1 Extractos e comentários ao livro "A Alma da Natureza " de Rupert

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A Alma da Natureza - Extractos e comentários
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Extractos e comentários ao livro "A Alma da Natureza "
de Rupert Sheldrake
A Mãe Natureza
Conceber a Natureza como um sistema inanimado e mecânico pode ser
confortável, por proporcionar um sentimento de domínio sobre ela e de
superioridade face aos conceitos animistas primitivos. Se dizemos que a chamada
Mãe Natureza não é mais do que uma superstição, um arquétipo mítico, passamos a
viver num universo natural inanimado, que nada mais nos pede do que ser explorado.
Infelizmente, as consequências desta opção são terríveis: secas, tempestades,
inundações, fomes. O caos ameaça-nos e os medos antigos reaparecem sob novas
formas. A ideologia oficial actual continua a ser: a conquista da Natureza segundo
os interesses do progresso humano.
Embora a tradição judaico-cristã dê precedência absoluta à omnipotência do
Deus masculino, a Mãe Terra conservou durante vários séculos um pouco da sua
antiga autonomia. Os cristãos continuaram durante toda a Idade Média a considerar
que a Natureza era viva e maternal.
Foi a reforma protestante do séc. XVI que estabeleceu a supremacia absoluta do
Pai, com a supressão do culto da Virgem e a dessacralização do mundo natural. Esta
evolução completou-se no séc. XVII, quando a Natureza foi rebaixada ao estado de
simples matéria inanimada em movimento, mecanicamente obediente às leis
imutáveis da criação divina. Assim a Natureza deixou de ser viva e identificada com a
Mãe. Passou a haver somente o Mundo Máquina e Deus, seu mecânico todopoderoso.
Ironicamente, o conceito de que a Natureza funciona automática e mecanicamente
tornou Deus cada vez mais supérfluo, até que nos finais do séc.XVIII Deus
desapareceu progressivamente da concepção científica do Universo. O ateísmo que a
seguir se instalou considera a Natureza como a única origem de todas as coisas.
Seguindo a ideologia oficial corrente, que corresponde ao Humanismo laico,
consideramos que a Natureza é um sistema físico inanimado e desprovido de
qualquer intenção.
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O renascimento da Natureza na Ciência
A revolução científica do século XVII negou à Natureza os atributos tradicionais da
vida: as capacidades de se auto-organizar e de se mover espontaneamente. A matéria
era inanimada e passiva, submetida a forças exteriores conformes com as leis
matemáticas do movimento.
Para melhor compreensão desta mudança crucial de paradigma, convém
recordarmos a distinção medieval entre natura naturata (a Natureza actuada) e
natura naturans (a Natureza actuante). A primeira refere-se aos fenómenos que
acontecem e são percebidos pelos nossos sentidos, a segunda refere-se ao poder
produtor invisível que origina os fenómenos. Na física animista medieval eram as
almas da Natureza que agiam: organizavam o desenvolvimento e comportamento
autónomos dos organismos e modelavam-nos por atracção. Assim o rebento era
atraído pela forma da planta adulta; a alma vegetal, invisível mas actuante, modelava
a matéria da planta em crescimento e organizava-a segundo as suas próprias
finalidades. Para Aristóteles e os seus discípulos medievais, as almas não eram
exteriores à Natureza, faziam parte dela; eram physis (físicas).
Os fundadores da ciência mecanicista, quando expulsaram as almas da Natureza, que
passou a ser simples matéria passiva em movimento, atribuíram a Deus todos os
poderes actuantes. A Natureza era totalmente natura naturata e o poder produtor, a
natura naturans, era divino, não físico, mais sobrenatural que natural.
Mas esta tentativa de excluir da Natureza qualquer capacidade de organização
espontânea não os livrou dos fantasmas das almas invisíveis, que passaram a ter a
forma de forças impalpáveis: como, por exemplo, a força da gravidade.
Na concepção gravítica de Newton todo o Universo está cheio de forças invisíveis, que
se estendem muito para além dos corpos sobre os quais actuam e assim tudo está
intima e reciprocamente ligado e mantido em equilíbrio.
Antes de Newton a interconexão entre todos os corpos do universo era mantida pela
alma do mundo, a “anima mundi”, ou pelos turbilhões duma substância subtil
denominada éter. Nenhuma destas causas era material, no sentido usual do termo, tal
como também não o eram as forças gravíticas que as substituíram. As equações
gravíticas permitem calcular a grandeza dessas forças, mas nada dizem sobre a sua
essência e Newton dizia:
"É inconcebível que uma porção, qualquer que ela seja, de matéria bruta, inanimada,
possa agir sem contacto mútuo sobre outra porção de matéria. Imaginar que a
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gravidade é inata, inerente à matéria, e da mesma essência desta, de tal modo que um
corpo pode agir à distância sobre um outro, através do vazio e sem mediação de algo
que possa transmitir essa força de um corpo ao outro, é para mim um absurdo tal que
não creio que algum homem dotado de um mínimo de reflexão filosófica possa
esposar tamanha enormidade"
Finalmente, a única forma que Newton encontrou para explicar os fenómenos
gravíticos foi a vontade de Deus: " Existe um espírito infinito e omnipresente no seio
do qual a matéria se move segundo leis matemáticas".
