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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO
DE 9 A 12 DE OUTUBRO
A SEGREGAÇÃO SOCIOESPACIAL: BELO HORIZONTE DA
CONSTRUÇÃO AOS ANOS 19301
FELIPE PERDIGÃO BARBOSA2
Resumo: A cidade de Belo Horizonte nasce como símbolo de modernidade, contudo
já surge segregada. O objetivo principal deste trabalho é discutir o processo de
segregação socioespacial de Belo Horizonte por meio de sua dinâmica espacial no
período entre sua construção e os anos 1930. Desta forma, o cerne da discussão
gira em torno da contradição que se apresenta com a construção da nova capital
mineira. A cidade racional, pensada para o aparato burocrático de Minas Gerais,
acabara sendo ocupada por trabalhadores que ajudaram a mesma a se erguer. Ao
se pensar em problemas urbanos, remontamos à ideia de falta de planejamento. No
entanto, chegamos à conclusão que mesmo cidades planejadas como Belo
Horizonte sofrem problemas em seu espaço intra-urbano.
Palavras-chave: segregação; planejamento; espaço.
Abstract: The city of Belo Horizonte is born as a symbol of modernity, but comes
already segregated. The aim of this paper is to discuss the social-spatial segregation
process of Belo Horizonte through its spatial dynamics in the period between its
construction and the 1930. Thus, the discussion of the core revolves around the
contradiction that presents itself to the construction of new mining capital. The
rational city, thought to the bureaucratic apparatus of Minas Gerais, had been
occupied by workers who helped it to rise. When thinking about urban problems, we
go back to the idea of lack of planning. However, we concluded that even planned
cities such as Belo Horizonte suffer problems in their intra-urban space.
Key-words: segregation; planning; space.
1
Trabalho baseado em monografia apresentada no Centro Universitário de Belo Horizonte no ano de
2007 para obtenção do título de graduação em Geografia e Análise Ambiental.
2
- Acadêmico do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Juiz de
Fora. E-mail de contato: [email protected]
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1 – Introdução
Os espaços urbanos, de modo geral, são grandes detentores de
complexidades e contradições a serem desvendadas. Entre edifícios, casas e
paisagens de concreto, vários fenômenos ocorrem simultaneamente. Não apenas
fenômenos como os de trânsito, por exemplo, mas também fenômenos sociais
muitas vezes escondidos em belos parques e bairros extremamente urbanizados.
Analisando a história das cidades e suas dinâmicas, percebemos que há
muita coisa a se desvendar. De cidades europeias nascidas de antigos burgos, à
cidades do continente americano, nascidas com o intuito de serem colônias de
exploração de suas metrópoles, as dinâmicas espaciais se tornam cada vez mais
complexas.
Ao se caminhar pela história das cidades e da urbanização, chegamos às
famosas cidades planejadas. Estas, pensadas para serem capitais de estados e
cidades “perfeitas”, quase sempre não são tão perfeitas assim. O Brasil adotou esta
prática, e planejou várias cidades, como por exemplo: Teresina, Belo Horizonte,
Goiânia, Brasília, dentre outras.
Belo Horizonte foi a segunda cidade planejada do país, sendo criada com a
responsabilidade de se tornar capital do Estado de Minas Gerais. Belo Horizonte
nasce em controvérsias sobre a real importância de se criar uma capital para o
Estado, pois Ouro Preto já cumpria essa função dentro do território mineiro, no
entanto, tornara-se obsoleta demais para exercer tal papel. Desta forma, além de
nascer para ocupar o cargo de capital, Belo Horizonte nasce também para quebrar o
“marasmo” do Estado. O projeto de Aarão Reis não deixava a desejar a nenhuma
cidade do mundo, sendo que o projeto de Belo Horizonte, inspirado em Washington
e Paris, era um dos mais modernos que o Brasil tinha conhecimento.
A capital mineira, já nasce com problemas sociais e espaciais em seu espaço
urbano. O planejamento inicial previa que Belo Horizonte seria uma cidade elitista e
sem pobres, mas esses ideias caem justamente com o nascimento real da cidade.
