dos dados.
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Baima CTS et al.
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Endereço para correspondência: Ana Paula Silva de Azevedo dos Santos –
Universidade Federal do Maranhão, Departamento de Ciências Fisiológicas,
Avenida dos Portugueses, 1966 – Bacanga – CEP: 65080-805 – São Luís (MA),
Brasil – E-mail: [email protected]
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):13-8
18
ARTIGO
ORIGINAL
Recebido: 19/08/2014
Aceito: 12/01/2015
Fonte de financiamento: nenhuma
Determinação dos níveis de
exposição de metais em trabalhadores
da construção naval: impactos e desafios
Determining levels of exposure to metals in
shipbuilding employees: impacts and challenges
Maria de Fátima Ramos Moreira1, Aldo Pacheco Ferreira1, Ulisses Cesar de Araújo2
RESUMO | Objetivo: Determinar os níveis de metais (Ag, As, Cd, Co, Cr, Cu, Fe, Mn, Ni, Pb, Se, Zn) em amostras ambientais e
biológicas. Métodos: Estudo transversal com 17 trabalhadores de um estaleiro de grande porte do Estado do Rio de Janeiro com idade
entre 18 e 65 anos, com tempo na função laboral de pelo menos 3 anos. A pesquisa foi realizada entre 2012 e o primeiro semestre
de 2013. Resultados: Os níveis dos metais nos trabalhadores pesquisados foram menores que os considerados críticos pelas legislações. Os cenários avaliados foram consoantes com a literatura científica, que apresenta exemplos de sucesso na iniciativa de diminuir
a exposição a metais de trabalhadores da indústria naval. Por outro lado, também, evidenciou a pesquisa que os trabalhadores desenvolvem grande parte de suas práticas em situações perigosas, potencializando as possibilidades de acidentes e outras intercorrências
na saúde, deflagrados pelo trabalho a curto ou longo prazo. Conclusões: Os profissionais estudados deixam clara a insatisfação com
as condições de trabalho e constrangimentos provocados em sua organização. O cenário atual da indústria naval no Brasil é de crescimento, porém, apesar do otimismo com investimentos no setor, pouco tem sido investido na melhoria das condições de trabalho e
na criação de políticas públicas eficientes para a saúde dos trabalhadores navais.
Palavras-chave | saúde do trabalhador; exposição; trabalhadores.
ABSTRACT | Objective: To determine levels of metals (Ag, As, Cd, Co, Cr, Cu, Fe, Mn, Ni, Pb, Se, Zn) in environmental and biological samples. Methods: Cross-sectional study with 17 workers of a large shipbuilding of the State of Rio de Janeiro aged between
18 and 65 years, with time in work function of at least 3 years. The survey was conducted between 2012 and the first half of 2013.
Results: The levels of metals in workers surveyed were smaller than those considered critical by the laws. The scenarios evaluated were
consonant with the scientific literature that shows examples of successful initiative to reduce exposure to metal workers of the shipbuilding industry. On the other side, the survey also showed that employees develop much of their practices in dangerous situations,
increasing the chances of accidents and other health complications, triggered by work in the short or long term. Conclusion: The evaluated workers make clear their dissatisfaction with laboral conditions and constraints caused in their organization. The current scenario
of the shipbuilding industry in Brazil is growing, however, despite the optimism with investments in the sector; little has been invested
in improving the working conditions and the creation of efficient public policies for the health of shipbuilding workers.
Keywords | occupational health; exposure; workers.
Trabalho realizado no Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana, da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, da Fundação Oswaldo
Cruz (Cesteh/Ensp/Fiocruz) – Rio de Janeiro (RJ), Brasil.
Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana/Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca/ Fundação Oswaldo Cruz (Cesteh/ENSP/Fiocruz) –
Rio de Janeiro (RJ), Brasil.
1
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) – Rio de Janeiro (RJ), Brasil.
2
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Moreira MFR et al.
apresenta potenciais riscos para a saúde dos trabalhadores
da construção naval9,10.Alguns desses elementos, mesmo
sendo essenciais (Cu, Fe, Mn e Zn), se tornam tóxicos em
concentrações acima daquelas necessárias (fisiológicas).
Alguns atuam sobre o sistema nervoso (Cu, Mn, Pb e Zn),
outros são nefrotóxicos (Cd e Pb), enquanto o Fe é hepatotóxico11,12. Intoxicações por Se acontecem quando há um
excesso de ingestão desse elemento químico. Os primeiros
sintomas são visão embaçada, diminuição de apetite, enfraquecimento de unhas e cabelo, problemas cardiorrespiratórios, depressão respiratória que pode progredir a óbito8.
O trabalho na construção naval é tradicionalmente
perigoso, com uma taxa de acidentes maior do que duas
vezes aquela da construção civil e da indústria em geral13.
A construção e o reparo de navios são algumas das mais
arriscadas operações de um estaleiro e envolvem a edificação, montagem, modificação, transformação, instalação,
limpeza, pintura, aparelhamento, testes e manutenção14.
O risco toxicológico pode ser definido como a consequência tóxica de uma atividade particular em relação à
probabilidade de que esta venha a ocorrer15. Por conseguinte,
para auxiliar no gerenciamento da exposição de populações e
trabalhadores aos riscos químicos, a fim de que não se atinja
ou exceda um risco intolerável, os organismos técnicos ou
agências reguladoras têm estabelecido os limites de exposição ocupacional utilizados como parâmetro na avaliação
do risco tóxico.
De modo geral, as propriedades tóxicas podem ser
avaliadas por meio da relação dose-resposta ou da relação
estrutura-atividade (struture-activity relationship)16. Assim, o
conhecimento básico de Química, além de auxiliar na identificação das substâncias ou compostos químicos, possibilita
uma avaliação preliminar de risco, pois certas propriedades
físicas determinam a exposição e os possíveis riscos àsaúde.
Uma das medidas mais eficazes de se prevenir a ocorrência de intoxicações ocupacionais é a monitorização biológica17-19. Para possibilitar a interpretação dos resultados da
análise dos diversos indicadores biológicos (IB) usados na
monitorização, constam da norma regulamentadora do Brasil
os valores máximos permitidos (Índice Biológico Máximo
Permitido (IBMP)), abaixo dos quais se supõe que a maioria
dos trabalhadores não apresente efeitos nocivos, e também
valores de referência desses parâmetros20.
Apesar de se ter vários indicadores que não têm
valores de referência (VR), como ácido metilhipúrico,
INTRODUÇÃO
Neste estudo, pretende-se trazer para o âmbito da
saúde pública, particularmente para o campo da Saúde do
Trabalhador, o contexto geral de atuação de profissionais
da indústria naval.
Os trabalhadores da indústria naval estão sujeitos a
diferentes fatores de risco, destacando-se, dentre outros,
a exposição a fumos metálicos, principalmente quando o
trabalho ocorre em ambientes confinados1,2.
O campo da Saúde do Trabalhador apresenta como objeto
de investigação o processo saúde e doença dos trabalhadores
na sua relação com o trabalho3. Mendes e Dias4 relatam que,
apesar das dificuldades teórico-metodológicas enfrentadas,
a saúde do trabalhador busca a explicação sobre o adoecer
e o morrer das pessoas, dos trabalhadores em particular,
por meio do estudo dos processos de trabalho, de forma
articulada com o conjunto de valores, crenças e ideias, as
representações sociais e a possibilidade de consumo de
bens e serviços, na moderna civilização urbano-industrial.
Portanto, o campo da Saúde do Trabalhador compreende
práticas interdisciplinares e interinstitucionais, como
técnicas sociais, políticas e humanas. Tendo atores situados
em diversos lugares distintos com o objetivo comum de
se produzir saúde, desenvolvem-se ações com vistas à
promoção da saúde, sempre no âmbito de atuação das políticas públicas de saúde5.
Os metais são elementos que ocorrem naturalmente,
onipresentes e resistentes à degradação natural. Existem
no ambiente em consequência de fontes naturais e antropogênicas6. Os efeitos tóxicos mais evidentes e relevantes
surgiram especialmente nos trabalhadores expostos ocupacionalmente a esses elementos, além dos danos ambientais
provocados pela mineração, processamento e descarte.
Mesmo assim, muitos metais se tornaram indispensáveis
ao funcionamento da sociedade moderna7,8.
Entre as substâncias químicas tóxicas resultantes das atividades de construção e reparo de um estaleiro, encontram-se
os metais. São comumente encontradas no ar, provenientes
da emissão de particulados, poeiras, fumos e aerossóis, liberados durante os processos de jateamento, tratamento de
superfície, goivagem, solda e pintura9.
A exposição a prata (Ag), arsênio (As), cádmio (Cd),
cobalto (Co), cromo (Cr), cobre (Cu), ferro (Fe), manganês
(Mn), níquel (Ni), chumbo (Pb), selênio (Se) e zinco (Zn)
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20
Exposição de metais em trabalhadores
metiletilcetona, dentre outros, temos uma grande maioria
já com definições de VR, os quais são quesitos indispensáveis à monitorização biológica, pois o nível dos indicadores
biológicos nos indivíduos expostos deve ser comparado
com o nível desse mesmo indicador em uma população
cuja característica principal é a de não estar exposta ocupacionalmente ou por uma situação ambiental especial aos
xenobióticos avaliados21.
Tais valores devem ser determinados em cada país e/ou
região, pois vários são os fatores que afetam o bioindicador, como o tipo de alimentação, o local de moradia e
de trabalho, os hábitos próprios do indivíduo, a poluição
ambiental, entre outros. Infelizmente, pela não disponibilidade de valores da população brasileira, a maioria dos VR
foi compilada da literatura internacional15.
Ao se usar valores reportados na literatura, existe o risco
de se cotejar dados de populações com características muito
diversas. No estabelecimento da validade de valores de referência é necessário:
1. conhecer as características relevantes da população usada
para o estudo;
2. estabelecer a técnica de amostragem;
3. estabelecer a técnica de análise do material biológico e
o desempenho da aparelhagem usada.
A população avaliada apresentava idade entre 18 e 65 anos,
tempo na função laboral de pelo menos 3 anos, e aceitou
participar da pesquisa mediante assinatura do Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido. Avaliaram-se os indivíduos das atividades de jateamento com granalha de escória
de aço e Cu, tratamento de superfície, soldagem, goivagem e
pintura em diversos locais de trabalho, sob diferentes condições, como espaço confinado e aberto.
Toda a vidraria e utensílios plásticos utilizados foram
descontaminados de acordo com procedimentos já descritos
anteriormente23. Todos os reagentes (Merck, Brasil) utilizados foram, pelo menos, de grau analítico (PA). As soluções-padrão dos metais eram preparadas diariamente em
ácido nítrico 0.2% (v/v) a partir das respectivas soluções
estoque de 1.000 µg/L, tendo sido a água de diluição previamente purificada pelo sistema Milli-Q (Millipore, USA).
Foram pesquisados os seguintes metais: Ag, As, Cd,
Co, Cr, Cu, Fe, Mn, Ni, Pb, Se e Zn. Para a avaliação da
exposição, foram feitos os procedimentos de acordo com
a especificidade:
1. ambiental – utilizou-se o método de amostragem
pessoal, que se fundamenta na coleta de ar na zona
respiratória do trabalhador, a fim de estimar a concentração de metal inalada pelo indivíduo. Coletaram-se
23 amostras de ar durante toda a jornada de trabalho
para fins de comparação com a média ponderada da
concentração no tempo (time weight average (TWA)).
A carga horária dos sujeitos da pesquisa era de 8 horas
diárias, 5 dias por semana, totalizando 40 horas semanais. Na coleta de ar, foi utilizada uma bomba portátil,
modelo 224-PCXR8 (SKC, USA), com vazão calibrada
para 2 L/min e acoplada por um tubo de látex (SKC) a
um cassete contendo suporte para filtro e membrana de
éster celulose de 37 mm de diâmetro e poro de 0,8 μm
(Millipore, USA). Níveis de Cd, Cr, Cu, Fe, Mn, Pb e
Zn foram determinados no ar do ambiente de trabalho;
2. biológica – indicadores biológicos de exposição (IBP)
(ou dose interna) adequados para cada um dos metais
avaliados foram utilizados.
Este estudo teve por objetivo pesquisar a presença de
metais (Ag, As, Cd, Co, Cr, Cu, Fe, Mn, Ni, Pb, Se, Zn)
em amostras ambientais e biológicas durante as atividades
laborais em um estaleiro de grande porte do Estado do Rio
de Janeiro.
MÉTODOS
Realizou-se um estudo transversal, entre 2012 e o
primeiro semestre de 2013, com amostra de conveniência
composta de 17 trabalhadores. A investigação foi desenvolvida em Jacuecanga, bairro de Angra dos Reis, Rio de
Janeiro. Hoje, o município abriga três usinas nucleares, dois
estaleiros — sendo um deles de grande porte e considerado
um dos maiores do Brasil —, um terminal de importação de
petróleo — o Terminal da Baía da Ilha Grande (TEBIG) —,
e duas grandes marinas, entre elas, a maior da América
Latina. O município está dividido em 5 distritos sanitários,
e no 3o distrito se localizam os estaleiros22.
Amostras de sangue total foram coletadas em tubos
a vácuo heparinizados de 7 mL, específicos para a determinação de elementos-traço, enquanto frascos coletores
descontaminados previamente, de 50 mL cada, foram utilizados para a coleta das amostras de urina. Todos os tubos
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21
Moreira MFR et al.
e frascos foram etiquetados com nome, data e horário de
coleta. As amostras foram conservadas e transportadas sob
refrigeração para o Laboratório de Toxicologia do Centro
de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana,
da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, da
Fundação Oswaldo Cruz (Cesteh/Ensp/Fiocruz), onde
permaneceram acondicionadas (-20°C) até a análise.
As análises foram feitas em um espectrômetro de absorção
atômica 5100 equipado com forno de grafite HGA-600,
corretor de fundo Zeeman e um amostrador automático
As-60 (Perkin-Elmer, Connecticut, Estados Unidos). Tubos
recobertos com grafite pirolítico (Perkin-Elmer part no B0109322) com plataforma de grafite pirolítico (Perkin-Elmer
part no B010-9324) também foram usados. A avaliação do
sinal corrigido Zeeman foi realizada por medidas de absorbância integrada (área de pico)24.
A exatidão dos resultados foi acompanhada por meio
da análise, em cada série de amostras, dos seguintes materiais de referência, diluídos conforme sua concentração:
* Contox Trace Metal Serum Control (144 1097RO2
Level I, Kaulson Laboratories, USA): [Mn]=16±4 μg/L;
[Cu]=70±10 μg/dL.
* Contox Blood Lead Controls (Kaulson Laboratories,
USA): 5±3 μg/dL (LBO33RO2, Low Level), 25±4 μg/dL
(MB30REO2, Medium Level)
* Metals on Filter Media SRM 2676d IIId (NIST, USA):
[Mn]=19,83±0,38 μg/filter; [Pb]=29,77±0,61 μg/filter;
[Cd]=10,04±0,20μg/filter; [Zn]=99,31 ± 1,77 μg/filter.
* Toxic Elements in urine (freeze-dried) SRM 2670a
(NIST, USA): [Mn]=2,6±0,7 μg/L (low level);
[Zn]=130±30 μg/L (low level); [Cr]=2 μg/L (low
level)); [Cr]=20 μg/L (high level).
outros nem as utilizavam. Houve um caso em que a pressão
positiva não funcionava adequadamente. Em relação
aos pintores, a vestimenta de polietileno era composta
por calça e camisa, o que deixava descobertas partes do
abdômen e antebraço, permitindo o contato da pele com
as substâncias químicas.
Os sistemas de ventilação e exaustão, quando presentes,
estavam mal projetados. Assim, tornavam-se ineficazes e,
algumas vezes, promoviam a exposição de outros trabalhadores não relacionados diretamente àquela atividade.
Por exemplo, o tratamento de superfície realizado no paiol
da praça de máquina contaminava todo o ambiente, expondo
também os pintores às partículas metálicas.
A participação do metal no processo de trabalho, bem
como sua importância toxicológica, orientou a escolha
desses a serem avaliados. Assim, Fe, Mn, Pb, Cr, Cd, Cu e
Zn foram determinados no ar de diferentes ambientes de
trabalho, conforme apresentado na Tabela 1. Cd, Cu e Zn
não foram avaliados nos processos de solda e goivagem
por não terem importância para essas atividades. Entre
os elementos, apenas o Pb contém limite de tolerância na
legislação brasileira. Portanto, foram adotados os limites
estabelecidos (concentração média ponderada no tempo –
TWA) pela American Conference of Governmental Industrial
Higyenists (ACGIH)25 para todos os metais, que podem ser
encontrados na Tabela 2, tendo-se como base a Associação
Brasileira de Higienistas Ocupacionais (ABHO)26. Foram
comparados os resultados biológicos obtidos (VR ou IBMP,
quando da existência destes).
Os resultados encontrados para os diferentes indicadores
biológicos (biomarcadores de exposição ou dose interna)
encontram-se na Tabela 3. Ainda que a ACGIH26 e a NR-727
não contemplem todos os metais avaliados, os valores de
referência da Comunidade Europeia foram utilizados como
base de comparação28.
A NR-727 só prevê VR e IBMP para Cd em urina (VR=até
2 μg/g creatinina; IBMP=5 μg/g creatinina), Pb em sangue
(VR=até 40 μg/L; IBMP=60 μg/dL), Cr hexavalente em
urina (VR=até 5 μg/g creatinina; IBMP=30 μg/g creatinina).
Além desses, constam também As, Hg e Pb na forma tetraetila na urina. Por outro lado, a ACGIH adota os IBP para
apenas Cd-urina (5 μg/g creatinina), Pb-sangue (30 μg/dL)
e Cr-urina durante a jornada de trabalho (10 μg/L) e
final da jornada e semana (25 μg/L), além de As-urina,
Cd-sangue, Co e Hg em sangue e urina, no caso dos metais.
RESULTADOS
Em geral, os trabalhadores utilizavam algum tipo de
equipamento de proteção individual (capacete, capuz,
óculos, protetor facial, máscara de solda, protetor auricular, luvas, botas, macacão e vestimentas de polietileno,
máscaras com e sem filtro, e respirador de ar tipo linha
de ar comprimido com pressão positiva, dependendo da
atividade desempenhada). Entretanto, observou-se que a
maioria dos trabalhadores utilizava máscaras, algumas em
estado precário ou inadequadas às atividades, enquanto
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22
Exposição de metais em trabalhadores
Tabela 1. Faixas de concentração de metais nas amostras de ar coletadas em diferentes atividades e ambientes de uma indústria
naval em Angra dos Reis, 2012–2013.
Atividade
Jateamento
granalha/aço
Tipo de
ambiente
Cabine (6)/
Tanque (2)
Confinado 483–7323
Plataforma/
Casco (3)
Jateamento
granalha/Cu
Cabine (4)
ST3
Faixa de concentração
(mg.m-3)
Local
(número de
amostras)
Fe
Aberto
99–407
Confinado 1540–8110
Mn
Pb
Cr
Cd
Cu
Zn
6–373
3,8–48,3
1,2–10,2
≤LD-0,15
≤LD-4,0
10–20
1–6
≤LD-4,3
≤LD-1,5
–
–
–
5–32
6,4–52,0
1,8–11,0
–
14–83
180–550
22,2–85,0
≤LD-33,4
0,03–0,44-
60–73
1140–3000
42–619
≤LD-2,5
≤LD-8,2
–
–
–
245–385
2,2–18,2
0,5–17,1
–
–
–
Corredor navio (4) Confinado 7424–27534 296–1028
Solda
Porão (2)
Goivagem
Convés (2)
Confinado 248–3824
Aberto
6723–11719
LD: limite de detecção; ST3: tratamento de superfície.
Tabela 2. Valores limites estabelecidos para a concentração média ponderada no tempo (TLV- TWA) pela American Conference of
Governmental Industrial Higyenists (ACGIH).
Valor Limite
ACGIH
TLV-TWA
(mg/m3)
Elementos
Fe
Mn
Pb
Cr
Cd
Cu
Zn
2000
200
50
500
50
1000
1000
Tabela 3. Concentração de metais em amostras de sangue e urina de trabalhadores da indústria naval em Angra dos Reis, 2012 – 2013
Atividade/local
Cr-U
(mg/L)
Mn-U
(mg/L)
Zn-U
(mg/L)
Pb-S
(mg/L)
Mn-S
(mg/L)
Cu-S
(mg/L)
1
Jateamento granalha aço/Tanque
≤0,44
0,90
≤100
98,0
5,11
898
2
Jateamento granalha aço/Tanque
≤0,44
1,22
200
81,0
7,92
792
3
Jateamento granalha Cu/Cabine
≤0,44
0,90
≤100
48,0
5,42
593
4
Jateamento granalha Cu/Cabine
≤0,44
0,90
≤100
158,0
2,62
937
5
Jateamento granalha Cu/Cabine
≤0,44
1,70
≤100
129,0
7,62
712
6
Jateamento granalha Cu/Cabine
≤0,44
2,50
300
89,0
5,74
1070
7
ST3
≤0,44
2,18
≤100
109,0
13,22
738
8
ST3
≤0,44
2,50
≤100
32,0
9,17
752
9
ST3
≤0,44
2,50
≤100
56,0
7,61
792
10
ST3 (empreiteira)
≤0,44
1,54
≤100
18,0
6,36
355
11
ST3 (empreiteira)
≤0,44
0,90
≤100
77,0
8,23
448
12
ST3 (empreiteira)
≤0,44
0,90
≤100
162,0
8,90
738
13
ST3 (empreiteira)
≤0,44
0,90
≤100
40,0
8,20
765
14
ST3
2,18
≤100
40,0
10,10
580
15
ST3
≤0,44
0,58
≤100
93,0
5,70
527
16
ST3
≤0,44
2,82
200
40,0
8,23
765
17
ST3/Paiol
≤0,44
1,90
400
81,0
11,66
659
0,04–1,50
0,12–1,90
266–846
39,7–275,7
7,10–10,5
807–1643
Amostra
Faixa de referência da Comunidade Europeia
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Moreira MFR et al.
TLV-TWA, que é de 2.000 μg/m3. Apenas o jateamento
com granalha de escória de cobre em ambiente aberto
alcançou concentrações de 20 a 5 vezes menores do que
o limite estabelecido. A inalação de fumos ou poeira de
óxido de ferro por trabalhadores das indústrias de metal
pode resultar na deposição de partículas desse metal nos
pulmões, produzindo um raio X semelhante ao da silicose.
Esses efeitos são vistos em mineradores de hematita, metalúrgicos e soldadores34,35.
A mortalidade por câncer de pulmão nas minas de hematita e fundições de ferro tem aumentado. Entretanto, o papel
etiológico dos óxidos de Fe ainda não está bem estabelecido
nos casos em que há uma exposição combinada a outras
substâncias potencialmente tóxicas e carcinogênicas36.
Quanto ao Mn, todas as atividades apresentaram concentrações acima de 200 μg/m3, exceto também na atividade
de jateamento com granalha de escória de Cu em ambiente
aberto. Em particular, a via respiratória é crítica para esse
metal, considerando uma absorção e distribuição direta
sobre o sistema nervoso central37. A forma mais comum
de toxicidade é o resultado da inalação crônica de Mn no
ar de minas, siderúrgicas, operações de solda e algumas
indústrias químicas38. Trabalhadores de indústrias com
altas concentrações de poeira de Mn apresentam uma
incidência de doença respiratória 30 vezes maior do que a
normal. Entretanto, um tipo mais sério de doença resultante
da exposição crônica à inalação de dióxido de manganês,
geralmente por um período maior do que 2 anos, envolve o
sistema nervoso central. O envenenamento crônico por Mn
(manganismo) produz uma desordem neuropsiquiátrica,
que persistindo pode chegar a desenvolver uma síndrome
semelhante à doença de Parkinson8,39.
Nos jateamentos com granalha de escória de aço e de
Cu, os resultados de Pb alcançaram níveis próximos ao
limite de 50 μg/m3, enquanto alguns valores obtidos no
tratamento de superfície estavam acima desse limite. Para
adultos com elevada exposição ocupacional, as preocupações são a neuropatia periférica e/ou a nefropatia crônica8,25.
Por outro lado, os níveis de Cr, Cd e Cu se encontravam
abaixo dos seus respectivos TLV-TWA, indicando que não
houve risco de exposição excessiva a esses metais nessas
atividades e condições de trabalho. O teor de Zn no ar se
apresentou acima do limite de 1.000 μg/m3 somente na
atividade de tratamento de superfície. Inalar grandes quantidades de Zn, sob a forma de pós ou fumos provenientes
A conversão dos valores da urina de μg/g para μg/L pode
ser realizada por meio de uma gravidade específica média
(1,019)12, considerando indivíduos com ingestão hídrica
normal. Assim, o IBMP para cádmio é 5,1 μg/L, praticamente o mesmo valor na outra unidade.
DISCUSSÃO
Dentre as Normas Regulamentadoras de Segurança e
Saúde no Trabalho, do Ministério do Trabalho e Emprego,
a NR-629 regulamenta o uso de EPI, definido como todo
dispositivo ou produto, de uso individual utilizado pelo
trabalhador, destinado à proteção de riscos suscetíveis de
ameaçar a segurança e a saúde no trabalho.
Na lógica do controle dos riscos no ambiente de trabalho,
as medidas de controle individual são as últimas a serem
tomadas, priorizando-se aquelas voltadas para a eliminação/
diminuição das fontes de emissão e dispersão do contaminante pelo ambiente, como a melhoria da circulação do ar,
com sistemas de ventilação/exaustão dimensionados para
o local de trabalho30,31.
De acordo com a NR-932, que trata da prevenção dos
riscos ambientais, quando os resultados das avaliações quantitativas da exposição dos trabalhadores excederem os limites
previstos na NR-1533, ou ainda na ausência destes, devem ser
adotados os valores para exposição ocupacional da ACGIH26.
