0 - Maria Betânia Moreira Amador e Sandra Medina Benini (Orgs.) ‘ A complexidade do “lugar” e do “não lugar” numa abordagem geográfico-ambiental - Organizadoras Maria Betânia Moreira Amador Sandra Medina Benini A COMPLEXIDADE DO “LUGAR” E DO “NÃO LUGAR” numa abordagem geográfico-ambiental 1a Edição TUPÃ/ SP ANAP 2016 1 2 - Maria Betânia Moreira Amador e Sandra Medina Benini (Orgs.) Editora ANAP - Associação Amigos da Natureza da Alta Paulista Pessoa de Direito Privado Sem Fins Lucrativos Fundada em 14 de setembro de 2003 Rua Bolívia, nº 88, Jardim América, Cidade de Tupã, Estado de São Paulo. CEP 17.605-31 Diretoria da ANAP Presidente: Sandra Medina Benini Vice-Presidente: Allan Leon Casemiro da Silva 1ª Tesoureira: Maria Aparecida Alves Harada 2ª Tesoureiro: Jefferson Moreira da Silva 1ª Secretária: Rosangela Parilha Casemiro 2ª Secretária: Elisângela Medina Benini Diretoria Executiva da Editora Sandra Medina Benini Allan Leon Casemiro da Silva Leonice Seolin Dias Suporte Jurídico Adv. Elisângela Medina Benini Adv. Allaine Casemiro Revisão Ortográfica Jairo Nogueira Luna Smirna Cavalheiro Contato: (14) 3441-4945 www.editoraanap.org.br www.amigosdanatureza.org.br [email protected] A complexidade do “lugar” e do “não lugar” numa abordagem geográfico-ambiental - 3 Organizadoras Maria Betânia Moreira Amador Possui Graduação em Engenharia Florestal pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (1986), Mestrado em Geografia pela Universidade Federal de Pernambuco (1994), Especialização em Silvicultura pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (1995), Doutorado em Geografia (Conceito CAPES 5) pela Universidade Federal de Pernambuco (2008) e Pós-doutorado em Geografia na linha de pesquisa Ecossistemas e Impactos Ambientais, Universidade Federal de Pernambuco (2011). Professora Adjunta da Universidade de Pernambuco, Campus Garanhuns. Lider do GESSANE Grupo de Estudos Sistêmicos do SemiArido do Nordeste e pesquisadora do GEQUA - Grupo de Estudos do Quaternario do Nordeste Brasileiro da UFPE. Além da docência, realiza pesquisas nos seguintes temas: geografia com abordagem sistêmica e interdisciplinar, sustentabilidade, agroecologia, geomorfologia, biogeografia, e educação ambiental. Experiência, também, em estudos e pesquisas sobre a algarobeira no Nordeste do Brasil. Sandra Medina Benini Possui Graduação em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de Marília (1995), Bacharelado em Direito pela Faculdade de Direito da Alta Paulista (2005), Licenciatura em Geografia pelo Centro Universitário Claretiano de Batatais (2014), Especialização em Administração Ambiental pela Faculdade de Ciências Contábeis e Administração de Tupã (2005), Especialização em Engenharia de Segurança do Trabalho (2008), Mestrado em Geografia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2009), Doutorado em Geografia na Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2015), Doutorado em Arquitetura e Urbanismo na Mackenzie/SP (2016) e atualmente esta cursando o Pós-doutorado em Arquitetura e Urbanismo (PNPD/Capes) pela FAAC/UNESP - Câmpus de Bauru. Tem experiência na área de Planejamento e Gestão Urbana, atuando principalmente nos seguintes temas: Estatuto da Cidade, Planos Diretores, Políticas Públicas Urbanas, Uso e Ocupação do Solo Urbano, Áreas Verdes Públicas e Infraestrutura Verde. 