Capacitação técnica de pesquisadores do Instituto Biológico para o diagnóstico DIVULGAÇÃO TÉCNICA laboratorial do vírus da Laringotraqueíte Infecciosa das Galinhas (LTI). CAPACITAÇÃO TÉCNICA DE PESQUISADORES DO INSTITUTO BIOLÓGICO PARA O DIAGNÓSTICO LABORATORIAL DO VÍRUS DA LARINGOTRAQUEÍTE INFECCIOSA DAS GALINHAS (LTI) N.M. Soares1, M.R. Buim1, A.J.P. Ferreira2, A.A. Ikuno3, C. Del Fava3, M.M. Ishizuka2*, F.G. Buchala4, R.L. Luciano1 Instituto Biológico, Centro Avançado de Pesquisa Tecnológica do Agronegócio Avícola, Unidade de Pesquisa e Desenvolvimento de Bastos, Av. Gaspar Ricardo, 1700, CEP 17690-000, Bastos, SP, Brasil. E-mail: [email protected] 1 RESUMO Este artigo descreve as etapas da capacitação dos pesquisadores científicos do Instituto Biológico nas técnicas de diagnóstico laboratorial da Laringotraqueíte Infecciosa das Galinhas (LTI). Este treinamento foi realizado no Poultry Diagnostic and Research Center do College of Veterinary Medicine da University of Georgia, em Athens, Georgia, Estados Unidos, no Laboratório Nacional Agropecuário – LANAGRO, em Campinas, SP e na Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP. PALAVRAS-CHAVE: Diagnóstico, vírus da laringotraqueíte das galinhas, capacitação técnica. ABSTRACT TECHNICAL TRAINING OF RESEARCHERS FROM Instituto Biológico FOR THE DIAGNOSIS OF INFECTIOUS LARYNGOTRACHEITIS (ILT). This article describes the steps in the technical training of researchers in the diagnosis of Infectious Laryngotracheitis (ILT), in order to employ them in the laboratories of the Instituto Biológico. This training was conducted in the Poultry Diagnostic and Research Center, of the College of Veterinary Medicine, at the University of Georgia in Athens, Georgia, United States, in the Laboratório Nacional Agropecuário Laboratório Nacional Agropecuário – LANAGRO from Campinas/SP and in the Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia of the University of São Paulo of the USP. KEY WORDS: Diagnosis, infectious laryngotracheitis virus, technical training. A Laringotraqueíte infecciosa das aves (LTI) é uma doença respiratória aguda, contagiosa, causada por um membro da família Herpesviridae e subfamília Alfaherpesvirinae e taxonomicamente identificado como Gallid herpesvirus 1, que afeta o sistema respiratório das aves. Esse agente possui a capacidade de infectar as aves e persistir de forma latente no gânglio trigêmio e na mucosa da traqueia, o que dificulta tanto o controle como a erradicação. É uma doença de distribuição geográfica cosmopolita, frequentemente relatada em áreas de grande concentração avícola, com elevado impacto econômico, devido às perdas ocasionadas pela mortalidade e/ou diminuição da postura. Os grandes surtos em áreas de alta produção têm sido causados pela disseminação de vírus de campo e de vírus vacinal. A manifestação clínica depende diretamente de fatores estressantes, entre os quais transporte prolongado, manejo inadequado, superlotação, criação conjunta de aves de diferentes idades, calor excessivo e muda forçada, e outras doenças respiratórias intercorrentes, que reduzem a imunidade da ave e a predispõe à doença. Técnicas de diagnóstico do vírus da laringotraquíte As primeiras provas de detecção do vírus consistiam na inoculação de material suspeito na membrana corioalantoide de ovos embrionados, seguida da enumeração de lesões. O isolamento viral, imunofluorescência direta e PCR, convencional e RFLP em tempo real, são os meios de diagnóstico, Universidade de São Paulo, Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, São Paulo, SP, Brasil. Instituto Biológico, Centro de Pesquisa e Desenvolvimento de Sanidade Animal, São Paulo, SP, Brasil. 4 Coordenadoria de Defesa Agropecuária do Estado de São Paulo, Campinas, SP, Brasil. *Comitê Estadual de Sanidade Avícola. 