O MÓDULO DIDÁTICO : UMA TECNOLOGIA PARA A EAD Ângela I. L. de Freitas Dalben – UFMG A sociedade atual vem sofrendo transformações estruturais em diferentes sentidos, níveis e sistemas delineando novas relações sociais, novos padrões de competências institucionais e pessoais. Conseqüentemente, estas transformações impelem novas necessidades relativas aos processos de formação dos sujeitos. Nesse contexto, o aumento do nível de escolarização passa a ser colocado como uma prioridade para os governos e a modalidade de Educação a Distância (EAD) como uma alternativa ao atendimento do grande público, até então impedido do acesso e permanência no sistema tradicional. O Brasil não tem uma tradição em EAD, como a Inglaterra, o Canadá, a Espanha dentre outros, mas é possível dizer que algumas experiências bem sucedidas já vêm ocorrendo, o que coloca a pertinência desse debate, especialmente, quando se depara com as características de diversidades ambientais e sócio-culturais do país. Verificou-se que a perspectiva de organização modular, constituída por um conjunto de atividades de aprendizagem articuladas entre si, apresenta-se como um formato interessante na elaboração de propostas de EAD, conferindo maior sentido e significado aos componentes curriculares de um curso, a qualidade da formação e a pouca evasão. Traçamos, assim, como objetivo deste trabalho analisar o módulo didático como uma técnica efetiva na elaboração de propostas para EAD discutindo a noção de Módulo Didático ou Módulo de Ensino situando as suas origens, os princípios e as teorias que constituíram seus fundamentos básicos, re-significando a sua proposta original dentro de parâmetros da pedagogia crítica. ORIGENS E PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DOS MÓDULOS DIDÁTICOS A organização do ensino por módulos surge a partir da idéia de aprendizagem para o domínio, ainda, na década de 1920, com a criação dos planos didáticos Winnetka de Carleton Washburne em 1922 e Henry C. Morrison, em 1926. Winnetka propunha um sistema organizado em duas partes : uma individual para aquisição de conhecimentos e habilidades específicas e outra coletiva responsável pela aquisição de atitudes sociais e de 2 criação. As matérias de ensino seriam organizadas em objetivos bem definidos acompanhadas de séries de exercícios para o aluno realizar e em seguida testes que informariam o domínio dos assuntos. O sistema Morrison propunha o currículo englobando objetivos nas áreas cognitiva, afetiva e psicomotora. O autor, questionando o ensino desenvolvido a partir de uma sucessão de aulas, tarefas e provas isoladas ou fragmentadas, propunha a organização de unidades amplas, significativamente coesas, que deveriam garantir o domínio do processo de conhecimento com níveis de abrangência que extrapolassem a perspectiva cognitiva. A aprendizagem seria garantida pela capacidade de o aluno aplicar o conhecimento em atividades concretas da vida. (CARVALHO, 1969, p.6) Esses princípios vieram a fundamentar a organização dos módulos de ensino, acrescentando ainda outros como: (a) o domínio de um conhecimento deve ser definido em termos dos objetivos educacionais, abrangendo as áreas cognitiva, afetiva e psicomotora; (b) o material a ser utilizado para o ensino deve estar organizado em função desses objetivos existindo unidade entre eles; (c) os estudantes devem demonstrar que adquiriram o conhecimento em cada unidade antes de darem continuidade às seguintes; (d) testes diagnósticos de rendimento devem ser aplicados ao término de cada unidade para informarem a suficiência na aprendizado do estudante, indicando o domínio alcançado no conteúdo; (e) uso de ensino complementar, caso o aluno não tenha apresentado o domínio; e ainda, (f) a variável tempo como importante fator no atendimento individual e apoio à aprendizagem de modo que o estudante possa gastar tanto tempo quanto for necessário para o domínio dos objetivos. Essa abordagem, embora difundida no decorrer das décadas de trinta e quarenta, desaparecem devido principalmente à falta de tecnologia de apoio. Voltam à tona no início da década de sessenta, com os estudos relativos a instrução programada. Segundo SKINNER (1954) para se aprender qualquer procedimento, por mais complexo que seja, é preciso dominar, primeiramente componentes menos complexos. Assim, para