4 - Maria Betânia Moreira Amador e Sandra Medina Benini (Orgs.) Conselho Editorial Interdisciplinar Profª Drª Alba Regina Azevedo Arana – UNOESTE Profª Drª Angélica Góis Morales – UNESP – Campus de Tupã Prof. Dr. Antônio Cezar Leal – FCT/UNESP – Campus de Presidente Prudente Prof. Dr. Antonio Fábio Sabbá Guimarães Vieira – UFAM Prof. Dr. Antonio Fluminhan Jr. – UNOESTE Prof. Dr. Arnaldo Yoso Sakamoto – UFMS Prof. Dr. Daniel Dantas Moreira Gomes – UPE – Campus de Garanhuns Profª Drª Daniela de Souza Onça – UDESC Profª Drª Danielle Gomes da Silva – UFPE – Recife Prof. Dr. Edson Luís Piroli – UNESP – Campus de Ourinhos Prof. Dr. Eraldo Medeiros Costa Neto – UEFS Prof. Dr. Erich Kellner – UFSCAR Profª Drª Flávia Akemi Ikuta – FFMS – FAENG Profª Drª Isabel Cristina Moroz-Caccia Gouveia – FCT/UNESP – Campus de Presidente Prudente Prof. Dr. João Cândido André da Silva Neto – UEA / CEST Prof. Dr. João Osvaldo Nunes – FCT/UNESP – Campus de Presidente Prudente Prof. Dr. Jorge Amancio Pickenhayn – Universidade de San Juan – Argentina Prof. Dr. José Carlos Ugeda Júnior – UFMS Prof. Dr. José Manuel Mateo Rodriguez – Universidade de Havana – Cuba Prof. Dr. José Mariano Caccia Gouveia – FCT/UNESP – Campus de Presidente Prudente Prof. Dr. Junior Ruiz Garcia – UFPR Profª Drª Jureth Couto Lemos – UFU Profª Drª Kênia Rezende – UFU Prof. Dr. Luciano da Fonseca Lins – UPE – Campus de Garanhuns Profª Drª Maira Celeiro Caple – Universidade de Havana – Cuba Profª Drª Marcia Eliane Silva Carvalho – UFS Prof. Dr. Marcos Reigota – Universidade de Sorocaba Profª Drª Maria Betânia Moreira Amador – UPE – Campus de Garanhuns Profª Drª Maria Helena Pereira Mirante – UNOESTE Profª Drª Martha Priscila Bezerra Pereira – UFCG Profª Drª Natacha Cíntia Regina Aleixo – UEA Prof. Dr. Paulo Cesar Rocha – FCT/UNESP – Campus de Presidente Prudente Prof. Dr. Pedro Fernando Cataneo – UNESP – Campus de Tupã Prof. Dr. Rafael Montanhini Soares de Oliveira – UTFPR Profª Drª Regina Célia de Castro Pereira – UEMA Profª Drª Renata Ribeiro de Araújo – FCT/UNESP – Campus de Presidente Prudente Prof. Dr. Ricardo Augusto Felício – USP Prof. Dr. Ricardo de Sampaio Dagnino – UNICAMP Profª Drª Roberta Medeiros de Souza – UFRPE – Campus Garanhuns Prof. Dr. Roberto Rodrigues de Souza – UFS Prof. Dr. Rodrigo José Pisani – Unifal Prof. Dr. Rodrigo Simão Camacho – UFGD Prof. Dr. Ronaldo Rodrigues Araújo – UFMA Profª Drª Rosa Maria Barilli Nogueira – UNOESTE Profª Drª Simone Valaski – Universidade Federal do Paraná Profª Drª Silvia Cantoia – UFMT – Campus Cuiabá Profª Drª Sônia Maria Marchiorato Carneiro – UFPR A complexidade do “lugar” e do “não lugar” numa abordagem geográfico-ambiental - A481a A complexidade do lugar e do não lugar numa abordagem geográfica-ambiental / Maria Betânia Moreira Amador e Sandra Medina Benini (Orgs.) – Tupã: ANAP, 2016. 141 p; il. Color. 29,7 cm ISBN 978-85-68242-25-4 1. Conceito de Lugar 2. Geografia 3. Ambiental I. Título. CDD: 900 CDU: 911/47 Índice para catálogo sistemático Brasil: Geografia 5 6 - Maria Betânia Moreira Amador e Sandra Medina Benini (Orgs.) Sumário Prefácio Prof. Dr. Antonio Carlos de Barros Corrêa 08 Apresentação 11 Capítulo 1 A cidade como espaço de nascimento, vida e morte Prof. Dr. Henrique Figueiredo Carneiro 12 Capítulo 2 Interconexão biogeografia, biodiversidade e lugar Profa. Dra. Maria Betânia Moreira Amador 20 Capítulo 3 Desastres naturais provocados por eventos extremos: uma realidade brasileira e do Estado de Pernambuco Profa. Dra. Cristiana Coutinho Duarte 30 Capítulo 4 Lugares inovativos: cidade do conhecimento e dimensões balizadoras Profa. Dra. Roberta Medeiros de Souza 45 Capítulo 5 A paisagem na escala do lugar Prof. Dr. Rodrigo de Freitas Amorim Profa. Dra. Danielle Gomes da Silva 55 Capítulo 6 Onde e quando: o lugar do espaço e do tempo no Espaço-Tempo Prof. Dr. Irami Buarque do Amazonas 68 Capítulo 7 Significado e importância ambiental dos espaços livres urbanos Prof. Dr. Carlos Sait P. de Andrade 83 Capítulo 8 O lugar de todos nós como possibilidade Prof. Dr. Alcindo José de Sá 98 A complexidade do “lugar” e do “não lugar” numa abordagem geográfico-ambiental - Capítulo 9 O lugar como construto de interpretação socioespacial: um olhar para o município de Horizonte, Estado do Ceará Prof. Dr. Emanuel Lindemberg Silva Albuquerque Prof. Dr. Daniel