Dentre os metais avaliados, somente o Pb consta da
NR-15, com limite de tolerância para até 48h por semana
igual a 100 µg/m3, o dobro do estabelecido pelos higienistas industriais americanos. Conforme esta norma, limite
de tolerância é a concentração ou intensidade máxima ou
mínima, relacionada com a natureza e o tempo de exposição
ao agente, que não causará dano à saúde do trabalhador,
durante a sua vida laboral.
O Threshold Limit Value - Time Weighted Average (TLVTWA) é definido como a concentração média ponderada
no tempo para uma jornada normal de 8 horas diárias e
40 horas semanais, à qual a maioria dos trabalhadores pode
estar repetidamente exposta, dia após dia, sem sofrer efeitos
adversos à saúde. Por isso, os TLV-TWA estabelecidos pela
ACGIH foram utilizados para comparação de todos os
elementos determinados26.
Das atividades avaliadas, os níveis de exposição dos
trabalhadores ao Fe estiveram, em sua maioria, acima do
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24
Exposição de metais em trabalhadores
de fundição ou solda, pode causar uma doença específica
de curta duração chamada febre dos fumos metálicos, que
geralmente é reversível uma vez cessada a exposição ao
Zn. No entanto, muito pouco se sabe sobre os efeitos da
inalação do metal a longo prazo40.
No caso do jateamento com granalha de escória de Cu,
dois tipos de ambiente foram avaliados, e a faixa de concentração encontrada para todos os metais foi bem menor em
ambiente aberto. A redução dos teores de Fe no ar variou de
15 a 20 vezes, enquanto o nível de Mn diminuiu 5 vezes,
de Pb 3 vezes e de Cr 7 vezes. Apenas Pb e Cr foram determinados na atividade de pintura, visto que são os elementos
mais frequentemente utilizados como pigmentos para tintas8.
Este trabalho não ofereceu risco de exposição quanto aos
metais avaliados, em razão de sua redução ou até remoção
das tintas utilizadas neste setor industrial. Pode-se observar
que os resultados foram interpretados para cada metal,
porém o trabalhador está exposto a uma mistura de metais,
e o resultado da interação destes com o organismo poderia
promover a potencialização, a adição, o sinergismo ou o
antagonismo dos efeitos tóxicos, que seriam causados pela
exposição a cada metal isoladamente.
Quando se compara os resultados da Tabela 3 com os
valores de referência da Comunidade Europeia, verifica-se
que apenas o Mn apresentou valores acima da faixa de referência, principalmente na urina. Em concordância com os
níveis encontrados para Mn no ar, a atividade de tratamento
de superfície proporcionou os níveis mais elevados de Mn
na urina, uma vez que 55% dos trabalhadores avaliados nesta
atividade apresentaram concentrações maiores do que os
valores de referência.
Entretanto, apenas um trabalhador encontrou-se nas
mesmas condições no jateamento. Em relação ao Mn no
sangue, somente 2 trabalhadores obtiveram resultados acima
do VR entre os 17 monitorados, e ambos realizavam a atividade tratamento de superfície, de modo que se pode dizer
que a exposição existe, porém fica difícil precisar em que
grau. O fato de todas as concentrações de Mn no ar estarem
acima do limite de exposição ocupacional na atividade de
tratamento de superfície, de 55% dos trabalhadores dessa
atividade apresentarem concentração de Mn em urina maior
do que o VR e de que apenas dois indivíduos tiveram seus
níveis de Mn-sangue acima do limite superior, pode sugerir
que talvez o Mn-urina seja um melhor biomarcador para a
exposição crônica tendo uma população como base.
Por outro lado, seis trabalhadores (35%) apresentaram
níveis de Mn-sangue abaixo do VR. Um único resultado
de Mn-urina acima da referência, mesmo com Mn-sangue
normal, pode estar relacionado ao alto conteúdo de Mn
renal e/ou maior concentração de Mn livre (ultrafiltrável) no sangue8. Entre os sete trabalhadores com as
menores concentrações de Mn-urina (<1), quatro (57%)
tiveram Mn-sangue abaixo do VR, o que pode indicar
uma deficiência de Mn, que é também um metal essencial apesar de tóxico39. O Mn tem VR na urina e sangue
norte-americanos e europeus (semelhantes), porém as
dosagens em meio biológico não têm correlação com a
exposição ambiental, e, portanto, não é possível de ser
utilizado. Por esse motivo, não existe Mn citado como
indicador biológico na NR-7, nem na ACGIH, tampouco
na SCOEL europeia.
Os níveis médios de Mn-sangue refletem o conteúdo
total do corpo em um grupo, mas não de forma individual.
A rápida liberação de Mn do corpo limita a correlação entre
os efeitos crônicos à saúde e o nível de Mn-sangue, especialmente depois de cessada a exposição. Assim, os níveis no
sangue total mostram a exposição atual, mas existe pouca
correlação entre a exposição passada ao Mn e a atuais concentrações de Mn no sangue total. Similar à interpretação das
concentrações de Mn no sangue, os níveis do metal na urina
são baixos e refletem a exposição muito recente a Mn38,40.
Quando se comparam os valores obtidos para Mn-sangue
com aqueles estabelecidos pela Agency for Toxic Substances
and Disease Registry (ATSDR)40, observa-se que todos os
sujeitos também se encontram dentro do intervalo de 4 a
14 μg/L. Esses resultados estão de acordo com os achados
de Ellingsen et al.41, pois estão abaixo dos valores encontrados para 96 soldadores que são trabalhadores sabidamente expostos ao metal em questão (Mn-sangue em torno
de 8,6 μg/L).
Quanto ao Pb-sangue, obtiveram-se níveis que variaram
de 2,4 a 16,6 μg/dL, e tais teores são preocupantes pelo
fato de que concentrações entre 5 e 10 μg/dL já sugerem
a existência de algum tipo de exposição ambiental e que
níveis de 10 a 20 μg/dL já mostram uma exposição ocupacional25,42,43. Nesse sentido, a observação dos níveis de
Pb-sangue encontrados mostra que 41% dos indivíduos se
encontram expostos, significando uma exposição ambiental
recente. Da mesma forma, 24% dos trabalhadores avaliados
se encontram expostos ocupacionalmente.
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):19-28
25
Moreira MFR et al.
Há bastante dificuldade na interpretação dos resultados de exposições múltiplas2, visto que alguns metais são
tóxicos mesmo em níveis muito baixos, enquanto outros
são essenciais até certas concentrações. Os elementos
essenciais são aqueles que participam do metabolismo
e formação de muitas proteínas, enzimas, entre outras, e
cuja deficiência causa anomalia funcional ou estrutural
no organismo. Por outro lado, a existência de um limiar
de toxicidade possibilita a ocorrência de efeitos adversos
à saúde nos casos de exposição a elevadas concentrações
desses metais12.
Além disso, a dose biologicamente efetiva para cada
tecido/órgão/sistema é diferenciada 6. Avaliando, por
exemplo, o sistema nervoso, Pb e Mn são neurotóxicos,
mas não é sabido quais os efeitos de uma ação combinada,
ainda que os metais essenciais (Cu, Zn) estejam dentro da
faixa ótima de concentração.
O método proposto apresentou-se adequado para a
análise dos metais em amostras do ar do ambiente de
trabalho e biológicas. É importante ressaltar que essa amostragem teve caráter exploratório e não teve a finalidade
de definir o perfil de exposição ocupacional nas plantas.
As coletas realizadas são uma fotografia instantânea da
produção. O perfil detalhado da exposição ocupacional
deve ser definido levando-se em conta amostragens em
diferentes semanas, meses, clima e volume de produção.
Além disso, coletamos amostras de sangue e urina para
avaliar os níveis de certos metais nos fluidos biológicos
dos trabalhadores, uma vez que, desde a década de 1990,
são realizados estudos com a finalidade de minimizar a
exposição de trabalhadores da indústria naval e daqueles
com exposições em fundições, com propostas de sistemas
de ventilação adequadas 44, bem como a avaliação da
eficiência de protetores respiratórios45.
Apesar de o monitoramento ambiental ser fundamental
para avaliação e manutenção dos níveis de exposição em
valores aceitáveis, identificação de fontes de emissão,
monitoramento da eficácia das medidas de controle e
obtenção de dados para as relações de exposição/efeito
e exposição/resposta, o monitoramento biológico é
mais adequado, uma vez que considera as diferenças
inter e intraindividuais, integrando a toxicocinética e a
toxicodinâmica. Também considera a exposição total,
apontando a amplitude da exposição e do risco. Assim,
o monitoramento biológico representa um avanço em
relação à avaliação dos riscos à saúde, visto que é capaz
de quantificar as doses e mostrar alterações precoces e
ainda reversíveis2,17.
O jateamento com granalha de aço e a atividade de
tratamento de superfície podem ocasionar exposição
excessiva a Fe, Mn e Pb, assim como o jateamento com
granalha de Cu, que, mesmo em ambientes semiabertos,
também expõe os trabalhadores a níveis elevados de Fe
e Pb, apesar de esses não terem alcançado teores críticos
nos biomarcadores. Por outro lado, altas concentrações
de Fe e Mn são encontrados na soldagem e goivagem,
constituindo-se também atividades de risco para os
trabalhadores2,38,43.
CONCLUSÃO
Os níveis dos metais nos trabalhadores pesquisados
foram menores que os considerados críticos pelas legislações. Os cenários avaliados foram consoantes com a literatura
científica, que apresenta exemplos de sucesso na iniciativa
de diminuir a exposição a metais de trabalhadores da indústria naval. Por outro lado, também evidenciou a pesquisa
que os trabalhadores trazem suas experiências com situações perigosas, tanto no que se refere às possibilidades de
acidentes quanto aos problemas de saúde deflagrados pelo
trabalho a curto ou longo prazo. Deixam clara a insatisfação
com as condições de trabalho e constrangimentos provocados pela organização deste.
Com a globalização, é de se esperar que o Brasil,
num futuro muito próximo, deverá enfrentar um novo
desafio no que diz respeito à Saúde Ocupacional, ou
seja, deverá aplicar procedimentos preventivos a efeitos
adversos à saúde ocasionados pelos metais. Em função
desses fatos, cresce a importância da avaliação dos
aspectos analíticos e a recomendação de aplicação do
monitoramento biológico dos trabalhadores da indústria naval como guia para avaliação do risco potencial à
saúde como recomenda a ACGIH.
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26
Exposição de metais em trabalhadores
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Endereço para correspondência: Aldo Pacheco Ferreira – Centro de Estudos da
Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana, Escola Nacional de Saúde Pública Sergio
Arouca, Fundação Oswaldo Cruz – Rua Leopoldo Bulhões, 1480 – Manguinhos –
CEP: 21041-210 – Rio de Janeiro (RJ), Brasil – E-mail: [email protected]
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ARTIGO
ORIGINAL
Recebido: 11/12/2014
Aceito: 12/02/2015
Fonte de financiamento: nenhuma
A aplicação da arquitetura de informação na
gestão dos riscos das doenças crônicas em
trabalhadores: uma análise preliminar
The information architecture to manage the risks
of chronic diseases in workers: a preliminary analysis
Adriano Hyeda1, Élide Sbardellotto Mariano da Costa1, Fides Sbardellotto2, Jean Carlo Camargo Ferreira3
RESUMO | Contexto: O aumento na prevalência dos casos de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) na empresa pode
resultar em queda de produtividade, absenteísmo, presenteísmo, invalidez, aposentadoria precoce e aumento nos gastos com o sistema
de saúde. A gestão dos fatores de risco para as DCNT é fundamental para garantir a saúde integral dos trabalhadores. Objetivos:
Apresentar um modelo de aplicação da arquitetura de informação no gerenciamento dos fatores de risco para as DCNT dentro do
programa de controle médico de saúde ocupacional (PCMSO) da empresa, apresentando os resultados preliminares. Métodos: Foi
desenvolvido um sistema de gerenciamento de risco para DCNT a partir do questionário da Michigan Heart Association, e aplicado
em uma empresa com 6.398 empregados e 317 estabelecimentos, distribuídos em um mesmo estado, no Brasil. Resultados: Houve a
participação de 1.660 empregados (26% do total) no período de uma semana. O escore global médio na amostra foi de 13,32 pontos
(DP ±6,57), ou seja, risco abaixo da média. Os três principais fatores de risco identificados foram o sedentarismo (42%), o sobrepeso
e obesidade (54%) e a hipercolesterolemia (54%). O estímulo à atividade física e um programa de orientação nutricional deveriam ser
priorizados na prevenção da saúde dos trabalhadores avaliados. Conclusão: A aplicação da arquitetura de informação pode contribuir na identificação dos riscos para saúde dos trabalhadores e no planejamento de ações de prevenção contra as DCNT na empresa.
Palavras-chave | doença crônica; gestão em saúde; saúde do trabalhador; fatores de risco; tecnologia da informação.
ABSTRACT | Context: The increased prevalence of chronic non-communicable diseases (NCDs) in one company can result in
decreased productivity, absenteeism, presenteeism, disability and increased spending on the health care system. The management
of risk factors for NCDs is critical to overall health of workers. Objective: It was developed an application model of information
architecture in the management of risk factors for NCDs within the occupational health program of the company and their preliminary results. Methods: It was developed a risk management system based at the questionnaire of Michigan Heart Association, and applied in a
company with 6,398 employees and 317 units, distributed in the same state, in Brazil. Results: There was the participation of 1,660 employees
(26% of total) in one week. The overall mean score obtained in the questionnaire was 13,32 points (SD ±6.57), below the average
risk. The three main risk factors identified were physical inactivity (42%), overweight and obesity (54%) and hypercholesterolemia
(54%). The incentive to physical activity and the implementation of a nutritional counseling program are the priority in the studied
company. Conclusions: The use of information architecture can contribute to the identification of workers’ health risks and for planning of preventive actions by the company against NCDs.
Keywords | chronic disease; health management; occupational health; risk factors; information technology.
Instituto Superior de Administração e Economia da FGV – Curitiba (PR), Brasil.
1
Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR); Departamento de Eventos Adversos Pós-vacinais do Município de Curitiba – Curitiba (PR), Brasil.
2
Universidade Federal do Paraná (UFPR) – Curitiba (PR), Brasil.
3
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):29-36
29
Hyeda A et al.
por objetivo promover e manter um elevado grau de bem
estar físico, mental e social dos trabalhadores em todas as
suas atividades5. Para atingir esse objetivo, há necessidade
de uma gestão do programa de controle médico de saúde
ocupacional (PCMSO) voltado para a saúde integral do trabalhador. Os exames médicos ocupacionais são fundamentais
na verificação das condições de saúde do empregado e da
preservação da saúde pelo desenvolvimento do trabalho no
dia a dia. Além disso, é a oportunidade de conhecer a saúde
integral do trabalhador, incluindo os fatores de risco para
DCNT. Conforme a Norma Regulamentadora (NR) 7, os
empregados com doenças crônicas deveriam ser avaliados
anualmente no exame periódico6. Entretanto, este intervalo
de tempo pode ser longo para um adequado monitoramento
dos riscos à saúde dos trabalhadores.
A implantação de uma política de gestão dos fatores de
risco da DCNT na empresa possibilita a melhoria da saúde,
produtividade e qualidade de vida aos seus empregados.
Para garantir um programa de gestão de risco para DCNT
na empresa algumas premissas devem ser observadas4:
1. o engajamento das lideranças nos programas de saúde
e qualidade de vida dos empregados;
2. o acompanhamento do perfil de saúde dos empregados
através do sistema de informação, determinando metas
e monitorando o processo;
3. o planejamento de intervenções prioritárias, conforme
o perfil de saúde dos empregados, com ações em grupo
e individuais, de forma contínua e sustentável;
4. a participação ativa dos empregados na gestão de sua
própria saúde, buscando um estilo de vida orientado
para o bem-estar, incluindo tanto os aspectos físicos
quanto os psíquicos (autogerenciamento da saúde);
5. a integração entre a saúde ocupacional com o plano de
saúde assistencial oferecido pela empresa, priorizando
a atenção primária à saúde;
6. o gerenciamento de casos críticos através do telemonitoramento assistencial, acompanhando a aderência
ao tratamento e o risco de eventos agravantes.
INTRODUÇÃO
A Organização Mundial da Saúde (OMS) define como
doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) as doenças
cerebrovasculares, cardiovasculares e renovasculares, neoplasias, doenças respiratórias e diabetes mellitus. A OMS também
inclui nesse rol aquelas doenças que contribuem para o
sofrimento dos indivíduos, famílias e sociedade; como:
desordens mentais e neurológicas, doenças bucais, ósseas
e articulares, desordens genéticas e patologias oculares e
auditivas1-3.
As DCNT estão entre os maiores problemas de saúde
publica da atualidade. Estimativas da OMS indicam que
foram responsáveis por 63% das mortes ocorridas no mundo
em 20081,4. No Brasil, em 2007, as DCNT foram responsáveis por 72,0% do total de mortes, com destaque para as
doenças do aparelho circulatório (31,3% dos óbitos), as
neoplasias (16,3%) e o diabetes (5,2%)2-4.
Em relação ao trabalho, as doenças crônicas impactam na
redução da participação na força de trabalho, no quantitativo
de horas trabalhadas, na maior rotatividade de empregos e nas
aposentadorias precoces, assim como no comprometimento
dos salários, ganhos e posição alcançada. Estimativas para
o Brasil sugerem que a perda de produtividade no trabalho
e a diminuição da renda familiar resultantes de apenas três
DCNT (diabetes, doença do coração e acidente vascular
cerebral) levarão a uma perda na economia brasileira de
US$ 4,18 bilhões entre 2006 e 20153,4.
A maioria das condições crônicas é passível de prevenção.
As estratégias para reduzir o surgimento e agravamento de
algumas destas condições — como o diabetes, as doenças
cardiovasculares, a obesidade e vários tipos de câncer —
incluem detecção precoce, aumento da atividade física,
redução no consumo de tabaco e uma nutrição saudável.
A abordagem preventiva em nível populacional e individual
revela-se eficaz para a modificação de comportamentos não
saudáveis e a promoção de bons hábitos. A implantação
de uma cultura preventiva contra os fatores de risco das
DCNT permite ações efetivas e de baixo custo, agregando
valor tangível e intangível para as empresas e para os seus
trabalhadores2-4. Estima-se que produzir reduções nos riscos
das DCNT, em torno de 2% ao ano, possa aumentar o crescimento econômico em até 1% ao ano, após uma década4.
Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT),
o serviço de segurança e saúde ocupacional da empresa tem
A arquitetura de informação, quando bem utilizada, pode
contribuir no conhecimento sobre os processos, no desenvolvimento e monitoramento de indicadores, no planejamento
de ações e no gerenciamento dos resultados. Caracteriza-se
pela arte e ciência de estruturar e organizar os conteúdos
e projetar sistemas de navegação com objetivo de facilitar
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):29-36
30
Arquitetura de Informação e Doenças Crônicas
o acesso e a gestão da informação, que envolve processos
de investigação, análise, desenho e implementação. Para
alcançar este objetivo, há necessidade de se considerar, para
cada sistema desenvolvido, as características do usuário, do
conteúdo, do contexto, da usabilidade, buscando balanceá-las,
para que a informação certa seja acessada pela pessoa certa
no momento certo7.
O objetivo deste manuscrito foi demonstrar um exemplo
de aplicação da arquitetura de informação no auxílio da
gestão dos fatores de risco para DCNT, dentro do programa
de controle médico de saúde ocupacional da empresa.
gestor a divulgar a mensagem para todos os seus empregados. A participação era facultativa. O tempo médio para
responder as questões era de cinco minutos. Ao acessar
o endereço eletrônico disponibilizado no convite, o
empregado era direcionado ao sistema. As questões
eram liberadas para o preenchimento assim que o trabalhador informasse a sua matrícula (número de registro
do funcionário na empresa). Ao confirmar as respostas,
os dados eram registrados e a pesquisa era encerrada.
O sistema não permitia responder as questões mais de
uma vez. As informações coletadas foram mantidas em
sigilo sob a responsabilidade do coordenador da saúde
ocupacional da empresa.
O questionário era composto por oito questões que
avaliavam os principais fatores de risco coronariano,
modificáveis ou não. Conforme a resposta escolhida para
cada questão havia um escore por fator analisado e um
escore global (soma de todos os escores parciais obtidos).
Entre os fatores de risco modificáveis, foram avaliados:
1. Tabagismo – Foram classificados em não fumantes,
ex-tabagistas e fumantes (entre menos de 10 cigarros
até 40 cigarros ao dia), com escore variando entre zero
e 10 pontos11-13.
2. Sobrepeso e obesidade – Foi considerado com sobrepeso o indivíduo com índice de massa corporal (IMC)
≥25 kg/m2 e obesidade com IMC >30 kg/m 2 11-14.
Para responder a questão, o participante poderia
acessar o ícone de ajuda. Ao inserir o peso e altura, o
sistema calculava automaticamente o IMC e o peso
excedente. Assim, além de conhecer o seu IMC o
participante poderia saber o quanto deveria perder de
peso para manter este indicador abaixo de 25 kg/m 2
(valor desejável). O escore poderia variar entre zero
e oito pontos.
3. Sedentarismo – Foi considerado sedentário aquele
que não realizava nenhuma atividade física por pelo
menos 10 minutos contínuos durante a semana, nos
últimos três meses. Os ativos eram aqueles que realizavam, no mínimo: 60 minutos de atividade vigorosa
ou 150 minutos de atividade moderada ou caminhada
por semana. Os moderadamente ativos realizavam atividade física, porém insuficiente para ser classificado como
ativo11-13,15. Considerando que a atividade profissional
avaliada era sedentária, o questionário previa um escore
entre três e seis pontos.
METODOLOGIA
O sistema de gerenciamento de fatores de risco para
DCNT foi desenvolvido em 2013 para ser aplicado na
Semana Interna de Prevenção de Acidentes do Trabalho
(SIPAT). A empresa que participou do projeto conta com
6.398 empregados distribuídos em 317 estabelecimentos
ou unidades, localizados em 113 cidades de um mesmo
Estado, no Brasil. A maioria dos estabelecimentos está
concentrada na capital (40%) e 63,4% deles apresentam até
20 empregados (mínimo de dois e máximo de 100 funcionários). Considerando o tipo de atividade, a empresa é
classificada como grau de risco I e apresenta um Serviço
Especializado em Engenharia de Segurança e Medicina do
Trabalho (SESMT) único.
Em relação ao desenvolvimento do sistema, considerando que os principais fatores de risco envolvidos na DCNT também estão presentes no risco de
doença coronariana, foi utilizado o questionário da
Michigan Heart Association, traduzido para língua brasileira 8-10. Com apoio da tecnologia de informação, foi
desenvolvida uma versão eletrônica do questionário, disponibilizada na rede de comunicação interna da empresa
(intranet). O sistema foi desenvolvido em um período de
14 dias, com os recursos disponíveis na empresa. Foram
realizados pelo menos três testes com 15 empregados,
para avaliar a distribuição do convite eletrônico, o acesso,
a geração do banco de dados e a identificação de falhas
na compreensão ou no preenchimento do questionário
eletrônico. Após a certificação da funcionalidade do
sistema, foi realizado um convite em formato eletrônico,
para a caixa postal de cada estabelecimento, orientando o
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):29-36
31
Hyeda A et al.
tecnologias de desenvolvimento Personal Home Page® (PHP
5.3) e Active Server Pages® (ASP 3.0) atinentes à arquitetura
Web. A metodologia foi desenvolvida com os recursos disponíveis na empresa, sem fontes de financiamento externo.
4. Hipertensão arterial – Foi considerado normal a pressão
sistólica referida igual ou inferior a 139 mmHg, com
escore variando entre zero e 10 pontos11-13,16.
5. Diabetes mellitus – Conforme o resultado da última
glicemia de jejum referida foi considerado normal o
resultado igual ou abaixo de 99 mg/dL, intolerância a
glicose entre 100 e 125 mg/dL, e diabetes se igual ou
superior a 126 mg/dL11-13. O questionário também
identificava, entre aqueles que tinham diabetes, os que
estavam controlados ou não. O escore poderia variar
entre zero e 10 pontos;
6. Hipercolesterolemia – Conforme o resultado do último
colesterol total referido foi considerado normal o resultado igual ou inferior a 199 mg/dL, com escore variando
entre zero e 10 pontos11,17.
RESULTADOS
O convite para participação da pesquisa foi distribuído
na caixa postal eletrônica de todos os estabelecimentos da
empresa. Durante o período de uma semana, o convite foi
reiterado para todas as unidades em três momentos diferentes. Entre os 317 estabelecimentos da empresa, 264
(83,3%) divulgaram o convite para os empregados que ali
trabalhavam. Sendo assim, estima-se que houve a divulgação
para 5.908 empregados (92,3%).
No final da pesquisa, foram identificadas 1.660 participações, ou seja, 26% do total de empregados na empresa e
28% dos que supostamente receberam o convite para participar da pesquisa. Entre os participantes, 54,3% eram do
sexo masculino e 45,7% do sexo feminino. A idade média
foi de 43,7 anos (DP ±9,22), variando entre 19 e 66 anos.
Com relação ao grau de instrução, 86,5% estavam cursando
ou concluíram o ensino superior.
Entre os 264 estabelecimentos que responderam a pesquisa,
a maioria apresentou menos de dez participações por unidade
(87,1%). A média de participação foi de 6,3 empregados por
estabelecimento (DP ±10,3), com mediana de 3, variando
entre 1 e 82 funcionários. Entre os 54 estabelecimentos que
não participaram da pesquisa (16,7%), a maioria estava localizado no interior do Estado (79,6%) e apresentava menos
de dez empregados por unidade (74,1%).
