Capítulo 04 - DBD PUC-Rio

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A Aquisição do Número Gramatical
O estudo da aquisição do número gramatical tem suscitado, ao longo dos
anos, algumas questões teóricas, abordadas em um número relativamente pequeno
de trabalhos. A seguir, será exposta uma breve apreciação destes trabalhos, no
intuito de mostrar como a abordagem da aquisição do número evoluiu dos estudos
centrados no desenvolvimento da morfologia de número para estudos voltados
para a aquisição do número no contexto da aquisição da sintaxe.
Os primeiros estudos em aquisição do sistema de número gramatical
concentraram-se na caracterização das regras morfológicas que subjazem à
marcação de plural na fala infantil (Berko, 1958), além dos trabalhos que visavam
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a uma análise quantitativa e qualitativa de dados de produção colhidos
longitudinalmente (Cazden, 1968; Mervis & Johnson, 1991), todos elaborados a
partir de dados do inglês. Estudos semelhantes foram levados a cabo com crianças
adquirindo PB (Massotti, 1977; Palhares, 1981, para o desenvolvimento da
morfologia de número; Cappellari & Zilles, 2002; Simioni, 2002; Ferrari-Neto,
2003; para estudos longitudinais). Destes, em rigor, somente os trabalhos de
Simioni (2002) e Ferrari-Neto (2003) cuidam especificamente da aquisição do
número, ao passo que os demais se situam no contexto maior da aquisição e
desenvolvimento da morfologia; ademais, os estudos de Berko (1958), Massotti
(1977), Palhares (1981) e Cappellari & Zilles (2002) foram conduzidos com
crianças em idade um tanto avançada para estudos desta ordem (para além dos
dois anos de idade), o que impede a análise das habilidades precoces de
processamento relativas a número.
Em Berko (1958), Cazden (1968), Mervis & Johnson (1991), Massotti
(1977), Palhares (1981) e Cappellari & Zilles (2002) o objeto a ser adquirido é
concebido em termos de regras morfológicas de formação de plural. De um modo
geral, afirma-se que a criança observa as diferentes manifestações lingüísticas do
número gramatical e induz destes dados uma regra genérica de formação de
plural, armazenando as irregularidades em um léxico. Contudo, nada é dito sobre
quais informações presentes no input lingüístico são relevantes para que a criança
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adquirindo número gramatical induza regras morfológicas, nem sobre como estas
informações são processadas pela criança (em realidade não são especificadas as
habilidades perceptuais necessárias para o processamento dos dados lingüísticos
primários e conseqüente retirada de informações relevantes para a aquisição do
número gramatical). Tais estudos prescindem de uma caracterização das
habilidades precoces de processamento que permita explicitar o modo como é
processado o sinal acústico, para que a criança possa distinguir elementos
funcionais e variações morfo-fonológicas que deverão servir de base para a
representação de distinções gramaticalmente relevantes para a língua em
aquisição.
Numa outra linha de pesquisa sobre a aquisição do número gramatical,
surgiram estudos que buscaram contribuir para o desenvolvimento do modelo
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teórico de língua a partir de dados da aquisição. Tais estudos visam igualmente a
permitir a explicação da ocorrência, na fala da criança, de determinadas
construções
sintáticas
que,
aparentemente,
violam a
gramática
adulta,
caracterizando estágios sucessivos por que passa a criança durante o processo de
aquisição de sua língua materna.
Nessa linha de investigação, citam-se alguns trabalhos com dados do PB,
como o de Cerqueira (1996) e o de Lopes (2004, 2006). No primeiro, oito dados
de fala de uma criança são analisados, com o autor elaborando uma argumentação
acerca do desenvolvimento concordância, e seu surgimento na fala infantil. Os
dados apresentados em Cerqueira (1996) são transcritos abaixo.1
(1) a. Coelhinhos (em resposta: Hum, e depois?) (2;05.05)
(Nome nu com flexão de número)
b. Os bichinho roubô a/ a/ a/ / a/a/hum /hum (2;05.05) (em resposta: E agora)
(DP com marca de número no determinante)
(2) a. Aquelas coisa minha; olha aí esse não é. (em resposta: O que tem nessa
gaveta?) (3;0.24)
1
Foram adicionadas a numeração referente à divisão por idade e os comentários relativos à
caracterização dos DPs em questão.
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(DP com marca de número no determinante)
(3) a. ...de onte eu vô pegá o brinquedo vô pegá as coisa (3;03.28)
(DP com marca de número no determinante)
b. Todas coisa que está aqui ó vô pegá eu vô saí com as coisa (em resposta: Ah,
tá) (3;03.28)
(DP com marca de número no quantificador/determinante)
c. monta os Brasilhanos da e O Circo Chegou (em resposta a: Monta o quê?)
(3;03.28)
(DP com flexão de número no D e no N – DP = nome próprio)
(4) a. só vô pegá as coisa pra brincá (3;04.29)
(DP com marca de número no determinante)
b. Cadê os personaves da Alice (3;04.29)
(DP com flexão de número no D em resposta à mãe que diz: ...olha lá tem os
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personagens da Alice, retomando este DP)
Certamente que oito dados de fala não constituem um corpus
representativo para a elaboração de uma teoria de aquisição, ainda que se possa
observar que predominam DPs plural com marca de número em D. Além do mais,
nota-se a presença de dados pouco informativos (em 4), visto que dizem respeito a
nome próprio e a retomada imediata da fala do adulto.
É importante destacar que, para Cerqueira (1996), o número é um traço de
N, que se estende aos demais itens do sintagma por via do Princípio de Projeção
Estendida A partir disso, a questão levantada pelo autor diz respeito à presença de
marcação apenas no D na fala infantil: se esta representaria violação de algum
princípio da gramática adulta. A questão da violação ou não é discutida a partir
dos estudos de Scherre (1988), descritos no capítulo 3. A conclusão do autor é a
de que não há violação da gramática adulta, uma vez que as mesmas estruturas
são atestadas também na fala do adulto, além de analisar a marcação de número
apenas em D como decorrente de um /-s/ nulo no nome.
Cerqueira (1996)
apresenta o apagamento da marca de plural como pertinente à interface
fonologia/sintaxe. Segundo este autor, /-s/ nulo encontra um licenciamento formal
no fato de o elemento fazer parte de uma projeção estendida e, por conseguinte,
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receber concordância por via sintática, e encontra um licenciamento funcional,
pois a presença da concordância é notificada em algum elemento da projeção (o
que justificaria, segundo o autor, que nomes nus recebam a marca de plural).
Apesar de a argumentação prover uma explicação coerente para a ausência de
marcação de número plural em N, o escasso número de dados utilizados na análise
não permite qualquer observação de caráter conclusivo.
