0 - Maria Betânia Moreira Amador e Sandra Medina Benini (Orgs.)

0 - Maria Betânia Moreira Amador e Sandra Medina Benini (Orgs.)
‘
A complexidade do “lugar” e do “não lugar” numa abordagem geográfico-ambiental -
Organizadoras
Maria Betânia Moreira Amador
Sandra Medina Benini
A COMPLEXIDADE DO
“LUGAR” E DO “NÃO LUGAR”
numa abordagem geográfico-ambiental
1a Edição
TUPÃ/ SP
ANAP
2016
1
2 - Maria Betânia Moreira Amador e Sandra Medina Benini (Orgs.)
Editora
ANAP - Associação Amigos da Natureza da Alta Paulista
Pessoa de Direito Privado Sem Fins Lucrativos
Fundada em 14 de setembro de 2003
Rua Bolívia, nº 88, Jardim América,
Cidade de Tupã, Estado de São Paulo.
CEP 17.605-31
Diretoria da ANAP
Presidente: Sandra Medina Benini
Vice-Presidente: Allan Leon Casemiro da Silva
1ª Tesoureira: Maria Aparecida Alves Harada
2ª Tesoureiro: Jefferson Moreira da Silva
1ª Secretária: Rosangela Parilha Casemiro
2ª Secretária: Elisângela Medina Benini
Diretoria Executiva da Editora
Sandra Medina Benini
Allan Leon Casemiro da Silva
Leonice Seolin Dias
Suporte Jurídico
Adv. Elisângela Medina Benini
Adv. Allaine Casemiro
Revisão Ortográfica
Jairo Nogueira Luna
Smirna Cavalheiro
Contato: (14) 3441-4945
www.editoraanap.org.br
www.amigosdanatureza.org.br
[email protected]
A complexidade do “lugar” e do “não lugar” numa abordagem geográfico-ambiental -
3
Organizadoras
Maria Betânia Moreira Amador
Possui Graduação em Engenharia Florestal pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (1986),
Mestrado em Geografia pela Universidade Federal de Pernambuco (1994), Especialização em
Silvicultura pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (1995), Doutorado em Geografia
(Conceito CAPES 5) pela Universidade Federal de Pernambuco (2008) e Pós-doutorado em Geografia
na linha de pesquisa Ecossistemas e Impactos Ambientais, Universidade Federal de Pernambuco
(2011). Professora Adjunta da Universidade de Pernambuco, Campus Garanhuns. Lider do GESSANE Grupo de Estudos Sistêmicos do SemiArido do Nordeste e pesquisadora do GEQUA - Grupo de Estudos
do Quaternario do Nordeste Brasileiro da UFPE. Além da docência, realiza pesquisas nos seguintes
temas: geografia com abordagem sistêmica e interdisciplinar, sustentabilidade, agroecologia,
geomorfologia, biogeografia, e educação ambiental. Experiência, também, em estudos e pesquisas
sobre a algarobeira no Nordeste do Brasil.
Sandra Medina Benini
Possui Graduação em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de Marília (1995), Bacharelado em
Direito pela Faculdade de Direito da Alta Paulista (2005), Licenciatura em Geografia pelo Centro
Universitário Claretiano de Batatais (2014), Especialização em Administração Ambiental pela
Faculdade de Ciências Contábeis e Administração de Tupã (2005), Especialização em Engenharia de
Segurança do Trabalho (2008), Mestrado em Geografia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de
Mesquita Filho (2009), Doutorado em Geografia na Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita
Filho (2015), Doutorado em Arquitetura e Urbanismo na Mackenzie/SP (2016) e atualmente esta
cursando o Pós-doutorado em Arquitetura e Urbanismo (PNPD/Capes) pela FAAC/UNESP - Câmpus de
Bauru. Tem experiência na área de Planejamento e Gestão Urbana, atuando principalmente nos
seguintes temas: Estatuto da Cidade, Planos Diretores, Políticas Públicas Urbanas, Uso e Ocupação do
Solo Urbano, Áreas Verdes Públicas e Infraestrutura Verde.
