IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística CDDI – Centro de Documentação e Disseminação de Informações II ENCONTRO NACIONAL DE PRODUTORES E USUÁRIOS DE INFORMAÇÕES SOCIAIS, ECONÔMICAS E TERRITORIAIS 21 a 25 de agosto, no Rio de Janeiro OFICINA COMO CRIAR UMA LINHA DE PESQUISA HISTÓRICA NO IBGE? 22 de agosto, às 14h DEBATES NA OFICINA Relatório Os trabalhos foram iniciados com a apresentação do coordenador do Projeto História das Estatísticas Brasileiras e coordenador/expositor da oficina, Nelson Senra. Sua argumentação buscou sustentar a legitimidade do IBGE para institucionalizar uma linha de estudos históricos. Legitimidade que se coloca em dois lados. Em termos acadêmicos, através da configuração e impulso crescente da sociologia das estatísticas que, ao buscar situar as estatísticas como objeto, pretende analisar a constituição e a trajetória histórica da estatística como instrumento privilegiado de gestão pública, mapear as relações entre os estaticistas, o Estado Nacional e as ciências. No âmbito institucional, uma linha de estudos históricos pode ser perfeitamente justificada e instalada em um órgão como o IBGE que, mais do que depositário e guardião de acervo e documentação, é produtor de informações estatísticas e geográficas e produtor das informações que estão no entorno das realidades estatística e geográfica. Foi o que esclareceu a colocação de Nelson Senra, ao evidenciar a aptidão do IBGE para desenvolver estudos históricos sistemáticos. Seguiu-se-lhe a exposição do relator da oficina, Alexandre Camargo, que retomou os laços tradicionais entre a história, a estatística e a geografia, em prol de sua atualização na construção de um novo e promissor caminho: a historicização da institucionalização dos saberes e práticas da estatística e da geografia, e de suas aplicações práticas por parte do poder público. Tendo este caminho como elemento norteador, o relator/expositor sintetizou as frentes e direções de pesquisa apontadas no documento-base que serviu de fundamentação preliminar à linha de história, distribuído aos convidados da oficina. Ao lado da apresentação das frentes, propostas e consagradas no referido documento, a relatoria abordou as reflexões escritas, encaminhadas anteriormente por alguns dos convidados, a saber: Lucia Paschoal Guimarães (História/Uerj), Guilherme Pereira das Neves (História/UFF), Lucia Bastos (História/Uerj), Hebe Mattos (História/UFF), Eustáquio Reis (IPEA), e Roberto Schmidt (Geografia/Uerj, pesquisador aposentado/IBGE)1. 1 À exceção de Hebe Mattos que nos brindou com textos de sua autoria e que comunicou seus compromissos que a impediriam de comparecer à oficina, todos os demais nos honraram com sua presença e foram interlocutores muito valiosos. Que fiquem registrados aqui nosso reconhecimento e a expectativa de novos encontros e de 2 Fez-se, então, a abertura dos debates. Para os fins de relatoria aqui presentes, amalgamamos as reflexões convergentes, nos furtando à observação da ordem de precedência, porém sempre nomeando as participações, dispostos entre debatedores e platéia. As intervenções foram distribuídas em três seções: questões teórico-metodológicas, questões práticas e sugestões de pesquisa. Questões teórico-metodológicas A preocupação aqui foi a de criar um fio condutor para a extensa gama de direções de pesquisa até então sugeridas. Construir uma área de concentração mais ampla, capaz de sustentar um foco convergente de ações e esforços na linha de história para prevenir contra eventuais dispersões. Ao mesmo tempo, fornecer um território fértil para formalizar futuras parcerias com o universo acadêmico. Esta foi a tônica das contribuições dos debatedores Guilherme Pereira das Neves e de Lucia Paschoal Guimarães, de que passamos a tratar. No tocante ao campo de pesquisa, Pereira das Neves vê na relação entre a “razão estatística” e o “ingresso na modernidade” o eixo que poderia unificar o conjunto de ramificações das frentes de pesquisa apontadas. Por quais caminhos o Brasil teria ingressado na modernidade? Propõe situar a estatística na inserção do mundo moderno e aparentar a razão estatística à razão da modernidade. Nestes termos, a pesquisa histórica deveria estudar o esforço de intelectuais e homens de governo específicos que buscaram ampliar o papel da estatística na sociedade, fazer dela uma razão de Estado. Para ajudar