Os resultados obtidos por fatores de risco modificáveis
foram demonstrados no Gráfico 1. Foi identificado que 9%
Entre os fatores de risco coronariano não modificável,
foram avaliados:
1. Idade e sexo – O questionário estratificava o risco
conforme a faixa etária, sexo, presença ou não de ovários,
histórico familiar positivo para doença coronariana e
outras morbidades (diabetes). O escore poderia variar
entre zero e seis pontos;
2. Histórico familiar – O questionário estratificava o risco
conforme o número de familiares com doença coronariana, o grau de parentesco e a idade. O escore poderia
variar entre zero e oito pontos.
Para cada questão, foi disponibilizado um ícone de ajuda
com informações detalhadas sobre cada pergunta. Foi acrescentada a alternativa “não sei informar” caso o participante
não soubesse a resposta. Nestes casos, não foi possível calcular
o escore total e o participante era excluído da avaliação, com
a recomendação de realizar uma consulta médica preventiva.
Após a conclusão do questionário, o participante recebia a
informação do seu escore global e do seu escore em cada
fator de risco avaliado. O escore total obtido poderia variar
entre três e 68 pontos. Quanto maior fosse o escore, maior
seria o risco de doença cardiovascular (Tabela 1).
Considerando a necessidade de um projeto de rápido
desenvolvimento, foi utilizada a arquitetura cliente/servidor
Web, alçando a versatilidade, leveza e imediato posicionamento dos participantes. Para a gestão das informações coletadas foi utilizado o Sistema de Gerenciamento de Banco
de Dados (SGDB) Microsoft® SQL 2008, em associação as
Tabela 1. Classificação de risco coronariano proposta pela
Michigan Heart Association.
Escore total
Até 11
12 a 17
18 a 24
25 a 31
32 a 40
41 a 68
Risco coronariano
Risco bem abaixo da média
Risco abaixo da média
Risco médio
Risco moderado
Alto risco
Risco muito alto
Fonte: Michigan Heart Association7
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):29-36
32
Arquitetura de Informação e Doenças Crônicas
dos empregados eram fumantes, 54% tinham sobrepeso ou
obesidade, 42% eram sedentários. Quanto ao metabolismo
glicêmico 2,3% eram diabéticos e 16,1% referiram intolerância à
glicose. Em relação ao colesterol, 54% dos empregados estavam
com os valores acima do desejável. Apenas 4,8% referiram que
a pressão sistólica estava acima de 139 mmHg. Também, foi
possível identificar que 49,4% dos participantes utilizaram o ícone de ajuda para o cálculo do IMC, antes de
responder a questão.
O escore global médio obtido, considerando os fatores
de risco modificáveis e não modificáveis, foi de 13,4 pontos
(DP ±6,8), com mediana de 12 pontos, valor máximo de 68
e mínimo de quatro pontos. A maioria dos empregados apresentava um risco bem abaixo da média (46,3%) ou abaixo
da média (33,1%). O risco médio e moderado foi identificado em 19,3% e o risco alto ou muito alto em apenas 1,3%
dos empregados (Gráfico 2). Entre os 103 empregados que
apresentaram um escore total acima de 25 pontos, ou seja,
pelo menos com risco moderado, 54,3% estão trabalhando
nas unidades da capital.
54,0%
DISCUSSÃO
O aumento na prevalência dos casos de DCNT na
empresa pode resultar em queda de produtividade, absenteísmo, presenteísmo, invalidez, aposentadoria precoce e
aumento nos gastos com o sistema de saúde. Para reduzir
este impacto e garantir um cuidado integral à saúde do
trabalhador, é recomendado incluir um programa de gestão
dos fatores de risco para DCNT no PCMSO da empresa.
Entretanto, algumas vezes, a identificação e monitoramento
dos empregados com risco para DCNT pode ser um grande
desafio dependendo das características da empresa como,
por exemplo, com grande número de funcionários distribuídos em vários estabelecimentos, numa área de abrangência estadual. Sendo assim, o objetivo deste estudo foi
demonstrar, através de uma análise preliminar, como a arquitetura de informação pode ajudar na gestão dos riscos para
DCNT em uma empresa.
A implantação de um questionário de avaliação de
risco para a saúde, dentro de um sistema de informação,
43,3%
53,9%
42,0%
33,1%
14,5%
16,1%
9,0%
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Gráfico 1. Distribuição de fatores de risco para doenças crônicas
não transmissíveis na amostra do estudo.
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1,0%
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2,3%
4,8%
4,8%
Gráfico 2. Distribuição dos trabalhadores conforme escore
e o grau de risco para doenças crônicas não transmissíveis.
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):29-36
33
Hyeda A et al.
demonstrou ser uma estratégia de rápido desenvolvimento
e fácil execução. Foi possível divulgar a informação para um
grande número de estabelecimentos (264), alcançando
a maior parte dos empregados (92,3%), de forma rápida
(uma semana). Apesar da ampla divulgação, apenas 28%
dos empregados responderam todas as questões. Como
não foi utilizado um contador de acesso ao sistema, não foi
possível identificar o número real de empregados que acessaram o questionário, mas não o finalizaram (por exemplo,
que não sabiam a resposta de pelo menos uma das questões).
O desenvolvimento de um ícone ajuda para cada questão
foi importante, pois contribuiu na compreensão e nas
respostas das perguntas. Muitos participantes recorreram
a esse recurso para responder o seu IMC (49,4%). Porém,
não foi possível contabilizar qual foi o número de acesso aos
ícones de ajuda referentes as demais questões.
Considerando que 63,4% dos estabelecimentos da
empresa apresentavam menos de dez empregados, era
esperado ocorrer poucas participações por unidade (6,3
empregados, em média). Foi percebido que os estabelecimentos com menor número de empregados e localizados
no interior do Estado representaram o maior número de
falha na divulgação do convite (16,7%). Acredita-se que o
número de participantes poderia ser maior se houvesse um
período de divulgação da pesquisa mais prolongado, e se
o convite fosse reiterado no correio eletrônico pessoal de
cada trabalhador, principalmente daqueles que não responderam ao questionário.
Quanto ao resultado da avaliação de risco para DCNT,
foi obtido um escore global médio relativamente baixo
(13,4 pontos), inferior ao resultado encontrado no estudo
de Moreira et al.10 de 17,8 pontos, e no estudo de Moura
et al.18 de 22,5 pontos. Além da avaliação global de risco,
o sistema permitiu calcular o escore médio por empregado, por estabelecimento e por cidade. Na amostra, foi
identificada uma maior concentração de empregados com
escore elevado trabalhando nas unidades da capital. Essa
informação pode contribuir no planejamento de ações no
controle das DCNT de acordo com o perfil de saúde dos
empregados em cada região.
Foi possível também identificar os empregados críticos
ou com alto risco para doenças crônicas (escore acima de 32
pontos). Considerando que o número de casos foi pequeno
(1,3%), recomenda-se que sejam monitorados rigorosamente através de um programa de gerenciamento de
casos críticos para DCNT. O telemonitoramento pode
ser uma estratégia no acompanhamento da aderência ao
tratamento e às consultas médicas, assim como no seguimento dos indicadores de saúde destes trabalhadores
(redução de peso, atividade física, controle do diabetes,
hipertensão e dislipidemia)4.
Outro ponto positivo do sistema foi facilitar a investigação de cada variável isoladamente na amostra. Neste caso,
três fatores de risco se destacaram: o sedentarismo (42%),
a hipercolesterolemia (54%), o sobrepeso e obesidade
(54%). Com objetivo de avaliar o impacto dos resultados
encontrados, recorremos ao estudo brasileiro de vigilância
de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por
inquérito telefônico12. Trata-se de uma pesquisa realizada
anualmente desde 2006 em todas as capitais dos 26 Estados
brasileiros e no Distrito federal, através de inquérito telefônico, com objetivo de monitorar a frequência e distribuição dos principais determinantes de DCNT no Brasil.
Na publicação referente ao ano de 2012, foi demonstrado
que o sedentarismo na população brasileira foi de 14,9%
e o sobrepeso e obesidade representaram 68% dos casos.
Segundo estudo na população norte-americana, publicado
na American Heart Association em 2014, estes valores foram
de 30 e 68%, respectivamente, sendo 57,2% com hipercolesterolemia11. Sendo assim, é possível verificar que o
sedentarismo foi o fator crítico nesta população. Apesar
da hipercolesterolemia, assim como a obesidade e o tabagismo estarem abaixo dos valores encontrados na população
geral brasileira, deve-se reconhecer que a prevalência deles
é importante e precisa ser considerada no plano de ação
contra a DCNT nesta população.
Considerando que o sistema permitiu identificar o perfil
de saúde de cada empregado, é possível levantar os grupos de
risco por variável e realizar uma ação direcionada para cada
situação. Por exemplo, espera-se que um programa contra o
tabagismo seja mais efetivo se divulgado entre aqueles que
apresentam o fator de risco.
A redução do impacto das DCNT na saúde do trabalhador depende da participação ativa e do autocuidado à
saúde2,4. Espera-se que o preenchimento do questionário e a
demonstração dos resultados (risco de adoecimento), além
de contribuírem no autoconhecimento da saúde, seja um
estimulo ao participante para identificar as oportunidades
de melhorias nos hábitos de vida. Como forma de incentivar
o trabalhador à autogestão da saúde, são propostas algumas
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):29-36
34
Arquitetura de Informação e Doenças Crônicas
melhorias no sistema. Além de demonstrar o escore global e
o escore por fator de risco após o primeiro preenchimento
do questionário, recomenda-se que seja disponibilizado um
novo acesso ao sistema para que o trabalhador possa simular
qual seria o seu novo escore se houvesse uma modificação no
seu estilo de vida. Outra sugestão é a reaplicação periódica do
questionário (por exemplo, a cada seis meses), permitindo ao
trabalhador fazer uma análise temporal dos seus riscos. Neste
caso, recomenda-se que o histórico do registro das informações esteja disponível em cada participação do empregado.
Para implantação da metodologia na empresa há necessidade de um sistema de informação com acessibilidade para
todos os trabalhadores. Além disso, os participantes devem
ter conhecimento para utilizar o correio eletrônico e a rede
cliente/servido Web. Apesar das orientações disponibilizadas para cada questão, salienta-se que o preenchimento
das questões depende da interpretação de cada participante,
sem a intervenção do pesquisador. Sendo assim, deve-se
ressaltar que o alto grau de instrução dos participantes contribuiu para o desenvolvimento deste projeto. Verifica-se que
o questionário utilizado foi estudado na avaliação de risco
coronariano e, portanto, não contempla a investigação de
alguns fatores relacionados às DCNT, como o uso de bebida
alcoólica, o perfil nutricional, o risco de câncer. Na avaliação
da hipertensão arterial, sugere-se acrescentar uma questão
perguntando se o empregado esta tomando medicação
ou se já recebeu a informação de um médico, pelo menos
duas vezes, de que tinha pressão alta (casos de hipertensão
controlada). Na avaliação da hipercolesterolemia, sugerese perguntar se o trabalhador esta tomando alguma medicação (casos de dislipidemia controlada).
CONCLUSÃO
A gestão dos fatores de risco para DCNT deve ser considerada no programa de saúde ocupacional da empresa para
garantir o cuidado integral da saúde do trabalhador. A arquitetura de informação pode contribuir na gestão dos riscos
para DCNT, ou seja, no desenvolvimento de um sistema de
avaliação de riscos, na divulgação da informação, na análise
dos resultados e no planejamento de ações. Futuros estudos
servirão para verificar a viabilidade do uso da arquitetura de
informação no gerenciamento dos resultados de programas
implementados na empresa contra as DCNT, assim como
no incentivo à autogestão da saúde dos trabalhadores.
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Unipar. 2008;12(3):213-9.
Endereço para correspondência: Adriano Hyeda – Rua José Loureiro, 195 –
12° andar – Centro − CEP: 80010-000 − Curitiba (PR), Brasil –
E-mail: [email protected]
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):29-36
36
ARTIGO
ORIGINAL
Recebido: 29/08/2014
Aceito: 19/02/2015
Fonte de financiamento: nenhuma
Patologias osteomusculares como causa de
aposentadoria por invalidez em servidores
públicos do município de São Luís, Maranhão
Musculoskeletal pathology as a cause of disability retirement for public
servants in the municipality of São Luís, Maranhão
Graça de Fátima Pereira Almeida1, Maria Hilda Araújo Ribeiro2,
Marcos Antonio Custódio Neto da Silva2, Rebeca Costa Castelo Branco2,
Flávia Coelho Mohana Pinheiro3, Maria do Desterro Soares Brandão Nascimento2
RESUMO | Introdução: É evidente a preocupação do governo em regulamentar as ações relacionadas à saúde. É passível de aposentadoria
por invalidez o servidor acometido de espondilite anquilosante e outras doenças osteomusculares. Objetivo: Descrever o perfil de morbidade
por patologias osteomusculares dos servidores públicos do município de São Luís aposentados por invalidez. Materiais e Métodos: Trata-se
de um estudo observacional, descritivo e retrospectivo, de 60 fichas de funcionários contendo informações registradas pela Comissão de
Perícia Médica no período de janeiro de 2009 a dezembro de 2011. Calculou-se como indicador de impacto da aposentadoria por invalidez
em doenças osteomusculares os somatórios dos anos perdidos em decorrência da aposentadoria. A condução do estudo recebeu anuência
da Comissão de Perícia Médica do IPAM e dos funcionários por meio do Termo de Compromisso de Utilização de Prontuários e Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido. Resultados: A análise de aposentadoria por invalidez em razão do diagnóstico por patologias osteomusculares demonstra que ocorreu prevalência do sexo masculino (90%) na faixa etária de 61 a 65 anos, e as profissões mais acometidas
foram professores e agente administrativo. As patologias osteomusculares ocorreram em 10% da amostra do estudo, e os profissionais que
mais se aposentaram por invalidez tipo integral e/ou proporcional foram agente administrativo e auxiliar de serviços gerais. Conclusão:
O estudo mostra a necessidade de promoção de saúde e vigilância em relação à saúde do trabalhador, propiciando melhores condições de
trabalho e reduzindo o adoecimento dos servidores, diminuindo o número de aposentadoria por invalidez por patologias osteomusculares.
Palavras-chave | anormalidades musculoesqueléticas; exames médicos; São Luís – MA.
ABSTRACT | Background: It is clear the concern of governments to discipline the actions related to health. It is likely to disability retirement
the server stricken with ankylosing spondylitis and other musculoskeletal diseases. Objective: Describe the morbidity profile for musculoskeletal pathologies of public in São Luís retired due to disability. Materials and Methods: This was an observational, descriptive and retrospective,
study of 60 employee records containing information recorded by the Commission of Forensic Medicine between January 2009 and December
2011. The sums of years lost due to retirement were calculated as an indicator of the impact of disability retirement in musculoskeletal diseases. The
conduct of the study received approval from the Commission of Forensic Medicine Division of IPAM and staff through the Commitment Term
Use of Medical Records and Statement of Consent. Results: The analysis of disability retirement due to musculoskeletal disorders diagnosis shows
that occurred primarily in men (90%) aged 61 – 65 years, and the professionals most affected were teachers and administrative agent. The musculoskeletal disorders occurred in 10% of the study sample, and the most retired for disability integral type and/or proportional were administrative
agent and assistant general services. Conclusion: The study shows the need for health promotion and surveillance in relation to workers’ health,
providing better working conditions and reducing illness among servers, reducing the number of disability pension for musculoskeletal pathologies.
Keywords | musculoskeletal pathology; medical examination; São Luis – MA.
Trabalho realizado na Universidade Federal do Maranhão – São Luís (MA), Brasil.
Instituto de Previdência e Aposentadoria do Município – São Luís (MA), Brasil.
1
Curso de Medicina da Universidade Federal do Maranhão, Campus de Pinheiro (UFMA) – São Luís (MA), Brasil.
2
Curso de Medicina da Universidade CEUMA – São Luís (MA), Brasil.
3
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):37-44
37
Almeida GFP et al.
Dedica-se à avaliação da capacidade laborativa, é
um profissional especializado, com atribuição de
pronunciar-se conclusivamente sobre condições
de saúde e capacidade do examinado, para fins de
ingresso no Serviço Público, concessões de licenças
para tratamento de saúde, readaptação de função e
para fins de aposentadoria nos casos de invalidez.
INTRODUÇÃO
Os avanços conquistados pela humanidade, além dos
benefícios, ocasionam problemas à saúde dos trabalhadores.
As relações de consumo são predominantes no modo de ser
e agir dos indivíduos, as inovações tecnológicas e as intensas
transformações do mundo globalizado tendem a acarretar
profundas mudanças no modo de viver das pessoas, inclusive no âmbito profissional1.
O julgamento da capacidade laborativa dos segurados da
Previdência Social que solicitam benefício por incapacidade,
o auxílio-doença, é atribuição da Perícia Médica, contudo o
acesso ao benefício implica reconhecimento da existência
de doença e de sua repercussão sobre a condição laborativa1.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) fundamenta
as definições de deficiência e incapacidade com a utilização
conjunta da Classificação Internacional de Doenças (CID
10) e a Classificação Internacional de Funcionalidade,
Incapacidade e Saúde (CIF)2.
No Brasil, as instituições previdenciárias organizaram-se a
partir da década de 1920 por categorias profissionais segundo o
modelo contributivo clássico. Até a década de 1950, houve forte
expansão tanto da quantidade de instituições e filiados quanto
da influência do Estado sobre elas, a ponto de serem convocadas a participar do financiamento da construção de Brasília.
O sistema previdenciário brasileiro atual é dividido em
quatro blocos. O primeiro deles é constituído por um regime
que atende ao setor privado, conhecido como Regime Geral
de Previdência Social (RGPS). O segundo bloco corresponde ao sistema dos servidores públicos da União, conhecido como Regime Jurídico Único (RJU). Um terceiro
bloco reúne os diversos sistemas de servidores estatutários
estaduais e municipais. O quarto bloco, de caráter privado
e facultativo, é constituído pelos fundos de pensão patrocinados por empresas privadas ou estatais (previdência
complementar fechada) e pelas entidades abertas de previdência complementar3.
As doenças osteomusculares, principalmente as
LER-DORT, epidemiologicamente ocupam o segundo
lugar como causa de doenças entre os trabalhadores do país4.
A preocupação dos governos em disciplinar as normas
jurídicas próprias, embasadas em conhecimentos científicos
atuais, são evidentes nas últimas décadas5.
O médico perito, como exemplo desse aspecto normatizador
da esfera pública, segundo descrição de Sogayar6, é aquele que:
Segundo a Lei no 8.112/90, é passível de aposentadoria
por invalidez o servidor acometido de tuberculose ativa, alienação mental, neoplasia maligna, esclerose múltipla, cegueira
posterior ao ingresso no serviço público, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de
Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave,
estados avançados de Paget (osteíte deformante) e síndrome
de imunodeficiência adquirida. Essa lei descortina a possibilidade de inclusão de outras doenças para concessão de
aposentadoria integral por invalidez.
A ampliação das doenças incapacitantes foram ampliadas
segundo a Portaria Interministerial no 2.998 de 2001, a qual
publicou nova lista de doenças tidas como incapacitantes,
acrescentando as já contempladas pela Lei no 8.112/90 e as
caracterizadas como contaminação por radiação com base
em conclusão da Medicina especializada e hepatopatia grave.
No âmbito do Serviço Público, a inexistência de uma política nacional de saúde do servidor público propiciou a estruturação de serviços de saúde e perícias com critérios diversos.
O perfil da morbidade dos servidores e as condições de
trabalho dos servidores públicos na esfera federal são desconhecidos em razão da carência de um sistema de informação
em saúde, portanto essa escassez de perfis de morbidade
dos servidores públicos ocorre também nos níveis estaduais e municipais.
O investimento em promoção à saúde, principalmente
no que diz respeito ao absenteísmo, deve compor o foco
gerencial em decorrência das doenças dos servidores, o que
vinha sendo relegado1.
O compromisso de construção de uma política de atenção
à saúde do servidor público resultou, em 2009, na criação de
um Subsistema de Atenção à Saúde do Servidor (SIASS).
A organização estrutural do SIASS compreende os eixos de
Promoção e Vigilância à Saúde, Assistência e Perícia, que
são fundamentadas pela Epidemiologia, trabalho multidisciplinar, diálogo entre os três eixos e avaliação dos ambientes
e relações de trabalho.
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):37-44
38
Patologias Osteomusculares e Aposentaria em São Luís
Em 2006, foram registrados 7,2 mil casos de lesões de
ombro e, em 2007, 18,9 mil (aumento de 163%). Os casos de
sinovite e tenossinovite aumentaram 126%, ou seja, de 9.845
para 22.217 casos em 2007. Em 2008, esse número foi crescente, principalmente com relação à doença do trabalho7,8.
As patologias osteomusculares são importantes causas
de aposentadorias por invalidez. Uma parcela significativa de
pacientes diagnosti­cados como portadores de distúrbios
osteomusculares desenvolve dor crônica e enfrenta importante limita­ção, ou mesmo incapacidade, para a reinserção
pro­dutiva, o que se constitui em grande desafio para pa­cientes
e médicos, e em alto custo social e econômico para o país9.
Os escassos estudos epidemiológicos sobre a classificação
das patologias osteomusculares relacionadas à aposentadoria
por invalidez tornam necessárias novas investigações, especialmente no serviço público municipal de São Luís, sendo
este o pioneiro no registro de casos de aposentadoria do
tipo integral e proporcional no período de janeiro de 2009
a dezembro de 2011.
Município (IPAM) e dos funcionários por meio do Termo
de Compromisso de Utilização de Prontuários e Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido. Para análise estatística
foi feito um estudo descritivo dos dados sociodemográficos,
anamnese, exames clínicos, radiológicos e laboratoriais,
informações sobre ocorrência de doenças osteomusculares.
RESULTADOS
No período de 2009 a 2011, a Coordenação de Perícia
Médica do município de São Luís atendeu a todos os servidores efetivos. Entre os funcionários atendidos, encontram-se
servidores da Secretaria Municipal de Administração –
SEMAD (251 funcionários); Secretaria Municipal de
Educação – SEMED: magistério (5.630 professores) e administrativos (1.685 funcionários); Secretaria Municipal de
Saúde – SEMUS (3.934 funcionários); Secretaria Municipal
de Obras e Serviços Públicos – SEMOSP (305 funcionários); Secretaria Municipal de Trânsito e Transportes – SMTT
(777 funcionários); Hospital Municipal Djalma Marques –
HMDM (1.159 funcionários); Secretaria Municipal de
Urbanismo e Habitação – SEMUH (236 funcionários),
além de outros (Figura 1).
Foram estudados 60 funcionários públicos com diagnóstico de patologias incapacitantes registrados pela Coordenação
de Perícia Médica do município de São Luís do Maranhão, no
OBJETIVOS
Objetivou-se descrever o perfil de morbidade por patologias osteomusculares dos servidores públicos do município de São Luís, Maranhão, aposentados por invalidez.
METODOLOGIA
8.000
Trata-se de um estudo observacional, descritivo e retrospectivo, tendo como base os dados obtidos das 60 (sessenta)
fichas de funcionários contendo informações registradas pela
Comissão de Perícia Médica, que incluíram variáveis sociodemográficas, clínicas e previdenciárias relativas às perícias
ambulatoriais dos grupos de causa com diagnóstico principal
em conformidade com o CID-10, registrados no período de
janeiro de 2009 a dezembro de 2011. Utilizaram-se as fichas
clínicas dos funcionários que receberam a concessão de
aposentadoria por invalidez, em especial aqueles com doenças
osteomusculares. Calculou-se como indicador de impacto
da aposentadoria por invalidez em doenças osteomusculares
os somatórios dos anos perdidos em razão da aposentadoria.
A condução do estudo recebeu anuência da Comissão de
Perícia Médica do Instituto de Previdência e Assistência do
7.000
6.000
5.000
4.000
3.000
2.000
1.000
0
Nº Funcionários
SEMAD
SEMED
SEMUS
SEMOSP
SMTT
HMDM
SEMUH
Figura 1. Distribuição dos servidores ativos, segundo a origem.
IPAM, São Luís, Maranhão, 2009–2011.
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):37-44
39
Almeida GFP et al.
período de janeiro de 2009 a dezembro de 2011 (Tabela 1).
Observa-se ainda que houve predomínio da aposentadoria
tipo integral (Tabela 2).
Evidenciam-se na Tabela 3 os grupos de causas relacionadas às aposentadorias por invalidez, destacando-se
neoplasias (12/60; 20%), doenças do aparelho circulatório
(10/60; 16,67%), seguindo-se de doenças osteomusculares
(10/60; 16,67%), entre outras.
Em relação à faixa etária, evidenciou-se predomínio
da idade entre 61 e 70 anos (37%). Em relação ao gênero,
o feminino foi o mais frequente entre todos os grupos de
causa (55,00%).
Na Figura 2, evidenciam-se as profissões dos servidores
aos quais foram concedidos os benefícios de aposentadoria por invalidez no período de estudo. Observa-se que
foram mais frequentes as profissões: agente administrativo,
professor, auxiliar de serviços gerais e técnico de nível superior, entre outros.
Os profissionais em estudo eram originariamente vinculados às Secretarias SEMED e SEMUS e ao Hospital
Municipal Djalma Marques, entre outros (Figuras 2 e 3).
No período de 2009 a 2011, foram aposentados 14 servidores por patologias osteomusculares. Destes, 9 (64%) eram
do sexo masculino, 50% estavam na faixa etária de 61 a 65
anos e foram predominantemente oriundos da SEMED. As
profissões mais acometidas por patologias osteomusculares
foram professores e agente administrativo, seguindo-se de
auxiliares de serviços gerais.
Em relação à aposentadoria por invalidez e ao tempo de
exercício da função pública, observa-se que 10 (6%) servidores receberam a concessão desse benefício por patologias
Tabela 3. Aposentadorias por invalidez segundo grupos de
causas, IPAM, em São Luís, Maranhão, 2009–2011.
Grupos de causas
Tabela 1. Distribuição das aposentadorias registradas pelo
IPAM no período de 2009 a 2011, em São Luís, Maranhão.