4 - Maria Betânia Moreira Amador e Sandra Medina Benini (Orgs.)
Conselho Editorial Interdisciplinar
Profª Drª Alba Regina Azevedo Arana – UNOESTE
Profª Drª Angélica Góis Morales – UNESP – Campus de Tupã
Prof. Dr. Antônio Cezar Leal – FCT/UNESP – Campus de Presidente Prudente
Prof. Dr. Antonio Fábio Sabbá Guimarães Vieira – UFAM
Prof. Dr. Antonio Fluminhan Jr. – UNOESTE
Prof. Dr. Arnaldo Yoso Sakamoto – UFMS
Prof. Dr. Daniel Dantas Moreira Gomes – UPE – Campus de Garanhuns
Profª Drª Daniela de Souza Onça – UDESC
Profª Drª Danielle Gomes da Silva – UFPE – Recife
Prof. Dr. Edson Luís Piroli – UNESP – Campus de Ourinhos
Prof. Dr. Eraldo Medeiros Costa Neto – UEFS
Prof. Dr. Erich Kellner – UFSCAR
Profª Drª Flávia Akemi Ikuta – FFMS – FAENG
Profª Drª Isabel Cristina Moroz-Caccia Gouveia – FCT/UNESP – Campus de Presidente Prudente
Prof. Dr. João Cândido André da Silva Neto – UEA / CEST
Prof. Dr. João Osvaldo Nunes – FCT/UNESP – Campus de Presidente Prudente
Prof. Dr. Jorge Amancio Pickenhayn – Universidade de San Juan – Argentina
Prof. Dr. José Carlos Ugeda Júnior – UFMS
Prof. Dr. José Manuel Mateo Rodriguez – Universidade de Havana – Cuba
Prof. Dr. José Mariano Caccia Gouveia – FCT/UNESP – Campus de Presidente Prudente
Prof. Dr. Junior Ruiz Garcia – UFPR
Profª Drª Jureth Couto Lemos – UFU
Profª Drª Kênia Rezende – UFU
Prof. Dr. Luciano da Fonseca Lins – UPE – Campus de Garanhuns
Profª Drª Maira Celeiro Caple – Universidade de Havana – Cuba
Profª Drª Marcia Eliane Silva Carvalho – UFS
Prof. Dr. Marcos Reigota – Universidade de Sorocaba
Profª Drª Maria Betânia Moreira Amador – UPE – Campus de Garanhuns
Profª Drª Maria Helena Pereira Mirante – UNOESTE
Profª Drª Martha Priscila Bezerra Pereira – UFCG
Profª Drª Natacha Cíntia Regina Aleixo – UEA
Prof. Dr. Paulo Cesar Rocha – FCT/UNESP – Campus de Presidente Prudente
Prof. Dr. Pedro Fernando Cataneo – UNESP – Campus de Tupã
Prof. Dr. Rafael Montanhini Soares de Oliveira – UTFPR
Profª Drª Regina Célia de Castro Pereira – UEMA
Profª Drª Renata Ribeiro de Araújo – FCT/UNESP – Campus de Presidente Prudente
Prof. Dr. Ricardo Augusto Felício – USP
Prof. Dr. Ricardo de Sampaio Dagnino – UNICAMP
Profª Drª Roberta Medeiros de Souza – UFRPE – Campus Garanhuns
Prof. Dr. Roberto Rodrigues de Souza – UFS
Prof. Dr. Rodrigo José Pisani – Unifal
Prof. Dr. Rodrigo Simão Camacho – UFGD
Prof. Dr. Ronaldo Rodrigues Araújo – UFMA
Profª Drª Rosa Maria Barilli Nogueira – UNOESTE
Profª Drª Simone Valaski – Universidade Federal do Paraná
Profª Drª Silvia Cantoia – UFMT – Campus Cuiabá
Profª Drª Sônia Maria Marchiorato Carneiro – UFPR
A complexidade do “lugar” e do “não lugar” numa abordagem geográfico-ambiental -
A481a
A complexidade do lugar e do não lugar numa abordagem
geográfica-ambiental / Maria Betânia Moreira Amador e Sandra
Medina Benini (Orgs.) – Tupã: ANAP, 2016.
