Geografia. Ensino & Pesquisa, v. 12, p. 2462-2479, 2008. Santa Maria: UFSM. HEMEROBIA NAS UNIDADES DE PAISAGEM DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO SOROCABA (SP) – DESAFIOS E OPORTUNIDADES PARA A CONSERVAÇÃO DA NATUREZA Oriana Aparecida Fávero ([email protected]) - CCBS/UPM1 João Carlos Nucci ([email protected]) – DG/UFPR2 Mário De Biasi ([email protected]) – DG/FFLCH/USP3 RESUMO: Considerando que a natureza desempenha inúmeras funções básicas para o suprimento do ser humano e que as transformações antrópicas têm provocado profundas modificações nos sistemas naturais, capazes de comprometer sua conservação, o presente trabalho objetivou avaliar os graus de alteração antrópica (hemerobia) nas Unidades de Paisagem (UPs) da Bacia Hidrográfica do Rio Sorocaba/SP, escala 1:250.000 [elaborado por Fávero (2007)], e as contribuições, dos usos das terras predominantes em cada UP, para a conservação da natureza (CCN). Partindo-se do pressuposto de que quanto mais modificadores forem os usos maiores as transformações nos sistemas naturais e menor sua estabilidade dificultando a conservação da natureza, elaborou-se o Mapa de Hemerobia das 35 UPs da Bacia que contemplou a avaliação da CCN. Foram identificados cinco graus de hemerobia que foram classificados comparando os diferentes usos (predominantes) e tipos de coberturas entre si conforme sua contribuição (relativa) para a conservação da natureza (muito alta, alta, média, baixa e muito baixa). Verificou-se que a maior parte das UPs (21 UPs - cerca de 65% da área da Bacia) apresentam usos das terras que acarretam modificações moderadas a fortes em sua paisagem, pastagens e campos antrópicos, que alteram o potencial de suprimento de funções naturais, mas mantêm a capacidade de recuperação de seu estado original e, portanto promovem média CCN. Usos mais modificadores e artificializadores, desde cultivos comerciais até graus diversos de urbanização, podem desestruturar os sistemas naturais comprometendo sua capacidade de recuperação, oferecendo baixa e muito baixa CCN, e compõem cerca de 25% da área estudada (onze UPs). Todavia usos antrópicos bem menos modificadores (silvicultura) que podem permitir melhor cumprimento das funções naturais, e os usos indiretos (recreação, áreas protegidas, etc.), são oportunidades de alta e muita alta CCN, porém reduzidas na área estudada (10% - três UPs). PALAVRAS CHAVES: hemerobia, unidade de paisagem, conservação da natureza. 1 Bióloga, doutora em Geografia Humana, Centro de Ciências Biológicas e da Saúde da Universidade Presbiteriana Mackenzie. 2 Biólogo, doutor em Geografia Física, Departamento de Geografia da Universidade Federal do Paraná. 3 Geógrafo, doutor em Geografia Humana, Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. Abstract: The nature performs countless functions according to human demand, however the anthropological transformations have caused deep changes in natural systems, which are able to endanger these functions maintenance. This paper has objectivated to evaluate the degrees of anthropological alterations (hemeroby) in the landscape’s unities (UPs) of the Sorocaba River’s Basin/SP, scale 1:250.000, and the contribution of prevailing land usage in each UP, to the nature’s conservation (CCN). From the idea of the more modifiers are the usages, the more transformations in the natural systems, and minor its stability, making more difficult the nature’s conservation. A Hemeroby Map of the 35 UPs in the basin was made that completed the evaluation of the CCN. Five hemeroby degrees were identified, that were classified by comparing the different usages (prevailing) and kinds of coverage among them according their distribution (relative) to the nature’s conservation (very high, high, medium, low and very low). It was verified that 21 UPs (around 65% of the basin’s area) show land usages that cause moderated to strong modifications in its landscape, pastures an anthropical fields, that change the natural functions` supplying potential, but that keep the capacity of recovering of its original state and, therefore, promotes medium CCN. Usages that are stronger modifiers and artificial makers, since commercial cultivations up to different degrees of urbanization, can eliminate the structure of the natural systems jeopardizing their recovering capacity, offering low and very low CCN, and consists around 25% of the study area (eleven UPs). Nevertheless, athropical usages that are less modifiers (as forest cultivation) that can allow better accomplishment for natural functions, and the indirect usages (recreation, protected areas, etc.) are opportunities of high and very high CCN, although reduced in the study area (10% and three UPs). KEY-WORDS: hemeroby, landscape unity, nature’s conservation. 1 INTRODUÇÃO O bem-estar e a qualidade de vida do ser humano dependem tanto da manutenção das funções da natureza quanto das relações técnicas que são estabelecidas entre ser humano e natureza, as quais acarretam diversos graus de transformação dos sistemas naturais. De forma direta ou indiretamente inúmeros benefícios e serviços são realizados pela natureza na medida em que a integridade das funções por ela realizadas é mantida. De acordo com De Groot (1992 e 2006), a natureza realiza cinco grupos de funções (de regulação, de habitat, de produtividade, de suporte e de informação) que conforme Born e Talocchi (2002) oferecem: os recursos ou bens – produtos ou elementos – e, os serviços naturais – processos protetores e regulatórios entre outros –, necessários ao bem-estar dos seres humanos e dos demais seres vivos. Entretanto, as transformações antrópicas quando feitas pensando-se apenas no maior lucro direto e imediato, baseada na crença no avanço tecnológico e sem um planejamento com visão sistêmica, têm provocado profundas modificações nos sistemas naturais, com conseqüências indesejáveis (LEFF, 2000; DOUROJEANNI e PÁDUA, 2001; FOLADORI, 2001; WILSON, 2002; FÁVERO et al., 2004; e FÁVERO, 2007). Além do comprometimento das funções da natureza, com a crescente tendência à concentração das populações em áreas urbanas, por exemplo, cada vez menos os cidadãos conseguem encontrar oportunidades de contato direto com a natureza (cuja importância para a saúde é fato comprovado cientificamente) já que, na maioria dos casos, a urbanização ocorre com aumento de “concreto” em detrimento da paisagem natural (McHARG, 2000; FÁVERO et al., 2004; e FÁVERO, 2007). Segundo ainda vários autores (ODUM, 1985; FORMAN, 1995; MATEO RODRIGUEZ, 2000; e McHARG, 2000) certas perturbações (estresses físicos) introduzidas pelos seres humanos (ou antrópicas), nos ecossistemas, são repentinas demais, violentas demais ou arrítmicas demais para o processo de adaptação da comunidade biótica, de tal forma que ocorre uma forte oscilação ao invés de uma estabilidade. Portanto, certos impactos que podem ser absorvidos nas paisagens naturais, em paisagens antropogênicas podem ser catastróficos. Desta forma, a adoção de uma postura precavida e de valorização de medidas de conservação da natureza, nos processos de planejamento do uso das terras e de transformação da natureza, buscando a utilização de conceitos e métodos que contemplem um melhor aproveitamento de seu potencial, tem se tornado emergencial. Das várias abordagens geográficas que vêm desenvolvendo conceitos e métodos para procurar integrar sociedade e natureza destaca-se a Ciência da Paisagem cujos princípios básicos são (MONTEIRO, 