que cada estudante domine até o mais complexo dos comportamentos, esse conteúdo deve ser subdividido em pequenas porções de sentido, possibilitando, no processo, o domínio paulatino de cada uma. A metodologia que advém dessas orientações é a instrução programada que se revelou bastante eficiente em casos de treinamento ou em situações de aprendizagem específicas. Essa proposta, no entanto, não foi bem aceita pela escola, sendo 3 questionada como um modelo adequado para a formação de crianças e jovens no ensino regular. A concepção de “aprendizagem para o domínio” retorna ao cenário com CARROL, em 1963. Discutindo o conjunto de variáveis que interferem e se relacionam com os resultados da aprendizagem, o autor defende que, num processo de ensino, o domínio da aprendizagem é resultante de uma função que faz interseção entre o tempo necessário e o tempo gasto para a aprendizagem. Esse domínio está diretamente relacionado à aptidão do aluno, à qualidade da estratégia e à capacidade de entender a instrução. Segundo o autor as variáveis seriam: (a) a aptidão, que se refere ao tempo necessário para se aprender uma tarefa no nível estabelecido no objetivo de ensino; (b) perseverança, que significa disposição para usar a aprendizagem; (c) habilidade de entender uma instrução, relacionada à facilidade para desempenhar um procedimento solicitado; (d) qualidade da instrução grau de clareza, ordenação e relacionamento entre as tarefas de instrução; (e) tempo necessário - permanência do aluno em certa tarefa de aprendizagem até alcançar o domínio de seu conteúdo. ( ROCHA, 1974,p.33) Os estudos de CARROL foram importantes porque ao lado da aptidão como fator importante para a aprendizagem, o autor incluiu a variável tempo. Segundo ele, se for dado o tempo suficiente para que certa aprendizagem se realize, todos os estudantes ou quase todos poderão adquirir o domínio do conhecimento. Assim, “aptidão passa a ser definida, pelo autor, como o tempo requerido pelo estudante para atingir o domínio de uma tarefa”.(ROCHA, 1974, p.34) Dentro deste contexto, o tempo gasto para aprender é a chance para o domínio, ficando clara a correlação entre alto nível de aptidão e o menor tempo para a aprendizagem. Da mesma forma, quanto mais qualificados forem os tipos de procedimentos de ensino utilizados e quanto mais eficaz for o uso do tempo pelo aluno, menor será o tempo necessário para que a aprendizagem ocorra. Outros pesquisadores confirmaram essas idéias, dentre eles, Glaser ( 1968) e Atkinson (1967). No entanto, será Benjamim Bloom, em 1968, que irá complementa-las, com mais estudos no sentido de sua utilização como técnica de ensino. Para BLOOM, o uso de estratégias de aprendizagem para o domínio pelos professores está diretamente relacionado à capacidade dos docentes em reconhecerem quando o aluno alcançou o domínio. Essa capacidade, por outro lado, está diretamente 4 relacionada à capacidade de especificação dos objetivos de ensino em termos de comportamentos observáveis, sejam eles cognitivos, afetivos ou psicomotores. Os objetivos, assim elaborados, permitiriam a observação e o julgamento do aprendizado do aluno durante os processos de ensino e avaliação, porque a definição operacional estabelece a suficiência nas aprendizagens, isto é, estabelece um padrão pelo qual o estudante será conceituado em relação ao seu desempenho. Segundo o autor, não existem regras rígidas sobre a determinação desses padrões, e uma forma de estabelecê-los seria cooperativamente entre professores e gestores do ensino, podendo, inclusive, serem utilizados outros padrões já previamente estabelecidos em outros sistemas de ensino. Para a organização desses processos é fundamental o investimento no planejamento do ensino. Para o autor, os conteúdos a serem aprendidos precisam ser divididos em unidades significativas e a cada uma dessas unidades deve corresponder um objetivo de ensino a ser considerado atentamente pelo professor. BLOOM e seus colaboradores elaboraram taxonomias de objetivos, hierarquizando-os quanto aos níveis de dificuldade e complexidade. Essas taxonomias permitem traduzir, operacionalmente, essas unidades de sentido e significado pedagógico salientando os níveis de abrangência e profundidade dos projetos de ensino. Para o autor, “o sinal de domínio” de um objetivo alcançado dá