141 p; il. Color. 29,7 cm
ISBN 978-85-68242-25-4
1. Conceito de Lugar 2. Geografia 3. Ambiental
I. Título.
CDD: 900
CDU: 911/47
Índice para catálogo sistemático
Brasil: Geografia
5
6 - Maria Betânia Moreira Amador e Sandra Medina Benini (Orgs.)
Sumário
Prefácio
Prof. Dr. Antonio Carlos de Barros Corrêa
08
Apresentação
11
Capítulo 1
A cidade como espaço de nascimento, vida e morte
Prof. Dr. Henrique Figueiredo Carneiro
12
Capítulo 2
Interconexão biogeografia, biodiversidade e lugar
Profa. Dra. Maria Betânia Moreira Amador
20
Capítulo 3
Desastres naturais provocados por eventos extremos: uma realidade brasileira e
do Estado de Pernambuco
Profa. Dra. Cristiana Coutinho Duarte
30
Capítulo 4
Lugares inovativos: cidade do conhecimento e dimensões balizadoras
Profa. Dra. Roberta Medeiros de Souza
45
Capítulo 5
A paisagem na escala do lugar
Prof. Dr. Rodrigo de Freitas Amorim
Profa. Dra. Danielle Gomes da Silva
55
Capítulo 6
Onde e quando: o lugar do espaço e do tempo no Espaço-Tempo
Prof. Dr. Irami Buarque do Amazonas
68
Capítulo 7
Significado e importância ambiental dos espaços livres urbanos
Prof. Dr. Carlos Sait P. de Andrade
83
Capítulo 8
O lugar de todos nós como possibilidade
Prof. Dr. Alcindo José de Sá
98
A complexidade do “lugar” e do “não lugar” numa abordagem geográfico-ambiental -
Capítulo 9
O lugar como construto de interpretação socioespacial: um olhar para o
município de Horizonte, Estado do Ceará
Prof. Dr. Emanuel Lindemberg Silva Albuquerque
Prof. Dr. Daniel Dantas Moreira Gomes
108
Capítulo 10
O lugar geográfico como metáfora consciência
Prof. Dr. Luciano Lins
118
Capítulo 11
Pesquisas sobre perfis longitudinais do Estado de Pernambuco: Estado da arte e
perspectivas futuras
Prof. Dr. Maurício Costa Goldfarb
131
7
108 - Maria Betânia Moreira Amador e Sandra Medina Benini (Orgs.)
Capítulo 9
O LUGAR COMO CONSTRUTO DE INTERPRETAÇÃO SOCIO-ESPACIAL:
UM OLHAR PARA O MUNICÍPIO DE HORIZONTE, ESTADO DO CEARÁ
Emanuel Lindemberg Silva Albuquerque12
Daniel Dantas Moreira Gomes13
O espaço que se estende sobre um reticulado de pontos cardeais torna nítida a
idéia de lugar, porém não transforma nenhuma determinada localidade geográfica
no lugar. (TUAN).
INTRODUÇÃO
Em virtude de ser o lugar um construto que é derivado de ações indissociáveis entre
a natureza e a sociedade, na percepção de espaço/tempo, torna-se necessário compreender
que o pensamento geográfico que materializou o conceito de lugar vincula-se
essencialmente à geografia humana, da qual derivaram dois ramos de pesquisa, ou seja, a
geografia humanista e a geografia radical (FERREIRA, 2000).
Na perspectiva de corroborar esta assertiva, Lopes menciona que,
é consenso que as concepções da categoria lugar para a ciência geográfica estão
atreladas com as discussões travadas pela Geografia humana, sendo que essa
categoria tem dois lastros de acepção principais: a geografia
fenomênica/humanista (geografia cultural) e a geografia crítica (marxista –
materialismo/histórico/dialético). (LOPES, 2012, p. 26).