Número
%
Algumas doenças infecciosas e
parasitárias
1
1,66
Neoplasias
12
20
Doenças do sangue
0
0
Doenças endócrinas
5
8,33
Transtornos mentais
3
5
Doenças do sistema nervoso
6
10
Doenças do olho
7
11,67
1
1,67
Número
%
Doenças do ouvido
2009
18
30
Doenças do aparelho circulatório
10
16,67
2010
28
46,7
Doenças do aparelho respiratório
3
5
2011
14
23,3
Doenças do aparelho digestivo
0
0
Total
60
100
Doenças da pele
0
0
Doenças do sistema osteomuscular
10
16,67
Doenças do aparelho geniturinário
0
0
Gravidez, parto e puerpério
0
0
Algumas afecções originadas no
período perinatal
0
0
Malformações congênitas
0
0
Ano/Aposentadoria
Tabela 2. Distribuição das aposentadorias registradas pelo
IPAM no período de 2009 a 2011, segundo o tipo, em São
Luís, Maranhão.
Aposentadoria/
Ano
Tipo de aposentadoria
Integral
n (%)
Proporcional
n (%)
Total
n (%)
2009
17 (94,4)
1 (5,6)
18 (100,0)
Sintomas, sinais e achados anormais de
exames
0
0
2010
18 (64,3)
10 (35,7)
28 (100,0)
Lesões, envenenamento...
2
3,33
2011
14 (100,0)
0
14 (100,0)
Causas externas
0
0
Total
49 (81,7)
11 (18,3)
60 (100,0)
Total
60
100
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):37-44
40
Patologias Osteomusculares e Aposentaria em São Luís
osteomusculares. Quanto à evolução desse grupo de causas,
ocorreu óbito em apenas um paciente, o qual viveu 63 anos
de vida, tendo trabalhado 20 anos (Tabela 4).
DISCUSSÃO
O trabalho humano, conforme Dejours10, é fonte de
realização, satisfação e prazer, estruturando e conformando
o processo de identidade dos sujeitos, mas também pode
transformar-se em elemento patogênico, tornando-se
nocivo à saúde. No ambiente de trabalho, os processos
de desgaste do corpo por patologias osteomusculares são
determinados em boa parte pelo tipo de trabalho e pela
forma como está organizado, portanto as doenças musculoesqueléticas e a dor crônica interferem nas atividades
diárias laborativas.
Na Perícia Médica do INSS do Rio de Janeiro, entre 2001
e 2003, verificou-se que hérnia de disco (11%), transtornos
mentais (10,5%), doenças cardiovasculares (10,5%) e tendinites/tenossinovites (8,5%) foram doenças predominantes,
contudo esses dados são relativos somente à concessão de
0
10
20
30
40
Secretarias do Município de São Luís
SENUD
GMSL
Instituto
Municipal
SEMOSP
Hospital Municipal
Djalma Marques
SEMUS
SMTT
SEMAD
Profissões
Figura 3. Distribuição das aposentadorias por invalidez, segundo
origem. IPAM, São Luís, Maranhão, 2009–2011.
0
2
4
6
8
10
12
14
16
Número de funcionários
Operador de máquinas pesadas
Motorista
Guarda municipal
Auxiliar de obras
Especialista em Educação
Art. obras de serviços públicos
Vigia
Técnico/a de nível superior
Auxiliar de serviços gerais
Professor/professora
Agente administratico/a
Figura 2. Distribuição das aposentadorias por invalidez, segundo as profissões. IPAM, São Luís, Maranhão, 2009–2011.
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):37-44
41
18
Almeida GFP et al.
benefícios por incapacidade laborativa, não sendo contempladas as aposentadorias por invalidez11.
Neste trabalho sobre patologias osteomusculares em
São Luís detectou-se, por análise dos grupos de causas relacionadas às aposentadorias por invalidez, que neoplasias
(12/60; 20,00%), doenças do aparelho circulatório (10/60;
16,67%) e doenças osteomusculares (10/60; 16,67%) foram
predominantes, contudo se referem à aposentadoria por
invalidez integral e/ou proporcional.
Segundo Ferreira1, o percentual de invalidez feminina
como causa do grupo de doenças osteomusculares foi mais
frequente quanto aos dados obtidos pela Perícia Médica
no Rio de Janeiro, os quais estão em desacordo com os
achados analisados pela Coordenação de Perícia Médica do
Tabela 4. Distribuição de aposentadoria por invalidez em decorrência de doenças osteomusculares de funcionários públicos do
município de São Luís, Maranhão, 2009–2011.
Profissão
Patologia
Gênero
Exame
Data de
Idade
admissional
nascimento (anos) M F
(anos)
Cio da
licença
médica
Tempo de
Evolução
serviço
Data da
Tipo de
Vivo (V)
trabalhado aposentadoria aposentadoria
Óbito (O)
(anos)
Agente
administrativo
Sinovite e
tenosinovite
21/07/1955
57
1
2/05/1988
06/04/2006
18
29/11/2010
Proporcional/
SEMED
V
Agente
administrativo
Sinovite e
tenosinovite
10/04/1960
52
1
16/11/1992
15/09/2007
15
13/05/2010
Proporcional/
SMTT
V
Sinovite e tenosinovite + neopla- 14/02/1950
sia de mama
62
1
30/10/1987 20/06/2008
21
20/01/2011
Integral/
SEMUS
V
Técnica
nível
superior
(médica)
Professor
Espondilite
anquilosante
23/03/1959
53
1
02/04/1980
11/10/2006
26
11/03/2009
Integral/
SEMED
V
Auxiliar
de obras
e serviços
públicos
Espondilite
anquilosante
12/08/1949
63
1
03/08/1987
29/01/2007
20
10/02/2009
Integral/
SMOSP
O
Auxiliar de
serviços
gerais
Espondilite
anquilosante
03/12/1953
58
1
09/02/1988 29/05/2007
19
25/11/2009
Proporcional/
SEMED
V
Agente
administrativo
Espondilite
anquilosante
04/10/1950
62
1
01/08/1984
23/01/2007
23
28/09/2010
Integral/
SEMED
V
Auxiliar de
serviços
gerais
Espondilopatias 09/10/1962
62
1
10/01/1983
04/03/2007
24
19/01/2010
Proporcional/
SEMED
V
Motorista
Espondilopatias+
cegueira em
um olho e visão 11/12/1960
subnormal em
outro
51
13/06/1986
01/02/2006
20
22/04/2010
Integral/
HMDM
V
02/10/1985
06.12.2007
22
25/11/2009
Proporcional/
HMDM
V
Auxiliar de
serviços
gerais
Gonartrose
22/01/1943
67
1
1
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):37-44
42
Patologias Osteomusculares e Aposentaria em São Luís
município de São Luís, Maranhão, em que se verificou que
o sexo masculino (90%) foi predominante, como também
os servidores na faixa etária de 61 a 65 anos, oriundos da
Secretaria de Educação do município, sendo as profissões
mais acometidas os agentes administrativos e auxiliares de
serviços gerais.
As evidências desses achados em São Luís suscitam
programas de promoção à saúde e reabilitação de trabalhadores. O processo de trabalho desses servidores públicos
deve ser estudado, principalmente no que tange à carga
horária extrapolada, levando-se em conta a dupla jornada
de trabalho e a maior tendência à obesidade e ao sedentarismo, pois, de dez casos de aposentadoria por invalidez,
três ocorreram em decorrência de tenossinovite.
As patologias osteomusculares dos servidores em estudo
indicam a necessidade de complementar a renda familiar,
por ser insuficiente, com outros trabalhos.
A carga horária média semanal de trabalho em todas as
escolas (em sala de aula e atividades extraclasse) foi elevada.
A essa carga horária ainda devem ser somadas as horas para a
preparação de aulas, os deslocamentos de uma escola para
outra e as atividades domésticas.
Delcor et al.12, estudando as condições de trabalho
e saúde dos professores da rede de ensino de Vitória
da Conquista, Bahia, Brasil, verificou que os professores estudados representam uma população jovem,
principalmente do sexo feminino, casadas e com nível
de escolaridade superior. Esses dados sociodemográficos e de escolaridade discordam dos achados em São
Luís do Maranhão, onde os servidores ocupam a faixa
etária de 61 a 65 anos. Ademais, esses pesquisadores da
Bahia ressaltaram que a proporção de professores do
sexo masculino vem aumentando no ensino médio em
relação ao pré-escolar, concordando com os achados
em São Luís. Sanchez et al., estudando a dor osteomuscular em professores de nível superior, verificaram que
as dores musculoesqueléticas foram observadas com
maior incidência em região lombar, pescoço/região
cervical e ombro13.
O Ministério da Saúde em 2001 destacou que os
esforços repetidos, trabalho em postura estática contínua,
exigência de força, condições organizacionais desfavoráveis, exposição à vibração e ao frio, sobrecarga contínua
das estruturas anatômicas ou falta de tempo para se recuperar no trabalho constituem os fatores favorecedores para
a ocorrência por lesões por esforços repetitivos (LER)
e distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho
(DORT), portanto LER/DORT. Esses fatores interagem
com a diversidade de características individuais, sociais e
culturais dos trabalhadores14.
Os achados desta investigação de patologias osteomusculares em servidores públicos de São Luís, Maranhão,
evidenciam que foram mais frequentes as profissões:
agente administrativo e auxiliar de serviços gerais, entre
outros técnicos.
Os servidores municipais em estudo, portadores de
patologias osteomusculares, que conceberam aposentadoria do tipo integral e/ou proporcional desempenharam
atividades profissionais resultantes dos fatores de risco de
LER/DORT, isto é, desenvolveram a função de agente
administrativo e auxiliar de serviços gerais, executando,
portanto, movimentos repetitivos na realização de suas
tarefas diárias, tendo relação com a temporalidade dessa
repetitividade imposta pelo modo como está organizado
o trabalho.
Esses servidores que receberam a aposentadoria por
invalidez permaneceram no processo durante três anos
em média, inclusive um deles era portador de espondilite
anquilosante, que evoluiu para óbito após dois anos do recebimento do benefício.
Segundo Diniz et al.15, o alargamento da compreensão da
deficiência pelos médicos peritos corresponde a um movimento internacional de não mais descrever a deficiência
em termos estritamente médicos da lesão, mas como resultado de uma relação complexa entre lesões, desigualdades
e meio ambiente.
Silva et al.16 estudaram as afecções musculoesqueléticas, principalmente as lombalgias e algias dos membros
superiores, entre as doenças crônico-degenerativas no que
diz respeito ao perfil de morbidade em diversos países.
Segundo análises, o custo anual com desordens musculoesqueléticas tem sido estimado entre 1,0 e 2,5% do
produto nacional bruto de países como Estados Unidos,
Inglaterra, França e Austrália. Nos Estados Unidos, essas
afecções, principalmente as da coluna, são a segunda
causa mais importante de afastamento temporário do
trabalho no país.
No Brasil, as doenças do sistema musculoesquelético
figuram como a terceira causa de aposentadorias por invalidez e a primeira causa de auxílio-doença17.
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):37-44
43
Almeida GFP et al.
O custo dos cuidados de pacientes com artrite reumatoide e
espondilite anquilosante é relevante na produtividade perdida18.
Luz 19 considera ainda importante a ser levado em conta
o papel do adoecimento e da cura, que requer o entendimento do processo histórico o qual envolve os projetos
de cura dos doentes, numa abrangência de espectro maior
que as centradas nas condições psicobiológicas da doença.
Os avanços quanto ao conhecimento de dados sobre a
aposentadoria por invalidez do tipo integral e/ou proporcional em São Luís, Maranhão, proporcionarão à gestão municipal fundamentos de promoção à saúde dos servidores, em
especial no campo da Perícia Médica, em que o perito deverá
honrar e exercer os preceitos do Código de Ética Médica.
CONCLUSÕES
O estudo sobre aposentadoria por invalidez das
patologias osteomusculares caracteriza a incapacidade
laborativa no Serviço Público Municipal de São Luís,
Maranhão.
Por meio desse estudo retrospectivo, a análise da série
histórica dos casos de aposentadoria por invalidez dos servidores de São Luís de 2009 a 2011 apresentou uma variabilidade em relação ao gênero, havendo predominância
no sexo masculino para as aposentadorias por invalidez
por patologias osteomusculares, diferindo, portanto, dos
grupos de causa.
REFERÊNCIAS
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racionalidades médicas e atividades corporais. Rio de Janeiro:
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Endereço para correspondência: Maria do Desterro Soares Brandão
Nascimento – Universidade Federal do Maranhão, Cidade Universitária –
Avenida dos Portugueses, 1966 – Bacanga – Prédio do CCBS, bloco 3, sala 3A –
CEP: 65080-805 – São Luís (MA), Brasil – E-mail: [email protected]
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):37-44
44
REVISÃO
DE LITERATURA
Recebido: 24/03/2014
Aceito: 18/06/2014
Fonte de financiamento: nenhuma
Silicose e esclerose sistêmica
(síndrome de Erasmus): a importância do
reconhecimento da associação entre doenças
Silicosis and systemic sclerosis (Erasmus syndrome): the importance of the
recognition of the association between diseases
Juliana Augusta Spinelli da Silva Teles1
RESUMO | Contexto: Silicose é uma doença pulmonar ocupacional crônica, fibrogênica, de evolução lenta, caráter progressivo
e irreversível, causada pela exposição à sílica livre. Esclerose sistêmica (ES) é uma doença de caráter autoimune, com alterações
vasculares e fibrose tecidual difusa. Associação entre ambas, denominada síndrome de Erasmus, já é conhecida há vários anos e
geralmente ocorre após 15 anos do início da exposição à sílica. Objetivo: Revisão da literatura referente à associação entre silicose
e ES. Método: Selecionados artigos nacionais e internacionais obtidos na íntegra, referentes à pneumoconiose, silicose, ES e a associação entre essas duas últimas doenças, sendo incluídos aos resultados os manuscritos que abrangiam especificamente a síndrome
de Erasmus. Resultados: Encontrados na literatura nacional relatos de casos de síndrome de Erasmus, os quais apresentavam ES e
exposição prévia à sílica com duração que variou de 2 a 15 anos, atividade laboral interrompida há mais de 7 anos, pacientes do sexo
masculino, média de idade 46 anos, sendo a principal atividade jateamento de areia; e havia relato em 3 casos de uso inapropriado de
equipamentos de proteção. Entre os cinco casos em que a tuberculose foi investigada, três apresentaram a associação entre tuberculose pulmonar e síndrome de Erasmus. Conclusão: Importância do reconhecimento precoce da associação entre silicose e ES, dando
ênfase na história ocupacional. O diagnóstico da síndrome de Erasmus por pneumologistas, reumatologistas e médicos do trabalho
permitirá intervenções mais efetivas e um tratamento precoce, que proporcionarão um melhor prognóstico para esses pacientes.
Palavras-chave | pneumoconiose; silicose; escleroderma sistêmico.
ABSTRACT | Context: Silicosis is a chronic occupational lung disease, fibrogenic, slowly evolving, progressive and irreversible,
caused by the exposure to silica. Systemic sclerosis (SSc) is an autoimmune disease with vascular changes and diffuse tissue fibrosis.
The association between both, called Erasmus syndrome, has been known for several years and usually occurs after 15 years from the
beginning of exposure to silica. Objective: To review the literature regarding the association between silicosis and SSc, known as
Erasmus syndrome. Method: Selected national and international articles retrieved in full, related to pneumoconiosis, silicosis, SSc
and the association between these two last diseases; manuscripts which specifically dealt Erasmus syndrome were included in the
results. Results: Reports of Erasmus syndrome were found in the national literature, which presented SSc and previous exposure to
silica with duration ranging from 2 to 15 years of exposure, interrupted employment business for over 7 years, male patients, mean age
of 46 years, being the main activity sandblasting, and 3 cases of improper use of protective equipment were reported. Among the five
cases in which tuberculosis was investigated, three showed the association between pulmonary tuberculosis and Erasmus syndrome.
Conclusion: Importance of early recognition of the association between silicosis and SSc, with emphasis on occupational history.
The diagnosis of Erasmus syndrome by pulmonologists, rheumatologists and occupational physicians will enable more effective interventions and early treatment, which will provide a better prognosis for these patients.
Keywords | pneumoconiosis; silicosis; scleroderma systemic.
Trabalho realizado no Departamento de Pós-graduação da Universidade Camilo Castelo Branco (UNICASTELO) – São Paulo (SP), Brasil.
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) – Campo Grande (MS); Programa de Pós-graduação em Medicina do Trabalho pela UNICASTELO – São Paulo (SP), Brasil.
1
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):45-51
45
Teles JASS
INTRODUÇÃO
•
O termo silicose foi empregado pela primeira vez por
Visconti, em 1870, e caracteriza-se por fibrose pulmonar
causada pela inalação de poeira contendo sílica cristalina,
sendo a mais frequente das pneumoconioses1.
As pneumoconioses são doenças pulmonares associadas
à exposição de substâncias em forma de poeiras, sendo as
principais em nosso meio: sílica, amianto, carvão mineral
e talco2. Na maioria dos casos, a doença está relacionada à
exposição ocupacional2.
A inalação de poeira com sílica está associada à ocorrência
de silicose, doença pulmonar obstrutiva crônica, câncer de
pulmão, insuficiência renal e aumento do risco de tuberculose pulmonar e de doenças autoimunes1-3.
A sílica ou dióxido de silício é um composto natural
formado pelos dois elementos químicos mais abundantes
na crosta terrestre, o oxigênio e o silício. É encontrada na
natureza nas formas amorfa e cristalina. A forma amorfa,
embora não seja inerte, é menos tóxica do que a cristalina1.
Conhecidos desde a Antiguidade, no Egito, Grécia e
Roma, em atividades de mineração, de construção e na
produção de peças decorativas, o emprego e o risco de exposição à sílica cresceram com o processo de industrialização1.
No Brasil, estima-se que o número de trabalhadores
potencialmente expostos a poeiras contendo sílica seja
de aproximadamente 6 milhões, configurando um potencial problema de saúde pública, em especial no campo da
saúde do trabalhador e do meio ambiente4,5, sendo que as
atividades que apresentam o maior risco de exposição são5:
• indústria extrativa: mineração e atividades de extração,
beneficiamento de pedras que contenham o mineral;
• perfuração de rochas em mineração de não metálicos:
como exemplo, a mica e o feldspato;
• construção civil: em várias etapas da obra como nas
fundações, acabamento, corte de azulejos e de pedras,
misturas de cimento e areia;
• perfuração de rochas: construção de túneis, barragens e estradas;
• jateamento de areia: utilizado na indústria naval, na
opacificação de vidros, na fundição e no polimento
de peças na indústria metalúrgica e em várias situações de
manutenção. É uma das operações de maior risco para
silicose e que vem apresentando os casos mais graves
da doença; está proibida no Brasil desde 2005;
•
•
•
•
•
•
•
•
•
•
fundição de ferro, aço e outros metais: em particular
onde se utilizam moldes de areia;
indústrias cerâmicas: fabricação de pisos, azulejos,
louças sanitárias e domésticas e outros, sendo que no
setor de acabamento o risco é bem acentuado;
produção, uso e manutenção de tijolos refratários;
fabricação de vidros: tanto na preparação como também
no uso de jateamento de areia usado para opacificação;
moagem de quartzo e pedras: para diversos fins;
construção de fornos refratários: particularmente no
corte do material;
execução de trabalhos diversos, artesanatos e acabamento em mármore, ardósia, granito e outras pedras;
fabricação de material abrasivo;
escavação de poços;
atividades de protético;
atividade agrícola de aragem.
O risco de desenvolvimento de silicose depende da
concentração, da superfície, do tamanho da partícula (partículas menores do que 1 mícron são mais tóxicas), da duração
da exposição, do tempo de latência (tempo decorrido desde
o início da exposição ao agente até os primeiros sintomas),
da forma de sílica cristalina (tridimita e cristobalita são
menos frequentes, mas mais tóxicas do que o quartzo) e do
fato das partículas serem recém-quebradas (perfuração
de poços, jateamento), provavelmente pelo maior número de
radicais na superfície, responsáveis por um maior estímulo
à produção de substâncias oxidantes1.
Em relação à apresentação clínica, a silicose divide-se em
três formas: aguda (proteinose alveolar silicótica ou silicoproteinose), acelerada e crônica (clássica)1,2. Essas formas são determinadas pela intensidade e pelo tempo de exposição à sílica1,2.
A silicoproteinose é uma forma aguda e progressiva da
doença, que se desenvolve geralmente após meses ou poucos
anos de exposição elevada a partículas de sílica, finamente
divididas e recém-quebradas, como ocorre no jateamento de
areia ou na perfuração de rochas1. É uma forma rara de apresentação e, devido a melhorias nos ambientes de trabalho,
há poucos casos na literatura recente em países desenvolvidos7. O prognóstico é ruim e a morte geralmente ocorre
após pouco tempo, de seis meses a dois anos, por insuficiência respiratória7.
A forma acelerada ocorre após um período de exposição à sílica de 5 a 10 anos. A alta concentração de poeira
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):45-51
46
Síndrome de Erasmus
em locais pouco ventilados predispõe o indivíduo a essa
forma de silicose1,2.
A crônica é a forma de apresentação mais comum e
geralmente ocorre após mais de 10 a 15 anos de exposição ou de latência1,2. Tem evolução insidiosa, sendo
inicialmente assintomática e pode evoluir com sintomas
de dispneia progressiva1.
A silicose clássica consiste em uma doença pulmonar
ocupacional crônica, fibrogênica, de evolução lenta, caráter
progressivo e irreversível, causada pela exposição à sílica livre
cristalizada8,9. O diagnóstico é estabelecido pela história de
exposição ocupacional, manifestações clínicas, com sintomas
de dispneia progressiva1 e pelas alterações radiográficas e
tomográficas do tórax, sendo esse último método o mais
sensível e específico. A presença de micronódulos difusos
e bilaterais, predominantemente em lobos superiores, e
de anéis de calcificação ganglionar (calcificação “em casca de
ovo” ou egg-shell), podem ser observadas tanto na radiografia como na tomografia computadorizada de tórax e são
características da silicose pulmonar10.
Além dos efeitos pulmonares da sílica livre, existe
associação entre esse tipo de exposição e diversas outras
enfermidades8. A associação entre silicose e tuberculose é
bastante conhecida7. A literatura mostra que a ocorrência
de tuberculose pulmonar é muito maior em silicóticos do
que em não silicóticos, e que a exposição à sílica, mesmo
sem evidências da presença de silicose, é um fator de risco
para o desenvolvimento de tuberculose pulmonar11.
Também existem vários relatos da associação entre essa
pneumoconiose e as doenças relacionadas com mecanismos
autoimunes, incluindo esclerose sistêmica (ES), artrite reumatoide (síndrome de Caplan), granulomatose de Wegener,
anemia hemolítica, dermatomiosite, síndrome de Sjögren,
doença de Graves e lúpus eritematoso sistêmico8.
A ES é uma doença de caráter autoimune, com alterações vasculares e fibrose tecidual difusa2,3,12. A associação de
exposição prévia à sílica e ES foi descrita por Erasmus em
19572,3,12,16. Essa doença do tecido conjuntivo posterior à
exposição à sílica ocorre geralmente após 15 anos do início
da exposição e a síndrome de Erasmus refere-se ao desenvolvimento de ES em indivíduos previamente expostos à
sílica e que apresentavam ou não silicose2.
A ES é uma doença inflamatória crônica do tecido conjuntivo, relacionada a distúrbios de autoimunidade e inflamação,
que determinam alterações estruturais e funcionais em
vasos de pequeno e médio calibres, evoluindo para fibrose
cutâneo-visceral progressiva, sendo a forma generalizada
da esclerodermia13,14.
O fenômeno de Raynaud é a manifestação inicial mais
frequente e caracteriza-se por episódios reversíveis de vasoespasmos de extremidades, associados à palidez, seguido por
cianose e rubor de mãos e pés, que ocorrem usualmente após
estresse ou exposição ao frio, sendo comumente associado
a lesões isquêmicas em extremidades14,15.
A ES é uma doença rara e apresenta prevalência que
varia entre 30 e 290 casos por milhão de habitantes, com
predomínio no sexo feminino (3 a 8:1), que pode aumentar
para 15:1 quando considerada a faixa etária correspondente
ao período fértil da mulher (15 a 50 anos) e diminuir para
2:1 em pacientes com início de doença acima de 50 anos de
idade. Inicia-se entre a 3ª e a 6ª década de vida, e é rara em
homens abaixo de 30 anos e em crianças e adolescentes13.
Diversos fatores estão envolvidos na etiopatogênese da ES,
destacando-se os fatores genéticos, imunológicos, ambientais, a ativação endotelial e a fibrose13,14. Os fatores ambientais
parecem estar envolvidos na gênese dos processos fibróticos.
Dentre esses fatores, podemos destacar os solventes orgânicos
(tolueno, benzeno, cloreto de polivinil, tricloroetileno, entre
outros), a sílica (em mineiros de carvão e trabalhadores em
pedreiras), o silicone (próteses mamárias) e o uso de drogas
(inibidores do apetite, L-triptofano, bleomicina)13,14.
O Colégio Americano de Reumatologia (CAR), em
1980, divulgou os critérios preliminares para o diagnóstico da ES, sendo necessária a presença do critério maior
(esclerodermia proximal às metacarpofalangeanas) ou de
dois critérios menores:
1. esclerodactilia;
2. ulcerações de polpas digitais ou reabsorção de falanges
distais;
3. fibrose nas bases pulmonares. Esses critérios mostraram
uma sensibilidade de 97% e uma especificidade de 98%13.
Em 1988 foi proposto o modelo de classificação da ES
em duas formas clínicas: limitada e difusa13.
A forma limitada apresenta envolvimento cutâneo
restrito às extremidades (até cotovelos, joelhos e face),
ritmo lento de acometimento cutâneo, presença de calcinose, contraturas articulares pouco frequentes, incidência
tardia de manifestações viscerais, podendo cursar com
anticorpo anticentrômero13.