2000; MATEO RODRIGUEZ, 2000; NUCCI, 2001; MATEO RODRIGUES et al., 2004; DIAS, 2006; e FÁVERO, 2007): 9 a construção de conceitos e métodos que buscam integrar os elementos da natureza e da sociedade de forma espacializada (e/ou georreferenciada); 9 a valorização da natureza e do entendimento de suas leis para buscar estabelecer suas potencialidades (limites e aptidões para os usos antrópicos). Tais princípios são fundamentais para o estabelecimento de estratégias, com critérios e parâmetros, que possibilitem utilizar a natureza aproveitando ao máximo os fluxos de renovação do suporte básico da vida e a capacidade de depuração de rejeitos dos processos ecológicos, para proporcionar uma qualidade ambiental (mínima) que melhore as condições de vida das populações conforme suas peculiaridades culturais. O conceito de “paisagem” foi introduzido como termo científico-geográfico no início do século XIX por Alexander von Humboldt (1769-1859), o grande pioneiro da moderna geobotânica e geografia física e, mais recentemente, foi resgatado por Bertrand (1972) que procurou reforçar a importância da visão integrada (holística) em renuncia ao processo de determinação de unidades sintéticas com base nas unidades elementares delimitadas pelas disciplinas mais especializadas (Geologia, Geomorfologia, Pedologia, Climatologia, etc), procurando talhar diretamente a paisagem global tal qual ela se apresenta, enfatizando que ‘a síntese vem felizmente, no caso, substituir a análise’ (FÁVERO, 2007; FÁVERO et al., 2007; e NUCCI, 2007). A Geografia das Paisagens foi se desenvolvendo em vários países tendo grande influência, segundo vários autores (BERTRAND, 1972; SOTCHAVA, 1978; MATEO RODRIGUEZ, 2000; MONTEIRO, 2000; NUCCI, 2001; e MATEO RODRIGUEZ et al., 2004), da teoria geral dos sistemas e, no Brasil, os trabalhos do professor Dr. Carlos Augusto de Figueiredo Monteiro apresentaram suas contribuições, a este desenvolvimento, com vários estudos voltados a construção de um conjunto de concepções e métodos integradores para tratamento das questões sobre qualidade ambiental. Deste esforço destaca-se o conceito de paisagem, o qual está sendo adotado para este trabalho: “Entidade espacial delimitada segundo um nível de resolução do geógrafo (pesquisador), a partir dos objetivos centrais da análise, de qualquer modo sempre resultando da integração dinâmica e, portanto, instável dos elementos de suporte, forma e cobertura (físicos, biológicos e antrópicos) e expressa em partes delimitáveis infinitamente, mas individualizadas através das relações entre elas, que organizam um todo complexo (sistema), verdadeiro conjunto solidário e único, em perpétua evolução” (MONTEIRO, 2000, p. 39). Para estudo da estrutura e dinâmica de uma paisagem, visando estabelecer suas potencialidades, o procedimento básico, largamente recomendado (BERTRAND, 1972; DELPOUX, 1974; SOTCHAVA, 1978; MONTEIRO, 2000; MATEO RODRIGUEZ, 2000; NUCCI, 2001; e FÁVERO, 2007), seria a apreensão das descontinuidades objetivas da paisagem (BERTRAND, 1972), ou a delimitação de Unidades de Paisagem (MONTEIRO, 2000). A Unidade de Paisagem seria definida por uma síntese de numerosas características e justificada pela redundância ou repetição, que fornecem uma relativa homogeneidade do sistema assim constituído, sendo, portanto uma representação geográfica (projeção espacial) do ecossistema, denunciada por indicadores facilmente perceptíveis (vegetação, formas de relevo, uso e cobertura do solo, etc.), com um nível homogêneo de organização da vida em seu interior, tanto no que diz respeito a sua estrutura quanto ao seu funcionamento (FÁVERO et al., 2004; e FÁVERO, 2007). A delimitação de Unidades de Paisagem não pode ser entendida como um fim em si