Na linha dos trabalhos sobre número gramatical que visam ao
desenvolvimento de um modelo teórico de língua, há os estudos que se referem
aos possíveis parâmetros relativos a número. De um modo geral, a literatura não
tem sido clara acerca de quais seriam, de fato, estes parâmetros. No mais das
vezes, tem-se associado tais parâmetros à existência de um núcleo funcional
NumP, o qual apresentaria algumas propriedades sintáticas e semânticas,
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concernentes à interpretação massiva ou contável de DPs flexionados em número,
ou ainda relativas à ocorrência de nominais nus (bare nominals) em determinadas
línguas. Dentre as propostas destacam-se a de Munn & Schmitt (2001) e Deprez
(2005). Os primeiros autores propõem a aplicação do Free Agr Parameter
(Bobaljik, 1995) ao domínio nominal. Línguas que possuem Agr e Num em
projeções distintas (não fundidos) podem, opcionalmente, ter Num ausente.
Segundo os autores, a possibilidade do singular bare em PB seria resultado da
presença de um D nulo (Raposo, 1998) e da ausência de NumP, ou seja, o núcleo
de número seria opcional no PB, conforme demonstram os esquemas a seguir:
Já Deprez (2005) propõe um parâmetro morfológico que controla a
presença sintática da projeção funcional para número. O parâmetro de plural
poderia ser expresso em termos de diferenças entre línguas. Em línguas +PL, a
projeção NumP é projetada sistematicamente para nomes contáveis, o que
significa que está presente mesmo quando um DP é singular. NumP, neste caso,
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deve conter um counter para a expressão da contabilidade (countability). Em
línguas –PL, NumP é opcional, e, quando é projetado, não apresenta um counter.
A proposta de Deprez assemelha-se à proposta de de Borer (2005), para quem
duas projeções relacionadas a número são assumidas: CLmax e *P. A camada CL é
responsável pela distinção massivos vs. contáveis, enquanto o sistema de
contagem - #P – é o local para a definição específica de quantidades. A presença
de NumP força a realização de uma espécie (kind) em ocorrências, ou seja, é
proposta uma relação entre a estrutura morfológica dos nominais bare e sua
interpretação, dispensando-se a necessidade de uma parametrização semântica,
como a proposta por Chierchia (1998).
A proposta defendida por Schmitt & Munn (2000) apresenta argumentos
contra a interpretação de Deprez (2005) e Borer (2005). Em primeiro lugar, no
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que diz respeito à presença do bare singular na posição de sujeito em PB, Munn &
Schmitt observam-se que há concordância entre sujeito e verbo no singular,
embora os nominais singulares bare possam ser antecedentes de pronomes no
singular ou no plural (exemplos em Munn & Schmitt, 2005:825):
a.
Coelho vê o mundo de outra maneira porque é muito pequeno.
b.
Coelho vê o mundo de outra maneira porque eles são muito pequenos.
Os fatos descritos em relação ao PB sugerem que os singulares bare sejam
sub-especificados para número. O comportamento desses nominais é distinto do
comportamento de termos massivos. Sendo assim, parece adequado assumir que
os massivos não apresentariam a camada NumP, mas que esta estaria presente nos
nominais bare: se marcada para plural (e na presença de um D nulo), plurais bare
seriam gerados; se não-especificada para número, os singulares bare seriam
projetados. A concordância local com o sujeito assumiria o número default, ou
seja, o singular.
Já a retomada por pronomes leva em consideração a
interpretação semântica gerada a partir da estrutura sintática, o que explica o uso
de pronomes singulares ou plurais (Augusto & Corrêa, 2007).
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Levando-se em conta o parâmetro proposto por Deprez (2005), poder-se-ia
admitir uma parametrização mais fina, sugerida pela própria autora em nota, em
que além da variação atribuída à projeção NumP especificamente, a associação da
obrigatoriedade do contador - “counter” - a essa projeção também admitisse
variação. Nesse sentido, não seria necessário supor que o PB estivesse se tornando
uma língua _PL, em que NumP fosse opcional, que parece ser uma caracterização
muito mais adequada a línguas do tipo do chinês, mas a mudança poderia se dar
na não-obrigatoriedade da associação do contador a NumP, o que explicaria o
singular bare nessa variedade do português.
Em suma, no que tange a parâmetros relativos a número, as discussões
anteriores mostram que freqüentemente se remete a diferentes tipos de projeção
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de NumP, seja em análises que se debruçam sobre a distinção massivo vs.
contável, seja para a caracterização da distribuição de nominais bare nas diversas
línguas. Estas propostas paramétricas, entretanto, não deixam explícito que tipo de
informação seria usada pela criança a fim de que os valores dos parâmetros
possam ser fixados. Assim, a formulação do que, ou de quais seriam os
parâmetros relativos a número permanece ainda uma questão em aberto para
teorias de aquisição e para a teoria lingüística em geral.
Os trabalhos de Lopes (2004, 2006) são referentes à aquisição de
concordância de número no DP, com o primeiro (2004) tendo por objetivo discutir
a aquisição de número no DP e sua correlação com um possível traço paramétrico
do PB; e o segundo (2006) dando enfoque especial aos nomes nus singulares,
propondo estruturas de DP distintas para os genéricos e existenciais e não
pressupondo uma análise unificada para os DPs singulares contáveis nus do PB.
Lopes (2004), analisando dados de produção (duas coletas longitudinais
realizadas com crianças de faixa etária 1;8 e 3;7), defende a existência de três
estágios no desenvolvimento da expressão de número no DP. No primeiro, a
criança assume assumiria um valor singular default e podendo haver nomes
contáveis singulares nus na fala infantil; no segundo, a criança fixaria a diferença
de número, sinalizada pela marca morfológica, ou seja, e finalmente, no terceiro, a
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criança fixaria a projeção opcional de NumP, de acordo com a proposta de Munn
& Schmitt (1999) .
Lopes assume, no que se refere ao local da interpretabilidade dos traços, a
proposta original de Chomsky (1995) segundo a qual o traço de número é
interpretável nos nomes. Assim, inicialmente os traços não-interpretáveis em D
ainda não foram selecionados. No caso do PB, a criança demoraria mais a
convergir para a gramática do número no PB em decorrência de haver um traço de
número não-especificado nos DP’s singulares nus. Isso daria conta da ocorrência
de DPs nos quais a marca de número se apresenta apenas no Nome (também
observados nos dados de Ferrari (2003), em concomitância com DPs marcados
para número em D e N e apenas em D)
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O traço de número interpretável em N permitiria explicar o porquê de a
criança, nas fases iniciais, realizar a marca morfológica apenas no N. Uma vez
que o traço faz parte do nome, e sabendo-se que itens lexicais como nomes são
rapidamente aprendidos pela criança em fase de aquisição, espera-se que haja
pouca dificuldade nessa marcação. Contudo, tendo em vista que diferentes formas
de marcação de número no DP coexistem nas primeiras produções da criança, não
necessariamente este pressuposto se faz necessário.