àqueles que o receberam a evidência positiva de sua realização. Essa evidência reforça a aprendizagem, sugere hábitos de estudo, gera interesse e atitudes positivas em relação à aprendizagem. O sinal, também, de “não domínio” deve, também, encorajar os alunos a completar seu aprendizado, pois o êxito nessas pequenas unidades de conteúdo assegura uma previsão de êxito nas avaliações finais. (ROCHA, 1974,p.44) O conjunto dos procedimentos operacionais irá delinear a estrutura do módulo didático, juntamente com todos os procedimentos e recursos complementares de tratamento do conteúdo que englobam a técnica. Estes procedimentos devem estar inter-relacionados visando assegurar a articulação interna de cada unidade, reduzir o tempo requerido para a aprendizagem e, combinados, garantir o nível de qualidade do ensino. Os estudiosos das estratégias da aprendizagem para o domínio defendem que os princípios nos quais a teoria se apóia são fundamentais para o sucesso do processo de ensino, especialmente no que se refere ao estímulo e motivação do estudante. O domínio dos objetivos das primeiras unidades de ensino parece facilitar o aprendizado das unidades 5 subseqüentes e o tempo de estudo gasto nas primeiras unidades garante a aprendizagem adequada nas seguintes, de modo que resulta em menos tempo para o desenvolvimento das demais. Defendem, também, que a programação de uma atividade não deva tender a alcançar uma forma rígida ou definitiva e o professor deve enriquecer o módulo com outras propostas a cada ano mais estimulantes e capazes de atender às diferentes possibilidades dos estudantes. CONFRONTOS E CONTRADIÇÕES : A BUSCA POR UM NOVO LUGAR Embora a importância pedagógica dos princípios discutidos anteriormente seja uma realidade, uma contradição se instalou no contexto das práticas advindas das teorias citadas. O uso exacerbado das técnicas propostas e a perspectiva tecnicista de ensino supervalorizada pelos educadores nos anos setenta desencadearam um “ambiente político pedagógico” capaz de explicar o fenômeno educativo como fechado em si mesmo e socialmente neutro. A ênfase na dimensão individual do processo educacional fortaleceu a fertilidade das idéias liberais e da ideologia meritocrática do talento, situando o desempenho escolar como uma questão de responsabilidade essencialmente pessoal. Nesse contexto, o fracasso na aprendizagem ficaria, então, sob a responsabilidade daqueles que não soubessem fazer uso das oportunidades que lhes foram dadas. Será a partir dos anos oitenta que as críticas a esse contexto irão originar novas pesquisas que, deslocando o foco da questão, passarão a se situar nas ações da escola sobre os sujeitos aprendizes. O livro “A Reprodução” de Bourdieu e Passeron é uma das mais importantes obras para a discussão das alterações dos rumos e das explicações das questões educacionais e dos produtos da escola. Para os autores, as bases da seleção escolar estão nas diferenças culturais e no ethos de classe, existindo, ambientes culturais mais próximos ou mais distantes da cultura escolar. Segundo os autores, a distribuição desigual do capital escolar rentável entre as diferentes camadas sociais constitui a principal variável na relação origem social e o êxito escolar. Assim, o julgamento dos professores sobre os seus alunos em situações escolares ou exames formais leva em conta não só o saber aprendido em sala de aula, mas, especialmente, aspectos ligados ao estilo e maneiras próprias de ação e 6 resolução de situações problemáticas que carregam, implicitamente, os valores sociais de classe. Segundo Forquin (1995,p.47) : “É a própria escola a grande responsável pelo fracasso escolar das crianças dos meios populares porque veicula uma cultura e uma simbólica fundamentalmente estranha à sua cultura, destruidora de identidades e que as desqualificam ao pretender salvá-las.” Ora, essa realidade questiona as propostas didáticas que em seu interior não considerem os sujeitos e as suas vivências como os principais protagonistas do processo de ensino. Esse debate construiu um amplo questionamento sobre toda a ação escolar com o argumento de que, embora o sistema de ensino simulasse conhecer e avaliar os valores propriamente escolares, na verdade, referendava os valores das classes dominantes. Neste contexto, as possibilidades concretas de