Nesse sentido, destaca-se que o cerne da Geografia (como ciência) é abordar de
forma pormenorizada a espacialidade social e os condicionantes ambientais de forma
integrada, independentemente do conceito e/ou categoria a ser adotada, tendo em vista
12
13
Professor Doutor em Geografia da UFPI, Brasil
Professor Doutor em Geologia da UPE / Campus Garanhuns, Brasil
A complexidade do “lugar” e do “não lugar” numa abordagem geográfico-ambiental -
109
que o espaço geográfico é concebido por realidades inseparáveis entre a sociedade e a
natureza (ALBUQUERQUE, 2014).
Portanto, partindo deste viés de análise e reflexão, objetiva-se delimitar o escopo
da categoria geográfica lugar, no presente estudo, como um constructo de interpretação
socioespacial, tendo como recorte espacial o município de Horizonte, localizado no Estado
do Ceará, a partir do viés e da percepção ambiental.
Ao considerar o exposto, adota-se no estudo em pauta uma postura tanto
fenomênica/humanista quanto marxista (por meio de uma reflexão epistemológica), em
virtude de que o cenário concebido e percebido para o recorte espacial adotado é fruto de
um construto socioespacial que permeia, de forma imbricada, a relação sociedade/natureza.
Por sua vez, esta é resultante de um conjunto de fatores que são estruturadas pelo homem
e que são condicionadas pelos fatores naturais.
Portanto, este estudo visa a contribuir com reflexões salutares para a temática em
epígrafe, na perspectiva de perceber o lugar como uma categoria que materializa no espaço
concreto da vivência à realidade socioespacial presente na sociedade.
Salienta-se que não é pretensão dos autores a extinção dos debates, tampouco a
definição categórica/verdadeira do lugar como construto de interpretação socioespacial,
mas apenas um elo de discussão e pensamento a respeito da categoria espacial que delimita
o assunto em mote no presente texto.
LUGAR: ESPAÇO CONCRETO DE VIVÊNCIA
Na perspectiva de identificar e apreender a realidade socioespacial (geográficoambiental) a partir do conceito de lugar, torna-se necessário a utilização de categorias
espaciais auxiliares que perpassam o espaço concreto de vivência, tendo em vista que
“trabalhar com conceito é bem mais complexo que cravar um sentido único para o mesmo,
visto que dependendo da posição epistemológica com que se trate o conceito, o mesmo terá
esse ou aquele maior destaque” (LOPES, 2012, p. 24).
De acordo com Tuan (1983), o espaço e o lugar são expressões interligadas em que
atribuímos alguma importância, sendo que os lugares encontram-se em articulações com o
espaço. Portanto, “[...] o sentido de lugar não está limitado ao nível pragmático da ação e da
110 - Maria Betânia Moreira Amador e Sandra Medina Benini (Orgs.)
percepção e que sua experiência (direta ou simbólica) se constitui em diversas escalas [...]”
(CABRAL, 2007). Dentre esses níveis escalares encontra-se o município como recorte
espacial.
Santos (1997) corrobora que o lugar constitui a dimensão da existência que se
manifesta através do cotidiano entre as mais diversas pessoas e instituições em diversos
níveis escalares. Não obstante, esta categoria espacial, a nosso ver, materializa as ações
interligadas entre sociedade e natureza, pois é neste nível de análise que se constrói a noção
de identidade e de pertencimento.
De acordo com Holzer (2003), o lugar encontra-se para além do espaço cartesiano
ou euclidiano, tendo em vista que o mesmo se traduz em experiência contínua, egocêntrica
e social, num espaço de movimento (espaço-tempo vivido), ou seja, uma categoria que não
se reduz, exclusivamente, ao espaço delimitado territorialmente, mas também se refere à
categoria do afetivo, do mágico e do imaginário.
Destarte, o espaço e o lugar são conceitos importantes não só para sabermos “mais
sobre a nossa própria natureza – nossa potencialidade para experimentar – mas também
como arrendatários da Terra, preocupados na prática com o projeto de um habitat mais
humano” (TUAN, 1983, p. 8).