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Teles JASS
A forma difusa afeta tronco, face e membros, apresenta
tendência à rápida progressão das alterações cutâneas, contraturas articulares, tendínea e comprometimento visceral
precoce (fibrose pulmonar, miocardiosclerose e crise renal),
podendo cursar com anticorpo antitopoisomerase I (anti-Scl 70) e anticorpo anti-RNA polimerase III13.
O tratamento da ES consiste na utilização de drogas
antifibróticas, drogas vasoativas, medicamentos imunossupressores e estimuladores da motilidade gastroesofágica13.
A associação entre silicose e ES está relacionada a uma
doença grave, devido ao comprometimento pulmonar, o qual
necessita de uma intervenção mais precoce com medicação
imunossupressora para possibilitar um sucesso terapêutico2.
Diante de um risco aumentado de silicose e tuberculose pulmonar11, deve-se atentar para a possibilidade dessa
associação quando se inicia o tratamento em pacientes com
síndrome de Erasmus, havendo um risco em potencial de
agravamento do quadro clínico, com uso de drogas imunossupressoras13. Obrigatoriamente, deve-se solicitar radiografia
de tórax e teste tuberculínico (teste de Mantoux ou PPD),
para afastar tuberculose pulmonar ou tuberculose latente13.
Visando ao controle e à prevenção da silicose e concomitantemente de doenças autoimunes que possam ser
desencadeadas com a exposição prévia à sílica, desde 1990
diversos estados e municípios produziram legislações
próprias para o controle da silicose, as quais se destacam1,5:
• proibição do processo de corte e acabamento a seco
de rochas ornamentais. As máquinas e ferramentas
utilizadas no processo de corte e acabamento devem
ser dotadas de sistema de umidificação capaz de minimizar ou eliminar a geração de poeiras decorrentes de seu
funcionamento, sendo proibidas adaptações de máquinas
elétricas que não tenham sido projetadas para sistemas
úmidos (Portaria nº 43, de março de 2008, do Ministério
do Trabalho e Emprego)5,6;
• proibição do processo de trabalho de jateamento que utilize
areia seca ou úmida como abrasivo (Portaria nº 99, de 19 de
julho de 2004, do Ministério do Trabalho e Emprego)5,6;
• notificação compulsória de agravos à saúde do trabalhador, sendo que entre os agravos estão as pneumoconioses (Portaria nº 777/GM, de 28 de abril de 2004)5;
• estabelece diversas atividades como de risco de exposição à sílica e de doenças relacionadas a essa exposição:
silicose, silicotuberculose, neoplasia maligna dos brônquios e pulmões, doença pulmonar obstrutiva crônica,
cor pulmonale e artrite reumatoide, devendo ser notificadas
•
ao Instituto Nacional de Seguro Social, através do preenchimento de formulário de Comunicação de Acidentes de
Trabalho (Decreto nº 3.048, de 06 de maio de 1999)1,5;
proibição da utilização de jateamento de areia a seco, determinando prazo para a mudança tecnológica nas empresas
que utilizam esse procedimento (Projeto de Lei nº 1.670
de 1999, aprovado em 20 de outubro de 2004)5.
A recomendação para a utilização de máscaras ou respiradores é regulada pela NR-6, da Portaria nº 3214/781.
O respirador tem como objetivo prevenir a inalação de substâncias indesejáveis e prover uma fonte de ar respirável em
ambientes com baixas concentrações de oxigênio1.
Para a proteção contra poeiras, a máscara ou respirador indicado deve possuir filtro mecânico capaz de reter
a fração respirável do material particulado1. Existem dois
tipos básicos: respirador purificador de ar, que cobre a
boca e o nariz, sendo dotado de um filtro com porosidade
de diversas medidas; e respirador com suprimento de ar,
que cobre toda a cabeça, sendo recomendado para situações de baixa atmosfera de oxigênio e/ou elevada poluição
ambiental, como em minas subterrâneas1.
Apesar de amplamente difundido, o emprego de respiradores
não tem se mostrado eficaz para impedir o desenvolvimento de silicose, por apresentar vários inconvenientes e indicação inadequada1.
A Organização Internacional do Trabalho e a Organização
Mundial da Saúde lançaram, em 1995, um programa conjunto
de erradicação global da silicose, com a intenção de diminuir drasticamente sua prevalência e proporcionar a erradicação dessa doença até 2030.
As medidas recomendadas internacionalmente visam
evitar o aparecimento da silicose e baseiam-se em prevenir
a exposição e a inalação de poeiras finas e respiráveis,
contendo a sílica livre e cristalina, utilizando-se de tecnologias apropriadas.
Este artigo teve como objetivo realizar uma revisão da
literatura referente à associação entre silicose e ES, conhecida como síndrome de Erasmus.
MÉTODOS
Pesquisa bibliográfica realizada no período de agosto
de 2013 a abril de 2014, por meio de busca por artigos
científicos indexados em bancos de dados de ciências da
saúde em geral, literatura Latino-Americana e do Caribe
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48
Síndrome de Erasmus
em ciências da saúde (LILACS), MEDLINE/PubMed,
Scientific Eletronic Library Online (SciELO) e livros textos
de reumatologia. Foram selecionados artigos nacionais e
internacionais obtidos na íntegra, referentes a pneumoconiose, silicose, esclerose sistêmica e associação entre essas
duas últimas doenças, sendo incluídos os manuscritos que
abrangiam especificamente a síndrome de Erasmus.
indução e proliferação dos pneumócitos tipo II. Com a liberação de enzimas proteolíticas, há formação de mais espécies
reativas de oxigênio e nitrogênio, e também ocorre liberação
de citocinas inflamatórias como o fator de necrose tumoral
alfa, o fator de transformação de crescimento beta, a interleucina 1 e a interleucina 6. Essas citocinas recrutam macrófagos,
neutrófilos e linfócitos, dando origem à alveolite e consequente
perda da integridade da barreira epitelial, permitindo assim a
passagem das partículas de sílica para o interstício. O resultado
final é a proliferação excessiva de fibroblastos e produção de
colágeno, resultando em fibrose intersticial1,2,8,21.
A doença do tecido conjuntivo posterior à exposição à sílica
ocorre em média após 15 anos do início da exposição, sendo que
os padrões de imagem observados em geral são opacidades em
vidro fosco, lineares, faveolamento e pequenos nódulos subpleurais, sendo essas alterações indistinguíveis da ES idiopática2,16.
Rustin et al.22 descreveram 17 pacientes com ES associada à sílica, dos quais 3 apresentavam ES difusa e 14 ES
limitada, sendo que todos os pacientes apresentavam fenômeno de Raynaud, enquanto 16 pacientes apresentaram
fibrose intersticial pulmonar, sendo 8 desses com anticorpo
antitopoisomerase I (anti-Scl 70) positivo.
Em estudo prospectivo realizado em Sevilha, Espanha,
com 300 trabalhadores de uma fábrica que utilizavam jateamento de areia, expostos durante 10 anos, identificaram
50 casos de silicose (17%), sendo que 5 desses estavam associados à ES, ou seja, 10% dos trabalhadores apresentavam
a associação (síndrome de Erasmus)23.
Na Índia, o primeiro caso de síndrome de Erasmus foi relatado
em 1997. Ganguly et al.24 descreveram o segundo caso dessa associação em 2013. Esses autores relataram o caso de um homem de
26 anos com doença pulmonar parenquimatosa difusa devido a
silicose e ES, que trabalhou como operador de britadeira durante
um ano e em alvenaria de pedras por 5 anos. Após esse período
de seis anos de exposição, parou de trabalhar devido à piora
progressiva da dispneia. Apresentou na tomografia computadorizada de tórax lesão nodular difusa, principalmente em lobos
superior e médio, com conglomerados nodulares em algumas
áreas e extensos anéis de calcificação ganglionar em mediastino e
linfonodos hilares, característicos da silicose pulmonar. A biópsia
cutânea da face apresentou alterações sugestivas da esclerodermia
e anticorpo anti-Scl-70 fortemente positivo24.
Souza et al.8 relataram na discussão de seu artigo uma
série de 16 casos de exposição à sílica, dentre os quais
15 pacientes apresentaram fenômeno de Raynaud e
5 pacientes com ES.
RESULTADOS
A associação entre silicose e ES foi inicialmente descrita
por Erasmus16, em 1957, na cidade de Witwatersrand, África
do Sul, em mineiros de ouro expostos a elevada concentração
de sílica livre, comparados com uma população de referência.
Em um estudo observacional, no período de 1955 a
1965, Rodnan et al.17 relataram 60 homens com ES, sendo
que 26 desses, ou seja, 46%, trabalhavam em mineração de
carvão ou outras ocupações, as quais os expunham à exposição prolongada e intensa ao pó da sílica.
Mais tarde, em 1987, também na África do Sul, Cowie18
realizou um estudo caso-controle, com 10 casos e 486
controles, que revelou uma relação significativa entre a
ocorrência de ES e a intensidade de exposição à sílica, em
mineiros de ouro e de carvão, ainda que na ausência de silicose.
Na Alemanha, a ES em trabalhadores expostos à sílica
passou a ser considerada doença ocupacional depois que
estudos epidemiológicos mostraram que a probabilidade
de ocorrência dessa colagenose em trabalhadores expostos à
sílica é 25 a 74 vezes maior do que na população geral, aumentando para 110 vezes quando se estudam apenas pacientes
com silicose em relação à população masculina não exposta19.
Na França, desde dezembro de 1992, o diagnóstico de ES
em indivíduos com história de exposição à sílica, mesmo na
ausência de silicose, é considerado como doença ocupacional20.
O mecanismo de associação entre exposição à sílica e
ES parece relacionar-se à resposta inflamatória desenvolvida pela sílica após fagocitose e liberação de mediadores
por macrófagos alveolares ativados2,21.
Na fase inicial, as partículas de sílica induzem, por
contato direto de sua superfície com a água e lipoproteínas
da camada de revestimento bronquioloalveolar ou pela
ativação de macrófagos e de células epiteliais, a formação de
radicais livres. Quando a produção desses radicais supera os
mecanismos de defesa antioxidantes, pode haver lesão dos
pneumócitos tipo I, aumento da ativação de macrófagos,
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Teles JASS
Foram encontrados na literatura nacional (Tabela 1)
relatos de casos de síndrome de Erasmus, os quais apresentavam ES e exposição prévia à sílica com duração que variou
de 2 a 15 anos de exposição, atividade laboral interrompida
há mais de 7 anos. Em todos os casos relatados os pacientes
eram do sexo masculino, com média de idade de 46 anos,
sendo a principal atividade jateamento de areia; e havia
relato em três casos de uso inapropriado de equipamentos
de proteção2,8-10,25. Entre os cinco casos em que a tuberculose foi investigada, três casos apresentaram a associação
entre tuberculose pulmonar e síndrome de Erasmus10,25.
Miranda et al.2 (Tabela 1) descreveram 2 casos de síndrome
de Erasmus em pacientes com história de exposição ocupacional
à sílica, que após 10 anos do diagnóstico de pneumoconiose
desenvolveram ES, sendo um caso com manifestações cutâneas características de ES difusa e outro caso com ES limitada2.
O primeiro caso relatado por Miranda et al.2 refere-se a um
homem de 35 anos, com história ocupacional de jateamento
de quartzo por 6 anos, que foi afastado do trabalho devido
a dispneia aos médios esforços. Feito diagnóstico de silicose
e tratado com corticoterapia, obteve remissão dos sintomas.
Após 10 anos do diagnóstico de pneumoconiose, evoluiu com
sintomas característicos de ES difusa, teste de PPD negativo
e tratado com medicações imunossupressoras e vasoativas,
com boa evolução e melhora do quadro clínico (Tabela 1).
No segundo caso, esses mesmos autores relataram um
homem de 38 anos, garimpeiro, que trabalhou com explosivos sem seguir normas técnicas de segurança do trabalho.
Apresentou quadro de doença parenquimatosa pulmonar
há 10 anos, com biópsia pulmonar apresentando partículas
de sílica no tecido e cultura de líquido pleural positiva para
tuberculose. Tratado com tuberculostáticos por seis meses.
Evoluiu após 10 anos do diagnóstico de pneumoconiose com
quadro característico de ES limitada. Apresentou quadro
de sepse grave de foco cutâneo, e mesmo sendo ampliado
o espectro dos antibióticos e suporte de terapia intensiva,
evoluiu para óbito2 (Tabela 1).
CONCLUSÃO
Através deste artigo coloca-se em evidência a importância
do reconhecimento precoce da associação entre silicose e ES,
dando ênfase na história ocupacional, principalmente em
casos de ES que apresentem comprometimento pulmonar
em indivíduos do sexo masculino.
Tabela 1. Artigos nacionais referentes à síndrome de Erasmus, selecionados e relatados nos resultados.
Artigos
nacionais
Ano
Miranda et al.2
2013
Souza et al.8
2005
Pinto et al.9
2006
Pedroso et al.10
2009
Rodrigues et al.25
2012
Desenho do estudo
Duração da
exposição à
sílica
Relato de caso
- 2 casos, ambos do
sexo masculino
1º caso: 6 anos
1º caso: 35 anos, com ES
2º caso: NI
difusa
2º caso: 38 anos, ES
limitada
Relato de caso
- 1 caso, sexo masculino,
2 anos
46 anos
Relato de caso
- 1 caso, sexo masculino,
15 anos
41 anos
Relato de caso
- 1 caso, sexo masculino,
4 anos
61 anos
Relato de caso
- 1 caso, sexo masculino,
4 anos
57 anos
Período de Associação com
latência para
tuberculose
silicose
pulmonar
NI
1º caso: ausente
1º caso: jateamento de
(PPD negativo)
quartzo e NI
2º caso: presente 2º caso: explosivos e uso
(diagnóstico pelo inadequado de equipalíquido pleural)
mentos de proteção
30 anos
NI
Jateamento de areia e
uso inadequado de equipamentos de proteção
7 anos
Presente
Jateamento de areia e NI
30 anos
Ausente
(PPD negativo)
Jateamento de areia e
uso inadequado de equipamentos de proteção
NI
ES: esclerose sistêmica; NI: não informado.
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História ocupacional e
uso de equipamentos
de proteção
Presente
(diagnóstico por Jateamento de areia e NI
biópsia pulmonar)
Síndrome de Erasmus
O diagnóstico da síndrome de Erasmus por pneumologistas, reumatologistas e médicos do trabalho permitirá
intervenções mais efetivas e um tratamento precoce, que
proporcionarão um melhor prognóstico para esses pacientes.
É imprescindível descartar tuberculose pulmonar ou
tuberculose latente antes de iniciar medicações imunossupressoras em pacientes com síndrome de Erasmus,
devido ao elevado risco da associação entre silicose e
tuberculose pulmonar.
Medidas prioritárias estão vinculadas à substituição da
sílica nos diversos processos em que isto já é possível, com
redução do tempo de exposição e implantação ampla de
medidas de controle ambiental.
Reduzir a exposição depende de um processo progressivo de vigilância, sempre com o objetivo de maximizar a
proteção quando a manipulação de material silicogênico
é imprescindível.
Essas estratégias são tecnicamente factíveis, eticamente
necessárias e epidemiologicamente urgentes, sendo que
através da prevenção da silicose estaremos promovendo
concomitantemente a prevenção de doenças autoimunes
e suas associações, como a síndrome de Erasmus.
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Endereço para correspondência: Juliana Augusta Spinelli da Silva Teles – Rua
Padre João 17-30, apartamento 183-A – Vila Santa Tereza – CEP: 17012-020 –
Bauru (SP), Brasil – E-mail: [email protected]
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):45-51
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REVISÃO
DE LITERATURA
Recebido: 08/01/2015
Aceito: 05/03/2015
Fonte de financiamento: nenhuma
O controle estatal em saúde e segurança no
trabalho e a auditoria do Programa de Controle
Médico de Saúde Ocupacional
State control in health and safety at work and the audit of the
Control Program Occupational Health Medical
Felipe Rovere Diniz Reis1, Satoshi Kitamura2
RESUMO | Para diminuir os danos sociais decorrentes dos riscos inerentes ao trabalho, os Estados criam normas que obrigam o
empregador a controlar a saúde ocupacional dos trabalhadores. No Brasil, estas ações devem estar dispostas no Programa de Controle
Médico de Saúde Ocupacional, segundo obriga a Norma Regulamentadora nº 07. Para garantir o cumprimento desta norma, tanto
o Estado quanto o empregador podem auditar o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO). O objetivo foi
verificar a aplicabilidade desta auditoria dentro do modelo brasileiro de controle estatal em saúde ocupacional. Para isso, foi feita
uma revisão narrativa da literatura. Os resultados indicaram que as normas, punitivas e reparadoras, e a fiscalização, pontual e repressora, falham tanto em reduzir os gastos com doenças relacionadas ao trabalho quanto em estimular o cumprimento voluntário da lei.
Indicaram também que as ações de controle estatal atuais (aumento do número de fiscais, flexibilização da alíquota do seguro acidente
de trabalho e a fiscalização programática) seguem o modelo de controle adotado por diversos países desenvolvidos. No entanto, ao
contrário destes países, o Brasil ainda não possui incentivos à adoção de Sistemas de Gestão em Saúde e Segurança no Trabalho, os
quais por sua vez devem contemplar uma auditoria do PCMSO, cujos resultados podem ser usados tanto pela empresa para melhorar
a gestão da saúde ocupacional quanto pelo Estado incentivar a adoção dos Sistemas de Gestão em Saúde e Segurança no Trabalho e
para reduzir os gastos com acidentes e doenças relacionadas ao trabalho.
Palavras-chave | saúde do trabalhador; gestão de riscos; auditoria médica.
ABSTRACT | To reduce the social consequences of the risks inherent in the work, the States shall establish rules, which require the
employer to control the occupational health of workers. In Brazil, these actions are to be arranged in the Medical Control Program of
Occupational Health in accord to which requires Regulatory Standard 07. To ensure compliance with this standard, both State and
the employer can audit the Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO ─ Occupational Health Medical Control
Program). The objective of this study was to verify the applicability of this audit within the Brazilian model of state control in occupational health and propose criteria for its realization. For this it was made a narrative review of the literature. The results indicated
that the rules, punitive and remedial, and supervision, timely and repressive, fail both in reduce spending on work-related diseases
as well as to encourage voluntary compliance. They also indicated that the current state control measures (increase in tax, easing of
workers’ compensation insurance rate and programmatic oversight) follow the control model adopted by many developed countries.
However, unlike these countries, Brazil yet does not have incentives for adoption of Management Systems Health and Safety at Work,
that should include an audit of PCMSO, with results may be used both by the company to improve their occupational health management as the State to encouraging the adoption of Occupational Health and Security Management Systems to reduce spending on
work-related accidents and diseases.
Keywords | occupational health; risk management; medical audit.
Trabalho realizado na Área de Saúde Ocupacional do Departamento de Saúde Coletiva da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) – Campinas (SP), Brasil.
Departamento de Saúde Coletiva da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) – Campinas (SP), Brasil.
1
2
Faculdade de Medicina da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) – Campinas (SP), Brasil.
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):52-9
52
O controle estatal em SST e auditoria do PCMSO
fiscalização do trabalho, vigilância em saúde do trabalhador,
acidente de trabalho, doenças ocupacionais. O autor declara
não haver conflito de interesses. O estudo não envolve
pesquisa com seres humanos e por isso, não foi submetido
a um Comitê de Ética em Pesquisa.
INTRODUÇÃO
O trabalho possui riscos inerentes que o tornam insalubre e, se estes riscos não forem controlados, eles podem
gerar danos aos trabalhadores que representarão um ônus
a toda sociedade. Neste sentido, as sociedades buscam estabelecer normas para controlar as condutas empresariais e
exigir um controle mínimo sob as condições de trabalho
para garantir a saúde ocupacional dos trabalhadores.
Estas normas, quando obrigatórias, estão sujeitas à fiscalização estatal, como é o caso da Norma Regulamentadora
nº 07 (NR-07) que obriga os empregadores a gerenciar a
saúde ocupacional através de um Programa de Controle
Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO). No entanto,
apesar das normas e da fiscalização, no Brasil os gastos
sociais com acidentes e doenças relacionadas ao trabalho
vêm aumentando ao longo dos últimos anos.
Neste sentido, para melhorar a gestão de saúde e segurança
no trabalho (SST) e reduzir os gastos com doenças e acidentes
de trabalho surgem normas voluntárias, sujeitas ou não à auditoria de um organismo certificador privado, como é o caso
da Occupational Safety and Health Administration System
(OSHAS) 18001, que comprova a implementação
de um Sistema de Gestão em Saúde e Segurança no
Trabalho (SGSST).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
EVOLUÇÃO NORMATIVA
Com a abertura do mercado nacional à produção de bens
industrializados no início do século XX, o Brasil viveu uma
verdadeira “Revolução industrial” e junto com esta mudança
vieram os problemas sociais como a urbanização descontrolada, as más condições de trabalho e os baixos salários,
que geraram reivindicações sociais por direitos trabalhistas que,
associadas às recomendações de organismos internacionais
principalmente da Organização Internacional do Trabalho
(OIT), fizeram o Estado brasileiro aumentar o controle
sobre as relações de trabalho1.
Com a criação do Departamento Nacional do Trabalho,
foi aprovada a primeira lei acidentária que obrigava o empregador indenizar o trabalhador acidentado no trabalho2.
Embora as Inspetorias Regionais do Trabalho, transformadas posteriormente em Delegacias Regionais do Trabalho,
tenham sido criadas no Brasil em 1919, foi só em 1965 que
a Inspeção do Trabalho foi regulamentada3.
Com o crescimento acelerado da indústria nacional
durante o “milagre econômico” devido à abertura ao capital
estrangeiro, o Brasil alçou o primeiro lugar nas estatísticas
de acidentes de trabalho e sob pressões externas criou a
Fundação Jorge Duprat e Figueiredo (Fundacentro) que
elaborou Normas Regulamentadoras incorporadas juridicamente pela Portaria 3214, que contemplava entre outras,
a NR 07 (denominada “Exames médicos” e atualmente
definida como “Programa de Controle Médico de Saúde
Ocupacional”), a NR-09 (Programa de Prevenção de Riscos
Ambientais), e a NR 04 (Serviços de Especializados em
Saúde e Segurança no Trabalho)4.
Os trabalhadores, através da Reforma Sanitária brasileira5, reivindicaram maior participação no controle e na
fiscalização das condições de trabalho6. Com a Constituição
de 1988, as ações de controle em SST foram divididas em
ações de “vigilância” desenvolvidas pelo Ministério da Saúde,
OBJETIVO
O objetivo deste artigo foi reconhecer as características
do modelo de controle estatal em Saúde e Segurança no
Trabalho (SST) e avaliar se ele tem sido capaz de reduzir
os gastos com acidentes e doenças relacionadas ao trabalho,
além de reconhecer as propostas apresentadas pela literatura para melhorar este controle, avaliando se a auditoria do
PCMSO se enquadra em alguma destas propostas.
METODOLOGIA
Trata-se de uma pesquisa aplicada do tipo qualitativa e
exploratória. Para revisão bibliográfica, foi feita uma busca
nas bases de dados SciELO, PubMed, Medline e Google, e
em outros documentos (leis, portarias, manuais técnicos) a
partir dos descritores: leis trabalhistas, saúde do trabalhador,
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Reis FRD, Kitamura S
atualmente voltadas à assistência ao trabalhador adoecido ou acidentado, e ações de “fiscalização” desenvolvidas pelo Ministério do Trabalho e Emprego, atualmente
voltadas à autuação e à interdição por descumprimento
da lei, enquanto as ações de “reparação” ficaram a cargo
do Ministério da Previdência e Assistência Social que
assegura auxílio financeiro ao trabalhador incapacitado
para o trabalho7.
O custeio do seguro acidentes de trabalho criado em
1919 ficou nas mãos da iniciativa privada até 1967, quando,
então, os empregadores passaram a ser obrigados a custear
o sistema previdenciário segundo alíquotas que variavam
segundo a atividade econômica desenvolvida8. Mas o cálculo
da alíquota de seguro acidentário não era individualizado e
não estimulava o investimento em SST9.
Assim, o histórico normativo em SST no Brasil
sempre foi centralizado 10 , pautado na punição e na
reparação, se aproximando do modelo tradicional de
controle estatal11.
Foi somente em 2011, após Plano de Ação Mundial
sobre a Saúde dos Trabalhadores da OMS elaborado em
200712, que o Estado brasileiro instituiu a Política Nacional
de Segurança e Saúde no Trabalho, dando a precedência das
ações de promoção, proteção e prevenção sobre as ações de
assistência, reabilitação e reparação13, propondo através do
Plano Nacional de Segurança e Saúde no Trabalho, uma
fiscalização programática e a implantação de sistemas
de gestão em segurança e saúde nos locais de trabalho,
através da formulação de uma Norma Regulamentadora
de Gestão em SST14.
Tabela 2, fica evidente quando observamos que em 2012
foram concedidos 10 vezes mais benefícios acidentários
relacionados a doenças ocupacionais sem CAT (164 mil)
do que com CAT (15 mil) o que indica uma subnotificação
das doenças ocupacionais de 90%17.
Tabela 1. Estatística das ações fiscais do Ministério do Trabalho
e Emprego relacionadas à saúde e segurança no trabalho.