mesma e também deve vir acompanhada da escala cartográfica adotada (dado que a escala restringe o grau de detalhamento da realidade analisada) (NUCCI, 2001). Cada unidade pode e deve passar por uma avaliação, ou seja, uma valoração em termos de suas qualidades ou grau de excelência intrínseco (GÓMEZ OREA, 1978). McHarg (2000), por exemplo, defende que cada paisagem apresenta uma suscetibilidade intrínseca aos usos das terras podendo eventualmente suportar mais de um tipo de uso antrópico sem comprometimento das funções da natureza, porém estas oportunidades ou aptidões para usos antrópicos diferem de acordo com suas características. Desta forma, utilizar a natureza racionalmente implica em reverter a favor do uso humano suas oportunidades respeitando, o máximo possível, seus limites. O acompanhamento e avaliação das mudanças no uso e na cobertura da terra, com a criação de um mosaico de unidades de paisagem em diferentes graus de transformações tem influenciado positivamente a construção de conceitos e métodos para a avaliação das paisagens. Para Mateo Rodriguez (2000), pode-se classificar e avaliar as paisagens, conforme o grau de impacto, modificação ou transformação. Esta idéia de avaliação das interferências antrópicas sobre as potencialidades naturais da paisagem está também presente na construção do conceito de hemerobia, proposto por Jalas (1953 e 1965 apud TROPPMAIR, 1989) e utilizado por Sukopp (1972), entre outros conforme apresenta o Quadro 01 obtido de Mateo Rodrigues e colaboradores (2004). Levando-se em consideração mudanças no solo (tipos de superfícies), mudanças na vegetação e na flora (perda de espécies nativas, por exemplo), as paisagens são classificadas em relação aos graus de naturalidade ou de estado hemerobiótico (artificialidade). Em Haber (1990), ainda, há outra classificação dos tipos de usos da terra, sem citar o termo hemerobia, de acordo com a diminuição da naturalidade ou aumento da artificialidade dos ecossistemas. Quadro 01 – Diferentes Interpretações do Grau de Transformação Antropogênica da Paisagem (FONTE: PIOTRZAK, 1990 apud MATEO RODRIGUEZ et al., 2004, p. 180). NÍVEL GRAU DE GRAU DE GRAU DE ESTRATOS DE GRAU DE HEMERÓBICO NATURALIDADE (H. Sukopp, (H. Ellemberg, SINANTROPIZAÇÃO NATURALIDADE SINANTROPIZAÇÃO TRANSFORMAÇÃO 1982, L. Jalas, 1973, H. Leser, (H. Sohiutter, 1982) (H. Sohlutter,1982) (J.B. Falinski, 1966) (J.B. Falinski (1966) l953 e 1963) 1978) 0. A-hemeróbico (primogênico) l. Oligohemeróbico (transformação leve) 2. Mesohemoeróbico (transformação média) 3. Eu-hemeróbico (extensamente transformado) 4. Polihemerôbico (maior grau de transformação) 5. Metahemetóbico (completamente transformado) Totalmente natural 0 9 - - Natural Seminatural 1-2 8-7 Presinantropização I Distante do natural 3-4-5 6-5 Preotosinantropização II Muito distante do natural 6-7-8 3–2-1 Polisinantropização III - IV Artificial 9 0 Metasinantropização/ Eusinantropização V - VI - VII Áreas urbanas 8 0 Pansinantropização VIII Desta forma o presente trabalho, considerando que a natureza desempenha inúmeras funções básicas para o suprimento de qualquer ser humano (ou outro ser vivo) e que as transformações antrópicas têm provocado, por vezes, profundas modificações nos sistemas naturais, capazes de comprometer sua conservação, objetivou avaliar os graus de alteração antrópica (hemerobia) nas Unidades de Paisagem (UPs) da Bacia Hidrográfica do Rio Sorocaba/SP, escala 1:250.000 [elaborado por Fávero (2007)], e as contribuições, dos usos das terras predominantes em cada UP, para a conservação da natureza. 