Construída para os funcionários públicos do Estado, não se pensou sobre como e
onde os trabalhadores e antigos moradores do Curral Del Rey iriam se instalar.
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Estes começaram a ocupar áreas ao redor e dentro da zona demarcada pela famosa
Avenida do Contorno, que era o limite da zona urbana da cidade, destinada ao
aparato burocrático e administrativo do Estado, e servia de residência para os
funcionários públicos. A cidade foi dividida em três zonas, conforme o projeto de
Aarão Reis: a urbana citada acima, a suburbana logo após a primeira, onde se
previa a construção de chácaras e sítios e o chamado cinturão verde (área rural que
abasteceria a cidade). Nasce então, junto com a cidade, formas de ocupação não
previstas no projeto, em geral constituindo-se de favelas ocupadas por trabalhadores
e pessoas que não tinham dinheiro para comprar lotes na área nobre. Desta forma,
Belo Horizonte já nasce com territórios segregados, e este fenômeno cresce durante
sua evolução.
O objetivo principal é discutir o processo de segregação socioespacial de Belo
Horizonte por meio de sua dinâmica espacial no período compreendido entre sua
construção e os anos 1930.
Para se chegar a este objetivo é preciso conhecer e entender a visão de
planejamento da época a ser estudada, especialmente a do final do séc. XIX e a
influência que esta teve na construção de Belo Horizonte. Outro fato importante a
ser analisado ao se desenvolver este trabalho, é identificar quais são os agentes
produtores do espaço e transformadores do espaço, analisando suas formas de
atuação no cenário belo-horizontino na época a ser estudada, buscando verificar se
e como estes agentes promoveram o processo se segregação socioespacial na
nova capital mineira.
2 – Desenvolvimento
As primeiras ações de planejamento urbano no Brasil se deram sob a égide
do embelezamento das cidades. As influências de planejamento trazidas dos
grandes centros capitalistas se espalharam pelo globo terrestre, juntamente com
suas ideologias “modernas”. As formas de se pensar as cidades, passam a ser
inspiradas, por países periféricos, em modelos, preferencialmente europeus.
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Torna-se relevante destacar que tais práticas de importações de modelos,
principalmente os de planejamento europeus, ocorrem sob o advento da República
(1889). São os ideias republicanos que implicam a necessidade de dotar o Brasil de
uma imagem moderna.
A racionalidade dos espaços e das mentes, também aparece nesta ótica, pois
a exclusão também se configura. Conforme Lemos (1998, p. 42) os modelos
culturais, principalmente o barroco, com seus traçados perfeitos, geometricamente
pensados, influenciam e transformam as dinâmicas espaciais de grande parte das
cidades brasileiras. Essa hierarquização de espaços, típicas de sistemas racionais e
pensados geralmente para centros urbanizados, perpetuam a ideia de exclusão.
Segundo Maricato (2000, p. 121), o planejamento é feito para “alguns” e sempre
“alguns” têm acesso à higiene e à modernidade. Caminhando pela ótica de Maricato,
pensamos sobre a frase que dá corpo ao seu trabalho: as ideias estão fora do lugar
e o lugar fora das ideias.
A ideia de se trazer o progresso, então difundida pelos ideais republicanos,
não combinava com o Brasil arcaico; daí a necessidade de modernização. A nova
“cara” das cidades levava a ideia de embelezamento, a ideia do novo, do moderno.
Segundo Villaça apud Cota (2002, p.34) “foi sob a égide do embelezamento que
nasceu o planejamento urbano no Brasil”.
Diante de tal perspectiva, apoiando-se nas concepções de Haussmann3,
Aarão Reis projeta Belo Horizonte. Um fato curioso acerca do projeto de Belo
Horizonte, diz respeito ao fato de que o projeto fora idealizado sem o conhecimento
das bases físicas da então capital do Estado de Minas Gerais.
Em 1984, ano de início da construção de Belo Horizonte, o lugar escolhido
para a implantação da nova capital de Minas Gerais, o antigo Curral Del Rey, já
apresentava problemas de moradia, sobretudo a moradia dos trabalhadores que não
foi considerada na elaboração do projeto da nova capital.