a fundamentar a razão estatística na entrada da modernidade, na relação mais ampla entre Estado e indivíduo, Pereira das Neves citou François Furet e Jacques Ozouf. Para tais autores, a escrita, que fundamenta a razão da modernidade ao estabelecer a relação direta entre Estado e indivíduo, libera este último da tirania ou da proteção do grupo, e o define por suas coordenadas sociais, nascido a tal data, de tais pais, em tal lugar, exercendo tal profissão, etc. “O acúmulo destes traços biográficos pelo escrito viabiliza a agregação estatística, que é uma maneira de pensar o coletivo através do individual, e a partir do individual. A estatística é uma resposta dos Estados modernos em termos operatórios, ambição de saber inseparável de uma vontade de manipulação dos homens”. Ela constitui “esses indivíduos em unidades comparáveis e intercambiáveis, justificada desde então pelo cálculo das probabilidades (que nasce na mesma época), quer dizer definidos pelo que têm de idêntico em matéria de comportamento e de papel. O resultado é um social mecanicamente constituído, submetido às próprias leis da mecânica constituinte: não mais uma consciência de grupo, mas um modo de conhecimento-dominação”2. Em consonância com a linha de argumentação destes autores, e com a agregação universalizante e a vocação manipuladora do saber estatístico, capaz de engajar grupos cada vez maiores de indivíduos e cada vez com mais eficiência nos grandes projetos políticos e sociais da modernidade, temos a associação que precisa ser estudada e explorada entre a estatística e o esperanto. Teixeira de Freitas, maior pioneiro do IBGE, e Bulhões Carvalho, maior prócer da DGE, desde 1906, não por acaso os maiores nomes da estatística brasileira, foram dois dos grandes disseminadores do esperanto no Brasil, muito contribuindo para sua consolidação, ao proferirem vários de seus discursos e publicar muitos de seus trabalhos na futuras parcerias. Luiz Antônio Teixeira, pesquisador da Casa de Oswaldo Cruz, juntou-se ao nosso grupo de debatedores, tecendo excelentes propostas sobre a visibilidade do acervo do IBGE. 2 FURET, François; OZOUF, Jacques. “Trois siècles de métissage culturel”. In: Lire et écrire: l´alphabétisation des français de Calvin à Jules Ferry. Paris: Minuit, 1977, p. 360. 3 referida língua. Teixeira de Freitas, além de editar obras em esperanto pelo IBGE, entendia que o número é uma forma universal de comunicar realidades e que as realidades numéricas deveriam ser comunicadas através de uma linguagem universal. A estatística e a língua esperantista seriam os dois grandes denominadores universais da humanidade. Caberia a elas dar corpo aos projetos políticos e sociais da modernidade. Esta associação revela-se especialmente interessante, pois se conjuga com a trajetória mais ampla da estatística no Brasil, com sua concepção e desenvolvimento, sempre como função administrativa e como programa de Estado. Como bem lembrou Pereira das Neves, a trajetória histórica da estatística, assim como o ingresso do Brasil na modernidade ocidental, se perfez “por caminhos bastante complicados”. Opinião partilhada por Lucia Paschoal Guimarães, quando enfatizou que, no Brasil, diferentemente do caso europeu, na origem mesma dos saberes da estatística e da geografia estaria a formação do Estado brasileiro, através da necessidade de centralização administrativa do Império. Estes saberes deveriam fornecer o conhecimento e a mobilização dos recursos, da população e da produção, mais bem auferidos pelos números da estatística. Já a cartografia histórica identificaria os limites da soberania e da ação do Estado. Isto posto, Lucia Guimarães sustentou que a história institucional da estatística e da geografia deveria ter como núcleo convergente a formação e a atuação do Estado, recuperando-se sempre na trajetória institucional destas áreas (concepção e desenvolvimento) as suas interfaces com as demandas e os programas de Estado. Dessa forma, para Pereira das Neves e Paschoal Guimarães o estudo de uma razão estatística forneceria um horizonte para trabalhos desenvolvidos em parceria com a academia, já que ela muito contribui para a mudança de perspectiva em relação ao indivíduo, à comunidade e à cultura, verificada no mundo ocidental desde meados do século XVIII. Segundo os debatedores, os caminhos bastante específicos deste ingresso do Brasil na modernidade