O segundo estágio proposto por Lopes revela que a criança percebeu a
informação semântica veiculada pela morfologia de número, com valores
singular/plural. Nesse caso, a criança seria capaz de extrair essa informação do
DP
por meio de uma análise de sua estrutura sintática e por meio do
processamento do DP como expressão referencial. Do ponto de vista de uma
teoria da aquisição da linguagem que visa a explicar o modo como a criança
identifica a língua, é necessário clarificar de onde a criança extrai de forma
confiável informação de que número é um traço formal do PB. Tais tópicos
remetem à questão da visibilidade da informação relativa a número nas interfaces,
no tocante ao tipo de informação tratada como relevante, e à necessidade de supor
concordância no DP, no que se refere ao modo como esta informação é
processada.
71
No trabalho de 2006, Lopes discute a proposta do parâmetro do Agr livre
(Free Agr Parameter - Bobaljik, 1995) na forma como aplicada à análise dos DPs
nus em PB por Munn & Schmitt (2001). Assumindo, semelhantemente a Munn &
Schmitt, que a projeção NumP seja opcional em PB, conforme o previsto pelo
Free Agr Parameter, Lopes (2006) vai propor, diferentemente daqueles autores,
que a aparente opcionalidade de NumP teria a ver com o fato de o PB ter um
determinante expletivo nulo que, semanticamente, é um type shifter, ou seja, um
kind creator, que são seleciona NumP em razão de suas propriedades semânticas.
Uma questão mais específica, para a qual se volta esta tese, é a questão do
tratamento procedimental da aquisição, na forma como descrita na Introdução. Por
conseguinte, pode-se pensar em um tratamento integrado entre teoria lingüística e
teoria de processamento, o qual especifique o modo como a criança processa
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informação de interface a fim de extrair dados lingüísticos relevantes para a língua
em questão.
Nessa linha, o trabalho de Ferrari-Neto (2003) trata do reconhecimento do
número gramatical e processamento da concordância no âmbito do DP. Buscou-se
neste estudo caracterizar as habilidades iniciais de identificação de informação
relativa a número e de processamento da concordância, num enfoque que conjuga
teoria de língua e teoria de processamento lingüístico, em termos de
bootstrapping.
Naquele estudo foram realizados três experimentos com vista a investigar:
a sensibilidade da criança à presença de um morfema de número adjungido ao
nome e informação semântica por ele veiculada, por meio do paradigma de
identificação de imagens;
sensibilidade à congruência/incongruência na
concordância de número, no mesmo paradigma utilizado em Name (2002) para
detectar sensibilidade à congruência de gênero.
Os resultados obtidos mostraram que criança de 18 e 28 meses são
sensíveis à presença do morfema de número adjungido aos nomes, e esta
sensibilidade aumenta com a idade. No entanto, diferentemente de Name (2002),
não foi obtida evidência conclusiva de que crianças dessa idade seriam sensíveis à
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concordância de número no DP. Considerou-se que o uso de nomes reais e a
possibilidade de referência genérica pode ter afetado a condução da tarefa, visto
que, a criança poderia apontar para uma gravura com um ou mais elementos
correspondentes à raiz nominal independentemente de ter processado a
concordância de número. Um experimento-piloto foi então conduzido com o
mesmo objetivo do anterior, fazendo uso de pseudo-nomes referindo-se a objetos
e seres inventados (não-reais), de forma a concentrar a informação semântica no
morfema de número, o qual sugeriu a possibilidade de crianças dessa idade serem
sensíveis a essa informação, a qual é explorada no experimento 1, exposto no
capítulo 5.
Questões relativas à aquisição do número a partir do processamento do
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material lingüístico também têm sido alvo de estudos experimentais com falantes
de outras línguas, em especial o inglês. Dentre esses estudos, pode-se citar o de
Soderström (2002), Miller (2005) e Kouider et al. (2006), descritos a seguir.
O estudo de Melanie Soderström (2002) concentra-se fundamentalmente
na compreensão das informações relativas à morfologia flexional. Concentrando
seu trabalho na identificação e reconhecimento do morfema flexional ⁄-s ⁄ do
inglês, língua que apresenta dois morfemas homófonos (como marca de plural nos
nomes e como indicador da terceira pessoa do singular nos verbos, a autora
investiga, numa série de experimentos, as habilidades de compreensão presentes
em crianças em fase de aquisição, bem como os conhecimentos sintáticos
precoces que estas crianças podem apresentar.
No experimento 1, comparou-se a preferência das crianças por histórias
que apresentavam sentenças gramaticais contendo a marca de terceira pessoa do
singular no verbo (“the boys bakes bread”) e sentenças gramaticais contendo a
marca de terceira pessoa do plural no nome (“the boys bake bread”) com
passagens nas quais as sentenças eram agramaticais, não apresentando nenhuma
flexão (“the boy bake bread”). Já no experimento 2, um segundo grupo de bebês,
distinto do primeiro, teve a preferência observada, preferência esta relativa às
mesmas histórias com frases gramaticais do experimento 1, só que desta vez
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comparadas a frases agramaticais com dupla marcação morfológica (“the boys
bakes bread”). Os experimentos 3 e 4 seguintes foram aplicados em bebês de 19 a
23 meses de idade, visando conferir se crianças nesta faixa etária distinguem
semanticamente a flexão nominal de número da flexão verbal de número.
Procedeu-se a duas diferentes comparações. Em uma, os sujeitos ouviram frases
com DP´s singulares e plurais (“look at the ball(s)"), e buscou-se conferir se as
crianças reconheciam o morfema ⁄-s ⁄ adjungido ao nome e o interpretava como
marca de pluralidade. Em uma segunda comparação, DP´s foram introduzidos em
sentenças como “the ball rolls”, visando-se deste modo checar se as crianças
identificavam o morfema ⁄-s ⁄ adjungido ao verbo como indicativo da terceira
pessoa do plural. Se a semântica destes morfemas fosse compreendida pelo bebê
entre 19ne 23 meses de idade, então seria possível predizer que olhariam
preferencialmente para as imagens singular ou plural, de acordo com o estímulo
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sonoro ouvido.
Os resultados obtidos por Soderström no experimento 1 demonstram que
os bebês preferem passagens gramaticais, tanto no singular quanto no plural, em
relação a passagens agramaticais. Já no experimento 2, os resultados não
mostraram preferência nem por passagens gramaticais, nem por passagens
duplamente flexionadas. Soderström procedeu ainda a uma comparação entre os
resultados apurados em ambos os experimentos, cotejando as médias obtidas nas
condições gramatical (plural e singular gramaticais) e agramatical (sem flexão e
duplamente flexionada). Desta comparação emergiu uma preferência significativa
por frases gramaticais em relação às frases sem flexão, mas nenhuma preferência
foi constatada entre sentenças gramaticais e sentenças duplamente flexionadas.