2 3 Biológico, São Paulo, v.73, n.1, p.61-68, jan./jun., 2011 61 62 N.M. Soares et al. atualmente, mais utilizados. As provas de biologia molecular associam especificidade e sensibilidade, sendo que a PCR-RFLP utiliza enzimas de restrição e permite a diferenciação de amostras de campo e de vírus vacinal. No diagnóstico histopatológico, a presença de inclusão intranuclear nas células epiteliais da conjuntiva, laringe e traqueia coradas por Hematoxilina-Eosina é patognomônica. Além dessa, são observadas outras alterações, como hiperplasia de células epiteliais respiratórias, perda de cílios, edemaciação, formação de sincício e infiltrado inflamatório mononuclear na lâmina própria. Nos casos severos observa-se hemorragia e desprendimento da camada epitelial da mucosa. Para o diagnóstico laboratorial indireto e pesquisa de anticorpos, a OIE recomenda métodos como imunodifusão em gel de ágar (IDGA), vírusneutralização, imunofluorescência indireta e o teste de ELISA. Capacitação técnica dos pesquisadores do Instituto Biológico No final de 2008, o projeto “Capacitação técnica de equipe multidisciplinar para o programa oficial de controle, erradicação e diagnóstico da laringotraqueíte infecciosa das galinhas, na região de Bastos, Estado de São Paulo” foi aprovado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) – Processo nº 578354/20080, sob a coordenação da pesquisadora Nilce Maria Soares Queiroz Gama da Unidade de Pesquisa de Desenvolvimento de Bastos/CAPTAA/IB. Nesse projeto, além de outros objetivos, está previsto o treinamento de técnicos do Instituto Biológico no Poultry Diagnostic and Research Center do College of Veterinary Medicine da University of Georgia (PDRC-UGA-EUA), em Athens, Geórgia, EUA. O treinamento recebido neste centro, que é referência internacional no diagnóstico das principais enfermidades avícolas, foi realizado sob a orientação dos John R. Glisson, Maricarmen García, Susan Williams e Guilhermo Zavala, especialistas em patologia aviária. A capacitação técnica, nos EUA, ocorreu em duas etapas. No período de 28 de junho a 6 de julho de 2009, os pesquisadores científicos do IB, Cláudia Del Fava e Marcos Roberto Buim receberam treinamento em histopatologia e técnicas biomoleculares, respectivamente. Em seguida, no período de 19 a 27 de outubro de 2009, os pesquisadores Alice Akimi Ikuno e Renato Luís Luciano foram capacitados para o treinamento em isolamento viral e técnicas moleculares. Durante o treinamento, os professores do PDRC apresentaram três conferências: na primeira o Dr. Guilhermo Zavala apresentou a Patogenia, Epide- miologia e Controle da Laringotraqueíte Infecciosa das Aves (LTI) nos Estados Unidos. Na segunda, Maricarmen García apresentou uma revisão de todas as técnicas que podem ser utilizadas para o diagnóstico da enfermidade: histopatologia, imunofluorescência, imunohistoquímica, reação de polimerização em cadeia do DNA (PCR) convencional, reação de polimerização em cadeia do DNA em tempo real (ReTi-PCR) e isolamento viral em cultura celular e na membrana corioalantoide de ovo embrionado. A terceira palestra, ministrada pela Dra. Maricarmen García, enfatizou a importância do controle de qualidade na reação de PCR. O diagnóstico laboratorial para a detecção do vírus da LTI é imprescindível, visto que o diagnóstico clínico não é conclusivo e só é possível suspeitar de LTI diante de quadros clínicos severos e agudos da doença, que são caracterizados pela ocorrência de alta mortalidade, expectoração sanguinolenta das aves e intensa dispneia. Os ensaios rápidos para a detecção do vírus, geralmente, são realizados em combinação com o isolamento, com a finalidade de tornar mais ágil o diagnóstico da doença. O isolamento viral