Diferença de temperatura entre bairros do Rio é de mais de 10 graus Águas frias chegam à orla e registro de termômetros cai na Zona Sul Na terça-feira, a máxima em Copacabana foi de 27,3ºC; em Santa Cruz, 39,2ºC Temperaturas de bairros da Zona Sul são mais de 10 graus Celsius menor do que as registradas em bairros distantes da praia Marcelo RIO - Depois de punir os cariocas com temperaturas exorbitantes — algumas delas recordes mundiais — e uma seca histórica, este verão fez do Rio uma cidade partida. A capital do estado finalmente recebe a ressurgência, o fenômeno que leva as águas frias das profundezas para a superfície do mar. Os ventos mais fortes e a brisa amenizam a temperatura na orla da Zona Sul, mas alguns bairros continuam padecendo com os termômetros. Na terça-feira, a máxima registrada no Forte de Copacabana foi de amenos 27,3 graus Celsius. Em Santa Cruz, porém, ela atingiu 39,2ºC. A massa de ar seco, estacionada sobre a cidade desde o início do ano, começa a se deslocar para o oceano. Com isso, a velocidade dos ventos aumentou, especialmente em direção ao Leste fluminense. A corrente marinha, por sua vez, desloca-se para o Oeste. É a fórmula prefeita para esfriar as águas. Apesar de ser um fenômeno típico do verão, a ressurgência não apareceu no mês passado. Há dez anos ela não demorava tanto para chegar ao Rio. Nos últimos dez dias de janeiro, a temperatura da superfície do mar em frente à capital fluminense foi de 28ºC. No início de fevereiro, os termômetros indicaram 23ºC. A cidade recebe a ressurgência em duas frentes. Uma, mais fraca, é de Cabo Frio, onde o posicionamento geográfico da cidade — uma espécie de “bico” — permite uma constante troca de águas com o oceano. Um bairro, dois casos Mas a maior fonte das águas frias que chegam ao Rio é uma região a poucos quilômetros da costa da cidade. Com a entrada de ventos do Leste, estas águas de profundidade vão para a superfície e viajam até a orla. — Os ventos precisam soprar a 15 km/h para que as águas frias cheguem ao Rio, mas a massa de ar seco mudou este regime — destaca o pesquisador Rafael Soutelino, da Divisão de Dinâmica dos Oceanos do Instituto de Estudos do Mar Almirante Paulo Moreira (IAPM). — As brisas dominam a região das praias. No entanto, devido ao relevo acidentado da cidade, é difícil que esse esfriamento chegue a zonas mais afastadas do litoral. O vento mais forte aumenta a diferença da temperatura da água e da terra. Isso produz o esfriamento dos bairros litorâneos. No entanto, os “paredões” formados pelos prédios da orla e a falta de áreas verdes dificultam a circulação do ar frio pela cidade. — A temperatura do mar pode baixar agora, mas esta diminuição demora muito para chegar ao interior da cidade — ressalta a climatologista Suzana Kahn, vice-presidente do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC). — Metrópoles como o Rio são aquecidas pela grande emissão de gasesestufa e só veem a temperatura diminuir com a entrada de frentes frias, o que ainda não aconteceu aqui. O bairro de Copacabana, segundo a climatologista, é um exemplo da diferença de temperaturas. As águas frias e a brisa diminuem o calor na Avenida Atlântica, mas em ruas a poucos quarteirões da praia, como a Barata Ribeiro, já são mais abafadas. Segundo o pesquisador Cláudio Gonçalves Tiago, do Centro de Biologia Marinha da USP, a correnteza que traz águas frias à superfície traz, também, alimentos para diversos organismos. — A massa de água arrasta nutrientes que estavam no fundo do mar e o torna propício à alimentação e à reprodução — explica. — A elevação das águas frias beneficia uma área que chega à costa e também a uma parte do oceano, que é um ambiente muito pobre em matéria orgânica. Professor de Engenharia Costeira e Oceanográfica da Coppe/UFRJ, Paulo Cesar Rosman destaca que as áreas de ressurgência são propícias a atividades econômicas como a pesca. — O fosfato e o nitrato, muito comuns nas regiões de convergência, são ótimos para a pesca, porque há um reflorescimento extraordinário de algas e condições para o aumento populacional de toda a cadeia alimentar, dos plânctons aos grandes peixes — avalia. Chuvas em algumas regiões A cidade também pode ser partida pelas chuvas. A partir da semana que vem, segundo o Climatempo, as precipitações voltam a atingir, em determinados dias, alguns pontos da cidade. — O ar seco ainda é muito forte sobre o Rio, mas já há previsão de pancadas de chuva no sábado — analisa o meteorologista Cesar Soares. — Na semana que vem chegarão nuvens carregadas na cidade, que podem provocar precipitações em determinados pontos. Talvez chova em algum bairro, mas não em outro perto dali. Não descartamos temporais, mas não um daqueles que provoque grandes tragédias. O Globo - 13/02/14