Soderström afirma que a preferência das crianças por passagens
gramaticais na terceira pessoa do singular demonstra que elas são sensíveis à
flexão verbal, o que sugere uma atenção das crianças na faixa dos 19 meses a
aspectos da morfossintaxe, mesmo quando a produção de tais morfemas possui
falhas. A autora ressalta, no entanto, que ambos os experimentos não fornecem
indícios do quanto estas preferências sugerem um conhecimento gramatical da
flexão. O fato de as crianças não demonstrarem preferência por enunciados
gramaticais comparativamente a enunciados agramaticais duplamente flexionados
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sugere, ao invés, que as crianças não procedem a um julgamento de
gramaticalidade sofisticado sobre tais sentenças – o que parece ser o caso é que
bebês com 19 meses de idade demonstram preferir sentenças com algum tipo de
flexão, distinguindo-as das sentenças não-flexionadas, embora sejam indiferentes
à gramaticalidade das mesmas. Os estudos de Soderström evidenciaram uma
percepção precoce da criança à presença do morfema de número, seja no verbo,
seja no nome, ainda que, no caso dos experimentos de Soderström, não se tenham
obtido evidências acerca do reconhecimento da informação semântica contida no
morfema de número. Os resultados de Soderström, no entanto, são omissos no que
diz respeito a uma possível capacidade de a criança perceber o morfema de
número mesmo quando este se apresenta variável fônica e morfologicamente,
tratando estas variações como expressões de um mesmo morfema abstrato. Neste
sentido, o trabalho de Miller (2005) é mais ilustrativo, pois os resultados por ela
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obtidos indicaram que inputs variáveis, tanto no tocante à pronúncia da
morfologia de plural, quanto à omissão desta mesma morfologia, caracterizando
assim diferentes dialetos sociais, são percebidas diferentemente por falantes de
um e outro grupo, conforme o mostrado a seguir.
O trabalho de Karen Miller (2005) é concernente à aquisição do sistema de
número gramatical do espanhol por crianças chilenas. O foco do trabalho é a
compreensão da morfologia de plural nas sentenças em que esta informação
apresenta-se variável – em espanhol chileno, a morfologia de plural apresenta
variação em sua expressão fônica (alternância entre [s] e [h] na pronúncia do
morfema –s) e em sua expressão morfológica (com omissão do morfema em
alguns
elementos
do
DP,
marcando
assim
diferenças
sociodialetais,
semelhantemente ao PB). Os experimentos de Miller examinam justamente se este
input variável afeta a compreensão do morfema de plural e em que nível, levando
uma criança adquirindo espanhol chileno a construir uma gramática que difere em
alguns pontos da gramática-alvo. Miller procedeu à aplicação de dois testes
experimentais, assumindo em ambos a hipótese de que inputs variáveis afetam a
compreensão. No experimento 1, testou-se a habilidade de a criança compreender
a marca de plural nos nomes e nos determinantes un/unos, algun/algunos e unos
de los/algunos de los. Os participantes foram 36 crianças, na faixa etária entre 4,5
e 5,11 anos, sendo que 18 delas eram pertencentes a uma classe social mais baixa
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(“working class”) e as outras 18 a uma classe social mais alta (“middle class”),
configurando deste modo grupos submetidos a inputs distintos. Testou-se
igualmente um grupo de 20 crianças, desta vez com faixa etária entre 6,0 e 8,2
anos, sendo metade pertencente a uma classe social mais alta e metade a classe
social mais baixa. Os resultados obtidos indicaram que um input variável, no
tocante à pronúncia, relacionado à morfologia de plural, afeta a compreensão do
morfema de plural em crianças de ambos os grupos, além de sugerirem que, dado
o alto nível de omissão da marca de plural na fala dos adultos da classe social
mais baixa, as crianças submetidas a esta variante têm sua capacidade de
compreensão do plural diminuída, uma vez que uma diferença significativa entre
os grupos sociais foi atestada. A comparação entre as faixas etárias mostrou que a
esta diferença significativa diminui a partir dos 6,0 anos, indicando que a
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influência da variação do input decresce a partir deste ponto.
Já no experimento 2, o objetivo foi testar a compreensão das crianças em
relação à semântica do morfema de plural presente nos determinantes un/unos. e
os participantes foram 20 crianças com faixa etária entre 4,4 e 5,11, metade
pertencente à classe social mais baixa e metade pertencente à classe social mais
alta, igualmente falantes de espanhol chileno. Os resultados obtidos evidenciaram
que inputs ambíguos concernentes à morfologia de plural, no que tange às
diferentes pronúncias da marca de número, afetam a compreensão do morfema de
plural, já que os sujeitos de ambas os grupos sociais apresentaram desempenho
insatisfatório na condição plural. Além disso, os resultados indicaram igualmente
que a variabilidade do estímulo, no que se refere à omissão do morfema de plural
também contribui para a dificuldade de interpretação do número, uma vez que os
sujeitos da classe social mais baixa aparentemente não distinguem nomes
flexionados e não-flexionados em número, diferentemente dos sujeitos da classe
social mais alta, de acordo com as diferenças significativas obtidas por Miller
quando da comparação dos resultados entre os dois grupos e entre ambas as
condições.
Por fim, tem-se o trabalho experimental de Kouider, Halberda, Wood &
Carey (2006), o qual apresenta uma série de estudos experimentais a respeito da
aquisição da marcação de número em inglês, nos quais foi investigado se bebês
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em fase de aquisição mapeiam as marcas morfológicas concernentes a singular e
plural presentes no input e as relaciona a distinções semânticas tais como “um” e
“mais de um”. Nos experimentos 1 e 2 foram testadas 14 crianças com idade entre
20 e 24 meses, apresentando-se a elas frases que continham nomes inventados e
informação relativa a número presentes no verbo (“look, there is/are some
blickets”), nos determinantes/quantificadores (“look, there is a/some blicket”) e no
nome (“look, there is a blicket(s)”). Nos experimentos 3 e 4, testaram-se sujeitos
entre 24 e 36 meses de idade, os quais foram submetidos a estímulos que
continham informação morfológica relativa a número apenas no nome (por
exemplo, “look at the blickets” e “look at the blicket”). Os experimentos 1 e 2,
assim como os experimentos 3 e 4, foram metodologicamente idênticos, variando
somente no tocante à idade dos sujeitos, justamente com o intuito de permitir a
comparação entre as faixas etárias estudadas. Os resultados obtidos por Kouider
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et. Al. (2006) provêem duas evidências principais. A primeira é relativa à idade
em que crianças adquirindo inglês começam a dominar a distinção entre singular e
plural, em torno dos 20 meses de idade. Já a segunda concerne ao fato de que, na
aquisição do inglês, as crianças parecem perceber a oposição singular/plural
inicialmente nos verbos (como demonstram os resultados obtidos com os verbos
is/are presentes nos estímulos), e depois nos determinantes e quantificadores
(conforme o evidenciado pela distinção entre a/some, presentes em alguns
estímulos), o que talvez possa ser explicado em termos da maior proeminência
fônica dos verbos em relação aos determinantes e quantificadores.