Ano
Nº de AFT
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
3.080
3.044
2.837
2.927
2.935
2.873
3.173
3.113
2.949
3.061
3.042
2.875
2.719
Empresas
Autos de
fiscalizadas
infração (mil)
(mil)
296
93
304
92
285
103
302
100
375
107
357
115
357
113
299
108
282
113
255
108
269
135
269
143
275
155
TREF
(%)
82
84
83
87
88
86
86
83
81
77
74
71
67
AFT: Auditores Fiscais do Trabalho; TREF: Taxa de regularização
em estabelecimentos fiscalizados equivalente a relação percentual
entre o número de itens da legislação trabalhista irregulares após a
fiscalização e o número de itens irregulares encontrados no início da
fiscalização. ND: não disponível
Tabela 2. Estatística de acidentes de trabalho conforme a
Previdência Social
Ano
A EFICÁCIA DA FISCALIZAÇÃO
Segundo dados estatísticos do Ministério do Trabalho
e Emprego (MTE), no período de 2001 a 2013, o número
de fiscais e o número de empresas fiscalizadas diminuíram,
entretanto o número de Autos de Infração relacionados a SST
aumentou. Mas mesmo com o aumento do número de
Autos de Infração, ou seja, com o aumento da punição,
não houve um aumento da taxa de regularização das
infrações relacionadas a SST, conforme disposto na
Tabela 115, nem uma diminuição dos gastos com benefícios previdenciários acidentários, que duplicaram no
mesmo período16.
Além disso, estes gastos poderiam ser ainda maiores se
não houvesse subnotificação, que conforme disposto na
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
Total de
Com CAT
Com CAT
Acidentes e
Acidentes Doenças do
doenças de
típicos (mil) trabalho (mil)
trabalho (mil)
340
282
18
393
323
22
399
325
23
465
375
30
499
398
33
512
407
30
659
417
22
755
441
20
733
424
19
709
417
17
711
426
15
705
423
15
Sem
CAT
(mil)
ND
ND
ND
ND
ND
ND
141
204
199
179
172
164
CAT: Comunicação de Acidente de Trabalho; ND: não disponível.
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O controle estatal em SST e auditoria do PCMSO
prazo e as ações fiscais buscam estimular a mudança voluntária do comportamento empresarial em relação à cultura de
SST25. Este modelo de fiscalização considera que as sanções
impostas pelo Estado são pouco coercitivas e não capazes
de reduzir efetivamente os gastos sociais com acidentes e
doenças do trabalho26,27.
No Brasil, a fiscalização programática passou a ser incentivada com a Lei 11.890 de 2008 que retirou da remuneração
dos fiscais qualquer forma de gratificação por produção28 e, a
partir de 2010, a fiscalização possui um programa desenvolvido anualmente segundo diretrizes e segundo o diagnóstico
do mercado de trabalho local e da capacidade de intervenção das Delegacias Regionais do Trabalho. No entanto,
na prática as ações programáticas não têm se desenvolvido
bem, dado que qualquer denúncia que envolva risco grave
ou relativas à atrasos nos pagamentos dos trabalhadores
devem ser apuradas imediatamente.
No que se refere, a contratação de profissionais especialistas para assessorar as ações fiscais, estes podem ser
Agentes de Higiene e Segurança do Trabalho ou Peritos em
SST, engenheiros de segurança do trabalho e/ou médicos
do trabalho.
Embora o Decreto 4.55229 tenha criado o cargo de
Agente de Higiene e Segurança do Trabalho ─ servidor
público responsável por auxiliar os fiscais fazendo levantamento técnico das condições de segurança nos locais de
trabalho, avaliando qualitativa ou quantitativamente os riscos
ambientais e, analisando as condições de risco ocupacional ─,
até hoje, não houve criação de vagas ou concursos para sua
contratação pelo MTE.
Tais atividades também poderiam ser realizadas por
Peritos em SST, através de auditorias nas empresas, a
semelhança do que é feito pelos Peritos contratados pela
Receita Federal, que, neste caso, avaliam as mercadorias aduaneiras, conforme prevê o Decreto nº 6.75930 e a
Instrução Normativa RFB nº 1.020 de 201031. Tais profissionais são contratados por processos seletivos e fazem
perícias das mercadorias a fim de constatar se as mesmas
estão regulares com a legislação e sua remuneração é paga
por Parecer ou laudo, elaborados segundo critérios previamente estabelecidos. Esta contratação poderia atender o
Artigo 22 do Decreto nº 4.552 e o item 28.1.5 da NR-28,
que permite ao fiscal do trabalho solicitar o concurso de
profissionais especialistas credenciados para verificar o
cumprimento da legislação.
PROPOSTAS PARA MELHORIA
DO CONTROLE ESTATAL
Da forma como o modelo de controle estatal em SST
está instituído, ele não estimula o investimento em SST18,
nem incentiva a promoção e a prevenção da saúde19. Assim,
surgem como propostas para aumentar a eficiência do
controle estatal o aumento da capacidade da fiscalização e
o incentivo a adoção de SGSST.
Aumento da capacidade de fiscalização
A capacidade da fiscalização em SST pode ser aumentada através do aumento do número de fiscais, da priorização
das ações fiscais, e/ou da contratação de especialistas para
assessoramento das atividades fiscais.
No que se refere ao aumento do número de fiscais, o
artigo 10º da Convenção nº 81 da Organização Internacional
do Trabalho (OIT) estabelece que o número razoável de
fiscais deva ser um fiscal para cada 15 mil trabalhadores
nas economias em vias de industrialização. Recentemente,
o Instituto Nacional de Pesquisas Econômicas (INPE)
informou que quanto maior o número de fiscais menor o
número de acidentes de trabalho, sendo que um acréscimo
de um fiscal para cada 1.000 empresas causa uma redução
de 0,06% na taxa de acidentes de trabalho20.
Apesar disso, o número de fiscais no Brasil despencou
nos últimos anos, passando de pouco mais de um fiscal para
cada 10 mil trabalhadores em 1996 para menos de um fiscal
para cada 30 mil trabalhadores em 2014. Em outras palavras,
apesar do número de empregos no Brasil ter aumentado
65% nos últimos 10 anos, houve uma redução de 18% no
número de fiscais, passando de 3.460 para 2.85021.
No que se refere à priorização da fiscalização, as ações
fiscais são iniciadas por denúncias pontuais não tem se
mostrado incapaz em reduzir os gastos com acidentes e
doenças do trabalho22, pois, além de limitar o número de
empresas fiscalizadas, ela não garante que a irregularidade
não se repetirá quando a ação fiscal terminar23. Além disso,
existem evidencias de que a fiscalização reduz a incidência
de acidentes e doenças do trabalho em longo prazo, principalmente se forem específicas24.
Assim, a fiscalização moderna adotada em vários países
estimula o cumprimento voluntário da lei através de fiscalizações programáticas, que priorizam as empresas com altas
taxas de acidentes e com histórico de não corrigir as irregularidades. Nestes países, a fiscalização possui metas de longo
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Reis FRD, Kitamura S
que atribui uma maior autorregulação às empresas, esbarra
em dificuldades práticas que precisam ser superadas, pois
o Estado, através dos órgãos de vigilância e fiscalização
intervém minimamente nos ambientes de trabalho pois
carece de recursos humanos e de conhecimento detalhado do processo de produção38. Além disso, os Serviços
Especializados em Segurança e Medicina do Trabalho das
empresas ou contratados normalmente elaboram e executam
programas descontextualizados da política organizacional
da empresa39.
O exemplo mais marcante deste tipo de iniciativa,
iniciado nos EUA na década de 90, foi o “OSHA`s Maine
200 Program”. As empresas com as maiores taxas de dias
perdidos por acidentes e doenças relacionada ao trabalho
que quisessem participar além de terem menores chances
de serem fiscalizadas seriam informadas da data das fiscalizações, mas só poderiam participar se implementassem um
SGSST que pudesse ser auditado40.
Como exemplo mais recente, Taiwan, em 10 anos de
implementação do programa de fiscalização voluntária,
certificou 724 empresas as quais nos últimos três anos do
programa tiveram 49% menos acidentes que as empresas
não participantes, com uma redução de 80% da gravidade
dos acidentes41.
Incentivos aos sistemas de
gestão em saúde e segurança no trabalho
Outra proposta para melhorar o controle estatal em
SST é incentivar a gestão sistemática das ações executadas
pelas empresas, pois investir em saúde ocupacional além do
cumprimento da lei aumenta a produtividade e a competitividade da empresa32.
Neste sentido, a Convenção 81 da OIT prevê a necessidade de os governos adotarem ações para facilitar uma cooperação efetiva entre as instituições públicas e as privadas que
exerçam atividades análogas relacionadas à SST e muitos
países incentivam a utilização voluntária de normas de
gestão como as ISO, explorando as auditorias realizadas
dentro destes sistemas33.
Este modelo de controle é compatível com o disposto na
Portaria 3.120 que preconiza que o processo de Vigilância
em Saúde do Trabalhador deve ocorrer dentro de um princípio de prioridades e da pesquisa-intervenção, no qual o
agente estatal, além de diagnosticar uma irregularidade,
intervenha ativamente para mudá-la, acompanhando as
mudanças propostas34.
Desta forma, houve uma crescente demanda por estes
sistemas de gestão tanto que o British Standart (BSI) inglês —
correspondente à Associação Brasileira de Normas Técnicas
(ABNT) no Brasil — foi pioneiro e propôs com base nos
conceitos prévios dispostos nas ISO 9.000 e ISO 14.000, a
OSHAS 18001:200735.
No Brasil, a ABNT — baseada na OSHAS 18.001 —
publicou a NBR 18801:2010, norma que continha, antes do
seu cancelamento pelo próprio órgão certificador, requisitos
de um Sistema de Gestão de Segurança e Saúde36.
As ações estatais mais comuns para incentivar a implementação de SGSST pelas empresas são os programas de
fiscalização voluntários e os descontos nas alíquotas do
imposto acidentário.
Descontos nas alíquotas de seguro de acidente de trabalho
Outra proposta para incentivar a adoção de SGSST
é oferecer incentivos financeiros através da redução da
alíquota do imposto pago como custeio, público ou privado,
do seguro acidente de trabalho.
A Federação Alemã das Instituições para Seguro e
Prevenção de Acidentes concede descontos nas alíquotas
de seguro mediante a comprovação da adoção de um
sistema integrado de gestão em SST, desde que certificado
por um organismo credenciado. O incentivo utilizado é um
desconto de até 50% na alíquota de seguro, de acordo com
o custo da certificação42. No Chile, com a implementação
do programa “Empresa competitiva” em 1997, no qual as
empresas devem comprovar ações sistemáticas de SST, em
dois anos a acidentalidade caiu de 10 para 5% em 199943.
Neste sentido, o Estado brasileiro, buscando estimular o
investimento em SST, não através da punição e da repressão
(aumentando o imposto), mas através do estímulo e da
bonificação (diminuindo o imposto) a Previdência Social,
através da Resolução MPS/CNPS nº 1.316 de 31 de maio
Programas de fiscalização voluntários
Buscando utilizar os resultados das auditorias dos
SGSST, a fiscalização em SST de diversos países tem adotado
programas de fiscalização voluntários tanto que em 2010
existiam aproximadamente 42 modelos de SGSST e 14 mil
empresas já tinham sido certificadas em 82 países, a maioria
pela OSHAS 1800137.
Mas a proposta de uma fiscalização programática com
critérios pré-determinados e com objetivos de longo prazo
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):52-9
56
O controle estatal em SST e auditoria do PCMSO
de 2010, prevê que a empresa que apresente casos de morte
ou invalidez permanente decorrente de acidentes de trabalho
poderá ter sua alíquota de imposto previdenciário (RAT)
reduzida se apresentar uma prova de que investe em SST44.
Esta prova deve ser feita através do “Demonstrativo
de Investimentos em Recursos Materiais, Humanos e
Tecnológicos em Melhoria na Segurança do Trabalho” que
deverá ser impresso, datado e assinado por representante
legal da empresa, homologado por representante do sindicato
dos trabalhadores e instruído com os documentos comprobatórios, entre eles uma auditoria do PCMSO, obrigatório
segundo a NR-0745. Tal auditoria, no entanto, requer critérios objetivos, a exemplo do que vem sendo proposto em
estudos recentes46, 47.
e repressora que não tem sido eficazes em reduzir os gastos
com acidentes e doenças relacionadas ao trabalho.
A proposta atual do Estado para melhoraria do controle
estatal em SST é aumentar a capacidade de fiscalização
através do aumento do número de fiscais e do aumento do
imposto acidentário dos empregadores que possuem piores
estatísticas de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho,
o que confirma as características históricas deste modelo.
No entanto, a literatura mostra que incentivos às empresas
para implementação de SGSST é a melhor proposta para
aumentar a eficácia do controle estatal em SST seja através
de programas de fiscalização voluntários seja através de
descontos na alíquota do seguro acidente de trabalho.
Assim, o Estado brasileiro deve incentivar os empregadores a implementarem SGSST que contemplem
auditorias do PCMSO, para que os resultados desta auditoria
possam ser usados tanto para melhorar a gestão da SST
e reduzir as estatísticas de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho quanto para requerer a redução do
imposto acidentário.
CONCLUSÃO
O modelo de controle estatal em SST está pautado em
normas punitivas e reparatórias e numa fiscalização pontual
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Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):52-9
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O controle estatal em SST e auditoria do PCMSO
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trata da flexibilização das alíquotas de contribuição destinadas ao
financiamento do benefício de aposentadoria especial e daqueles
concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade
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Endereço para correspondência: Felipe Rovere Diniz Reis – Área de Saúde
Ocupacional do Departamento de Saúde Coletiva da Universidade Estadual
de Campinas – Rua Vital Brasil, 100 – Cidade Universitária – CEP: 13083-888 –
Campinas (SP), Brasil – E-mail: [email protected]
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):52-9
59
REVISÃO
DE LITERATURA
Recebido: 02/02/2015
Aceito: 13/04/2015
Fonte de financiamento: nenhuma
Ocorrência de espécies fúngicas isoladas a
partir de mãos e unhas de trabalhadores
Occurrence fungal species isolated from hands and nails of workers
Milena Araújo Ferreira1, Daiane Martins2
RESUMO | Contexto: A infecção fúngica que acomete as mãos, além de funcionar como porta de entrada para infecções, também
pode causar dor, desconforto, limitação física e ocupacional. As pesquisas de microrganismos nas mãos de trabalhadores e as recomendações relacionadas à higiene adequada das mãos valorizam mais o risco de contaminação de alimentos e objetos e a transmissão
de infecções a terceiros, desconsiderando muitas vezes a importância de manter a saúde das mãos dos profissionais. É importante
conhecer a legislação e as orientações pertinentes que regulamentam as atividades profissionais e os aspectos relacionados ao desempenho profissional para promover medidas de proteção e prevenção de agravos à saúde do trabalhador e no estabelecimento de nexo
que possa existir com dermatose ocupacional. Objetivo: Pesquisar sobre estudos de espécies fúngicas isoladas a partir das mãos
de manipuladores de alimentos e profissionais da área de saúde, comparar com espécies isoladas em outras populações, destacar as
dermatoses cutâneas por agentes biológicos e mais especificamente por fungos dermatófitos e Candida, abordar aspectos relacionados
à segurança, saúde e medicina do trabalho. Métodos: Revisão de literatura de artigos publicados nos bancos de dados da CAPES,
sítio da biblioteca virtual em saúde, SciELO e pesquisas em livros específicos. Conclusões: Evidenciou-se diferenças na detecção
de fungos nas mãos de trabalhadores, em manipuladores de alimentos os percentuais variaram de 26,3 a 63,4% e em profissionais de
saúde a variação foi desde 6,7 até 93%; predominaram espécies de Candida. Observou-se, em outras populações, menor percentual
de positividade dos exames laboratoriais e predomínio de dermatófitos.
Palavras-chave | contaminação das mãos; dermatite ocupacional; onicomicose.
ABSTRACT | Context: The fungal infection that affects the hands, in addition to functioning as a gateway for infection, can also
cause pain, discomfort, physical and occupational limitations. Research of microorganisms in the hands of workers and recommendations related to proper hand hygiene value the risk of contamination of food and objects and transmission to third parties infections, often disregarding the importance of maintaining the health of the hands of professionals. It is important to know the relevant
legislation and guidelines governing their professional activities and aspects related to the performance to promote protection and
prevention of harm to workers’ health and the nexus of business that might exist with occupational dermatosis. Objective: To analyse
studies of fungal species isolated from the hands of food handlers and health professionals, to compare them to species from other
populations, highlighting the skin dermatoses by biological agents and more specifically by dermatophytes and Candida, and to
address aspects related to safety, health and occupational medicine. Methods: Literature review of articles published in the CAPES,
Biblioteca Virtual em Saúde website, and SciELO databases and also from specific books. Conclusions: Differences were identified in
the detection of fungi in the hands of workers; in the food handlers the percentage ranged from 26.3 to 63.4%; and in health professionals the range was from 6.7 to 93%, with a prevalence of Candida species. It was observed, in other populations, lower percentage
of positive laboratory tests and prevalence of dermatophytes.
Keywords | contamination of the hands; dermatitis, occupational; onychomycosis.
Trabalho realizado no Departamento de Morfologia da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) – Manaus (AM), Brasil.
Instituto de Pós-graduação e Graduação (IPOG) e Universidade Estácio de de Sá (ESTÁCIO) – Manaus; Gerência Executiva Manaus – Manaus (AM), Brasil.
1
Programa de Pós-graduação em Biotecnologia da Universidade Federal do Amazonas e Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) – Manaus (AM), Brasil.
2
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):60-70
60
Ocorrência de espécies fúngicas isoladas a partir de mãos e unhas de trabalhadores
Todos os indivíduos possuem microrganismos (bactérias
e fungos) residentes permanentes de determinados sítios
corporais, na superfície da pele e mucosas, orofaringe, trato
intestinal e trato genitouninário, compondo a população
comensal ou microbiota normal. Esses microrganismos
estimulam a resposta imune protetora e produzem fatores
de crescimento. Quando um indivíduo é exposto a um
microrganismo, esse pode: colonizar de forma transiente
o indivíduo, colonizar permanentemente o indivíduo ou
produzir doença. É importante distinguir entre colonização, um processo natural, e doença (ou infecção), que
está relacionada à colonização de sítios estéreis do corpo e
à exposição do indivíduo a microrganismos muito patogênicos5,7. Dermatofitoses e outras micoses superficiais podem
ser consideradas como doenças relacionadas ao trabalho,
nas quais o trabalho pode ser um fator de risco que favorece o adoecimento, mas não é causa necessária para que o
mesmo aconteça, estando relacionadas a trabalhadores que
exercem atividades em condições inadequadas de temperatura e umidade, bem como a outras situações nas quais
os agentes infeciosos têm ligação com a atividade ocupacional ou ao ambiente de trabalho2. A candidíase relacionada ao trabalho poderá ser verificada em trabalhadores
que exercem atividades que requerem longas imersões
das mãos em água, irritação mecânica das mãos, exposição da pele à umidade e oclusão, como nas atividades que
requerem o uso de luvas por longos períodos, tais como
trabalhadores de limpeza, lavadeiras, cozinheiras, enfermeiros, assistentes dentários, entre outros, com exposição
ocupacional caracterizada por meio de história laborativa
e de inspeção em ambiente de trabalho2,8. Não é simples
determinar um vínculo definitivo de causa e efeito entre
trabalho e uma infecção específica, exige isolamento laboratorial do agente infeccioso, história clínica, exame físico
detalhado e análise epidemiológica8.
Consoante estabelecido na Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988 e por meio da Lei Orgânica
da Saúde, nº 8.080, de 19909, a saúde do trabalhador foi
inserida como campo de atuação do Sistema Único de
Saúde (SUS), visando à promoção, proteção e prevenção
de agravos à saúde do trabalhador10. Portanto, o objetivo
desta pesquisa foi realizar um levantamento bibliográfico
sobre estudos de espécies fúngicas isoladas a partir das
mãos de trabalhadores, comparar espécies isoladas em
outras populações, não especificadas quanto à profissão,
INTRODUÇÃO
Toda e qualquer possibilidade de algum elemento ou
circunstância relacionada a um processo ou ambiente de
trabalho que possa causar prejuízo à saúde, seja através
de acidente, doenças ou do sofrimento dos trabalhadores,
ou ainda através da poluição do ambiente, define-se como
risco à saúde do trabalhador. Referidos fatores ou condições de risco são definidos como químicos (arsênio, berílio,
asbestos, bromo, cloro, chumbo, entre outros listados como
relacionados ao trabalho), biológicos (vírus, fungos, bactérias, parasitas, conforme lista de agentes etiológicos ou
fatores de risco relacionados trabalho), físicos (frio, calor,
radiação, ruídos, etc.), ergonômicos, mecânicos e da organização do trabalho1,2. Os riscos biológicos ocorrem por meio
de microrganismos que, em contato com o homem, podem
provocar inúmeras doenças. Muitas atividades profissionais favorecem o contato com tais riscos, como nas indústrias de alimentação, ginásios, piscinas, hospitais, limpeza
pública (coleta de lixo), laboratórios, etc. Diversos fatores
estão relacionados às doenças profissionais, tanto por causas
ligadas diretamente ao trabalho realizado, bem como pelas
suas condições de execução. Schilling3 classificou a relação
do trabalho com as doenças em três grupos. No grupo I
estão as doenças em que o trabalho ou as condições nas
quais o mesmo é exercido têm relação direta com a causa
do adoecimento, ou seja, o trabalho é causa necessária para
o desenvolvimento ou surgimento da doença; no grupo II
temos as doenças em que o trabalho pode ser um fator de
risco, contributivo, mas não necessário para o surgimento
da doença; no grupo III estão as doenças em que o trabalho
é provocador de um distúrbio latente, ou agravador de
doença já estabelecida ou preexistente. Os grupos II e III
contêm doenças relacionadas a múltiplos fatores de risco2,4.
O mecanismo de transmissão dos microrganismos pode
ser de humano para humano, como pode envolver fontes
não humanas, como solo, água, animais e objetos5. As mãos
estão envolvidas entre as principais vias de transmissão de
microrganismos. Através delas esses podem ser transferidos
de uma superfície para outra, por meio de contato direto
(pele com pele), ou indireto, através do contato com objetos
e superfícies contaminados, assim, a dinâmica de transmissão de muitas doenças tem relação com o contato pelas
mãos, havendo tanto a relação do risco de contaminação
individual, quanto de alimentos, objetos e de terceiros6.
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):60-70
61
Ferreira MA, Martins D
destacar as dermatoses cutâneas por agentes biológicos e
mais especificamente por fungos dermatófitos e Candida,
abordar aspectos relacionados à segurança, saúde e medicina do trabalho.
aos trabalhadores, existem importantes leis, as quais estão
orientadas para a prevenção e a assistência do trabalhador
vítima de acidente, doença ou de incapacidade relacionadas ao trabalho, bem como para a promoção da saúde,
do bem-estar e da produtividade dos trabalhadores 2.
Entre o amparo legal pertinente à segurança e saúde
do trabalhador destaca-se a Consolidação das Leis do
Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-lei nº 5.452, de
1º de maio de 1943 e alterada pela Lei nº 6.514, de 22
de dezembro de 1977, que discorre no título II, no capítulo V, relativo à segurança e medicina do trabalho, do
artigo 154 ao 201, sobre as regras a serem disciplinadas
nos locais de trabalho. Como consequência das políticas
voltadas para o trabalhador e considerando o disposto no
artigo 200 da CLT, foram aprovadas pela Portaria nº 3.214,
de 8 de junho de 1978, as Normas Regulamentadoras
(NR). Referidas normas regulamentam e fornecem orientações sobre procedimentos obrigatórios relacionados à
medicina e segurança no trabalho, destacando-se as ações
relacionadas à prevenção, ao controle e à eliminação
de riscos, as quais são de observância obrigatória pelas
empresas privadas e públicas e pelos órgãos públicos da
administração direta e indireta, bem como pelos órgãos
dos Poderes Legislativo e Judiciário, que possuam empregados regidos pela CLT. As NR são atualizadas periodicamente, cabendo ao Ministério do Trabalho, através da
Secretaria de Segurança e Medicina do Trabalho, baixar
as alterações necessárias. Atualmente, temos 36 normas,
NR-1 a NR-36, normatizando sobre as peculiaridades de
cada atividade ou setor de trabalho. Destacou-se algumas
normas que se relacionam a medidas gerais de proteção
e prevenção a agravos a saúde do trabalhador e algumas
específicas como a NR-32, que traz informações importantes sobre riscos biológicos. A NR-4 define os Serviços
Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina
do Trabalho (SESMT), objetivando promover a saúde e
proteger a integridade do trabalhador no local de trabalho,
cujo dimensionamento tem relação com o correspondente
grau de risco da atividade econômica da empresa. Entre as
competências dos profissionais integrantes do SESMT está
reduzir até eliminar os riscos existentes à saúde do trabalhador; suas atividades são principalmente preventivas.
A Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA)
(NR-5), composta por representantes do empregador e
dos empregados, tem a finalidade de prevenir acidentes e
MÉTODOS
Foi realizado um levantamento bibliográfico (relação
das bibliografias existentes nos acervos das bibliotecas
do sistema, livros e artigos de periódicos sobre o tema
em estudo 11 de janeiro a novembro de 2014, o qual
buscou estudos publicados entre 1999 e 2014. As bases de
dados utilizadas nesta pesquisa foram: Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES),
Scientific Electronic Library Online (SciELO), Biblioteca
Virtual em Saúde (BVS) – Centro Latino-Americano e
do Caribe de Informação em Ciências da Saúde, também
conhecido pelo seu nome original Biblioteca Regional de
Medicina (BIREME). Com o intuito de aprimorar os resultados, foram utilizados os seguintes descritores de busca:
dermatose ocupacional; onicomicoses mãos; dermatófitos unhas; manipuladores alimentos e contaminação
mãos. Também foi realizada pesquisa em livros específicos
da área de microbiologia, epidemiologia e dermatologia,
manuais e diretrizes relacionadas à medicina do trabalho.
Entre 49 artigos analisados, foram incluídos os que descreviam a microbiota das mãos, avaliando a pesquisa de espécies fúngicas. Destacou-se três grupos: trabalhadores da
área de alimentação, trabalhadores da área de saúde e um
terceiro grupo relacionado à população em geral, sem foco
na atividade laboral. Foram excluídos trabalhos que não
especificavam sobre percentuais de coletas de microrganismos nas mãos, que não envolviam humanos e que não
tinham relação específica com o tema de estudo.