estão a exigir reflexões redobradas e renovadas, que poderiam levar a aproximações promissoras entre o IBGE e a universidade. Ainda no sentido de circunscrever as ramificações de pesquisa esboçadas, Pereira das Neves deu valiosa contribuição, ao sugerir a fixação das propostas de trabalho levantadas no quadro teórico da História dos Conceitos. Neste aporte, os conceitos são tomados não apenas como categorias mas como formas de apreensão da realidade, contribuindo para a transformação da própria realidade, na medida em que ela é conceituada. Ao mesmo tempo, a mudança operada na realidade nos obriga a forjar novos conceitos para dar conta dela. Neste sentido, a História dos Conceitos poderia se constituir em uma vertente que perpassasse as frentes de pesquisa ancoradas nos saberes e práticas da estatística e da geografia - em especial, da cartografia, nas objetivações objetivadas do real e na reconstrução das individualidades como individualizações. As categorias de classificação, em particular, sintetizam bem o quanto o construto estatístico pode subsumir a realidade em si. Ao moldar as percepções das realidades e participar da elaboração do social, as categorias de classificação determinam posições sociais e tomadas de decisões, atuam na distribuição dos indivíduos em agrupamentos humanos. Tendo alterado o tecido das relações sociais, a estatística deve, em contrapartida, reconceitualizar suas categorias, renovando este processo. Questões práticas Em mais um sentido, Pereira das Neves interveio, desta vez ao alertar para a necessidade de medidas de caráter prático e que estimulassem as parcerias pretendidas pelo 4 IBGE. Seja na direção de dar visibilidade e reconhecimento ao seu acervo, orientando digitalizações e fornecendo critérios para reedições de obras, seja na direção de incentivar que temas e referências da estatística e da geografia se tornem objetos de dissertações e teses de pós-graduação. Mais uma vez, foi acompanhado por Lucia Paschoal Guimarães, quanto à necessidade de o IBGE criar mecanismos e convênios para provocar o acesso dos departamentos de História e do público em geral, provocar a percepção da relevância do acervo do IBGE, como arquivo privilegiado e de ponta no Rio de Janeiro. Algumas medidas foram enumeradas por Pereira das Neves. Para estimular pesquisas que se reportem ao universo do IBGE, sugeriu a concessão de bolsas e de prêmios 3 em concursos para os melhores trabalhos monográficos/dissertações/teses, que estivessem de acordo com os objetivos da linha de História. Para disseminar as preocupações, os fundamentos e os objetivos do movimento em favor da linha de História, sugeriu a criação de uma publicação de História, ou a veiculação pelas Revistas Brasileiras de Estatística e Geografia4. Frisou, ainda, o sucesso que poderia lograr o IBGE, ao institucionalizar estágios de pós-doutorado5, orientados pela equipe de historiadores, durante períodos determinados e em parceria com as universidades. Luiz Antônio Teixeira, completou o quadro de reflexões de caráter prático. Deu-nos um alento especial, ao propor um sistema de integração de informações entre os acervos da FIOCRUZ e os do IBGE, com o fim de ampliar a visibilidade de ambos. Através da aproximação das referências dos acervos em questão, os usuários poderiam ser mais facilmente encaminhados para um ou para outro acervo6. Também disponibilizou a “Revista História, Ciências, Saúde – Manguinhos” como possível canal de intercâmbio de produção e conhecimento, um espaço de publicação para pesquisadores que trabalham com dados sobre saúde. Sugestões de pesquisa Aqui incluímos as reflexões mais livres dos debatedores convidados e do público em geral. Comecemos pelas reflexões dos debatedores. Eustáquio Reis enfatizou o papel de recuperação e de digitalização das séries históricas e econômicas, adotando uma perspectiva mais marcadamente contemporânea. Em reforço das suas contribuições incorporadas ao documento-base, destacou a possibilidade de comparar os movimentos da população, o produto interno bruto, o estoque de capital das diferentes regiões do Brasil, a partir da criação de uma base histórica de dados municipais e do estabelecimento de áreas mínimas comparáveis para períodos variados no tempo (recuando-se, pelo menos, a 1872). 