De todo modo, o fato de as crianças adquirindo inglês lançarem mão da
informação relativa a número presente no determinante é bastante sugestiva,
conforme será visto em no experimento 1 do capítulo 5. O estudo de Kouider et
al. (2006), o qual apresenta enfoque bastante semelhante ao adotado aqui, auferiu
resultados que em muita medida sustentam os dados aqui coligidos, na razão em
que evidencia uma capacidade de a criança em fase de aquisição perceber
informação relativa a número presente nos estímulos sonoros e relacionar esta
informação a um conteúdo semântico advindo da referência externa. Os resultados
do experimento sobre reconhecimento de informação relativa a número e
processamento da concordância no DP, realizado no escopo da pesquisa aqui
77
desenvolvida e exposto no capítulo seguinte, reforçam os obtidos e relatados por
Kouider et al.
Sobre os três experimentos aqui relatados, tomados em conjunto, pode-se
afirmar que todos concentram-se no tratamento que algumas questões
fundamentais do processo de aquisição do número gramatical, quais sejam a
percepção de morfemas de número (como no de Soderström, 2002), a influência
da variabilidade do input (como no de Miller 2005) e o processamento semântico
da informação relativa a número (como no de Kouider et al. 2002). Questões
semelhantes a essas serão discutidas no Capítulo 5, no âmbito do estudo da
aquisição do número gramatical em PB, visando-se com isso fornecer novas
evidências acerca o tratamento desses problemas em uma teoria de aquisição da
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linguagem.
4.1
Estudos sobre Distinção entre Mass e Count Nouns na Aquisição da
Linguagem
Em um estudo sobre a aquisição do sistema de número gramatical, assume
uma grande importância a análise de estudos relativos à distinção entre mass e
count nouns. Isso porque se assume que o estabelecimento de distinções relativas
à oposição mass/count é pertinente às propriedades da projeção funcional NumP.
O objetivo desta seção é esboçar uma proposta teórica que permita abordar
a questão da aquisição da distinção mass/count por crianças em fase inicial de
aquisição do Português Brasileiro (PB). Considera-se que a proposta aqui
esboçada permite um tratamento unificado das questões relativas à caracterização
da distinção mass/count em termos estritamente formais, possibilitando assim a
determinação do que de fato deve ser adquirido pela criança, no que tange a esta
distinção.
A expressão lingüística da distinção mass e count é observada em muitas
línguas modernas. O inglês e o português são casos típicos de línguas em que esta
78
distinção se apresenta. Tem-se associado a divisão entre mass e count nouns à
distinção entre nomes de substâncias e nomes de objetos, sendo estes últimos
constantes da classe dos count nouns, e os primeiros à classe dos mass nouns. Um
exame rápido desta classificação, contudo, revela a sua precariedade: palavras
como furniture, embora designe um conjunto de objetos, classifica-se como mass
noun; outras, como beer, que claramente se refere a uma substância em frases
como there is beer all over the floor, aparece flexionado em uma sentença como
we ordered three beers, propriedade atribuída a count nouns. Uma outra
associação feita foi a que relacionava mass e count nouns às categorias contável e
incontável, colocando-se os mass nouns no grupo dos substantivos incontáveis e
os count nouns no grupo dos substantivos contáveis. Todavia, uma vez mais se
encontraram casos em que associação falhou: açúcar em português comporta-se
como quase sempre como incontável, mas, em sentenças como no intestino
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digerem-se açúcares e ácidos graxos, seu comportamento é de contável. Outros
exemplos como este também podem ser observados em inglês em outras línguas.
No que diz respeito à aquisição da linguagem, as questões fundamentais
que se colocam são o que a criança tem de adquirir no tocante à distinção
mass/count, que habilidades/conhecimentos ela já tem de possuir para que esta
aquisição ocorra naturalmente e que tipo de informação constante no input se faz
relevante para este processo. Nicolas (1996) agrupa os trabalhos em aquisição de
nomes massivos e contáveis em três grupos: o primeiro seria formado pelos
trabalhos que assumem um conhecimento semântico inato (innate semantic views)
(Middleton et al. 2004; Macnamara, 1982; Macnamara e Reyes, 1994;
McPherson, 1991; Brown, 1973; Bloom, 1990, 1994, 1996); o segundo pelos
estudos embasados em uma abordagem distribucional (distributional accounts)
(Gathercole, 1983, 1985); e o terceiro pelas pesquisas que buscam conjugar as
duas visões (Gordon, 1985, 1988). Poder-se-ia sugerir um quarto grupo, mais
focado nas propostas fundamentadas em parâmetros de aquisição concernentes a
diferenças sintático-estruturais específicas entre nomes contáveis e massivos
(Chierchia, 1998; Deprez, 2005).
As posições teóricas sobre a distinção massivo/contável apresentam uma
multiplicidade de visões. Segundo Joosten (2003), uma das razões para esta
variação é que os lingüistas e os filósofos que têm se dedicado ao estudo de mass
79
e count nouns apresentam dificuldades em definir claramente os seus critérios, o
que acarreta a convergência de diferentes níveis de análise lingüística no
tratamento da questão. Joosten propõe então que o problema da distinção entre
nomes contáveis e massivos seja estudado sob quatro pontos de vista diferentes,
tomados separadamente.
O primeiro ponto de vista adotado por Joosten seria o gramatical, de
acordo como qual a oposição mass/count apresenta reflexos gramaticais bastante
visíveis. A existência de casos como os relatados anteriormente levou os
lingüistas a não mais associarem mass e count nouns às categorias
substância/objeto e incontável/contável, ou a qualquer outra categoria de base
semântica. Antes, eles passaram a preferir apontar as características e
propriedades puramente gramaticais relacionadas a ambas as classes em questão.
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Assim, uma série de características morfológicas e sintáticas foi associada a mass
e count nouns. Chierchia (1998) afirma serem as propriedades semânticas
específicas de mass e count nouns que determinam seu comportamento
morfossintático, e em seu trabalho de 2003, faz um elenco destes traços:
I – Count Nouns:
1. recebe facilmente morfologia de plural
2. combina-se com numerais
3. não precisam usar expressões de medida ou classificadores para serem
contados
4. são precedidos de quantificadores específicos (many, several, few, etc)
5. pode ser precedido por artigo definido ou indefinido
II – Mass Nouns:
4. não possuem morfologia de plural
5. não se combinam com numerais
6. precisam usar expressões de medida ou classificadores para serem
contados
7. são precedidos de quantificadores específicos (much, little, etc.)