RESULTADOS
SEGURANÇA, SAÚDE
E MEDICINA DO TRABALHO
As condições gerais de vida, relações, processo e
organização do trabalho são elementos fundamentais na
preservação da saúde dos trabalhadores1. Para garantir e
assegurar condições de saúde, tanto física quanto mental,
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):60-70
62
Ocorrência de espécies fúngicas isoladas a partir de mãos e unhas de trabalhadores
doenças decorrentes do trabalho. É importante destacar
a NR-6, que trata sobre os equipamentos de proteção
individual (EPI), considerando EPI todo dispositivo ou
produto, de uso individual utilizado pelo trabalhador, destinado à proteção de riscos suscetíveis de ameaçar a segurança e a saúde do trabalhador. O Programa de Controle
Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO) (NR-7) está
relacionado à promoção e prevenção da saúde do conjunto
dos trabalhadores, visando rastreamento e diagnóstico
precoce dos agravos à saúde relacionados ao trabalho.
Sua implantação baseia-se na identificação dos riscos à
saúde do trabalhador. O objetivo e campo de aplicação da
NR-9 é o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais
(PPRA), o qual deve ser elaborado e implementado pelo
empregador para a prevenção da saúde e a integridade dos
trabalhadores, através da antecipação, reconhecimentos,
avaliação e consequentemente controle da ocorrência de
riscos relacionados ao ambiente de trabalho. A NR-15
define sobre atividades e operações insalubres, destaca-se
no Anexo nº 14 as atividades ou operações que exponham
o trabalhador a agentes biológicos. Condições ambientais
de trabalho, organização do trabalho, mobiliário e equipamentos do posto de trabalho são importantes no desempenho adequado das atividades laborais e na prevenção de
agravos à saúde do trabalhador, a NR-17-Ergonomia, ressalta
sobre o estabelecimento de parâmetros que permitem a
adaptação das condições de trabalho às características
psicofisiológicas dos trabalhadores, proporcionando um
máximo de conforto, segurança e desempenho eficiente.
A NR-24 destaca as condições sanitárias e de conforto nos
locais de trabalho e a NR-36 estabelece sobre segurança e
saúde no trabalho em empresas de abate e processamento
de carnes e derivados, em seu item 36.9.4 aborda sobre
agentes biológicos12.
A NR-32 tem como objetivo e campo de atuação a segurança e saúde no trabalho em serviços de saúde; considera
risco biológico a probabilidade da exposição ocupacional a
agentes biológicos, e por sua vez considera agentes biológicos
os microrganismos, geneticamente modificados ou não, as
culturas de células, os parasitos, as toxinas e os príons. no
Anexo I temos a classificação dos agentes biológicos em classe
de risco 1, 2, 3 e 4; no Anexo II a tabela de classificação dos
agentes biológicos; e no Anexo III o plano de prevenção de
riscos de acidentes com materiais perfurocortantes. Quanto à
classificação dos agentes biológicos em classes de risco, temos:
• Classe de risco 1: se refere a baixo risco individual para
o trabalhador e para a coletividade, sendo baixa a probabilidade de causar doença em humano.
• Classe de risco 2: há moderado risco individual para o
trabalhador e baixa probabilidade de disseminação para
a coletividade, as doenças causadas têm tratamento e
profilaxia eficazes.
• Classe de risco 3: elevado risco para o trabalhador e com
probabilidade de disseminação para a coletividade, pode
causar doença e infecções graves ao ser humano.
• Classe de risco 4: elevado risco individual para o trabalhador e de disseminação para a coletividade, tem grande
poder de transmissibilidade entre os indivíduos, podendo
causar doenças graves, incuráveis, com profilaxia ou
tratamento ineficiente12.
Em 5 de outubro de 1988 foi promulgada a Constituição
da república Federativa do Brasil, que destaca entre as
competências do SUS, art. 200, inciso II, a execução das
ações de vigilância sanitária e epidemiológica, bem como
as de saúde do trabalhador; e no inciso VII, colaborar
na proteção do meio ambiente, nele compreendido o
do trabalho. A Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990,
denominada Lei Orgânica da Saúde, incluiu no campo de
atuação do SUS, art. 6º, incisos I, alínea “c” e V, executar
ações de saúde do trabalhador e colaborar na proteção
do meio ambiente nele compreendido o do trabalhador,
entendendo por saúde do trabalhador, para fins da lei, um
conjunto de atividades que se destina, através das ações de
vigilância epidemiológica e vigilância sanitária, à promoção
e proteção da saúde dos trabalhadores, assim como visa
à recuperação e reabilitação da saúde dos trabalhadores
submetidos aos riscos e agravos advindos das condições de
trabalho, definindo uma ampla abrangência (§ 3º); tratou
ainda da saúde do trabalhador nos artigos 13, 15, 16, 17 e
182. Normas Operacionais Básicas (NOBs) foram editadas
em 1991, 1993 e 1996 como mecanismos de instrumentalização e operacionalização do SUS. A NOB-SUS 01/96
incluiu a saúde do trabalhador no campo de atuação da
atenção à saúde. Conforme a necessidade de definição das
atribuições e responsabilidades como forma de orientar e
instrumentalizar as ações de saúde do trabalhador urbano
e do rural desenvolvidas pelas Secretarias de Saúde dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, foi aprovada
a Norma Operacional de Saúde do Trabalhador (NOST),
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):60-70
63
Ferreira MA, Martins D
na forma de anexo à Portaria Federal 3.908/GM, de 30 de
outubro de 19982. Considerando a atenção integral à saúde
do trabalhador, a Portaria nº 1.679/GM, de 19 de dezembro
de 2002, definiu no âmbito do SUS uma Rede Nacional de
Atenção Integral à Saúde dos Trabalhadores (RENAST),
definindo para a sua estruturação ações na rede de Atenção
Básica e no Programa de Saúde da Família, criação de
Centros de Referência em Saúde do Trabalhador (CRST)
e ações na rede assistencial de média e alta complexidade
do SUS. A Portaria nº 2.728, de 11 de novembro de 2009,
dispõe que a RENAST deverá ser implementada de forma
articulada entre o Ministério da Saúde, as Secretarias de
Saúde dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,
com o envolvimento de órgãos de outros setores dessas
esferas, executores de ações relacionadas com a saúde do
trabalhador, além de instituições colaboradoras nessa área13.
Em 23 de agosto de 2012, através da Portaria nº 1.823, foi
instituida a Política Nacional de Saúde do Trabalhador e
da Trabalhadora, a qual se estende a todos os trabalhadores, homens e mulheres, independentemente de sua
localização, urbana ou rural, de sua forma de inserção no
mercado de trabalho, formal ou informal, de seu vínculo
empregatício, público ou privado, assalariado, autônomo,
avulso, temporário, cooperativados, aprendiz, estagiário,
doméstico, aposentado ou desempregado, tendo como finalidade definir os princípios, as diretrizes e as estratégias a
serem observados pelas três esferas de gestão do SUS, para
o desenvolvimento da atenção integral à saúde do trabalhador, com ênfase na vigilância, visando à promoção e
proteção da saúde dos trabalhadores e à redução da morbimortalidade decorrente dos modelos de desenvolvimento
e dos processos produtivos.
Em relação à Previdência Social, a Lei nº 8.213, de 24
de julho de 1991, dispõe sobre os planos de benefícios
da previdência social, na qual as bases para se definir a
relação entre uma doença e o trabalho estão fundamentadas: nos artigos 19, 20 e 21, acrescentadas as alterações
estabelecidas pela Lei nº 11.430, de 26 de dezembro de
2006. O Decreto nº 3.048, de 06 de maio de 1999, e seus
anexos, Regulamento da Previdência Social, em seu art. 337
estabelece sobre a caracterização de acidente do trabalho
que será tecnicamente definido pela perícia médica do
INSS, mediante a identificação do nexo entre o trabalho e
o agravo. Este foi alterado pelo Decreto nº 6.042, de 12 de
fevereiro de 2007 (disciplina a aplicação, acompanhamento
e avaliação do fator acidentário de prevenção – FAP – e do
nexo técnico epidemiológico, e dá outras providências) e
pelo Decreto nº 6.957, de 09 de setembro de 2009 (altera
o Regulamento da Previdência Social em relação à aplicação, acompanhamento e avaliação do FAP). A Instrução
Normativa INSS/PRES nº 31, de 10 de setembro de 2008,
dispõe sobre procedimentos e rotinas referentes ao Nexo
Técnico Previdenciário, e dá outras providências. Todo esse
amparo legal define e embasa a caracterização do nexo
entre o trabalho e o agravo que é definido tecnicamente
pela perícia médica do INSS, como: nexo profissional, nexo
individual, nexo técnico epidemiológico previdenciário
(NTEP). O nexo profissional trata das condições de risco
ou agentes etiologicos aos quais o trabalhador está exposto
em seu ambiente de trabalho e as doenças relacionadas com
o trabalho. Consta no anexo II do Decreto nº 3.048/99 os
agente patogênicos causadores de doenças profissionais ou
do trabalho e o trabalho que contêm risco (lista A), e as
doenças com a respectiva relação de agentes etiológicos ou
fatores de risco de natureza ocupacional (lista B). O nexo
individual baseia-se em laudos de avaliação, por parte do
perito médico previdenciário, que atestem condições especiais de trabalho capazes de causar o adoecimento, mas
que não constam nas listas A e B do Decreto nº 3.048/99.
O NTEP é determinado a partir do cruzamento entre os
códigos da Classificação Internacional de Doenças (CID)
e da Classificação Nacional de Atividade Econômica
(CNAE) da empresa, apresentado na lista C do Anexo II
do Decreto nº 3.048/99. Baseia-se em dados epidemiológicos, nos quais doenças com maior prevalência em dado
ramo econômico, em relação a outros, pressupõem-se como
de origem ocupacional13.
DERMATOSE OCUPACIONAL, EXPOSIÇÃO
PROFISSIONAL E DOENÇAS FÚNGICAS
Dermatoses ocupacionais são alterações cutâneas
relacionadas ao trabalho ou pelas condições nas quais o
mesmo é executado, estando associadas a interações entre
fatores causais indiretos (idade, sexo, etnia, antecedentes
mórbidos e doenças preexistentes, umidade, temperatura, hábitos, entre outros) e diretos (agentes biológicos,
físicos, químicos ou mecânicos). Aproximadamente 80%
das dermatites ocupacionais são ocasionadas por produtos
químicos, irritantes e sensibilizantes, sendo a dermatite de
contato por irritantes ou alérgenos a dermatose ocupacional
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):60-70
64
Ocorrência de espécies fúngicas isoladas a partir de mãos e unhas de trabalhadores
mais frequente, representando cerca de 90% dos casos.
O diagnóstico é estabelecido com base na história de
exposição ocupacional, melhora do quadro clínico com o
afastamento e piora com o retorno ao trabalho, áreas do
corpo afetadas e características das lesões, exame físico
minucioso; resultados dos testes epicutâneos, nos casos
de dermatoses por sensibilizantes; exames laboratoriais,
culturas e histopatológicos2,14. Pode-se dividir as dermatoses ocupacionais em doenças cutâneas ocupacionais por
irritantes ou alérgenos e doenças cutâneas ocupacionais
não eczematosas decorrentes de agentes químicos, físicos
e biológicos. Determinadas ocupações estão associadas
ao aumento no risco de desenvolver infecções cutâneas,
profissionais de saúde, alimentação, limpeza e manutenção, fazendeiros e pessoas envolvidas com a criação de
gado, mas definir uma relação definitiva de causa e efeito
entre o trabalho e uma infecção específica não é simples
e exige isolamento laboratorial do agente, história clínica e
exame físico detalhado8. Conforme citado anteriormente,
a dermatose ocupacional mais frequente é a dermatite alérgica ou por irritante, mas no presente artigo destacou-se as
dermatoses cutâneas por agentes biológicos, e mais especificamente por fungos dermatófitos e Candida.
Os agentes etiológicos das doenças infecciosas relacionadas ao trabalho não são de natureza ocupacional e
o adoecimento está relacionado às condições ou circunstâncias em que o trabalho é executado, o nível de exposição ocupacional, que favorece o contato, o contágio
ou a transmissão, uma vez que os agentes etiológicos
estão disseminados no meio ambiente e não é possível
precisar uma demarcação entre o ambiente de trabalho
e o ambiente externo. Dermatofitoses, outras micoses
superficiais e candidíase podem ser consideradas como
doenças relacionadas ao trabalho do grupo II da classificação de Schilling2 e estão relacionadas a condições
de trabalho que requerem longas imersões das mãos em
água, irritação mecânica das mãos, situações que envolvam
aumento da transpiração, exposição da pele a umidade e
oclusão, sendo que a exposição ocupacional deve ser nitidamente caracterizada pela história clínica ocupacional e
pela inspeção em ambiente de trabalho8. Quanto à classificação dos agentes biológicos em classe de risco, NR-32,
Anexos I e II, os fungos estão no grupo 2, ou seja, risco
individual moderado para o trabalhador e baixa probabilidade de disseminação para a coletividade, podendo
causar doenças ao ser humano, para as quais existem
meios eficazes de profilaxia e tratamento12.
A determinação da relação de entre nexo causal e os
transtornos à saúde e o trabalho pode ser estabelecida, como
mencionado anteriormente, pelos procedimentos estabelecidos em perícia médica previdenciária, conforme padronizado e especificado nas listas A e B e C no Anexo II do
Decreto nº 3.048/99. A lista A traz uma relação de doenças
que podem ser causadas ou estão etiologicamente relacionadas com cada um dos agentes patogênicos ou grupos de
agentes patogênicos. Entre os agentes biológicos, os fungos
são mencionados, no referido anexo II, no item XXV-8; a
lista B traz as doenças infecciosas e parasitárias relacionadas com o trabalho (Grupo I da CID-10), relacionando
as doenças e os agentes etiológicos ou fatores de risco de
natureza ocupacional, nos itens XI e XII, do Anexo II, são
mencionadas, respectivamente, as dermatofitoses e outras
micoses superficiais e a candidíase. Na Tabela 1 está a lista
dos trabalhos com risco e na Tabela 2 as doenças fúngicas
com os respectivos agentes etiológicos ou fatores de risco
de natureza ocupacional.
Os fungos ou seus produtos metabólicos estão relacionados a três tipos de doenças em humanos: alérgicas
(interação de um hospedeiro sensibilizado com antígenos
fúngicos), tóxicas (ingestão de alimentos contaminados
com fungos) e infecciosas (o fungo age como patógeno
primário ou oportunista, causando as doenças chamadas
de micoses). As micoses são classificadas em superficiais,
subcutâneas, sistêmicas e oportunistas15. Onicomicose
relaciona-se à infecção fúngica superficial nas unhas,
causada por diversas espécies de fungos: dermatófitos,
não dermatófitos e leveduras. Há fatores que favorecem
a instalação de onicomicose, como perturbações circulatórias periféricas, resistência diminuída, traumatismo e
fatores de manutenção, como profissão, clima, disfunção
hormonal. Presume-se que em mais de 80% das onicomicoses as alterações ou traumatismos das unhas têm relação
com o início da infecção16.
Dermatofitoses ou tinhas são micoses superficiais (atualmente cutâneas), estão relacionadas a doenças causadas
por espécies de fungos filamentosos, taxonomicamente
relacionados nos gêneros: Trichophyton, Microsporum e
Epidermophyto. De acordo com a região do corpo afetada,
podem ser classificadas clinicamente como: tinea capitis
(cabeça), tinea barbae (barba), tinea corporis (corpo), tinea
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Ferreira MA, Martins D
cruris (virilha), tinea pedis (pé), tinea manuum (mãos),
tinea unguium (unhas)5. Caracteriza-se clinicamente pela
presença de lesões cutâneas com contornos arredondados,
bordas vesiculosas, pruriginosas em qualquer parte do tegumento. São produzidas por fungos referidos como dermatófitos, degradam a queratina, transformando-a em material
nutritivo, colonizando a pele, os pelos e as unhas, não invadindo os tecidos mais profundos15.
Baseado no habitat natural e no padrão de infecção dos
dermatófitos, eles são classificados em três categorias: geofílicos, zoofílicos e antropofílicos. Os dermatófitos geofílicos
vivem no solo e são patógenos ocasionais em humanos
e animais, geralmente infectam humanos por contato
direto, sendo disseminados normalmente por esporos
que podem viver anos em cobertores e outros objetos; o
Microsporum gypsem é o patógeno geofílico mais comum
em humanos8. Zoofílicos são espécies que parasitam a
pele e o pelo de animais, mas podem ser transmitidos ao
homem7. A transmissão pode ocorrer por contato direto
com espécies animais específicas ou indiretamente, quando
o pelo animal contamina roupas, habitação ou alimentos.
Animais domésticos infectados, como Microsporum canis em
cães e gatos, são fontes comuns dessas infecções em área
urbana8. Dermatófitos antropofílicos geralmente infectam
humanos e podem ser transmitidos direta ou indiretamente de pessoa a pessoa7. Frequentemente causam infecções epidêmicas; essas espécies adaptaram-se para utilizar
humanos como hospedeiros8.
Tabela 1. Agentes patogênicos, biológicos, causadores de doenças profissionais ou do trabalho, conforme previsto no artigo 20
da Lei nº 8.213, de 1991.
Agentes patogênicos
Trabalhos que contêm risco
Agricultura; pecuária; silvicultura; caça (inclusive a caça com armadilhas); veterinária; curtume
Construção; escavação de terra; esgoto; canal de irrigação; mineração
Manipulação e embalagem de carne e pescado
Microrganismos e parasitas infecciosos vivos e seus
produtos tóxicos.
Fungos (micose cutânea)
Manipulação de aves confinadas e pássaros
Trabalho com pelo, pele ou lã; veterinária
Hospital; laboratórios e outros ambientes envolvidos no tratamento de
doenças transmissíveis.
Trabalhos em condições de temperatura elevada e umidade (cozinhas; ginásios; piscinas; etc.)
Fonte: Anexo II, Decreto nº 3.048, de 06 de maio de 1999.
Tabela 2. Lista B, alterada pelo Decreto nº 6.957, de 9 de setembro de 2009, doenças infecciosas e parasitárias relacionadas com
o trabalho (Grupo I da CID-10).
Doenças
Agentes etiológicos ou fatores de risco de natureza ocupacional
Dermatofitose (B35) e outras micoses superficiais (B36)
Exposição ocupacional a fungos dos gêneros Epidermophyton,
Microsporum e Trichophyton, em trabalhos em condições de temperatura elevada e umidade (cozinhas, ginásios, piscinas) e outras
situações específicas de exposição ocupacional.
Candidíase (B37)
Exposição ocupacional a Candida albicans, Candida glabrata, etc.,
em trabalhos que requerem longas imersões das mãos em água e
irritação mecânica das mãos, tais como trabalhadores de limpeza,
lavadeiras, cozinheiras, entre outros.
Fonte: Anexo II, Decreto nº 3.048, de 06 de maio de 1999.
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Ocorrência de espécies fúngicas isoladas a partir de mãos e unhas de trabalhadores
Candidíase ou candidose relaciona-se a um grupo
diverso de infecções causadas por Candida albicans ou
por outros gêneros de Candida, sendo que 70 a 80%
de todas as infecções por Candida são causadas pela
espécie Candida albicans. Conforme estudos epidemiológicos, cresce a prevalência de espécies como C.
glabrata, C. tropicalis, C. krusei, C. dubliniensis e C. parapsilosis;
e diminui a prevalência relativa de C. albicans8.
Candidose ungueal e periungueal relacionam-se às micoses
superficiais produzidas pelas leveduras que atingem a região
superficial da pele ou das mucosas, em sua maioria relacionadas
a espécies do gênero Candida17. Espécies de Candida têm sido
associadas a infecções de unhas e de tecidos moles periungueais relacionadas a uma causa primária de natureza física,
traumática ou degenerativa, sendo as lesões mais comuns nas
unhas de pessoas que molham frequentemente as mãos, que
sofrem trauma nas mãos no trabalho ou que apresentam alterações degenerativas; também pode haver infecção bacteriana
secundária18. Os agentes do gênero Candida spp são comuns
de micoses oportunistas, sendo a espécie C. albicans a mais
importante causa de monilíase, vaginite, esofagite e candidíase mucocutânea crônica; e também causam infecções
disseminadas relacionadas a catéteres. Elas fazem parte da
microbiota normal do trato respiratório superior, gastrointestinal e genital feminino, além de fazer parte de determinadas
regiões do tegumento cutâneo, podendo invadir a camada
córnea da pele ou a lâmina ungueal de hospedeiros normais.
As lesões têm localização peculiar: nas unhas das mãos e nas
áreas intertriginosas da pele (região inguinal, espaços interdigitais das mãos, região submamária e axilar). Também é
possível ocorrer lesões nas unhas dos pés5,19.
Tabela 3 os autores, percentuais de positividade para fungos
e espécies predominantes, quando referidas.
A análise das mãos de profissionais da área de saúde é
destacada em vários trabalhos envolvendo profissionais de
unidade de terapia intensiva (UTI), de hospital materno-infantil e laboratório. A Tabela 4 destaca os autores, número
das amostras, percentuais de positividade para fungos e
espécies predominantes, quando referidas.
Destacando trabalhos em outras populações, a Tabela 5
consolida resultados de pesquisas de fungos em estudantes,
pacientes de ambulatórios, amostras de laboratórios e população em geral, sem especificação quanto à profissão.
DISCUSSÃO
As pesquisas de microrganismos nas mãos de trabalhadores e as recomendações relacionadas à higiene adequada
das mãos valorizam mais o risco de contaminação e transmissão de infecções a terceiros, desconsiderando muitas
vezes a importância de manter a saúde das mãos dos profissionais e a relação entre o trabalho e o agravo, quando da
ocorrência de doença que afete o trabalhador. Há falta
de critérios microbiológicos objetivos para avaliação das
mãos de trabalhadores, dificultando, assim, a nítida avaliação
das suas condições.
Na análise dos trabalhos estudados evidenciou-se diferenças na constatação de fungos nas mãos dos indivíduos,
em manipuladores de alimentos os percentuais variaram de
34,8 a 63,4%, predominando espécies de Candida. Em profissionais de saúde a variação foi ainda maior desde 6,7% até
93,0%, também predominando Candida. Nos trabalhos
envolvendo outras populações, observou-se um menor
percentual de positividade dos exames laboratoriais e
predomínio de dermatófitos. Com base nos trabalhos
revisados pode-se observar divergências em relação às
frequências de fungos nas mãos e unhas de trabalhadores,
REVISÃO DE ARTIGOS RELACIONADOS A
ESPÉCIES FÚNGICAS ISOLADAS A PARTIR DAS
MÃOS DE TRABALHADORES
Através da análise de amostras de raspados de unhas e
mãos de manipuladores de alimentos são apresentados na
Tabela 3. Análises de fungos em unhas e mãos de manipuladores de alimentos.
Autores
Amostras
Positividade
Espécie predominante
Silva et al.20
23
34,8%
Candida sp., C. parapsilosis
Lima et al.
50
60%
Candida sp., C. parapsilosis
68
63,4%
21
Andrade et al.22
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Ferreira MA, Martins D
Tabela 5. Análises de fungos em unhas e mãos de outras populações, não especificada a profissão
Autores
Amostras
Positividade
Espécie predominante
Martelozo et al.16
435
26,3%
Leveduras
Suqueira et al.30
280
(incluiu mãos e pés)
18,2%
Trichophyton rubum
T. mentagrophytes
11.085
1,5%
T. rubrum
2.920
6,8%
Diversos
Reis Filho et al.33
1.035
26,0%
Candida
Brilhante et al.34
2.297
1,7%
Dermatófitos
817
16,4% lesões unhas das mãos, sendo
positivas 56,2%
Candida não albicans
Xavier31
Araújo et al.
32
Calado35
Tabela 4. Análises de fungos em unhas e mãos de profissionais da área de saúde
Autores
Amostras
Positividade
Espécie predominante
Passos et al.23
30
73,3%
Candida albicans
Palos et al.24
16
93,7%
Martins-Diniz et al.25
66
39,4%
Hinrichsen et al.26
30
22,2%
Bueno et al.27
25
80,0%
Candida sp
M. pachydermatis
Santos et al.28
183 espaços intedigitais
151 escamas ungueais
31,1 %
9,3%
Candida parapsilosis
60 enfermeiros
30 estudantes e técnicos de
laboratório
20% mãos sadias*
26,7% danificadas*
6,7%*
Candida não albicans
Rocha29
C. parapsilosis
*Frequência de fungos leveduriformes antes da lavagem de mãos
o que pode estar relacionado ao fato dos estudos serem
dirigidos em diferentes estados, com condições climáticas,
temperatura e umidade distintas, presença de hábitos de
higiene e culturais diversos. Os trabalhos não seguem uma
uniformidade nos grupos pesquisados, nas amostras e na
sua execução, dificultando a análise comparativa, além
de terem sido encontrados poucos trabalhos específicos
relacionados à pesquisa de fungos nas mãos de manipuladores de alimentos. Os percentuais de positividade no
exame micológico direto e na cultura não foram relatados,
apesar da importância de realização dos dois métodos no
diagnóstico de micoses.