Com o passar dos anos, as pessoas foram adaptando-se à ideia (absurda, no entender
de Newton) de que a matéria, embora bruta e inanimada, podia exercer à distância
poderes de atracção. Só no início do séc. XX, a teoria da gravitação de Einstein deu a
esta misteriosa força de atracção uma explicação física, mas não material, sob a
etiqueta: "campo gravítico".
Tal como a anima mundi, o campo gravítico de Einstein não se situa nem no
espaço nem no tempo; antes contem a totalidade do universo físico,
incluindo o tempo e o espaço. O campo gravítico é o espaço-tempo e são as suas
propriedades geométricas que provocam os fenómenos de gravitação; age como causa
formadora e formal, tal como as almas da filosofia medieval.
Enquanto que os discípulos de Newton suponham que as forças de atracção gravíticas
surgiam inexplicavelmente dos corpos materiais e se propagavam em todas as
direcções através do espaço, para a física moderna é o campo gravítico que inclui
tanto os corpos materiais como o espaço que os separa. Assim, a Lua não gira em
torno da Terra sustida por uma força, como na física de Newton, mas sim porque o
espaço-tempo no qual ela se move é curvo.
Com a sua famosa equação E = m c
2,
Einstein estabeleceu a equivalência entre a
matéria e a energia e provou a sua convertibilidade recíproca. Assim, actualmente
considera-se que toda a Natureza é constituída por energia, que pode adoptar
diferentes formas, organizadas pelos campos energéticos.
O mistério da matéria negra
A Cosmologia moderna diz-nos que a matéria tal como a conhecemos (constituída
por átomos) é o constituinte mais raro do Universo em que vivemos: escassos 4,4%. O
resto é 23% de "matéria negra fria" - cuja natureza é desconhecida. Os restantes 73%
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são "energia negra", ainda mais misteriosa, a que se atribui a acção de repulsiva de
tudo o mais.
Assim, a grande maior parte do que constitui o nosso Universo é-nos desconhecida,
só a apercebemos pelos seus efeitos gravíticos. Tal como o nosso consciente flutua na
superfície do mar dos nossos processos mentais inconscientes, assim também o
mundo físico conhecido flutua no oceano cósmico da matéria e energia negras.
A causalidade formativa e a ressonância mórfica
No paradigma do humanismo laico, que considera a Natureza como inanimada e
desprovida de intenção, é difícil entender o crescimento e desenvolvimento dos
organismos vivos, i. e., a sua morfogénese (do grego morphe para forma e genesis
para nascer). As minúsculas bolotas dão carvalhos. As máquinas não crescem nem se
desenvolvem expontaneamente.
Também o ADN não chega para explicar a vida. Os genes definem a estrutura
primária das proteínas, não a forma do meu nariz, ou da flor da orquídea. O modo
segundo o qual as proteínas são organizadas nas células, e as células nos tecidos, e os
tecidos nos órgãos e os órgãos nos organismos não é definido pelo código genético, o
qual só programa as moléculas proteicas.
Para explicar como as coisas se organizam no Universo, Sheldrake desenvolveu na
década de 1980 a hipótese da causalidade formativa, segundo a qual tudo são
sistemas auto-reguladores, evolutivos, organizados pelos chamados "campos
mórficos".
A propriedade formativa dos campos mórficos não é determinada por leis
matemáticas intemporais (tal como no paradigma do cientismo oficial) mas pelas
formas actuais e passadas dos outros existentes da mesma espécie.
O modo segundo o qual as moléculas de hemoglobina, os cristais da penicilina ou as
girafas do passado influenciam os campos mórficos genéticos actuais depende dum
processo denominado de "ressonância mórfica" – o qual se baseia na similitude
reconhecida a través do espaço e do tempo.
Segundo a hipótese da causalidade formativa, qualquer novo esquema de organização
– duma molécula, duma galáxia, dum cristal, duma planta, ou dum instinto – implica
o aparecimento de um novo campo mórfico. Pela repetição esses novos esquemas
organizacionais tornam-se cada vez mais habituais. É esta memória da Natureza que
torna cumulativo o processo evolutivo.
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A ressonância mórfica não implica qualquer transferência de energia, mas sim de
informação. Por isso não se dissipa com as distâncias de transmissão e explica as
regularidades da Natureza; que são regidas pelos hábitos herdados por ressonância
mórfica – não por leis eternas, não materiais e não energéticas.
Os químicos sabem como é difícil sintetizar novos compostos: várias semanas, às
vezes meses, passam até que surgem os primeiros cristais na solução sobre saturada.
Mas daí em diante quanto maior fôr a produção do novo composto mais facilmente a
cristalização acontece, não só nesse laboratório como nos outros em todo o mundo.
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