Dantas Moreira Gomes 108 Capítulo 10 O lugar geográfico como metáfora consciência Prof. Dr. Luciano Lins 118 Capítulo 11 Pesquisas sobre perfis longitudinais do Estado de Pernambuco: Estado da arte e perspectivas futuras Prof. Dr. Maurício Costa Goldfarb 131 7 108 - Maria Betânia Moreira Amador e Sandra Medina Benini (Orgs.) Capítulo 9 O LUGAR COMO CONSTRUTO DE INTERPRETAÇÃO SOCIO-ESPACIAL: UM OLHAR PARA O MUNICÍPIO DE HORIZONTE, ESTADO DO CEARÁ Emanuel Lindemberg Silva Albuquerque12 Daniel Dantas Moreira Gomes13 O espaço que se estende sobre um reticulado de pontos cardeais torna nítida a idéia de lugar, porém não transforma nenhuma determinada localidade geográfica no lugar. (TUAN). INTRODUÇÃO Em virtude de ser o lugar um construto que é derivado de ações indissociáveis entre a natureza e a sociedade, na percepção de espaço/tempo, torna-se necessário compreender que o pensamento geográfico que materializou o conceito de lugar vincula-se essencialmente à geografia humana, da qual derivaram dois ramos de pesquisa, ou seja, a geografia humanista e a geografia radical (FERREIRA, 2000). Na perspectiva de corroborar esta assertiva, Lopes menciona que, é consenso que as concepções da categoria lugar para a ciência geográfica estão atreladas com as discussões travadas pela Geografia humana, sendo que essa categoria tem dois lastros de acepção principais: a geografia fenomênica/humanista (geografia cultural) e a geografia crítica (marxista – materialismo/histórico/dialético). (LOPES, 2012, p. 26). Nesse sentido, destaca-se que o cerne da Geografia (como ciência) é abordar de forma pormenorizada a espacialidade social e os condicionantes ambientais de forma integrada, independentemente do conceito e/ou categoria a ser adotada, tendo em vista 12 13 Professor Doutor em Geografia da UFPI, Brasil Professor Doutor em Geologia da UPE / Campus Garanhuns, Brasil A complexidade do “lugar” e do “não lugar” numa abordagem geográfico-ambiental - 109 que o espaço geográfico é concebido por realidades inseparáveis entre a sociedade e a natureza (ALBUQUERQUE, 2014). Portanto, partindo deste viés de análise e reflexão, objetiva-se delimitar o escopo da categoria geográfica lugar, no presente estudo, como um constructo de interpretação socioespacial, tendo como recorte espacial o município de Horizonte, localizado no Estado do Ceará, a partir do viés e da percepção ambiental. Ao considerar o exposto, adota-se no estudo em pauta uma postura tanto fenomênica/humanista quanto marxista (por meio de uma reflexão epistemológica), em virtude de que o cenário concebido e percebido para o recorte espacial adotado é fruto de um construto socioespacial que permeia, de forma imbricada, a relação sociedade/natureza. Por sua vez, esta é resultante de um conjunto de fatores que são estruturadas pelo homem e que são condicionadas pelos fatores naturais. Portanto, este estudo visa a contribuir com reflexões salutares para a temática em epígrafe, na perspectiva de perceber o lugar como uma categoria que materializa no espaço concreto da vivência à realidade socioespacial presente na sociedade. Salienta-se que não é pretensão dos autores a extinção dos debates, tampouco a definição categórica/verdadeira do lugar como construto de interpretação socioespacial, mas apenas um elo de discussão e pensamento a respeito da categoria espacial que delimita o assunto em mote no presente texto. LUGAR: ESPAÇO CONCRETO DE VIVÊNCIA Na perspectiva de identificar e apreender a realidade socioespacial (geográficoambiental) a partir do conceito de lugar, torna-se necessário a utilização de categorias espaciais auxiliares que perpassam o espaço concreto de vivência, tendo em vista que “trabalhar com conceito é bem mais complexo que cravar um sentido único para o mesmo, visto que dependendo da posição epistemológica com que