Conforme pontua Santos (2010), é no lugar que a história é socialmente construída,
pois os sujeitos (sociedade) são elementos vivos que, por meio de suas mais diversas
atividades e relações, entram diretamente na dinâmica da (re)produção do lugar onde vivem
(natureza).
Portanto, a prática cotidiana dá sentido aos lugares, produzindo no indivíduo o
sentimento de pertencimento, referência e identidade, pois o lugar.
[...] é a base de reprodução da vida [...]. É o espaço passível de ser sentido,
pensado, apropriado e vivido através do corpo [...]. As relações que os indivíduos
mantêm com os espaços habitados se exprimem todos os dias nos modos de uso,
nas condições mais banais, no secundário, no acidental [...]. São os lugares que o
homem habita dentro da cidade que dizem respeito a seu cotidiano, e a seu modo
de vida onde se locomove, passeia, flana, isto é, pelas formas através das quais o
homem se apropria e que vão ganhando o significado dado pelo uso [...]. Os
percursos realizados pelos habitantes ligam o lugar de domicílio aos lugares de
lazer, de comunicação, mas o importante é que essas mediações espaciais são
ordenadas segundo as propriedades do tempo vivido. (CARLOS, 2007, p. 20-22).
A complexidade do “lugar” e do “não lugar” numa abordagem geográfico-ambiental -
111
Diante deste aporte teórico, menciona-se que o caminho metodológico do conceito
de lugar é adotado no presente estudo como uma categoria operacional de percepção do
espaço geográfico, tendo em vista que o lugar é produto das atividades e das relações dos
sujeitos sociais entre si e entre estes e o meio (sociedade/natureza).
ANÁLISE SOCIOESPACIAL DO MUNICÍPIO DE HORIZONTE/CE: O LUGAR NA PERSPECTIVA
AMBIENTAL
A importância de se compreender o lugar em que se habita e de como se dão as
relações socioespaciais, por meio do viés ambiental, faz o homem efetivamente participar
do espaço social, ou seja, aquele habitado e transformado pelo homem. Por sua vez, o lugar
pode trazer reveladoras informações sobre a sociedade que nele habita, como, por exemplo,
sua formação histórica, cultural e econômica (SANTOS, 2010), incluindo aqui o viés
ambiental.
Nessa perspectiva, o recorte espacial adotado no estudo em epígrafe compreende o
município de Horizonte (FIGURA 1), localizado na Região Metropolitana de Fortaleza – RMF,
Estado do Ceará, Região Nordeste do Brasil. Possui extensão territorial de aproximadamente
160,77 km² e dista 40 km de Fortaleza. O acesso principal à cidade se dá pela BR-116
(Rodovia Federal Santos Dumont).
112 - Maria Betânia Moreira Amador e Sandra Medina Benini (Orgs.)
Figura 1: Mapa de localização do município de Horizonte, Estado do Ceará
Fonte: Elaboração dos autores (2016).
Ao compreender que o lugar encontra-se para além do espaço cartesiano ou
euclidiano (HOLZER, 2003), conforme apresentado acima, o lugar é também espaço concreto
de vivência, em que há a predominância da identidade, tendo em vista que o mesmo se
traduz em experiência em sociedade, pois.
Um lugar não é apenas um quadro de vida, mas um espaço vivido, isto é, de
experiência sempre renovada, o que permite ao mesmo tempo, a reavaliação das
heranças e a indagação sobre o presente e o futuro. A existência naquele espaço
exerce um papel revelador sobre o mundo. (SANTOS, 2000, p. 114).
Não obstante, para alcançar este nível de análise e reflexão, não se pode
desconsiderar, de forma alguma, o fator histórico, cultural, econômico e ambiental do lugar.
No caso específico em questão, o município de Horizonte merece destaque, pois em virtude
de sua localização geográfica (proximidade da capital cearense), de seus condicionantes
ambientais favoráveis e atrelada a uma lógica mercadológica (econômica) inserida numa
região metropolitana, transformou à realidade local num curto intervalo de espaço/tempo.