3 Ao longo do tempo, houve os prêmios Teixeira de Freitas e Bulhões Carvalho, cada qual com sua própria missão, contudo, caíram no desuso. Uma recuperação de suas intenções e das razões de seus fracassos está por ser feita. Isso nos ajudaria a bem praticar a proposta que nos parece, em tese, ótima (Nota de Nelson Senra). 4 No passado essas revistas dariam espaço a esse tipo de tema. Nos últimos dez ou quinze anos, contudo, tornaram-se restritivas, tornando-se mais específicas. Assim, elas perderam seu sentido de origem, e, a nosso juízo, deviam voltar a ser revistas ibgeanas (talvez mesmo fundidas numa única). Nesse caso, sob essa mudança, abririam espaço para abordagens históricos. Como seja, com ou sem mudanças, suas trajetórias precisam ser historicizadas: mudanças editoriais, seus públicos leitores, seus autores, etc. (Nota de Nelson Senra) 5 Salvo equívoco nosso na apreensão dessa proposta, nos parece um exagero, e nem em sonho pensamos nessa possibilidade (Nota de Nelson Senra). 6 A propósito, Marco Santos, integrante do projeto História das Estatísticas Brasileiras, lembrou que muito se valeu de pesquisas nos acervos da FIOCRUZ quando escrevia sobre os demógrafos sanitaristas (para o volume II desta coleção) (Nota de Nelson Senra). 5 Nesta mesma direção de formação e alimentação de um banco de dados, sugeriu um programa de cartografia histórica, baseado na legitimidade do IBGE na matéria, para o período dominado por estradas e caminhos pré-ferroviários. Aponta, ainda, para o resgate de estatísticas históricas de recenseamentos provinciais. Nestas três frentes de disponibilização de um banco de informações comparáveis, poder-se-ia satisfazer possíveis necessidades presentes e futuras da comunidade de historiadores. Por fim, como tema de pesquisa, Eustáquio Reis sugere a investigação do pioneirismo de São Paulo na elaboração de estatísticas, que já na década de 1830 fazia censos sistematicamente com dados econômicos, inexistentes nos outros estados. Já Roberto Schmidt ressaltou a enorme importância do mapeamento do papel da estrutura de funcionamento e da concepção do IBGE na montagem da centralização política do Estado na Era Vargas, na acomodação das tensões históricas entre as esferas de governo. Sendo o IBGE a única agência capilarizada de informação que, ao abarcar a todos os municípios, poderia recolher rapidamente informações sobre todas as localidades municipais e disponibilizá-las diretamente ao governo central, destacou a investigação do papel do IBGE na evolução do planejamento e de sua participação na construção da dimensão verdadeiramente nacional do Estado, antes inexistente. Nesta direção de investigação, ressaltou a importância do estudo das áreas de cartografia e geodésia, cujo acervo teria a vantagem de já se encontrar bastante sistematizado para a atividade de historiadores. Assim, o estudo dos trabalhos geodésicos, como base para a cartografia mais apurada, já disporia de material rico e organizado. Sobre a relação entre o IBGE e a universidade, sugeriu a investigação do livre-trânsito, das negociações e concessões entre ambos, sempre tendo em vista o grande poder logístico do IBGE e sua autoridade em qualquer ponto do país. Neste sentido, deveria se dar atenção às figuras articuladoras entre estes espaços, pesquisadores no IBGE e professores na universidade, caso de Francis Ruellan e de Leo Waibel, entre outros. Deste pacto de alianças entre os recursos e o acesso ao poder do IBGE e o saber acadêmico garantiu, entre outros proventos, a realização do Congresso Internacional da UGI, marco da geografia mundial, no Rio de Janeiro, em 19567. Também o público, mostrando-se entusiasmado com o encaminhamento das discussões, gratificou-nos com importantes colocações. Maria Ângela Gemaque, do IBGE/Pará, engrandeceu o debate, ao acusar a investigação da formação e das modificações das redes de coleta do IBGE, levando-se em consideração a distância entre a sede e as unidades estaduais e recuperando-se a memória relacionada à diferenciação das redes de coleta, em suas diversas realidades estaduais. Neste processo histórico de identificação e ajuste das redes de coleta às realidades locais, a participante julgou interessante analisar as variações estaduais e regionais na relação com o poder municipal e na delegação do olhar fundamento básico das operações das instituições de estatística. Raul Tabajara, do IBGE/Amapá, alertou com lucidez para o imperativo de