2 MATERIAIS E MÉTODOS A Bacia do Rio Sorocaba possui uma área de drenagem de 5.273 km² e encontrase entre as latitudes 22°45’ e 24° Sul e as longitudes 47° e 48°15’ Oeste, na região centro-sudeste do Estado de São Paulo (Figura 01) e de cobertura vegetal natural do Domínio da Mata Atlântica que é um dos 10 ‘hotspots’ de biodiversidade considerados prioritários para a conservação da natureza dada sua grande riqueza em espécies endêmicas e o extremo grau de fragmentação dos remanescentes. Figura 01 – Bacia Hidrográfica do Rio Sorocaba no Estado de São Paulo (Org.: FÁVERO, 2006). Fávero (2007), em sua tese de doutorado intitulada “Paisagem e Sustentabilidade na Bacia Hidrográfica do Rio Sorocaba”, elaborou o mapa síntese com proposta de delimitação de Unidades de Paisagem (UPs), na escala 1:250.000, para a Bacia do Rio Sorocaba, com base na integração de elementos de cobertura (a vegetação e o uso das terras), com as unidades geomorfológicas (os compartimentos morfoestruturais e morfoesculturais de suporte). Para tanto utilizou a sobreposição dos mapas: de caracterização da vegetação natural (ou original e secundária); de usos das terras; e o geomorfológico. Do quadro síntese, elaborado por Fávero (2007), que caracteriza exaustivamente cada uma das UPs, foram utilizadas, principalmente as informações referentes à vegetação e os usos das terras para a avaliação do grau de naturalidade/artificialidade de acordo com o conceito de hemerobia (dominação e/ou alteração das paisagens, ou a totalidade dos efeitos das ações, voluntárias ou não, do ser humano sobre os ecossistemas/paisagens) revisado na literatura. Partindo-se do pressuposto de que quanto mais modificadores ou hemerobióticos forem os usos das terras estabelecidos maiores as transformações nos sistemas naturais e menor sua estabilidade dificultando a conservação da natureza, elaborou-se o Mapa de Hemerobia das UPs da Bacia Hidrográfica do Rio Sorocaba (Figura 02) que contemplou a avaliação da contribuição dos usos das terras para a conservação da natureza. Conforme cada tipo de uso favorece ou dificulta a manutenção das funções da natureza ao modificar menos ou mais a estrutura (morfo-funcional dinâmica) dos sistemas naturais, e contribuindo (ou não) para a conservação da natureza, atribuiu-se valores numéricos correspondentes ao grau de contribuição para a conservação. Pretendeu-se não uma avaliação absoluta e independente, mas sim uma comparação entre as UPs para ordená-las de forma relativa de acordo com uma maior ou menor interferência antrópica levando ao afastamento da paisagem mais natural. 3 RESULTADOS E DISCUSSÕES As trinta e cinco Unidades de Paisagem (UPs), delimitadas por Fávero (2007) para a Bacia Hidrográfica do Rio Sorocaba, foram avaliadas de acordo com os elementos naturais e as interferências antrópicas concretizadas na paisagem. Cinco graus de hemerobia foram identificados e classificados comparando os diferentes usos das terras e tipos de coberturas entre si conforme sua contribuição (relativa) para a conservação da natureza estabelecendo as seguintes categorias para avaliação das UPs: 9 muita alta (contribuição para a conservação da natureza - CCN) – paisagens não modificadas ou levemente modificadas [(naturais e semi-naturais) - com muito baixa hemerobia] – cujos usos das terras predominantes são as áreas protegidas com controle de usos antrópicos onde ocorrem atividades de turismo, educação ambiental e recreação controladas (a cobertura vegetal natural e sucessões naturais predominam); 9 alta (CCN) – paisagens levemente modificadas [(semi-naturais) - com baixa hemerobia] – usos silviculturais (reflorestamentos de eucaliptos) e atividades de turismo, educação ambiental e recreação extensivas; 9 média (CCN) – paisagens com modificações moderadas a fortes [(antropo-naturais; pastoris) - com média hemerobia] – com pastagens entremeadas por campos antrópicos; 9 baixa (CCN) – paisagens com modificações fortes a muito fortes [(antropo-naturais; agrícolas) - com alta hemerobia] – com culturas e lavouras diversas e grandes barragens; 9 muito baixa (CCN) – paisagens com vários graus de urbanização [(desde povoados até grandes áreas urbanizadas com alta densidade demográfica) - com muito alta hemerobia] e áreas industrializadas. Os graus de hemerobia correspondentes são inversamente proporcionais às contribuições dos usos das terras para a conservação da natureza sendo tanto maiores quanto menores forem estas contribuições. O Quadro 02 resume as categorias supracitadas e sistematiza a legenda do Mapa de Hemerobia da Bacia Hidrográfica do Rio Sorocaba da Figura 02. Por sua vez o Quadro 03 apresenta a avaliação das UPs da Bacia do Rio Sorocaba quanto a contribuição dos usos antrópicos para a conservação da natureza conforme as categorias detalhadas no Quadro 02. Quadro 02 – Graus de Modificação ou Artificialização dos Usos das Terras (Hemerobia) e Respectivos Parâmetros para a Avaliação da Importância dos Usos das Terras para a Conservação da Natureza nas UPs da Bacia Hidrográfica do Rio Sorocaba (Elaborado por FÁVERO, 2007). Grau de Modificação ou artificialização (Hemerobia) Não modificadas ou levemente modificadas – naturais e semi-naturais (Menor hemerobia) Levemente modificadas – semi-naturais Modificações moderadas a fortes – antropo-naturais (pastoril) Modificações fortes a muito fortes – antropo-naturais (agrícolas) Intensamente modificadas – artificializadas ou antrópicas (Maior hemerobia) Descrição dos Usos Predominantes 9 Parte de ou áreas protegidas (UCs) com controle dos usos antrópicos; 9 Atividades de turismo, educação ambiental e recreação controladas; 9 Atividades de turismo, educação ambiental e recreação extensivas; 9 Silvicultura (reflorestamentos de eucaliptos); Contribuição para a Conservação da Natureza (Parâmetro) Muito Alta (4) Alta (3) 9 Pastagens entremeadas por campos antrópicos Média (2) 9 9 Baixa (1) Culturas e lavouras diversas Grandes Barragens 9 Povoados e Áreas urbanas (em geral com alta densidade demográfica); 9 Áreas de industrialização. Muito Baixa (0) Quadro 03 – Avaliação da Contribuição dos Usos Estabelecidos nas UPs da Bacia do Rio Sorocaba para a Conservação da Natureza (Elaborado por FÁVERO, 2007). Contribuição para a Conservação dos Usos das Terras Estabelecidos MUITO ALTA (4) ALTA (3) UPs 6 4a, 4b, MÉDIA (2) 1a, 1b, 2a1, 2a2, 2a3, 2b, 3a, 3b, 5a1, 5a2, 5a3, 5b1, 5b2, 5c1, 5c2, 5c3, 5d, 8a1, 8a2, 8a3, 8b BAIXA (1) 7a, 7b1, 7b2, 7b3 MUITO BAIXA (0) 9a1, 9a2, 9b1(a), 9b1(b), 9b1(c), 9b1(d), 9b2 Analisando o Quadro 03 e o Mapa de Hemerobia da Bacia Hidrográfica do Rio Sorocaba (Figura 02) verificou-se que a maior parte das UPs (21 UPs - cerca de 65% da área da Bacia), apresenta predominância de pastagens entremeadas a campos antrópicos em seus usos das terras, atividades que promovem modificações moderadas a fortes nos sistemas naturais e, portanto oferecem média contribuição para a conservação da natureza. Menor Graus de Hemerobia Maior Figura 02 – Mapa de Hemerobia e Contribuição dos Usos das Terras para a Conservação da Natureza nas Unidades de Paisagem da Bacia Hidrográfica do Rio Sorocaba (Elaborado por FÁVERO, 2007). Conforme alguns autores (MATEO RODRIGUEZ, 2000; FÁVERO et al., 2004; e MATEO RODRIGUEZ et al., 2004) as pastagens e os campos antrópicos alteram de forma moderada a forte as paisagens promovendo principalmente remoção ou modificação na cobertura vegetal natural, alterando o relevo e o microclima, que acarretam alterações no potencial de suprimento de certas funções naturais, porém conservam a capacidade de recuperação de seu estado original. Na Bacia do Rio Sorocaba a grande extensão do