Pelo projeto de Aarão Reis, a cidade seria composta por três zonas: a
primeira seria constituída pela zona urbana, dotada de infraestrutura sendo
3
O Barão Georges-Eugène Haussmann, mais conhecido como Barão de Haussmann, foi responsável por fortes
estruturações do espaço urbano de Paris entre os anos de 1853 a 1870. A filosofia de Haussmann se perpetuou
em projetos urbanos nas Américas, inclusive em Whashington, fundamentando em grande parte o projeto da
construção da capital mineira, Belo Horizonte.
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responsável por abrigar o aparto burocrático e os funcionários públicos que
residiriam na nova capital. A segunda seria a zona suburbana, onde os lotes seriam
maiores, sendo destinada a pequenos sítios e chácaras. Por fim, a terceira,
denominada cinturão verde, seria a zona rural da cidade, que abasteceria todo o
centro. Ainda segundo o projeto, a expansão da cidade se daria do centro para a
periferia, mas na realidade dos fatos isso não ocorreu, justamente pelo alto custo
das moradias na área central. Os então operários que residiam na capital
começaram a ocupar as áreas da zona suburbana.
Um período importante na história é o dia 22 de maio de 1895, quando Aarão
Reis demite-se. Na verdade, havia uma conflito entre o estado organizador da
ocupação do solo na cidade que comprava e vendia os terrenos na cidade,
realizando
especulação
Sintomaticamente
Aarão
imobiliária
Reis
e
declara:
o
engenheiro
“retiro-me
chefe
exatamente
do
projeto.
quando
os
especuladores de toda a sorte, inclusive os politiqueiros, começam a entrar”.
(PENNA, 1997).
No ano de 1897 a cidade é inaugurada, sobre o comando do engenheiro
chefe recém empossado, Saturnino de Brito, como capital de Minas Gerais,
primeiramente com o nome de Cidade de Minas, e, posteriormente, assume o nome
de Belo Horizonte.
A realidade se reafirma em Belo Horizonte, logo após sua inauguração. Belo
Horizonte nasce em 1897, inacabada, suja, dotada de um grande centro urbano
estruturado, mas vazio. A segregação urbana nasce com a cidade. A utopia do novo
cai, justamente quando a cidade se ergue. As influências de Haussmann não se
caracterizam como realidade moderna em Belo Horizonte e sim em uma realidade
que segrega, que exclui e reafirma o arcaico sobre o moderno. Belo Horizonte nasce
dividida em duas: a cidade do poder e de seus funcionários e a cidade de seus
trabalhadores, que se desenvolverá espontaneamente.
O projeto da capital de Minas, sob sua égide moderna, não previa lugar para
pobres. Os trabalhadores que ajudaram a cidade a se erguer não teriam pelo
projeto, lugar dentro da cidade, pois a mesma se baseava, em suma, para os
trabalhadores públicos do Estado. Daí nasce junto com a cidade problemas de
ordem habitacional, pois os trabalhadores precisavam morar em algum lugar, até
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porque a cidade foi fundada inacabada, e as obras deveriam continuar. A solução
então foi a ocupação da área suburbana da cidade. Consequentemente a periferia é
ocupada antes da área central.
Em 1912 quase 70% da população de Belo Horizonte residia fora da zona
urbana com sérios problemas de infraestrutura, como: falta de energia elétrica, água,
saneamento, etc. Em outras palavras, afirma GUIMARÃES (1991):
Os poderosos tentavam remanejar os trabalhadores que estavam
localizados na zona urbana da cidade pela visão esteticista do projeto não
se preocupavam com nenhuma questão social, as cafuas e os barracões
comprometiam a imagem da capital, as atenções estavam voltadas para a
área nobre permitindo que as ocupações da zona suburbana se
desenvolvessem de forma desordenada.
Na verdade, a questão de moradia em Belo Horizonte havia saído do controle.
Os planos urbanísticos da nova capital, até a década de 1930 previam apenas a
segregação urbana como medida de planejamento. As áreas destinadas para a
população mais pobre e operária se localizavam longe do centro urbanizado e em
condições precárias, constituindo assim uma dinâmica perversa sem nenhuma
preocupação social, simplesmente separando pobres e ricos.