De acordo com Albuquerque (2012), o município de Horizonte teve um acréscimo
significativo em sua população, principalmente, no perímetro urbano, onde não houve, por
A complexidade do “lugar” e do “não lugar” numa abordagem geográfico-ambiental -
113
parte dos gestores públicos e dos atores sociais, nenhuma e/ou escassa preocupação com as
características geoambientais do local frente às suas potencialidades e limitações de uso.
Todavia, o sentido de lugar, na perspectiva retromencionada, não está circunscrito
apenas ao espaço nucleado (área urbana), podendo também estar associado a espaços
maiores e distantes do núcleo sede, com o qual não mantém laços afetivos e de identidade.
No entanto, não é foco do presente trabalho constatar as nuanças entre urbano e rural.
Por sua vez, o estudo visualiza o lugar por meio da experiência e do conhecimento
dos indivíduos, pois, de acordo com Albuquerque (2012), mais de 80% da população
horizontina é migrante, o que corrobora a existência de uma miscelânea de culturas e
identidades que são (re)construídas a partir da vivência cotidiana no lugar (origem/destino).
Do ponto de vista demográfico, a taxa geométrica de crescimento populacional do
município nas últimas décadas (1991-2000) e (2000-2010) alcançou um crescimento da
ordem de 7,06% e de 5,02%, respectivamente, sendo a maior taxa de crescimento
populacional entre os municípios cearenses, e bem superior à registrada para o Estado, que
foi de 1,3% (ALBUQUERQUE, 2012).
Dessa forma, verifica-se ainda que a população deste município vem crescendo
notadamente na área urbana. Em termos percentuais, no ano de 1991, a população urbana
correspondia a 58,99%, passando para 59,30% no ano de 1996 e alcançando 83,23% no ano
2000. Destaca-se que na última década (2000-2010), diagnosticou-se um aumento ainda
mais expressivo, apresentando um somatório de 92,49% da população horizontina inserida
no perímetro urbano, conforme pode ser visualizado na Tabela 1.
Tabela 1: Evolução da população do município de Horizonte, Ceará: 1991-2010
População
Ano
Urbana
Total
Rural
Nº
%
Nº
%
1991
18.283
10.786
58,99
7.497
41,01
1996
25.382
15.051
59,30
10.331
40,70
2000
33.790
28.122
83,23
5.668
16,77
2007
48.660
42.457
87,25
6.203
12,75
2010
55.187
51.016
92,49
4.138
7,51
Fonte: IBGE/IPECE, 2010.
114 - Maria Betânia Moreira Amador e Sandra Medina Benini (Orgs.)
Diante desse cenário, constata-se que a taxa de crescimento populacional urbana
foi igual a 11,24% no período (1991/2000) e de 6,14% na década (2000/2010). Por
conseguinte, a taxa de crescimento geométrica da população rural alcança a marca de
-3,10%. Este valor negativo evidencia a migração da população rural do município para a
área urbana, em virtude essencialmente do fator econômico.
Como resultado deste processo, tem-se que a urbanização tem tido um papel
fundamental nos impactos socioambientais, que causam agudas transformações no meio
ambiente geográfico e, particularmente, no lugar, seja ao nível da rua, do bairro ou do
município como um todo.
Vale destacar que os processos de urbanização e industrialização têm uma
contribuição significativa nos impactos socioambientais ocorridos nas mais diversas cidades,
tendo em vista que a lógica da industrialização encontra-se atrelada aos lugares mais
propícios à sua instalação, implementação e, consequentemente, na geração de riquezas, ou
seja, o maior lucro e/ou acúmulo de capital em detrimento da conservação/preservação
ambiental, como é o caso do município de Horizonte.
Ao considerar a análise socioespacial do lugar por meio do viés ambiental (tendo o
lugar como categoria espacial), constata-se que a percepção humanista, por meio da relação
homem-natureza/ambiente ganha vulto, tendo em vista que é fundamental conceber o
lugar enquanto base da existência humana (LOPES, 2012).