se trate o conceito, o mesmo terá esse ou aquele maior destaque” (LOPES, 2012, p. 24). De acordo com Tuan (1983), o espaço e o lugar são expressões interligadas em que atribuímos alguma importância, sendo que os lugares encontram-se em articulações com o espaço. Portanto, “[...] o sentido de lugar não está limitado ao nível pragmático da ação e da 110 - Maria Betânia Moreira Amador e Sandra Medina Benini (Orgs.) percepção e que sua experiência (direta ou simbólica) se constitui em diversas escalas [...]” (CABRAL, 2007). Dentre esses níveis escalares encontra-se o município como recorte espacial. Santos (1997) corrobora que o lugar constitui a dimensão da existência que se manifesta através do cotidiano entre as mais diversas pessoas e instituições em diversos níveis escalares. Não obstante, esta categoria espacial, a nosso ver, materializa as ações interligadas entre sociedade e natureza, pois é neste nível de análise que se constrói a noção de identidade e de pertencimento. De acordo com Holzer (2003), o lugar encontra-se para além do espaço cartesiano ou euclidiano, tendo em vista que o mesmo se traduz em experiência contínua, egocêntrica e social, num espaço de movimento (espaço-tempo vivido), ou seja, uma categoria que não se reduz, exclusivamente, ao espaço delimitado territorialmente, mas também se refere à categoria do afetivo, do mágico e do imaginário. Destarte, o espaço e o lugar são conceitos importantes não só para sabermos “mais sobre a nossa própria natureza – nossa potencialidade para experimentar – mas também como arrendatários da Terra, preocupados na prática com o projeto de um habitat mais humano” (TUAN, 1983, p. 8). Conforme pontua Santos (2010), é no lugar que a história é socialmente construída, pois os sujeitos (sociedade) são elementos vivos que, por meio de suas mais diversas atividades e relações, entram diretamente na dinâmica da (re)produção do lugar onde vivem (natureza). Portanto, a prática cotidiana dá sentido aos lugares, produzindo no indivíduo o sentimento de pertencimento, referência e identidade, pois o lugar. [...] é a base de reprodução da vida [...]. É o espaço passível de ser sentido, pensado, apropriado e vivido através do corpo [...]. As relações que os indivíduos mantêm com os espaços habitados se exprimem todos os dias nos modos de uso, nas condições mais banais, no secundário, no acidental [...]. São os lugares que o homem habita dentro da cidade que dizem respeito a seu cotidiano, e a seu modo de vida onde se locomove, passeia, flana, isto é, pelas formas através das quais o homem se apropria e que vão ganhando o significado dado pelo uso [...]. Os percursos realizados pelos habitantes ligam o lugar de domicílio aos lugares de lazer, de comunicação, mas o importante é que essas mediações espaciais são ordenadas segundo as propriedades do tempo vivido. (CARLOS, 2007, p. 20-22). A complexidade do “lugar” e do “não lugar” numa abordagem geográfico-ambiental - 111 Diante deste aporte teórico, menciona-se que o caminho metodológico do conceito de lugar é adotado no presente estudo como uma categoria operacional de percepção do espaço geográfico, tendo em vista que o lugar é produto das atividades e das relações dos sujeitos sociais entre si e entre estes e o meio (sociedade/natureza). ANÁLISE SOCIOESPACIAL DO MUNICÍPIO DE HORIZONTE/CE: O LUGAR NA PERSPECTIVA AMBIENTAL A importância de se compreender o lugar em que se habita e de como se dão as relações socioespaciais, por meio do viés ambiental, faz o homem efetivamente participar do espaço social, ou seja, aquele habitado e transformado pelo homem. Por sua vez, o lugar pode trazer reveladoras informações sobre a sociedade que nele habita, como, por exemplo, sua formação histórica, cultural e econômica (SANTOS, 2010), incluindo aqui o viés ambiental. Nessa perspectiva, o recorte espacial adotado no estudo em epígrafe compreende o município de Horizonte (FIGURA 1), localizado na Região Metropolitana de Fortaleza – RMF, Estado do Ceará, Região Nordeste do Brasil. Possui extensão territorial de aproximadamente 160,77 km² e dista 40 km de Fortaleza. O acesso principal à cidade se dá pela BR-116 (Rodovia Federal Santos Dumont). 