8. são precedidos apenas por artigos definidos, repelindo os indefinidos
(aceita-o apenas em circunstâncias excepcionais)
80
Ainda que se possam determinar com relativa clareza e segurança as
diferenças entre mass nouns e count nouns, no tocante a suas propriedades
morfossintáticas, não são poucas as questões decorrentes da existência de tal
separação. Em realidade, duas objeções são apontadas por Joosten com relação ao
ponto de vista gramatical. A primeira é que parece improvável que nomes
massivos como água, ouro e fumaça ou contáveis como flor, carro e cachorro
assim o sejam apenas por coincidência – ao contrário, eles parecem indicar que há
uma tendência geral para nomes massivos se referirem a substâncias e nomes
contáveis se referirem a objetos e seres animados. A segunda é que o ponto de
vista gramatical parece pressupor uma correlação um-para-um entre forma
gramatical e significação, o que nem sempre acontece. Barner & Snedeker (2005),
em um estudo experimental sobre a aquisição de mass e count nouns, apontam o
fato de que nomes com sintaxe típica de mass fazerem também referência a
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indivíduos, além de substâncias.
Estudos sobre mass e count nouns costumam adotar igualmente um ponto
de vista ontológico em suas teorizações. Sob esta visão, a distinção massivocontável decorre de distinções operadas entre entidades reais do mundo, ou seja,
entre referentes extralingüísticos. Quine (1960) afirma que mass nouns têm
“referência cumulativa”, isto é, qualquer soma de uma entidade X é um X, fato
que não ocorre com os count nouns. Cheng (1973) postula que mass nouns
apresentam "referência distributiva": qualquer parte de um todo de um objeto
massivo que é X é um X. Por fim, Ter Meulen (1981) propõe que mass nouns
possuem “referência homogênea”, isto é, partes de uma entidade X apresentam as
mesmas propriedades de X, podendo ser referidas como X. Para estas três
propriedades, cumulatividade, distributividade e homogeneidade, o mundo real é a
base de classificação, portanto, são as propriedades físicas dos objetos e dos seres
referidos que determinam se um nome deve ser classificado como massivo ou
contável.
Esta forma de teorização apresenta, entretanto, alguns problemas. Se são
as propriedades das entidades do mundo extralingüístico que determinam a
classificação de um nome, então é lícito prever que diferentes línguas
apresentarão a mesma classificação para as mesmas entidades. Todavia, não é isso
81
que se observa em um exame da distribuição dos nomes entre classes de nomes
massivos e contáveis nas diferentes línguas. Translingüisticamente, aponta-se uma
variação da categorização dos nomes em classes de mass e count nouns. Chierchia
(2003) nos fornece alguns exemplos, retirados de um cotejo entre nomes do inglês
e do italiano:
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Count Nouns (italiano)
Mass Nouns (inglês)
Capello
hair
Bagaglio
luggage
Mobile
furniture
Calzatura
footwear
Posata
cutlery
parentela
relative
Um outro problema decorrente da adoção do ponto de vista ontológico é o
fato de que os conceitos de cumulatividade, distributividade e homogeneidade são
difíceis de serem aplicados a substantivos abstratos tais como crise, qualidade ou
tristeza. O ponto de vista ontológico pode ser aplicado com maior sucesso a
substantivos concretos, que designam objetos tangíveis ou perceptíveis, mas falha
quando aplicado a nomes abstratos, embora também estes possam ser
classificados em contáveis e massivos. Por fim, o ponto de vista ontológico não dá
conta de explicar como um nome que se refere a uma mesma entidade do mundo
real pode ser usado tanto como mass quanto como count, em uma mesma língua.
A existência de pares como os acima listados evidencia que os nomes são
classificados em uma ou outra classe conforme o modo como são
conceptualizados pelos falantes de uma dada língua, refletindo, portanto, a visão
de mundo característica do povo usuário da língua. Tal afirmação constitui a base
do terceiro ponto de vista proposto por Joosten, o ponto de vista semânticoconceptual, segundo o qual as distinções gramaticais entre massivos e contáveis
não se baseiam diretamente na realidade extralingüística, mas no modo como esta
realidade é conceptualizada pelos usuários de uma língua. Algumas abordagens
sobre a separação entre mass e count nouns sugerem que tal distinção é um
reflexo, na linguagem, do modo como o mundo é conceptualizado e organizado
82
pelos falantes de uma dada língua. As propriedades morfossintáticas sumarizadas
acima seriam, de acordo com esta visão, as manifestações lingüísticas das
propriedades semânticas extralingüísticas das coisas às quais os nomes se referem,
conforme o modo como os falantes de uma dada língua as conceptualizam.
Dentre os trabalhos relevantes desta linha, pode-se citar o de Macnamara
(1982), o qual sugere que count nouns se referem a coisas que possuem contornos
(shapes) característicos, ao passo que mass nouns se referem a coisas que se
aglutinam (coalesce). O problema com esta proposta é que ela não dá conta de
explicar por que nomes que não possuem contornos característicos como puddles
e clouds são count nouns e nomes como crowd são mass nouns.
Recentemente, uma nova proposta foi sugerida no ensejo de se dar conta
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de uma distinção precisa entre mass e count nouns: a hipótese da individuação
cognitiva (cognitive individuation hypothesis). De acordo com ela, o uso que uma
pessoa faz de um mass noun ou de um count noun depende do modo com a
realidade referida pelo nome em questão é interpretada pelo falante, se como
indivíduo ou como uma entidade não-individuada (cf. Bloom & Kelemen, 1990).
Os proponentes desta hipótese afirmam que tal variação na interpretação da
realidade é algo um tanto flexível, explicando assim o fato de um mesmo nome
ser usado como mass ou como count. Os falantes não são, segundo a cognitive
individuation hypothesis, meros usuários passivos de um sistema de nomes, antes,
possuem um ativo papel na conceptualização das entidades pelos nomes
denotadas.
Uma premissa importante para a cognitive individuation hypothesis é que a
individuação, operação crucial para o estabelecimento de uma separação dos
nomes em mass terms e count terms, é um aspecto fundamental da cognição,
sendo a base para muitas outras operações cognitivas. No que tange à aquisição da
linguagem, por exemplo, muitos defensores da cognitive individuation hypothesis
têm afirmado que a individuação é a responsável por uma série de restrições
(constraints) que permitem a criança aprender uma língua (como o whole object
constraint, Markman, 1990).
83
O estudo de Wierzbicka (1988) sobre o uso de mass e count nouns apontou
que características das entidades predispõem a conceptualização dos mesmos com
individuado
ou
não-individuado.
Wierzbicka
propôs
duas
importantes
propriedades: o modo como os falantes interagem com estas entidades e a
facilidade de distinção. Em relação à primeira, se os falantes interagem de certa
forma com as entidades, esta forma acaba por determinar se a entidade será
considerada individuada ou não. No que concerne à segunda, se uma entidade for
perceptualmente mais distinguível do que outra, tende a ser considerada um count
noun. Uma vez que as classificações tenham sido feitas, o produto destas escolhas
acaba por se refletir na sintaxe da língua em questão. O estudo de Wierzbicka é
um bom exemplo do uso da cognitive individuation hypothesis.