inclusão de novos grupos anteriormente excluídos ou pela idade, ou pelo gênero ou pela origem étnica, o redimensionando das relações de poder e hegemonia presentes nos espaços da escola, da educação e da cultura tornaram-se os principais desafios da educação. E, junto a esses, revigorou-se a importância de se educar as crianças, jovens a partir de objetivos concretos e claros de cidadania, não mais sobre bases de direitos formais abstratos, mas na perspectiva do direito, ampliando-se, assim o conceito do educativo como uma luta pela vida pública democrática e pela cidadania crítica. Diante desse cenário, os sistemas escolares passaram a delimitar novas estruturas de organização e gestão. Paralelamente a esse debate, uma nova realidade mundial, advinda das possibilidades criadas pelas novas tecnologias de informação e comunicação começaram a introduzir alterações nas relações humanas e de trabalho inevitavelmente profundas. Novos confrontos e novos desafios... Se são visíveis essas transformações vividas nas relações sociais nos últimos tempos provocadas pelas diferentes possibilidades de consumo, de trabalho e pelos processos de globalização, difusão e produção do conhecimento, são visíveis, também, as contradições sociais que estes processos passaram a gerar no interior de comunidades que têm dificuldades em acompanhar esse desenvolvimento, acirrando as desigualdades entre os seres humanos. Nesse contexto, o aumento do nível de escolarização passou a ser colocado como uma prioridade na pauta das políticas dos governos e a modalidade de Educação a 7 Distância como uma alternativa ao atendimento do grande público, até então impedido do acesso e permanência no sistema tradicional. Essa situação não é simples e a discussão sobre a Educação a Distância no Brasil situa-se nesse patamar e incorpora o conjunto desses dilemas. Considera-se que, embora muitos busquem respostas rápidas, torna-se fundamental a análise do contexto ambiental global no sentido de não reinventarmos a roda em situações desnecessárias e enquanto percebemos que novos caminhos se abrem com a produção didática de propostas que fazem uso de tecnologias e suportes arrojados com materiais instrucionais de última geração, revela-se, ao mesmo tempo, a força de princípios anteriormente considerados como os elos sustentadores dos processos de ensino presencial. É uma situação rica para um país com as características de diversidades ambientais e sócio-culturais como o Brasil. Alguns adeptos da “vanguarda” defendem os formatos de projetos, materiais e suportes instrucionais de primeira linha. Alguns consideram que um projeto ousado ou pertinente aos novos tempos deveria priorizar os formatos em CD rom, internet, ou mesmo os programas de TV e vídeo, alternativamente aos textos impressos, porque esses já seriam obsoletos nos tempos atuais. Diferentemente dessa posição, defende-se aqui que todos os meios são fundamentais e pertinentes, desde que atendam às necessidades do estudante, às diversidades regionais e locais para a implementação dos projetos com qualidade educativa. A partir dessas considerações, acreditamos que o pensamento pedagógico pode resignificar práticas anteriores, num campo de argumentação que reveja os excessos do passado, re-situando politicamente o lugar das técnicas de ensino. Sabemos que qualquer uma delas não tem existência própria e não possui uma racionalidade em si mesma, mas retirar todo e qualquer mérito de um suporte pedagógico na construção de propostas educativas é também uma leviandade. Será, então, dentro desse contorno que recuperamos a idéia de Módulo Didático como uma técnica importante na elaboração e desenvolvimento de propostas curriculares na modalidade EAD e mesmo presencial. O QUE É UM MÓDULO DIDÁTICO? Analisando as suas origens percebemos que o termo módulo tem ampla significação em diferentes ramos, sendo especialmente utilizado na área da arquitetura e engenharias. 