112 - Maria Betânia Moreira Amador e Sandra Medina Benini (Orgs.) Figura 1: Mapa de localização do município de Horizonte, Estado do Ceará Fonte: Elaboração dos autores (2016). Ao compreender que o lugar encontra-se para além do espaço cartesiano ou euclidiano (HOLZER, 2003), conforme apresentado acima, o lugar é também espaço concreto de vivência, em que há a predominância da identidade, tendo em vista que o mesmo se traduz em experiência em sociedade, pois. Um lugar não é apenas um quadro de vida, mas um espaço vivido, isto é, de experiência sempre renovada, o que permite ao mesmo tempo, a reavaliação das heranças e a indagação sobre o presente e o futuro. A existência naquele espaço exerce um papel revelador sobre o mundo. (SANTOS, 2000, p. 114). Não obstante, para alcançar este nível de análise e reflexão, não se pode desconsiderar, de forma alguma, o fator histórico, cultural, econômico e ambiental do lugar. No caso específico em questão, o município de Horizonte merece destaque, pois em virtude de sua localização geográfica (proximidade da capital cearense), de seus condicionantes ambientais favoráveis e atrelada a uma lógica mercadológica (econômica) inserida numa região metropolitana, transformou à realidade local num curto intervalo de espaço/tempo. De acordo com Albuquerque (2012), o município de Horizonte teve um acréscimo significativo em sua população, principalmente, no perímetro urbano, onde não houve, por A complexidade do “lugar” e do “não lugar” numa abordagem geográfico-ambiental - 113 parte dos gestores públicos e dos atores sociais, nenhuma e/ou escassa preocupação com as características geoambientais do local frente às suas potencialidades e limitações de uso. Todavia, o sentido de lugar, na perspectiva retromencionada, não está circunscrito apenas ao espaço nucleado (área urbana), podendo também estar associado a espaços maiores e distantes do núcleo sede, com o qual não mantém laços afetivos e de identidade. No entanto, não é foco do presente trabalho constatar as nuanças entre urbano e rural. Por sua vez, o estudo visualiza o lugar por meio da experiência e do conhecimento dos indivíduos, pois, de acordo com Albuquerque (2012), mais de 80% da população horizontina é migrante, o que corrobora a existência de uma miscelânea de culturas e identidades que são (re)construídas a partir da vivência cotidiana no lugar (origem/destino). Do ponto de vista demográfico, a taxa geométrica de crescimento populacional do município nas últimas décadas (1991-2000) e (2000-2010) alcançou um crescimento da ordem de 7,06% e de 5,02%, respectivamente, sendo a maior taxa de crescimento populacional entre os municípios cearenses, e bem superior à registrada para o Estado, que foi de 1,3% (ALBUQUERQUE, 2012). Dessa forma, verifica-se ainda que a população deste município vem crescendo notadamente na área urbana. Em termos percentuais, no ano de 1991, a população urbana correspondia a 58,99%, passando para 59,30% no ano de 1996 e alcançando 83,23% no ano 2000. Destaca-se que na última década (2000-2010), diagnosticou-se um aumento ainda mais expressivo, apresentando um somatório de 92,49% da população horizontina inserida no perímetro urbano, conforme pode ser visualizado na Tabela 1. Tabela 1: Evolução da população do município de Horizonte, Ceará: 1991-2010 População Ano Urbana Total Rural Nº % Nº % 1991 18.283 10.786 58,99 7.497 41,01 1996 25.382 15.051 59,30 10.331 40,70 2000 33.790 28.122 83,23 5.668 16,77 2007 48.660 42.457 87,25 6.203 12,75 2010 55.187 51.016 92,49 4.138 7,51 Fonte: IBGE/IPECE, 2010. 