É de suma importância seguir as legislações e orientações pertinentes que regulamentam as atividades
profissionais, a avaliação de aspectos relacionados ao
desempenho dos profissionais, infraestrutura organizacional e aos recursos materiais, conjuntamente à
implementação de programas, instituindo a higienização correta das mãos, fiscalização do uso de EPIs e
execução correta dos serviços. Tais medidas podem
diminuir acentuadamente a contaminação fúngica e de
outros microrganismos nas mãos, assegurando a saúde e
bem-estar do profissional, bem como evitando a contaminação de materiais, alimentos e usuários. Nesse contexto,
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68
Ocorrência de espécies fúngicas isoladas a partir de mãos e unhas de trabalhadores
destacam-se as competências dos profissionais integrantes dos SESMT em atuar para reduzir até eliminar
os riscos existentes à saúde do trabalhador, determinar a
utilização de EPIs, conforme as especificações da NR-6 e
de acordo a necessidade, promover medidas preventivas,
esclarecer e conscientizar sobre prevenção de acidentes
do trabalho e doenças ocupacionais.
os percentuais variaram de 26,3 a 63,4%, e em profissionais de saúde, de 6,7 até 93,0%, com predomínio de
espécies de Candida, em ambos. Em outras populações a
variação foi de 1,5 a 56,2% e com predomínio de dermatófitos. Pesquisas relacionadas à detecção de fungos nas
mãos de trabalhadores podem fornecer informações quanto
à colonização das mãos, caracterizando as espécies mais
frequentes, podendo demonstrar particularidades em
relação à população em geral. A legislação oferece embasamento pertinente na caracterização de nexo entre o
trabalho e o agravo, relacionado as dermatoses ocupacionais, entretanto, é necessário ampliar as pesquisas e caracterizar melhor os aspectos relacionados com a colonização
fúngica e o desenvolvimento de doença.
CONCLUSÕES
Evidenciou-se percentual maior de detecção de fungos
nas mãos dos trabalhadores quando comparados com a
população em geral. Em manipuladores de alimentos,
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Otávio, 6.200, Universidade Federal do Amazonas, Instituto de Ciências
Biológicas, Departamento de Morfologia – Japiim – CEP: 69077-000 – Manaus
(AM), Brasil – E-mail: [email protected]
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):60-70
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DIRETRIZ
TÉCNICA ANAMT
Recebido em: 29/10/2015
Aprovado em: 10/11/2015
Fonte de financiamento: nenhuma
DIRETRIZ TÉCNICA DA ANAMT (DT nº 01/2015)* —
Epilepsia e Trabalho: Rastreamento
TECHNICAL GUIDELINES OF ANAMT (DT no 01/2015)
– Epilepsy and Work: Screening
Fernando Akio Mariya1, José Domingos Neto2, Diego Nozaki3, Eduardo Myung4,
Mario Bonciani5, Flavia de Almeida6
‘ ... medicina de qualidade não consiste na aplicação
indiscriminada de exams laboratoriais a um paciente,
mas sim no esclarecimento das probabilidade e
possibilidades de um caso assim como quais testes
fornecem as melhores expectativas de informações
valiosas.’ (Francis Peabody, 1922)
P(Programas de Rastreamento) I(Eletroencefalografia)
C(não há descritor controlado) O(Epilepsia, Acidentes
de Trabalho, Acidentes Aeronáuticos e Acidentes
de Trânsito). Para a segunda pergunta de pesquisa,
a estratégia PICO estabelecida foi: P(Programas de
Rastreamento) I(Questionários) C(não há descritor
controlado) O(Epilepsia, Acidentes de Trabalho, Acidentes
Aeronáuticos e Acidentes de Trânsito).
A terceira etapa foi a realização das buscas nas seguintes
bases e/ou fontes de dados - TRIP DATABASE, JAMA,
PUBMED (incluindo MEDLINE), LILACS, COCHRANE
LIBRARY e Biblioteca Central da Organização Internacional
do Trabalho (LABORDOC). Para primeira pergunta, os
critérios de inclusão foram artigos em inglês e português,
sem limite de tempo, completos e temática de rastreamento
da epilepsia a partir do Eletroencefalograma com ou sem
fotoestimulação e os critérios de exclusão foram artigos
com temática de diagnóstico e tratamento, artigos exclusivamente em pediatria e artigos com temática de rastreamento
da epilepsia sem eletroencefalograma. A última atualização
ocorreu no dia 25/07/2015. No PUBMED, utilizou-se a
estratégia de busca com os descritores: “Mass Screening” AND
“Electroencephalography” AND (“Epilepsy” OR “Accidents,
Aviation” OR “Accidents, Occupational” OR “Accidents, Traffic”).
DESCRIÇÃO DO MÉTODO
DE COLETA DE EVIDÊNCIA
Para a formulação deste documento realizou-se uma
revisão da literatura.
A primeira etapa foi um levantamento preliminar da
literatura e definição do tema.
A segunda etapa foi a formulação das perguntas de
pesquisa, definindo-se as perguntas conforme estratégia
PICO (P de população ou problema, I de intervenção, C
de controle e O de desfecho). Para essa etapa, r­ ealizou-se
a determinação de descritores controlados a partir dos
Descritores em Ciência de Saúde (DECS) vinculada
à Biblioteca Virtual da Saúde (BVS). Para a primeira
pergunta de pesquisa, a estratégia PICO estabelecida foi:
*Diretriz publicada originalmente no site da Associação Nacional de Medicina do Trabalho. Disponível em: <http://www.anamt.org.br/site/arq_consulta_publica/arquivo_2.pdf>.
1
Curso de Especialização em Medicina do Trabalho da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) – São Paulo (SP), Brasil.
2
Curso de Especialização de Medicina do Trabalho do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (FCMSCSP) –
São Paulo (SP), Brasil.
3
Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (FAMERP) – São José do Rio Preto (SP), Brasil.
4
Universidade de São Paulo (USP) – São Paulo (SP), Brasil.
5
Associação Nacional de Medicina do Trabalho (ANAMT/AMB) – São Paulo (SP), Brasil.
6
Departamento de Saúde Coletiva, Faculdade de Ciências Médicas da FCMSCSP – São Paulo (SP), Brasil.
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):71-6
71
Mariya FA et al.
Foram encontrados 40 artigos no total, 5 artigos incluídos,
35 artigos excluídos (17 artigos exclusivamente em pediatria,
11 artigos em temática de diagnóstico e tratamento, 6 artigos
em temática de rastreamento sem EEG e 1 artigo na língua
japonesa). A partir dos 5 artigos incluídos, utilizou-se a estratégia sensibilizada com análise das referências bibliográficas
destes artigos, determinando assim, a inclusão de mais 1 artigo.
Não foram encontrados artigos no JAMA, na COCHRANE
LIBRARY, na LABORDOC, na TRIP DATABASE e na
LILACS. Para segunda pergunta, os critérios de inclusão
foram artigos em inglês e português, sem limite de tempo,
completos e temática de rastreamento da epilepsia a partir de
questionários aplicados a população geral que inclua a população economicamente ativa e os critérios de exclusão foram
artigos com temática de rastreamento de riscos ou doenças
não epilépticas, artigos com temática de rastreamento de
comorbidades relacionadas a epilepsia, artigos com temática
de rastreamento de doenças não epilépticas e artigos exclusivamente em pediatria. A última atualização ocorreu no dia
07/09//2015. No PUBMED, utilizou-se a estratégia de busca
com os descritores: “Mass Screening” AND “Questionnaires”
AND (“Epilepsy” OR “Accidents, Aviation” OR “Accidents,
Occupational” OR “Accidents, Traffic”). Foram encontrados
um total de 46 artigos sendo incluídos 7 artigos e excluídos
39 artigos (3 artigos sem acesso, 22 artigos de rastreamento
de riscos ou doenças não epilépticas, 12 artigos de rastreamento de comorbidades relacionadas a epilepsia, 1 artigo
de rastreamento de doenças não epilépticas, 1 excluído
pois incluía apenas pacientes que referiam ser portadores
de epilepsia). A partir dos 7 artigos incluídos, utilizou-se a
estratégia sensibilizada com análise das referências bibliográficas destes artigos, determinando assim, a inclusão de
mais 3 artigos. No TRIP DATABASE, utilizou-se a estratégia de busca com os descritores: (title: “Mass Screening” or
“Screening”)(title: “Questionnaires” )(“Epilepsy” OR “Accidents,
Aviation” OR “Accidents, Occupational” OR “Accidents, Traffic”).
Foram encontrados um total de 4 artigos sendo incluído
1 artigo e excluídos 3 artigos (2 artigos de rastreamento de
riscos ou doenças não epilépticas e 1 artigo exclusivamente
em pediatria). Não foram encontrados artigos no JAMA, na
COCHRANE LIBRARY, na LABORDOC e na LILACS.
A quarta etapa foi a análise do material levantado e determinação dos níveis de evidências que fundamentaram as
recomendações propostas.
GRAU DE RECOMENDAÇÃO
E FORÇA DE EVIDÊNCIA:
A: Estudos experimentais ou observacionais de melhor
consistência.
B: Estudos experimentais ou observacionais de menor
consistência.
C: Relatos de casos (estudos não controlados).
D: Opinião desprovida de avaliação crítica, baseada em
consensos, estudos fisiológicos ou modelos animais.
OBJETIVOS
Analisar a relevância técnica e científica do rastreamento
da epilepsia na prática da medicina do trabalho.
1. INTRODUÇÃO
Aproximadamente 80% dos 50 milhões de pessoas no
mundo com epilepsia vivem em países em desenvolvimento1(D). As taxas de incidência de epilepsia registradas na Europa
e América do Norte variam entre 30 a 50 pessoas com epilepsia
por 100 mil indivíduos por ano. Estudos na América do Sul
relataram taxas de incidência de 113 pessoas com epilepsia por
100 mil indivíduos por ano no Chile 2(B) e 122-190 pessoas
com epilepsia por 100 mil indivíduos por ano no Equador 3(B).
Em relação à epilepsia e trabalho, existem evidências que
associam fracamente a epilepsia com acidentes de trabalho,
porém tal associação é determinada a partir de estudos de
baixa qualidade metodológica e, portanto, com conclusões meramente especulativas. Em uma coorte prospectiva
multicêntrica de 2006, os resultados foram inconclusivos
devido ao baixo número acidentes de trabalhos evidenciados7(B). Da mesma forma, em uma revisão sistemática de
2008, observaram-se achados não significativos para associação de epilepsia e acidente de trabalho e observou-se, a
partir do levantamento preliminar, a presença de estudos
com baixa qualidade metodológica8(A).
Em relação ao processo investigativo de um episódio
convulsivo, o diagnóstico da epilepsia é, fundamentalmente,
baseado no exame clínico sendo o eletroencefalograma
(EEG) com fotoestimulação um exame complementar que
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):71-6
72
Epilepsia e Trabalho: Rastreamento
auxilia tanto na confirmação diagnóstica como na classificação da doença4(A)5(B).
Em contrapartida, a utilização do EEG para rastreamento
de epilepsia é controverso. Apesar disso, o EEG é utilizado
em alguns países, entre eles algumas nações da Europa,
principalmente na seleção de trabalhadores para tripulação
aérea na aviação civil e militar. Porém, não é mais utilizado
para esta finalidade em vários outros países, como Canadá,
Estados Unidos e Austrália6(C).
Dessa forma, torna-se fundamental a diferenciação entre
EEG para rastreamento e EEG para diagnóstico. O EEG
para rastreamento deve ser distinguido do EEG diagnóstico
sendo este último utilizado na avaliação inicial de aptidão em
trabalhadores com fatores de risco para convulsões, como
a história de convulsão na infância, traumatismo craniano,
história familiar de epilepsia, e investigação de episódio
recente de alteração na consciência entre outros6(C).
Nesse sentido, o EEG para rastreamento é defendido por
alguns médicos, a fim de reduzir a chance de um episódio
convulsivo durante a atividade laboral, que colocaria em
risco: vidas e equipamentos. Isto baseado na crença de que a
exclusão de trabalhadores com certas anomalias no EEG evitaria
convulsões durante a atividade laboral6(C). Nesse mesmo
sentido, alguns médicos defendem a utilização do EEG para
rastreamento baseando-se na problemática associada à judicialização da medicina a fim de proteção legal da empresa.
Dessa forma, o cenário atual no Brasil é a solicitação
do EEG para rastreamento sendo comumente utilizado no
exame médico ocupacional de forma periódica e sistemática,
e inclusive utilizado em atividades laborais que não apresentam o risco de acidentes, podendo ser considerado um
procedimento discriminatório.
Diante desse cenário, este levantamento de dados da
literatura destina-se a contextualizar a problemática para
o rastreamento da epilepsia na seleção de trabalhadores, e,
ao mesmo tempo, garantir acesso seguro ao trabalho para
funcionários e empresas.
os programas de rastreamento9(D). Abaixo descrevemos
algumas considerações em relação ao EEG para rastreamento.
Na seleção de um exame para rastreamento, a característica mais importante é a sensibilidade, que deve ser muito
alta10(D). Em relação ao EEG, o valor da sensibilidade
encontra-se entre 20 a 55 por cento na realização de apenas
um exame11,12(B). Mesmo com o seriamento da realização
do exame, a sensibilidade encontrada passa de 20 a 55 por
cento para não mais que 80 a 90 por cento12-15(B).
Em relação à interpretação dos achados do EEG, é
importante frisar que um EEG anormal não define epilepsia,
pois a maioria dos achados anormais são inespecíficos.
Dessa forma, observa-se uma grande variação na interpretação quando o EEG é lido por médicos sem treinamento
específico levando a uma interpretação errônea de padrões
benignos ou normais 6-19(B)20,21(C).
Em relação aos estudos que descreviam a utilização
do EEG para rastreamento, segue algumas considerações.
Todos os estudos selecionados são relacionados ao uso
do EEG para rastreamento na seleção de trabalhadores para
aviação civil e/ou comercial.
A prevalência de achados específicos em EEG de
candidatos a seleção, na aviação civil e militar, é de aproximadamente 0,7% (intervalo entre 0,1-5,4%)22,25,27(B).
Os estudos selecionados apresentavam limitações metodológicas como seguimento curto dos trabalhadores com
EEGs com alterações específicas e presença de inadequações nos grupos controles.
Gregory et al. analisaram uma população de 13.658 candidatos e seguiram 43 de 69 indivíduos com EEG com alterações
específicas ao longo de um período de 5 a 29 anos, e apenas 1
desenvolveu epilepsia22(B). Everett e Jenkins analisaram 2.947
candidatos e seguiram 14 indivíduos com EEGs com alterações
específicas durante um período de 10 a 15 anos, observando
que nenhum deles desenvolveu a epilepsia24(B). LeTourneau
e Merren analisaram 28.658 candidatos e seguiram 31 de 38
indivíduos com EEG com alterações específicas, sendo que
apenas 1 sujeito desenvolveu epilepsia23(B). Dessa forma,
observa-se que o número de candidatos com EEG com alterações específicas que evoluíram com epilepsia é muito baixo
(0-3%)25(B), ao mesmo tempo observa-se um número elevado
de falsos positivos nestas populações estudadas. Dessa forma,
o EEG para rastreamento efetuado em assintomáticos sem
indicação clínica em um população com baixa prevalência da
doença, tem valor limitado ou possivelmente prejudicial28(D).
2. RESULTADOS E DISCUSSÕES
2.1. O EEG É UM EXAME INDICADO PARA
RASTREAMENTO DA EPILEPSIA?
A Organização Mundial da Saúde (OMS), em 1968, por
Wilson e Jungner, estabeleceu critérios de elegibilidade para
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):71-6
73
Mariya FA et al.
Estes dados levantados foram corroborados por
Mitchell e Schenk que estimaram que o uso do EEG para
rastreamento poderia evitar um acidente aéreo a cada
8.000 anos com custo do rastreamento para o Reino Unido
de € 2.400.000.00025(B). Portanto, apresentando custo
efetividade prejudicada26(C).
Dessa forma, Zifkin et al concluíram que as atuais práticas
de rastreamento a partir do EEG podem ser um importante desvio de recursos de meios mais úteis para avaliar
e controlar a aptidão médica, especialmente em países em
desenvolvimento, nos quais o treinamento dos funcionários e a manutenção de equipamentos são, provavelmente,
os focos mais urgentes para ação6(C).
Dessa forma, observa-se nesses estudos que o principal
questionário de predição clinica utilizado foi o Questionário
da OMS sendo aplicado, no geral, em estudos transversais
apresentando sensibilidade que variou de 95,8 a 100% e
especificidade que variou de 80 a 97%34-38(B).
A principal aplicação do Questionário da OMS foi observada na Campanha Global Contra Epilepsia criada pela
OMS, ILAE (International League Against Epilepsy), IBE
(International Bureau for Epilepsy), em 1997, com os objetivos
de reduzir o atraso no diagnóstico e tratamento, promover o
esclarecimento público sobre a epilepsia, promover prevenção
primária e secundária, melhorar o cuidado da epilepsia no
atendimento médico, social e psicológico, reduzir as limitações dos pacientes e familiares incluindo a questão do
acesso ao trabalho para os portadores da doença.
Os Projetos Demonstrativos (PD) desta campanha
foram elaborados e executados em diversos países incluindo
Brasil, Argentina, China, Índia, Sudão, Somália, Indonésia
e outros39(B). O PD é dividido em três fases principais:
avaliação da situação, avaliação da intervenção e avaliação
do controle40(B). Para a fase de avaliação da situação da
epilepsia, utiliza-se o questionário da OMS para rastreamento de epilepsia (Questionário I) que possui validação
para o português sendo que na presença de uma ou mais
respostas positivas nas perguntas determina-se um rastreamento positivo41(B).
Dessa forma, observa-se que o questionário da OMS
apresenta qualidades técnico cientificas para rastreamento
da epilepsia incluindo objetividade, baixo custo de aplicação
e validação científica para o português. Ao mesmo tempo, o
questionário apresenta limitações que inclui a baixa prevalência da epilepsia, limitações metodológicas nos estudos
levantados e ser operador dependente.
Recomendação
As evidências científicas fundamentam pela não realização
do EEG, com ou sem fotoestimulação para rastreamento na
seleção de trabalhadores para atividade laboral6(C)22-25,27(B).
Dessa forma, não recomendamos a utilização do EEG,
com ou sem fotoestimulação, para rastreamento de epilepsia
na prática da Medicina do Trabalho.
2.2. OS QUESTIONÁRIOS DE PREDIÇÃO
CLÍNICA ESTÃO INDICADOS PARA
RASTREAMENTO DA EPILEPSIA?
O Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional
(PCMSO) tem o objetivo de promoção e preservação da
saúde do conjunto dos seus trabalhadores, para isto deverá
considerar as questões incidentes sobre o indivíduo e a coletividade de trabalhadores, privilegiando o instrumental clínico-epidemiológico na abordagem da relação entre sua saúde e
o trabalho. Tem então o caráter de prevenção, rastreamento
e diagnóstico precoce dos agravos à saúde relacionados ao
trabalho. Dessa forma, para a implantação do PCMSO, o
problema clínico a ser rastreado deve atender aos critérios
propostos por Wilson e Jungner para os princípios e práticas
de rastreamento de doenças.
Nesse sentido, a partir da análise dos artigos levantados, observa-se que os estudos de rastreamento para
epilepsia utilizando questionários de predição clínica
são bastante heterogêneos, principalmente, na população
escolhida para rastreamento, no tipo de questionário
utilizado e na sua adaptação, no conceito de epilepsia
utilizado e na metodologia de análise dos resultados da
aplicação dos questionários29-33(B).
RECOMENDAÇÃO
As evidências cientificas levantadas determinam que há
necessidade de mais estudos com metodologia padronizada
que minimize as inúmeras fontes de vieses nos estudos que
utilizam o Questionário da OMS para rastreamento a fim
de permitir uma conclusão para seu uso sistematizado42(A).
Dessa forma, não recomendamos a aplicação sistemática
do questionário da OMS para rastreamento de epilepsia na
prática da Medicina do Trabalho29-38(B)42(A).
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):71-6
74
Epilepsia e Trabalho: Rastreamento
Questionário I. Questionário para identificação de indivíduos com epilepsia (OMS).
Perguntas
Respostas
1 - Você tem ou teve crises (ataques, acesso, convulsão) na qual perde a consciência e cai subitamente?
E na sua casa, alguém tem?
SIM [ ] NÃO[ ]
2 - Você tem ou teve crises em que perde o contato com a realidade (meio) e fica como se estivesse fora do
ar ? E na sua casa, alguém tem?
SIM [ ] NÃO[ ]
3 - Você tem ou teve crises na qual tem repuxões incontroláveis em braços, pernas, na boca ou vira a
cabeça para o lado? E na sua casa, alguém tem?
SIM [ ] NÃO[ ]
4 - Você tem ou teve crises de desmaio e que ao acordar nota que fez xixi ou cocô na roupa sem perceber?
E na sua casa, alguém tem?
SIM [ ] NÃO[ ]
5 - Você tem ou teve crises na qual sente sensação ruim de “fundeza” ou bola na “boca do estômago” e que
sobe até a garganta e em seguida sai fora do ar, e depois dizem que você ficou mexendo em algo com as
mãos ou mastigando ou olhando para algo distante? E na sua casa, alguém tem essas crises?
SIM [ ] NÃO[ ]
6 - Algum médico ou profissional de saúde ou mesmo familiares já lhe disse que você tem ou teve convulsão febril na infância; ou durante alguma doença grave qualquer? E na sua casa, alguém teve este
problema?
SIM [ ] NÃO[ ]
7 - Você tem rápidos abalos tipo “choque” nos braços (as coisas caem da mão) ou pernas, com ou sem
queda, principalmente pela manhã?
SIM [ ] NÃO[ ]
8 - Há alguém na sua casa com epilepsia em algum asilo?
SIM [ ] NÃO[ ]
Fonte: Borges MA et al., 2004
não recomendação para aplicação sistemática do questionário da OMS, ou seja, sem discriminação de critérios
da população a ser aplicado, na prática da Medicina do
Trabalho. Nesse sentido, sugere-se o incentivo de estudos,
com maior poder estatístico, utilizando o questionário da
OMS aplicado na Medicina do Trabalho a fim de determinar, com maior segurança, o impacto da aplicabilidade
do questionário para o acesso seguro ao trabalho para
funcionários e empresas.
3. CONCLUSÕES
A utilização do EEG para rastreamento em trabalhadores assintomáticos, como ocorre na prática atual da
Medicina do Trabalho no Brasil, apresenta limitações que
prejudicam sua utilização devido à baixa sensibilidade, ao
elevado número de falsos positivos e ao desvio de recursos
financeiros de outras áreas mais prioritárias. Dessa forma,
conclui-se com a não recomendação do EEG, com ou sem
fotoestimulação, para rastreamento de epilepsia na prática
da Medicina do Trabalho. Em relação ao questionário da
OMS para rastreamento de epilepsia, apesar de apresentar
qualidades técnico cientificas para rastreamento, as limitações levantadas na análise dos estudos determinou pela
CONFLITO DE INTERESSES
Não há qualquer tipo de conflito de interesses relacionado
a qualquer um dos autores relacionados neste documento.
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epilepsy: a systematic review. Epilepsia. 2014 Nov;55(11):1772-80.
doi: 10.1111/epi.12811. Epub 2014 Nov 6.
Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):71-6
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CALENDÁRIO
DE EVENTOS
ABRIL
MAIO
Ciclo de Encontros - Amazônia Meio Ambiente do
Trabalho - 3º Encontro
Data: 28 e 29 de abril de 2016
Local: Audiotorio TRT da 8º Região
Endereço: Travessa Dom Pedro I, 750 – Belém (PA)
Contato: (91) 4008-7280
Homepage: http://amatra8.org.br
Realização da XL Prova de Titulo de Especialista em
Medicina do Trabalho
Data: 15 de maio de 2016 (Domingo)
Horário: 13h30 às 17h30
Local: Recanto Cataratas Thermas Resort e Convention
Endereço: Avenida Costa e Silva, 3.500 -– Foz do Iguaçu (PR)
Homepage: www.anamt.org.br
E-mail: [email protected] / [email protected]
22a Conferência Mundial de Promoção da Saúde
da UIPES
Data: 22 a 26 de maio de 2016
Local: Expo Unimed Teatro Positivo
Endereço: Rua Prof. Pedro Viriato Parigot de Souza,
5300 – Campo Comprido – Curitiba (PR)
Homepage: http://www.iuhpeconference2016.com/
index.php
Esta seção da revista está aberta para divulgar eventos nacionais e internacionais. O material deverá ser enviado à Editora-Assistente Sandra Lucia Picchiotti através do
e-mail: [email protected]
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Rev Bras Med Trab. 2016;14(1):I
I
PRODUÇÃO EDITORIAL
ZEPPELINI
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Zeppelini – Tel: 55 11 2978-6686 – www.zeppelini.com.br
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REVISTA BRASILEIRA DE
MEDICINA DO TRABALHO
Disponível em iPad e Android
Vo l u m e 1 4 • N ú m e r o 1 • 2 0 1 6
ISSN 1679-4435
Endereço on-line: www.anamt.org.br
Revista Brasileira de Medicina do Trabalho
ARTIGOS ORIGINAIS
» Medicina do Trabalho e doenças emergentes, reemergentes e negligenciadas: a conduta no caso das
febres da dengue, do Chikungunya e do Zika vírus
» Afastamento do trabalho por pacientes gestantes: principais causas de absentismo
» Determinação dos níveis de exposição de metais em trabalhadores da construção naval: impactos
e desafios
» A aplicação da arquitetura de informação na gestão dos riscos das doenças crônicas em trabalhadores:
uma análise preliminar
Volume 14 • Número 1 • 2016
» Patologias osteomusculares como causa de aposentadoria por invalidez em servidores públicos do
município de São Luís, Maranhão
REVISÕES DE LITERATURA
» Silicose e esclerose sistêmica (síndrome de Erasmus): a importância do reconhecimento da associação
entre doenças
» O controle estatal em saúde e segurança no trabalho e a auditoria do Programa de Controle Médico de
Saúde Ocupacional
» Ocorrência de espécies fúngicas isoladas a partir de mãos e unhas de trabalhadores
DIRETRIZ TÉCNICA ANAMT
» Diretriz Técnica da ANAMT (DT nº 01/2015) — Epilepsia e Trabalho: Rastreamento
CALENDÁRIO DE EVENTOS
PUBLICAÇÃO OFICIAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL
DE MEDICINA DO TRABALHO – ANAMT
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