Na década de 1920, em decorrência do chamado “boom” imobiliário, que foi
sustentado pela facilidade de crédito para construção, dada pelas organizações
financeiras. GUIMARÃES (1991) destaca que a cidade apresentou como fatos
importantes no período: o deslocamento da população do subúrbio para o centro (a
elite), do centro para a periferia e para a zona rural (trabalhadores mais
qualificados).
Desta forma, em 1920, existiam na cidade as favelas: Barroca (Gutierrez),
Pedreira Prado Lopes (Lagoinha), Vila Plamital (Lagoinha), Pindura Saia (Cruzeiro),
Serra, Cachoerinha, Arrudas, Morro das Pedras ou Leitão (Vila São Jorge) e a Praça
Raul Soares.
As invasões e o surgimento de favelas continuavam na capital mineira, pois o
setor imobiliário tornava o preço dos terrenos da periferia inviáveis para os mais
pobres. Não existia serviço de transporte que ligasse o centro à periferia fazendo
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com que os trabalhadores preferissem se fixar próximos ao local de trabalho que era
o centro.
A partir de 1925 até 1930, há um crescimento da população das favelas da
capital. Pode-se citar a Favela da Barroca e Pedreira Prado Lopes, localidades para
onde se dirigiam os trabalhadores excluídos pela sociedade burguesa, detentora de
privilégios, capital e poder, que queriam fazer da capital de Minas Gerais, a cidade
da burguesia mineira.
3 – Metodologia
Os procedimentos metodológicos para o trabalho se basearam em pesquisas
e revisões bibliográficas. Tais pesquisas procuraram levantar, principalmente, a
visão de planejamento da época da construção de Belo Horizonte e os modelos
adotados por seus idealizadores.
Outro ponto que se destaca neste item, foi a dificuldade em se obter dados do
período estudado. Desta forma, grande parte do trabalho fora baseado na discussão
estabelecida por GUIMARÃES (1991), Cafuas, Barracos e Barracões: Belo
Horizonte, cidade planejada? 1894/1945.
4 – Resultados
As influências trazidas da Europa, não couberam perfeitamente no Brasil, pois
os contextos onde foram aplicados os ideais são bastante particulares. O Brasil
configurava seu planejamento sob a ideia de embelezamento e modernidade de
suas cidades, enquanto a Europa enxergava o planejamento como aparato para o
desenvolvimento do capital dentro do espaço urbano. As influências que
modificaram tanto as cidades existentes e que foram a base para a construção de
tantas outras, como Belo Horizonte, por exemplo, trouxeram, porém as marcas da
exclusão social. No caso de Belo Horizonte, essa exclusão se configura com o seu
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nascimento, e fica mais claro, com seu desenvolvimento enquanto capital de Minas
Gerais.
5 – Conclusões
Belo Horizonte, mesmo com toda sua “modernidade”, se mostrou em sua
construção e em seus anos iniciais como sendo uma cidade arcaica, pois
apresentava problemas de ordem estruturais e sociais bastante expressivos. A
importação de “modernidade” através de modelos nem sempre se dá de forma
perfeita. A nova capital mineira se mostrou pouco ambientada a este modelo em
seus períodos iniciais. A cidade racional, pensada para o aparato burocrático de
Minas Gerais, acabara sendo ocupada por trabalhadores que ajudaram a mesma a
se erguer. É interessante ressaltar o fato de a cidade ter sido pensada para a elite
mineira, e nesta não havia lugar para pobres, pois estes, não caberiam nas ideias
higienistas presentes no projeto da nova capital. Ate quando a importação de
modelos advindos de outras culturas se caracteriza como uma ação positiva? O uso
de modelos se torna relevante para se construir algo novo, porém estes devem ser
adequados à cultura local. Ao se pensar em problemas urbanos, remontamos à ideia
de falta de planejamento, entretanto verificamos que mesmo cidades planejadas
como Belo Horizonte sofrem problemas em seu espaço intra-urbano. O problema
então, não se caracteriza pela falta de planejamento, mas sim pela forma como este
é feito.
6 – Referências
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