114 - Maria Betânia Moreira Amador e Sandra Medina Benini (Orgs.) Diante desse cenário, constata-se que a taxa de crescimento populacional urbana foi igual a 11,24% no período (1991/2000) e de 6,14% na década (2000/2010). Por conseguinte, a taxa de crescimento geométrica da população rural alcança a marca de -3,10%. Este valor negativo evidencia a migração da população rural do município para a área urbana, em virtude essencialmente do fator econômico. Como resultado deste processo, tem-se que a urbanização tem tido um papel fundamental nos impactos socioambientais, que causam agudas transformações no meio ambiente geográfico e, particularmente, no lugar, seja ao nível da rua, do bairro ou do município como um todo. Vale destacar que os processos de urbanização e industrialização têm uma contribuição significativa nos impactos socioambientais ocorridos nas mais diversas cidades, tendo em vista que a lógica da industrialização encontra-se atrelada aos lugares mais propícios à sua instalação, implementação e, consequentemente, na geração de riquezas, ou seja, o maior lucro e/ou acúmulo de capital em detrimento da conservação/preservação ambiental, como é o caso do município de Horizonte. Ao considerar a análise socioespacial do lugar por meio do viés ambiental (tendo o lugar como categoria espacial), constata-se que a percepção humanista, por meio da relação homem-natureza/ambiente ganha vulto, tendo em vista que é fundamental conceber o lugar enquanto base da existência humana (LOPES, 2012). Desse modo, há uma miríade de abordagens a respeito desta temática, em que o viés epistemológico dos conceitos e categorias são engendrados, muitas vezes, de forma forçada as configurações estruturais/conjunturais convenientes à realidade local. Por sua vez, há um distanciamento entre o ver e o perceber, como é o caso do lugar na perspectiva ambiental. Por ser o lugar uma categoria espacial, é neste contexto que o homem se insere como parte integrante da natureza, tendo em vista que é neste espaço que ele vive e interage, em que ele pode desenvolver ou não a noção de identidade e de pertencimento, ou seja, o lugar é o espaço vivido em que proporciona ao cidadão uma identidade com o espaço. Portanto, são nesses lugares que o homem habita dentro da cidade e que dizem respeito ao seu cotidiano (CARLOS, 2007), dando forma e se apropriando do espaço das mais A complexidade do “lugar” e do “não lugar” numa abordagem geográfico-ambiental - 115 diversas formas, incluindo, nestes usos, os processos degradacionais do ambiente natural, que são potencializados pelas desigualdades socioeconômicas. A partir do conjunto integralizado das relações sociedade e natureza, materializadas no lugar, Corrêa (1986) delineia que as obras do homem são as marcas que apresentam um padrão de localização próprio de cada sociedade, constituindo o espaço do homem, a organização espacial da sociedade ou, simplesmente, o espaço geográfico, que é construído e reconstruído de acordo com um jogo de interesses. Nesse sentido, tem-se que os problemas socioambientais imperam no lugar enquanto conceito operacional de um cotidiano compartido entre as mais diversas pessoas, firmas e instituições-cooperação (SANTOS, 1997), enfatizando-se para o lugar em pauta as seguintes características que permeiam: o desmatamento indiscriminado das matas ciliares que revestem as planícies fluviais tanto a montante quanto à jusante dos canais fluviais, ocasionando, consequentemente, a diminuição da biodiversidade local; o manejo inadequado dos solos e dos recursos hídricos, resultando na aceleração dos processos erosivos com o consequente adelgaçamento dos solos e, a intensificação do assoreamento dos riachos, rios e lagoas. Nesse mesmo contexto, destaca-se