8 Na área educacional, os módulos de aprendizagem constituem base para a organização curricular de programas de ensino, de propostas de formação inicial e continuada e são reconhecidos pela sua capacidade de possibilitar ao estudante autonomia no processo de aquisição e produção de conhecimentos e auto controle no percurso de aprendizagem. Houston et al, ainda em 1971 já observava a centralidade do estudante na construção dos módulos de ensino , “módulo de aprendizagem constitui um veículo de instrução efetiva e de desenvolvimento do currículo. Baseia-se nas necessidades dos estudantes, e não nas necessidades dos professores; enfatiza principalmente a obtenção dos objetivos, mais que simplesmente a participação nas atividades.” (1971,p.2) Existem diferentes formatos e denominações para os módulos. Podem ser chamados de módulos de aprendizagem, módulos de instrução, módulos de ensino ou módulos didáticos. No entanto, em qualquer uma das suas formas, conceitualmente representam um plano em que um conjunto de experiências de aprendizagem são organizadas de modo a permitir que o estudante atinja os objetivos propostos com níveis de competência previamente definidos. Assim, a estrutura curricular de um módulo didático se depara com diferentes possibilidades e maneiras de ser abordado, podendo abranger todo um curso, ou componentes curriculares de um curso ou até unidades de uma disciplina. ETAPAS NA ELABORAÇÃO DE UM MÓDULO DIDÁTICO Existem diferentes maneiras de se conceber e elaborar um módulo didático e, atualmente, princípios, anteriormente considerados, estão sendo re-significados em razão das novas discussões da pedagogia crítica conferindo novas configurações e estilos. Assim, aspectos fundamentais vêm sendo apontados para essa elaboração como por exemplo a ênfase na contextualização da temática selecionada, a definição de objetivos abrangentes focalizando as diferentes dimensões da formação humana, a centralidade no sujeito aprendiz e à dinâmica de ação/reflexão/ação como forma de aquisição e produção de conhecimentos. No entanto, nesse processo as clássicas etapas de constituição de um projeto de ensino, continuam sendo recomendadas para a sua elaboração, embora possam ser desdobradas em outras subdivisões à vontade dos autores. 9 É na fase de planejamento que se define o projeto global da proposta, incluindo aí, a caracterização detalhada do público alvo na perspectiva de se elaborar um projeto que realmente seja significativo para os estudantes e que desenvolva interações efetivas. É nesta fase que será delimitada a estrutura global, as especificações e as características globais do módulo, quais os materiais ou suportes tecnológicos disponíveis em razão dos recursos orçamentários, da infra estrutura e das possibilidades de produção, distribuição e uso dos materiais. Assim, questões como essas a seguir devem ser respondidas: o que se deseja com a proposta? Quais as suas finalidades político pedagógicas? Qual a sua amplitude e abrangência? O que o estudante estará apto a desenvolver? Sob quais circunstâncias o processo se desenrolará? Qual a abordagem teórica estará dando suporte ao programa? A resposta a essas questões favorecerá a definição do Projeto Pedagógico do Curso e da estrutura curricular básica, a seleção e organização dos materiais a serem elaborados. Orientará a forma de gestão e de organização, os componentes fundamentais para a execução do módulo, a determinação dos objetivos específicos e o conjunto das técnicas de ensino e de avaliação a serem utilizadas. A fase de produção do material depende diretamente desse planejamento que irá determinar as diferentes exigências e especificidades do elaborador. Apontamos aqui, como exemplo, a experiência vivida no projeto Veredas - Formação superior de professores para os anos iniciais desenvolvido no Estado de Minas Gerais, formando 14 mil professores em exercício. Foram realizadas uma série de oficinas com os autores porque, embora doutores e mestres, estavam bastante acostumados a escrever artigos em formato acadêmico, mas não tinham experiência com a produção de materiais instrucionais com as características de um módulo didático, como era o caso. O objetivo dessas oficinas foi exercitar a aquisição de habilidades como: escrever objetivos claros, delimitando ações de formação concretas e em níveis de complexidade; adequar a linguagem a um leitor que deve conversar com o texto o tempo todo; especificar as atividades de realização e de avaliação vinculadas aos objetivos de ensino; esboçar uma estrutura de módulo e outras. Uma observação importante na elaboração de um material dessa natureza situa-se no fato de as atividades, necessariamente, estarem co-relacionadas aos objetivos