preservação, recuperação, organização, catalogação do acervo das unidades estaduais e das agências municipais, no bojo das discussões sobre a nova dinâmica disseminadora das agências. A partir desta linha de raciocínio, Nelson Senra destacou a pesquisa da função e influência das Juntas executivas regionais, na estrutura parlamentar do IBGE. Ou seja, como 7 A propósito, valerá lembrar parte das memórias de Jurandyr Pires Ferreira, então presidente do IBGE (com cópia no acervo da nossa Memória Institucional), em que reproduz seu discurso nesse evento. A gestão Pires Ferreira, aliás, foi bastante voltada à geografia, tendo como marco a elaboração da Enciclopédia dos Municípios Brasileiros (hoje, inteiramente digitalizada). (Nota de Nelson Senra). 6 os estados e os órgãos estaduais de estatística articulavam seus parceiros para estabelecer o seu discurso nas Assembléias Gerais no Rio de Janeiro, influenciando a campanha e o programa estatísticos. Nesta vertente, convém estudar o corpo documental composto por mais de 2.000 resoluções da Junta Executiva Central e da Assembléia Geral, cabendo a elas a elaboração da legislação concernente ao IBGE. Licia Rubinstein, designer do IBGE, propôs o estudo da propaganda gráfica nos censos e do acervo iconográfico do IBGE como uma trajetória específica da história do design. A própria gráfica mereceria uma história tendo ela num dado momento suprido a Imprensa Nacional. A participante também deu um testemunho pessoal, ao se reportar à surpresa causada aos acadêmicos de sua área, quando estes, por ocasião de sua dissertação de mestrado, puderam conhecer um pouco da riqueza do acervo iconográfico do IBGE, por eles absolutamente ignorado. Na mesma direção apontou a intervenção de Luciene Carris Cardoso, doutoranda em História na Uerj, em seu depoimento pessoal, na qualidade de usuária do acervo do IBGE, pesquisado durante o seu doutoramento. Impressionada com a riqueza das obras raras do IBGE, ela se reportou à surpresa manifestada por professores e pesquisadores universitários, diante de sua intenção de pesquisar no arquivo do IBGE (o objeto em questão era a Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro e o material da pesquisa eram os Anais dos Congressos Brasileiros de Geografia - estão quase todos sob a guarda do IBGE). Para corroborar as duas intervenções anteriores, discursou o relator/expositor da oficina, Alexandre Camargo. Seu relato concentrou-se em sua dupla experiência. Como usuário do acervo, pesquisou por um longo tempo na biblioteca do IBGE (cerca de dois anos), onde em suas salas vazias pode constatar a baixa procura ao arquivo do órgão. Além disso, teve dificuldade de acesso a vários documentos, estando alguns já extraviados (embora ainda em catálogo) e outros sem qualquer catalogação. Narrou que contou com o fator sorte, totalmente casual, e com a lucidez da prestimosa bibliotecária Regina Fucci para ter acesso aos trabalhos de Nelson Senra, em perfeita consonância com seu tema de pesquisa pessoal: a formação do campo científico da estatística no Brasil. Da reunião com Nelson Senra teriam surgido férteis intercâmbios que, no limite, levaram à integração do relator ao Projeto História das Estatísticas Brasileiras. E um mundo de relações e suposições teriam se descortinado para ele, diante do contato com o olhar mais marcadamente institucional. Em reforço, Alexandre Camargo salientou a importância de fazer da relação entre usuários e pesquisadores do IBGE afinados com estudos históricos algo mais do que simples casualidade. Para ele, uma equipe permanente de historiadores estaria capacitada a orientar o acesso à documentação e a minimizar o desajuste entre a alteridade do olhar acadêmico e uma perspectiva institucional comprometida com reflexões conceituais e problemas de pesquisa, levando a ganhos mútuos. Este foi o resultado da oficina, em seu conjunto de reflexões. No entanto, vale dizer que muitos outros participaram indiretamente8 e que aguardamos também suas reflexões e 8 Simon Schwartzman, Edson Nunes, Jose Murilo de Carvalho e Roberto Martins responderam com muita atenção às nossas consultas, em notas eletrônicas. Dispuseram-se a oferecer seus testemunhos. Expressaram solidariedade os seguintes pesquisadores: Martha Abreu (História/UFF), Carlos Gabriel Guimarães (História/UFF), Icleia Thiesen (História/Uni-Rio), Keila Grinberg (História/Uni-Rio), Tamás Szmrecsányi (Economista/UNICAMP), Kaori Kodama (História/Casa de Rui Barbosa), Ivana Lima (História/PUC e Casa de Rui Barbosa), Gilberto Hochman (História/Casa de Oswaldo Cruz), Alfredo Tolmasquim (diretor-geral/Museu de Astronomia), Maria Mônica O´Neill (Diretoria de Geociências/IBGE), José Ribeiro (SEI-BA/IBGE) e Ilara Hammerti Moraes (Escola Nacional de Saúde Pública/FIOCRUZ). Gostaríamos imensamente de contar com muitos destes nomes nas fileiras de nosso próximo encontro. 