Desse modo, há uma miríade de abordagens a respeito desta temática, em que o
viés epistemológico dos conceitos e categorias são engendrados, muitas vezes, de forma
forçada as configurações estruturais/conjunturais convenientes à realidade local. Por sua
vez, há um distanciamento entre o ver e o perceber, como é o caso do lugar na perspectiva
ambiental.
Por ser o lugar uma categoria espacial, é neste contexto que o homem se insere
como parte integrante da natureza, tendo em vista que é neste espaço que ele vive e
interage, em que ele pode desenvolver ou não a noção de identidade e de pertencimento,
ou seja, o lugar é o espaço vivido em que proporciona ao cidadão uma identidade com o
espaço.
Portanto, são nesses lugares que o homem habita dentro da cidade e que dizem
respeito ao seu cotidiano (CARLOS, 2007), dando forma e se apropriando do espaço das mais
A complexidade do “lugar” e do “não lugar” numa abordagem geográfico-ambiental -
115
diversas formas, incluindo, nestes usos, os processos degradacionais do ambiente natural,
que são potencializados pelas desigualdades socioeconômicas.
A partir do conjunto integralizado das relações sociedade e natureza, materializadas
no lugar, Corrêa (1986) delineia que as obras do homem são as marcas que apresentam um
padrão de localização próprio de cada sociedade, constituindo o espaço do homem, a
organização espacial da sociedade ou, simplesmente, o espaço geográfico, que é construído
e reconstruído de acordo com um jogo de interesses.
Nesse sentido, tem-se que os problemas socioambientais imperam no lugar
enquanto conceito operacional de um cotidiano compartido entre as mais diversas pessoas,
firmas e instituições-cooperação (SANTOS, 1997), enfatizando-se para o lugar em pauta as
seguintes características que permeiam: o desmatamento indiscriminado das matas ciliares
que revestem as planícies fluviais tanto a montante quanto à jusante dos canais fluviais,
ocasionando, consequentemente, a diminuição da biodiversidade local; o manejo
inadequado dos solos e dos recursos hídricos, resultando na aceleração dos processos
erosivos com o consequente adelgaçamento dos solos e, a intensificação do assoreamento
dos riachos, rios e lagoas.
Nesse mesmo contexto, destaca-se o desaparecimento de fontes perenes e
sazonais, em virtude, principalmente, do aterramento desses ambientes com vistas à
expansão urbana e ao desenvolvimento econômico a qualquer custo, fruto da expansão
imobiliária e/ou industrial; aumento do escoamento superficial e da diminuição da
infiltração da água devido aos processos de urbanização e impermeabilização do solo; além
da contaminação e poluição dos corpos hídricos a partir de esgotos industriais e residenciais
que são lançados na natureza sem nenhum tipo de tratamento prévio.
Percebe-se, a partir desses exemplos, que a construção do sentido de lugar implica,
essencialmente em vivência, tendo a dimensão temporal um papel crucial para as relações
do indivíduo com o espaço e, consequentemente, para desenvolver suas identidades. O
tempo confere valores às experiências do vivido, pois a sensação do tempo afeta a sensação
de lugar (TUAN, 1983). Ou seja, o lugar é construído constantemente e é fruto da relação
indissociável entre sociedade e natureza.
Isto implica em compreender o lugar através de nossas necessidades existenciais
quais sejam, localização, posição, mobilidade, interação com os objetos e/ou com
116 - Maria Betânia Moreira Amador e Sandra Medina Benini (Orgs.)
as pessoas. Identifica-se esta perspectiva com a nossa corporeidade e, a partir dela,
o nosso estar no mundo, no caso, a partir do lugar como espaço de existência e
coexistência. (SUERTEGARAY, 2001, p. 6).
Em síntese, o município de Horizonte, neste contexto, insere-se nas feições da
reestruturação urbana, contidas na (re)produção do espaço metropolitano de Fortaleza,
consolidada e materializada no emprego, na migração, nas moradias e, consequentemente,
nos aspectos sociais, ambientais e espaciais que se (re)formam e se (re)transformam de
acordo com um jogo de interesse que moldam o lugar.