propostos e às atividades de avaliação. Assim, se um objetivo está vinculado à área cognitiva, as 10 atividades de avaliação deverão examinar o que o aluno sabe, dentro do nível de complexidade também, previamente definido nesta área. As atividades de realização podem variar em profundidade crescente, pois, conforme sabemos, a aquisição de uma informação ou fato pode sugerir desde a solicitação do seu reconhecimento simples até a resolução de problemas que exijam uso e aplicação, dependendo do nível de abrangência e complexidade especificados. O projeto Veredas propôs para a elaboração dos seus módulos didáticos as seguintes orientações para o escritor: (a) apresentar uma introdução informando ao leitor o tema a ser trabalho na unidade, explicitando e delimitando sua abrangência, relevância e sua relação com outros componentes e com a formação do estudante; (b) apresentar os objetivos de ensino, em torno de 3 ou 4, a partir das competências delineadas para o perfil de um professor preparado para atuar nos anos iniciais do ensino fundamental; (c) subdividir o corpo do texto em “seções, razoavelmente, autônomas” para permitir que pudessem ser estudadas em momentos diferentes; (d) trazer à tona a experiência do leitor, mobilizando seus conhecimentos prévios e promovendo a articulação com informações anteriormente trabalhadas ou com experiências vividas; (e) sugerir problemas ou questões relacionadas à prática docente concretizando a metodologia da ação-reflexão-ação. Cada módulo Veredas, por componente curricular, foi composto por 12 atividades de estudo, 4 em cada seção. Essas questões cumpriam o papel de fornecer ao estudante a auto-avaliação do seu desempenho na aprendizagem, além de permitir a exploração de aspectos importantes do texto, a análise de questões polêmicas ou mesmo a delimitação dos conceitos. Sínteses parciais aos estudantes são, também, recomendadas na elaboração do módulo, assim como ligações entre as diferentes seções com a previsão de pequenos textos de referência para que o estudante possa complementar seu processo de aprendizagem, ampliando seu horizonte com outros autores. Um outro aspecto fundamental na constituição de um módulo didático é a seleção das atividades de aprendizagem a serem propostas. O elaborador precisa estar atento à adequação dessas atividades porque, por vezes, algumas delas podem ser consideradas interessantes e tentadoras, no entanto, podem não estar de acordo com o projeto de módulo. Atividades envolvendo estímulos, como textos, figuras, vídeos, experiências de vida real ou demonstrações são recomendadas e, ainda, aquelas que envolvem a participação ativa do 11 estudante, solicitando que organize dados, anote, responda questões e demonstre alguma habilidade. Um aspecto importante a ser salientado refere-se à dimensão de socialização presente na constituição dos módulo didáticos. Como dissemos, sua estrutura envolve momentos individuais e momentos coletivos para que o estudante compartilhe experiências e interaja com outros colegas. No caso Veredas, as denominadas Semanas Presenciais, com uma programação de 40 horas realizadas com atividades variadas como palestras, seminários, grupos de trabalho, oficinas, visitas à museus e outras foram consideradas o ponto alto do programa. Uma recomendação importante situa-se na definição dos propósitos dessas atividades de aprendizagem. Essa definição atende a diferentes perspectivas como: estimular o estudante, oferecer mais informação, melhorar as habilidades de estudo, construir uma noção de realidade em relação às habilidades pessoais e necessidades de aprendizagem, permitir a interação com o ambiente, com outros estudantes, com outros autores. Considera-se que boas atividades manterão o estudante interessando e com atitude positiva em relação ao seu próprio aprendizado. Os módulos, dependendo das atividades propostas, têm o potencial pedagógico para desenvolverem habilidades e atitudes importantes na EAD, como: a capacidade de planejamento de seu tempo próprio, habilidades de selecionar, organizar e sistematizar as informações captadas, capacidade de expressar, organizar e apresentar conhecimentos relevantes de diferentes maneiras, expressar opiniões, transmitir os próprios pensamentos, participar de debates a cerca de temas polêmicos, estimular a busca por