A maior parte dos trabalhos sobre aquisição de mass e count nouns que
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seguem uma orientação semântico-conceptual tendem a tratar a aquisição de
nomes massivos e contáveis atreladamente ao desenvolvimento da cognição em
geral. Eles sustentam que há uma interação entre o modo como a criança
desenvolve categorias semânticas gerais, a partir de sua experiência com a
realidade, e identifica os membros destas categorias na linguagem. Assume-se que
são as propriedades de referência dos nomes que guiam a criança na identificação
de categorias. Middleton et al. (2004), em tarefas experimentais com adultos,
fornecerem evidências favoráveis à hipótese da cognição individuada, afirmando
que os falantes adultos conceptualizam os referentes de count nouns como
entidades individuais, ao passo que conceptualizavam os referentes dos mass
nouns como entidades não-individuais. Um outro estudo nesta mesma linha é o de
Bloom (1994) sobre aquisição de nominais por falantes de inglês. Ele postula que
a criança mapeia as categorias como mass noun e count noun de categorias
semânticas abstratas, e este mapeamento atua como restrição às inferências que
podem ser feitas sobre o significado das palavras.
Macnamara (1982) afirma que a distinção mass/count é basicamente uma
distinção semântica: “nomes contáveis nomeiam coisas que possuem uma forma
característica, ao passo que nomes massivos não o fazem”. Já Brown (1973)
demonstrou que crianças são sensíveis a covariação da semântica e das expressões
lingüisticas relativas a ambas classes de nomes. McPherson (1991) propôs que
84
“algum tipo de informação perceptual invoca intuições relevantes para a definição
de distinções semânticas relativas às categorias massivo e contável, o que faz com
que a classificação de um nome seja guiada por estas intuições”. Portanto, de
acordo com a abordagem semântica-conceptual, a aquisição de mass e count
nouns baseia-se não em uma análise distribucional por parte da criança adquirindo
uma língua, mas na compreensão que esta criança tem do sentido dos nomes. Em
outro estudo, Macnamara e Reyes (1994) apresentaram uma regra de aquisição da
seguinte forma: “marque um nome como count se ele se refere a uma entidade
perceptual que quando combinada não permite uma outra entidade de mesmo
tipo”, ou, de outro modo, “marque um nome como mass se a entidade perceptual a
qual ele se refere pode ser combinada em uma entidade maior”. Trabalhando nesta
linha, Bloom (1990) propôs que o contraste semântico fundamental entre
massivos e contáveis é centrado na referência destes termos. Assim, um count
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noun combina-se com determinantes para formar sintagmas nominais que
denotam indivíduos, ao passo que mass nouns combinam-se com outros
determinantes para denotar porções. Bloom distingue três níveis de “arquitetura
cognitiva”, ligados um com o outro: um nível conceptual, um nível semântico e
um nível sintático, sendo que nomes são semanticamente marcados como
[+individual] ou [-individual], o que determina seu status sintático como count ou
como mass. O traço semântico [+individual] mapeia a noção de indivíduo, e o seu
traço homólogo [-individual] mapeia a noção de porção.
Um ponto convergente em todos os trabalhos que assumem uma visão
semântica da distinção mass/count é que eles parecem assumir algum tipo de
conhecimento inato relativo à capacidade de a criança proceder a tal classificação.
Deste modo, a criança disporia de um conhecimento inato que a tornaria capaz de
categorizar nomes que denotam espécies de indivíduos como contáveis e nomes
que designam substâncias como massivos. A crítica que se pode fazer a esta
abordagem é que, na realidade, a criança não aprende a classificar um nome como
mass ou como count: o que de fato a criança procede é a menos uma classificação
e mais um aprendizado do modo como um nome pode ser usado, se seguido de
marcadores gramaticais específicos ou não, e os sentidos que se podem atribuir a
um e a outro usos. De acordo com Nicolas (1996), uma criança não classifica
erroneamente um nome como mass ou como count, já que não há classificação
85
propriamente dita: o que ocorre é um uso inadequado de marcadores gramaticais
de um ou outro tipo, devido ao fato de que a criança ainda não percebeu
exatamente a referência destes nomes ou destas estruturas.
A grande objeção que se pode apontar para uma teorização sobre mass e
count nouns baseada em conceptualização é que tal ponto de vista torna
complicada a explicação para diferentes conceptualizações para objetos e seres
bastante semelhantes. Um exemplo seria o da palavra ervilha, que é classificada
como contável em português (uma ervilha, duas ervilhas), o mesmo não
ocorrendo como a palavra arroz, que em português insere-se entre os massivos
(*um arroz, *dois arrozes). Ademais, o ponto de vista semântico-conceptual,
semelhantemente à visão ontológica, não permite explicar como um nome
referente a uma mesma entidade do mundo real pode ser usado tanto como mass
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quanto como count, por falantes de uma mesma língua.
O último dos pontos de vista sugeridos por Joosten seria o contextual,
conforme o qual não é uma propriedade dos nomes de per se serem massivos ou
contáveis, mas sim das expressões referenciais das quais eles fazem parte, ou seja,
dos NP's ou DP's. Assim, um nome não deve ser classificado como mass ou como
count, antes a distinção entre estas duas categorias é determinada pelos
quantificadores e determinantes que são utilizados por cada tipo de nome, ou
ainda pelos operadores semânticos que atuam sobre os NP's e DP's determinando
leituras contáveis ou não para estas expressões. Percebe-se uma aproximação
entre esta visão e o ponto de vista gramatical, exposto acima. O ponto fraco da
visão contextual é o fato de ela não explicitar as razões pelas quais determinados
contextos favorecem a ocorrência de nomes massivos, ao passo que outros
contextos favorecem o aparecimento de nomes contáveis, como, por exemplo, o
fato de substantivos coletivos ou abstratos favorecerem leitura massiva, e
substantivos concretos privilegiarem interpretação contável.
No tocante à aquisição de mass/count nouns, o que os estudos
experimentais nesta linha sugerem é uma sensibilidade da criança à forma fônica
dos determinantes específicos dos nomes de massa e dos nomes contáveis
(notadamente em inglês), sem que se possa afirmar, a partir daí, que a criança
86
esteja procedendo a uma distribuição dos nomes em classes distintas. Além do
mais, uma análise distribucional de per si não seria suficiente para se estabelecer a
distinção massivo/contável, já que nomes com sintaxe massiva podem ter
referência contável, conforme apontam Chierchia (1998) e Barner & Snedeker
(2005), sem mencionar o fato de não ficar claro que capacidades perceptuais e
procedimentais a criança tem de possuir para reconhecer os diferentes
determinantes. Por fim, se se postular que diferentes determinantes projetam
diferentes estruturas sintáticas para mass e para count nouns, será preciso
conceber um mecanismo de análise sintática inato, tipo parser, responsável por
processar enunciados e atribuir uma estrutura sintática a eles, o que eliminaria o
ponto central da abordagem distribucional, em favor da abordagem inatista.