para o diagnóstico do vírus da LTI caracteriza-se pela observação da replicação viral em diferentes tecidos durante o curso da infecção, além da formação de placas e efeito citopático dos diferentes isolados em cultura celular ou em ovo embrionado. Assim, o isolamento viral é considerado o método padrão, ou “gold standart” para verificar uma infecção viral ativa, enquanto que pelo exame histopatológico pode se visualizar a lesão patognomônica para o diagnóstico rápido da LTI. Além do exame histopatológico, outros ensaios rápidos, tais como a imunofluorescência direta, utilizando conjugados com anticorpos policlonais ou monoclonais, pode ser utilizado com sucesso, possibilitando a visualização do antígeno viral em cortes de traqueias. A Profa. García enfatizou em sua apresentação que a reação de PCR convencional ou ReTi-PCR associada com o exame histopatológico compõe o ensaio mais utilizado para o diagnóstico rápido da LTI em aves comerciais. Outra prova molecular utilizada é o PCR em tempo real, ReTi-PCR. Essa reação é rápida e sensível, com elevada reprodutibilidade e riscos reduzidos de contaminação cruzada. Além disso, é possível quantificar o ácido nucleico viral diretamente nas amostras clínicas. Outras vantagens: a amplificação pode ser monitorada em tempo real, não ocorre processamento pós-PCR, diminuindo o risco de contaminação e a ciclagem é ultrarápida, de 30 minutos a 2 horas. Durante o ano de 2010, o pesquisador Marcos Roberto Buim realizou na FMVZ/USP o treinamento de técnicas moleculares para diferenciação entre o Biológico, São Paulo, v.73, n.1, p.61-68, jan./jun., 2011 Capacitação técnica de pesquisadores do Instituto Biológico para o diagnóstico laboratorial do vírus da Laringotraqueíte Infecciosa das Galinhas (LTI). vírus LTI de campo e vacinais, sob a orientação do Prof. Dr. Antonio José Piantino Ferreira. Isso ocorreu em atendimento sugestão da Profa. Maricarmen Garcia, da Universidade da Geórgia. O objetivo foi desenvolver uma técnica diagnóstica PCR-RFLP/ LTI, capaz de diferenciar as cepas vacinais das cepas de campo encontradas no Brasil. Um programa de restrição enzimática utilizando 4 enzimas de restrição, ApoI, BccI, DpnI e HhaI foi delineado para diferenciar as amostras, baseado nas sequencias obtidas de estudos anteriores. Ainda no ano de 2010, os pesquisadores Antonio Guilherme de Castro, Nilce Maria Soares, Renato Luís Luciano e Marcos Roberto Buim, do Centro Avançado de Pesquisa Tecnológica do Agronegócio Avícola, IB, receberam treinamento técnico no Laboratório Nacional Agropecuário, em Campinas, SP, LANAGRO/ SP. A capacitação nas técnicas sorológicas de ELISA e imunodifusão em gel de Agar para o diagnóstico de ILT, foi realizada sob a supervisão da Dra. Dilmara Reischak e de Soraya Cecília Albieri Camillo. Esse treinamento também objetivou atender à exigência do Ministério da Agricultura, Pecuária e AbastecimentoMAPA, no credenciamento de laboratórios para o diagnóstico sorológico para LTI. indicativo da presença do vírus na granja e deve ser imediatamente comunicado ao serviço oficial de defesa sanitária animal. A Figura 1 apresenta lesões da mucosa laringotraqueal ocasionadas pelo vírus LTI. Ensaios diagnósticos desenvolvidos na capacitação técnica Ensaios moleculares Toda a base teórica da PCR foi recordada pela Dra. Maricarmen García, que enfatizou a necessidade de se realizar o diagnóstico da LTI pela PCR convencional ou em tempo real (ReTi-PCR), tendo em vista que são provas rápidas, específicas e sensíveis. A parte prática de extração de DNA viral foi realizada sob supervisão da assistente de pesquisa Sylva Riblet, assim como a realização das reações de PCR. No Laboratório de Biologia Molecular foi realizada a extração do DNA viral de amostras de raspados