CONCLUSÃO
Ao considerar que o lugar é um construto que deriva de ações indissociáveis entre a
natureza e a sociedade, é notório constatar que o espaço geográfico é concebido por
realidades inseparáveis no tempo e espaço, tendo em vista que o lugar constitui a dimensão
da existência que se manifesta através do cotidiano entre as mais diversas pessoas e
instituições.
Portanto, o lugar se materializa por meio da experiência contínua, egocêntrica e
social do ser humano, perpassando, consequentemente, pelo viés do afetivo, do imaginário,
da vivência e da identidade, e não estando restrito, somente, ao caráter do espaço
cartesiano ou euclidiano, que é representado no mapa.
Nesse sentido, a prática cotidiana dá sentido aos lugares, produzindo no indivíduo o
sentimento de pertencimento, referência e identidade. Por sua vez, constata-se que o lugar
é produto das atividades e das relações dos sujeitos sociais entre si e entre estes e o meio
(sociedade/natureza).
Na perspectiva de contemplar tal assertiva, apresentou-se como exemplo o
município de Horizonte, localizado no estado do Ceará, tendo em vista que neste recorte
espacial foi possível contemplar reveladoras informações sobre a sociedade que nele habita,
dando ênfase na formação histórica, cultural, econômica e ambiental.
À guisa de uma conclusão, corrobora-se que o lugar é uma categoria espacial e que
representa um conceito operacional na Geografia, pois é neste contexto que o homem se
insere como parte integrante da natureza e é neste espaço que ele vive e interage,
desenvolvendo a noção de identidade e de pertencimento através do espaço vivido.
A complexidade do “lugar” e do “não lugar” numa abordagem geográfico-ambiental -
117
REFERÊNCIAS
ALBUQUERQUE, E. L. S. Análise geoambiental como subsídio ao ordenamento territorial do
município de Horizonte – Ceará. 131 p. Dissertação (Mestrado), Geografia. Universidade
Estadual do Ceará, Fortaleza, 2012.
_______. Dialética da/na natureza: algumas análises, reflexões e considerações. Revista da
Casa da Geografia de Sobral (RCGS), v. 16, n. 1, p. 9-18, 2014.
CABRAL, L. O. Revisitando as noções de espaço, lugar, paisagem e território, sob uma
perspectiva geográfica. Revista de Ciências Humanas, v. 41, n. 1 e 2, p. 141-155, abr./out.
2007.
CARLOS, A. F. A. O lugar no/do mundo. São Paulo: Labur Edições, 2007.
CORRÊA, A. R. L. Região e organização espacial. São Paulo: Ática, 1986.
FERREIRA, L. F. Acepções recentes do conceito de lugar e sua importância para o mundo
contemporâneo. Território, n. 9, p. 65-83, jul./dez. 2000.
HOLZER, W. O conceito de lugar na Geografia cultural-humanística: uma contribuição para a
geografia contemporânea. GEOgraphia, ano v, n. 10, 2003.
LOPES, J. G. As especificidades de análise do espaço, lugar, paisagem e território na
geográfica. Geografia Ensino & Pesquisa, v. 16, n. 2, p. 23-30, maio/ago. 2012.
SANTOS, L. P. O estudo do lugar no ensino de geografia: os espaços cotidianos na geografia
escolar. 158 p. Dissertação (Mestrado), Geografia. Universidade Estadual Paulista Júlio de
Mesquita Filho, Rio Claro, 2010.
SANTOS, M. Natureza do espaço. Técnica e tempo. razão e emoção. 2. ed. São Paulo:
Hucitec, 1997.
_______. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. São
Paulo: Record, 2000.
SUERTEGARAY, D. M. A. Espaço geográfico uno e múltiplo. Revista Electrónica de Geografía
y Ciencias Sociales, n. 93, p. 1-11, julho, 2001.
TUAN, Yi-Fu. Espaço e lugar: a perspectiva da experiência. Tradução de Lívia de Oliveira. São
Paulo: DIFEL, 1983.
A complexidade do “lugar” e do “não lugar” numa abordagem geográfico-ambiental -
141