O problema da aquisição da linguagem, no que toca à distinção mass/count
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não
pode
ser
considerado
exclusivamente
em
termos
semânticos
ou
distribucionais. Como bem aponta Chierchia (2003) tal questão não é de cunho
exclusivamente semântico (e nem conceptual, poder-se-ia acrescentar), nem de
natureza estritamente lingüística, já que as crianças não adquirem mass e count
nouns considerando unicamente a informação semântico-conceptual; tampouco o
fazem apenas observando comportamentos sintáticos e propriedades de
distribuição. Uma teoria baseada na interação sintaxe-semântica se faz necessária.
É o que fez Gordon (1985, 1988), que em seus estudos procurou avaliar a
chamada semantic category hypothesis, segundo a qual as categorias sintáticas
iniciais da criança são definidas referencialmente, e não formalmente, sendo que a
criança, inicialmente, arranja os nomes em categorias semânticas, baseada em
características perceptuais dos objetos e coisas, e só após isto é que ela cria
categorias sintáticas para estes nomes. Os resultados obtidos por Gordon sugerem
que a distinção mass e count nouns não é adquirida via distinção tipo
objeto/substância, ainda que conceptualizações deste tipo exerçam papel
importante na aquisição, mas sim via uma interação entre sintaxe e semântica,
indicando que a criança parece saber que há uma correlação entre tipos
semânticos e categorias sintáticas.
87
Gordon concluiu de uma série de estudos experimentais que a distinção
massivo/contável é, primeiramente, sintática, pois as pistas de cunho sintático
seriam mais efetivas e claras, e por esta razão predominariam sobre as pistas
semânticas, embora estas tivessem também um papel da categorização. De fato,
crianças não parecem ser capazes de usar somente pistas semânticas no
reconhecimento, e as crianças parecem igualmente não errar a classificação
quando as pistas semânticas estão em desacordo com as informações sintáticas.
Portanto, para Gordon “a distinção mass/count não é adquirida por meio de uma
distinção objeto/substância, ainda que propriedades semânticas de quantificação
exercem provavelmente um papel importante no processo de aquisição”. Gordon
levanta
a
hipótese
de
que
a
criança
primeiro
adquire
propriedades
quantificacionais dos marcadores gramaticais, como artigos e numerais, entre
outros, e isto é o que permite a ela dividir os nomes em duas categorias: aquela
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dos nomes que podem ser individuados quando quantificados (count) e aqueles
que não podem (mass). Tal hipótese não requer que a criança proceda a uma
classificação com base em propriedades referenciais, mas sim levando em conta
as propriedades sintáticas que os marcadores possuem na quantificação.
Algumas questões podem ser levantadas a partir da análise da inate
semantic hypothesis. A principal objeção se pode fazer é a determinação do tipo
de conhecimento que se supõe inato. A assumpção de que há categorias
semânticas inatas que guiam a criança na distribuição dos nomes em duas classes,
massivo e contável, não escapa a uma certa circularidade: se as classes já estão
formadas inatamente, então o que restaria a ser adquirido ? Assim concebida, a
aquisição de mass e count nouns se reduziria a uma mera divisão de nomes em
classes, sem que se fiquem claras as razões de assim se proceder. Ainda, é
razoável supor que, dado que o conhecimento é inato, é lícito admitir que a
classificação de nomes seria uniforme por entre as línguas, pois as categorias
teriam de ser universais, e as propriedades dos referentes dos nomes também, e
isto não é o que se observa, conforme já exposto acima.
A despeito de a proposta de Joosten sugerir que o estudo da distinção
massivo/contável deva ser feito considerando-se quatro pontos de vista, tomados
isoladamente, acredita-se ser possível conferir a este tópico um tratamento
88
unificado. Uma tal unificação de abordagens permitiria melhores considerações
acerca da definição do que vem a ser a oposição mass/count, bem como acerca do
modo como esta distinção é adquirida pelos falantes de uma língua.
No capítulo 3, mostrou-se que os estudos concernentes à descrição da
manifestação mass/count em PB dividem-se entre os que admitem que a distinção
entre nomes massivos e contáveis existe em PB (Simões, 1992; Camacho e
Pezatti, 1996; Neves, 2000; Paraguassu, 2005) e os que não admitem a essa
separação (Blühdorn & Favaretto,2000; Müller, 2002; Blühdorn, Simões e
Schmaltz, 2007). Assumindo-se a primeira corrente, torna-se necessário admitir
uma conceptualização da realidade, na maneira como sugerida pelo ponto de vista
semântico-conceptual citado por Joosten, fazendo com que a língua em questão
apresente distinção lexical entre mass e count nouns, conforme defende
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Paraguassu (2005), para o PB, ao expor a idéia de que essa língua apresenta
distinção lexical entre massivos e contáveis, a qual não se manifesta no nível do
nome, mas apenas em determinados ambientes marcados para contabilidade.
Assim, pode-se prever que, na aquisição de massivos e contáveis em PB, traços
semânticos do nome podem influenciar a interpretação do DP. Por outro lado, se a
distinção massivo/contável se apresenta apenas em certos ambientes, então a
criança adquirindo essa distinção tem de perceber esses ambientes, extraindo
deles informação relevante nesse sentido. Assumindo-se que a categoria Num
possui papel relevante no estabelecimento de distinções relativas a mass e count
nouns, uma vez que ela pode conferir leitura massiva ou contável dos DPs, tem-se
que a percepção da expressão de Num no morfema de plural é crucial na
identificação da oposição massivo/contável no PB.
Assim, informação fônica, correspondente ao morfema de número, e
informação semântica, advinda dos traços semânticos da raiz, seriam usadas pela
criança ao adquirir uma língua, podendo ser utilizadas em situações e momentos
distintos do processo de aquisição, em especial no caso de DPs ambíguos quanto a
mass/count. O experimento 5 visa justamente a investigar essa possibilidade.
A aquisição da distinção mass/count, dentro da perspectiva acima
esboçada, pode ser concebida, portanto, em termos de capacidades e habilidades
89
de processamento e identificação de informações presentes no input, e em termos
do que se apresenta como informação relevante para a aquisição, a saber,
informação passível de ser extraída das interfaces. A proposta aqui apresentada
igualmente confere um tratamento unificado à distinção massivo/contável,
combinando o uso de informação lingüístico-gramatical e semântica, em
detrimento da visão clássica de distribuição de nomes por classes semânticas
estanques. Os experimentos relatados no capítulo 5 visam a investigar em que
medida a criança identifica informação de número no DP e parte do pressuposto
da concordância no DP na identificação de número como um traço formal; a
verificar possíveis efeitos de alomorfia e da coexistência de variáveis dialetais,
assim como avaliar os fatores de ordem morfológica, lexical e semântica que
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contribuem para a distinção mass/count no PB.
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