o desaparecimento de fontes perenes e sazonais, em virtude, principalmente, do aterramento desses ambientes com vistas à expansão urbana e ao desenvolvimento econômico a qualquer custo, fruto da expansão imobiliária e/ou industrial; aumento do escoamento superficial e da diminuição da infiltração da água devido aos processos de urbanização e impermeabilização do solo; além da contaminação e poluição dos corpos hídricos a partir de esgotos industriais e residenciais que são lançados na natureza sem nenhum tipo de tratamento prévio. Percebe-se, a partir desses exemplos, que a construção do sentido de lugar implica, essencialmente em vivência, tendo a dimensão temporal um papel crucial para as relações do indivíduo com o espaço e, consequentemente, para desenvolver suas identidades. O tempo confere valores às experiências do vivido, pois a sensação do tempo afeta a sensação de lugar (TUAN, 1983). Ou seja, o lugar é construído constantemente e é fruto da relação indissociável entre sociedade e natureza. Isto implica em compreender o lugar através de nossas necessidades existenciais quais sejam, localização, posição, mobilidade, interação com os objetos e/ou com 116 - Maria Betânia Moreira Amador e Sandra Medina Benini (Orgs.) as pessoas. Identifica-se esta perspectiva com a nossa corporeidade e, a partir dela, o nosso estar no mundo, no caso, a partir do lugar como espaço de existência e coexistência. (SUERTEGARAY, 2001, p. 6). Em síntese, o município de Horizonte, neste contexto, insere-se nas feições da reestruturação urbana, contidas na (re)produção do espaço metropolitano de Fortaleza, consolidada e materializada no emprego, na migração, nas moradias e, consequentemente, nos aspectos sociais, ambientais e espaciais que se (re)formam e se (re)transformam de acordo com um jogo de interesse que moldam o lugar. CONCLUSÃO Ao considerar que o lugar é um construto que deriva de ações indissociáveis entre a natureza e a sociedade, é notório constatar que o espaço geográfico é concebido por realidades inseparáveis no tempo e espaço, tendo em vista que o lugar constitui a dimensão da existência que se manifesta através do cotidiano entre as mais diversas pessoas e instituições. Portanto, o lugar se materializa por meio da experiência contínua, egocêntrica e social do ser humano, perpassando, consequentemente, pelo viés do afetivo, do imaginário, da vivência e da identidade, e não estando restrito, somente, ao caráter do espaço cartesiano ou euclidiano, que é representado no mapa. Nesse sentido, a prática cotidiana dá sentido aos lugares, produzindo no indivíduo o sentimento de pertencimento, referência e identidade. Por sua vez, constata-se que o lugar é produto das atividades e das relações dos sujeitos sociais entre si e entre estes e o meio (sociedade/natureza). Na perspectiva de contemplar tal assertiva, apresentou-se como exemplo o município de Horizonte, localizado no estado do Ceará, tendo em vista que neste recorte espacial foi possível contemplar reveladoras informações sobre a sociedade que nele habita, dando ênfase na formação histórica, cultural, econômica e ambiental. À guisa de uma conclusão, corrobora-se que o lugar é uma categoria espacial e que representa um conceito operacional na Geografia, pois é neste contexto que o homem se insere como parte integrante da natureza e é neste espaço que ele vive e interage, desenvolvendo a noção de identidade e de pertencimento através do espaço vivido. A complexidade do “lugar” e do “não lugar” numa abordagem geográfico-ambiental - 117 REFERÊNCIAS ALBUQUERQUE, E. L. S. Análise geoambiental como subsídio ao ordenamento territorial do município de Horizonte – Ceará. 131 p. Dissertação (Mestrado), Geografia. Universidade Estadual do Ceará, Fortaleza, 2012. _______. 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