estabelecimento desta forma de uso das terras está homogeneizando esta paisagem e em certas UPs acarretando redução nos fluxos de funções da natureza por elas oferecidos. Usos indiretos das terras (recreação e turismo controlado, áreas protegidas, entre outros), que promovem muito alta contribuição à conservação da natureza só foram encontrados, com predominância, em uma UP (cerca de 2% da área), e usos menos modificadores das paisagens, como a silvicultura, que promovem alta contribuição para a conservação da natureza predominam em duas UPs (cerca de 8% da área). A silvicultura ou as plantações florestais, consideradas como uma forma de usos antrópicos menos modificadora dos sistemas naturais, alterando em geral a cobertura vegetal natural e a composição faunística, segundo vários autores (MATEO RODRIGUEZ, 2000; FÁVERO et al., 2004; e MATEO RODRIGUEZ et al., 2004), permite melhor cumprimento das funções naturais. Em quatro UPs (cerca de 15% da área) atividades agrícolas, (para cultivos diversos) que promovem modificações fortes a muito fortes nas paisagens, são predominantes, e em sete UPs (cerca de 10% da área) encontram-se as paisagens mais artificializadas caracterizadas por vários graus de urbanização, oferecendo, portanto, as menores contribuições para a conservação da natureza, baixa e muito baixa, respectivamente. Segundo os mesmos autores supracitados (MATEO RODRIGUEZ, 2000; FÁVERO et al., 2004; e MATEO RODRIGUEZ et al., 2004) os cultivos comerciais provocam modificações mais intensas (fortes a muito fortes) na estrutura e estabilidade dos sistemas naturais, pois além da substituição da cobertura vegetal natural ocorrem alterações físico-químicas, sobretudo no suporte edáfico (erosão ou empobrecimento nutricional dos solos) e nos recursos hídricos, tanto superficiais quanto subterrâneos. De acordo, ainda, com Fearnside (1997), os cultivos anuais ou perenes intensivos, com o passar do tempo, levam a aumentos significativos da lixiviação, compactação do solo, e invasão por ervas daninhas, minando as condições mínimas para estas mesmas atividades. 4 CONCLUSÕES Verificou-se que a maior parte da (65%) Bacia do Rio Sorocaba apresenta usos das terras que acarretam modificações moderadas a fortes em sua paisagem, as pastagens e os campos antrópicos, que alteram o potencial de suprimento de certas funções naturais, mas mantêm a capacidade de recuperação de seu estado original e, portanto certa contribuição para a conservação da natureza. Usos mais modificadores e artificializadores, desde cultivos comerciais até graus diversos de urbanização, podem desestruturar os sistemas naturais comprometendo sua capacidade de recuperação, desta forma desafiam a conservação da natureza e compõem aproximadamente 25% da área estudada. Todavia usos antrópicos bem menos modificadores, como a silvicultura que, apesar de alterar a cobertura vegetal natural e a composição faunística, pode ainda permitir melhor cumprimento das funções naturais, e os usos indiretos (recreação, turismo controlado, etc.), são oportunidades, porém reduzidas na área estudada (10%), para a conservação da natureza. 5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BERTRAND, G. Paisagem e Geografia Física Global, Esboço Metodológico. Caderno de Ciências da Terra, São Paulo, n. 13, p. 01-27, 1972. BORN, R. H. e TOLOCCHI, S.. Compensações por Serviços Ambientais: sutentabilidade ambiental com inclusão social. In: BORN, R. H. e TOLOCCHI, S. (Coords.). Proteção do Capital Social e Ecológico: por Meio de Compensações por Serviços Ambientais (CSA). São Paulo: Peirópolis, 2002. p. 27-45. DE GROOT, R.. Functions of Nature. Amsterdã: Wolters-Noordhoff, 1992. 315p. DE GROOT, R.. 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