respostas em fontes diversas e outras. Os processos de avaliação têm por objetivo o controle da aprendizagem e o reconhecimento do desempenho do estudante no decorrer dos trabalhos e, numa dimensão formativa, promover novas aprendizagens. São previstas atividades avaliativas, apresentadas ao longo do processo de realização do módulo com o objetivo de informar ao estudante o seu desempenho no processo, incentivando-o a dar continuidade ao percurso. Considera-se que o incentivo ao percurso é um aspecto fundamental da estrutura dos módulos didáticos, assim como a avaliação contínua do desempenho porque reforça a permanência do estudante no processo. Observou-se no decorrer do Curso Veredas que a cada módulo os estudantes apresentaram desempenhos superiores aos anteriores, havendo 12 inúmeros depoimentos a respeito. É interessante salientar que os módulos incorporam uma concepção positiva de relação com o processo de avaliação porque mantêm os estudantes conscientes do que se espera deles em razão do seu desempenho, isto é, obter sucesso significa alcançar os objetivos claramente estabelecidos. Assim, de acordo com as bases teóricas que fundamentam a proposta, todo estudante teria condições de aprender o previsto no módulo didático. Essa relação altera a perspectiva classificatória dos processos de avaliação escolar, vinculada, comumente, a definição de notas ou médias. Nesse contexto, todo estudante tem condições de alcançar um bom desempenho a partir de novos tempos de estudo ou de recuperações previstas, sendo oferecido sempre que necessário mais tempo para quem assim necessitar. CONSIDERAÇÕES FINAIS Salientamos, ainda, que as possibilidades didáticas dos módulos não se prendem a EAD ou ao ensino regular presencial. O seu uso pode estar vinculado em processos que exigem tempos não presenciais e ou mesmo presenciais, articulando possibilidades múltiplas de interação entre os estudantes de uma rede de trabalho ou um de grupo em uma sala de aula. Ressaltamos que um processo de ensino efetivo numa perspectiva de formação humanista precisa se apoiar na participação direta do estudante, no envolvimento e na responsabilidade pelas ações previstas. Um professor precisa, para isso, estar atento a um formato de trabalho e a uma previsão de atividades de aprendizagem que permitam contemplar os diferentes ângulos dessa formação e a construção de atitudes de autonomia diante de um processo que exige articulação social e pessoal. Nesse sentido, as diferentes possibilidades de organização e de formatos possíveis para os módulos conferem liberdade ao elaborador. Diante do exposto, podemos dizer que, discutir uma possibilidade de organizar o ensino de maneira bastante planejada pode significar para alguns um didatismo sem necessidade. No entanto, temos observado que muitas propostas pedagógicas interessantes, apresentadas nos últimos tempos, não têm obtido o devido sucesso pela ausência da incorporação de princípios e dimensões de planejamento e articulação concreta com o uso de técnicas de ensino adequadas. Nesse sentido, consideramos pertinente trazermos à tona a idéia de Módulo Didático como uma alternativa importante. 13 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BLOOM, Benjamin S. et al. Taxonomia de los objectivos de la educacion. Buenos Aires. Editorial “El Ateneu”. 1971. Manuales I e II. BOURDIEU, P. e PASSERON, J.C. A reprodução: elementos para uma teoria dos sistemas de ensino. Lisboa: Veja, [s/d]. CARVALHO, Irene Mello. O ensino por unidades didáticas, Rio de janeiro. Fundação Getúlio Vargas, 1969, p.6 FORQUIN, J.C. Escola e cultura: as bases sociais e epistemológicas do conhecimento escolar. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993. HOUSTON, W. Robert et all. Developing Instructional Modules. Texas, university of Houston, 1971. ROCHA, Maria de Lourdes. Uma estratégia de aprendizagem para o domínio da estatística educacional descritiva I baseada em módulos – um estudo experimental. Dissertação de Mestrado – RJ – PUC. 1974 SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO DE MINAS GERAIS, Veredas – Formação Superior de Professores – Projeto Pedagógico, 2a. Ed. Belo Horizonte. 2002. UNESCO. Las tecnologías de la información y la comunicación en la formación docente – Guia de planificación. División de Educación Superior, 2004. UNESCO