7 sugestões nos desdobramentos desta oficina9, em que tornaremos a convocar os que se fizeram nela presentes, assim como as ausências sentidas. Num futuro encontro, poderemos avaliar o alcance de nossa evolução e o saneamento de nossas deficiências, através do quadro de propostas já apresentado. Lançar novos desafios para a linha de história e tatear soluções plausíveis. A se manter o ritmo dos trabalhos e a receptividade da comunidade acadêmica e ibgeana às nossas consultas, com certeza teremos êxito! E a linha de História do IBGE será uma consistente realidade! Rio de Janeiro, 1o de setembro de 2006. Alexandre de Paiva Rio Camargo Historiador. Mestrando em História (UFF). Integrante do Projeto “História das Estatísticas Brasileiras”. Relator/Expositor da Oficina “As pesquisas históricas no IBGE”. 9 Teceram reflexões e valiosos comentários, em correspondências eletrônicas, os seguintes nomes: André Vilela (economista/FGV e UCAM), Gylcilene Ribeiro Storino (Diretoria Executiva/IBGE), Maria Angélica Vasconcelos Araújo (coordenadoria de censos/IBGE), Luiz Antonio Pinto de Oliveira e Celso Simões (Diretoria de Pesquisas/IBGE), Maria Cristina Guimarães (Agência Nacional de Petróleo) e Tarcísio Rodrigues Botelho (História/PUC-MG). Gylcilene Storino nos fez indicações de procedimentos administrativos no foro interno, necessários à formalização do projeto. Os demais também fizeram arranjos pontuais bastante pertinentes, que serão incorporados na atualização futura do documento que dá forma à linha. Não obstante, a contribuição de Tarcísio Botelho, por sua expressividade, merece ser citada em seus pontos capitais: “Gostaria de contribuir para a discussão com três pontos específicos para uma agenda futura de pesquisas na área. 1) Acho que a "pedra de Rosetta" dos estudos históricos de demografia e economia do Brasil são os formulários originais dos censos antigos. Até o momento, pelo que sei, não se conhece o destino final desse material (...). O que gostaria de propor seria um esforço institucional do IBGE para localizar esses materiais (além daqueles dos censos de 1890, 1900 e 1920) ou, alternativamente, confirmar a sua destruição. Após essa localização, seria relativamente fácil mobilizar segmentos do meio acadêmico para auxiliar na digitação desse material, por amostra ou mesmo em seu universo. 2) É possível levantar um conjunto muito expressivo de fontes sobre a população e a economia brasileira no passado a partir de fontes documentais que estão dispersas pelo território nacional mas que são continuamente coletadas por historiadores isolados quanto fazem suas teses e dissertações. Estou pensando, sobretudo, nos registros paroquiais de batismos, casamentos e óbitos, nos inventários e em documentos fiscais e eleitorais. Entretanto, esses levantamentos permanecem inéditos e dispersos, redundando em avanços limitados para a historiografia econômica e demográfica do Brasil porque não se compartilham os dados primários. Minha proposta seria que o IBGE encampasse ou auxiliasse na implantação de uma ou mais propostas de recolhimento, sistematização e divulgação desses acervos em formato digital, nos moldes que o Consórcio de Informações Sociais (CIS), ligado à ANPOCS, vem fazendo no âmbito das ciências sociais (...). 3) Acho que um ponto importante que vem sendo negligenciado nos estudos históricos brasileiros é a questão da padronização da coleta e da apresentação dos dados. Esse ponto encontra-se bastante avançado quando se usa estatísticas contemporâneas, mas encontra muitas resistências de historiadores, que teimam em construir suas próprias classificações das categorias e suas próprias especificações de bancos de dados. Acho que um ponto importante, inclusive para viabilizar (ou em concomitância com) o ponto 2, seria estimular a discussão em torno dessa padronização e da adoção de protocolos comuns na produção de metadados de caráter histórico.