de traqueias de aves doentes, utilizando o kit de extração QiAamp DNA mini kit e, em seguida, a reação de PCR convencional, análise dos produtos do PCR por RFLP (polimorfismo de fragmentos de restrição) e ReTi-PCR, para comparação da sensibilidade analítica das técnicas. O set de primers utilizados na reação de PCR amplificaram um segmento de 688 pb de uma região conservada do gene ICP4 (infected cell protein 4) do vírus da LTI que, quando combinado com RFLP, proporciona um teste rápido e específico para a detecção e caracterização de isolados da LTI. A análise do gene ICP4 por PCR-RFLP pode ser utilizada como ferramenta para diferenciar amostras vacinais e de campo, identificando regiões de diversidade e geneticamente categorizar os isolados do vírus da LTI. A Figura 5 mostra o perfil eletroforético obtido nas amostras por PCR onde todas foram positivas, com a presença de DNA do vírus da LTI. O set de primers delineados a partir de sequências do gene ICP4 demonstrou ser específico para o vírus. Histopatologia O objetivo foi realizar a capacitação para o diagnóstico histopatológico diferencial das enfermidades do trato respiratório de aves. Segundo a Dra. Susan Williams, anatomopatologista responsável técnica pelo diagnóstico histopatológico do PDRC-UGA, a triagem das amostras suspeitas de LTI fixadas em formol tamponado e emblocadas em parafina, a partir do qual são realizados cortes histológicos corados pela hematoxilina/eosina (HE) é um método diagnóstico rápido, pois permite a liberação de resultados em até 24 horas, desde que o laboratório de histotécnica esteja automatizado. O exame histopatológico busca, fundamentalmente, a identificação da inclusão viral eosinofílica no núcleo das células epiteliais da mucosa conjuntiva e do trato respiratório, seios infraorbitários, laringe e traqueia, sendo essa lesão patognomônica em aves enfermas no estágio inicial da doença, de 5 a 7 dias após a infecção. Nos casos severos, quando ocorre desprendimento da mucosa, as inclusões intranucleares podem ser observadas nos debris celulares do lúmen da traqueia. As amostras inconclusivas na coloração HE devem ser submetidas à imunohistoquímica e ou PCR para comprovação da infecção viral. Nos Estados Unidos, a identificação de pelo menos uma ave com inclusão intranuclear eosinofílica em uma amostragem de um lote de aves com sinais clínicos respiratórios é Isolamento viral em cultura celular de rins de galinha Inicialmente, células de rim de galinha SPF (specific pathogen free) de 3 semanas de idade, foram cultivadas em meio mínimo essencial de Earle suplementado com 10% de soro fetal bovino e incubadas em estufa com 5% de CO2 por 24h, (conforme mostra a Fig. 2). O efeito citopático característico do vírus é observado 3-5 dias após a inoculação da suspensão de raspados de traqueias de galinha infectadas com LTI, conforme ilustra a Figura 3. Isolamento viral em ovos embrionados A inoculação do vírus da LTI em ovos embrionados de galinha SPF de 9-11 dias de idade é feita por via membrana corioalantoide (MCA), seguida de incubação dos ovos e o exame diário para verificação do espessamento e formação de pocks, placas opacas, na MCA. Esse processo ocorre 3 dias após a inoculação do vírus, conforme ilustrado na Figura 4. Biológico, São Paulo, v.73, n.1, p.61-68, jan./jun., 2011 63 64 N.M. Soares et al. Tabela 1 - Resultados do Real Time-PCR para detecção do vírus da LTI. Identificação A1 A2 A3 A4 A5 A6 A7 A8 A9 Sample ID 71287-4 77601-1 77601-2 77601-3 77601-4 ePBS 1874 Pos control gC 1000copies water Os sítios de clivagens dos produtos do PCR (PCRRFLP) foram comparados utilizando-se as enzimas de restrição (RE) Apo I e Bcc I. A Profa. García sugeriu a utilização dessas enzimas de restrição nas amostras brasileiras. Esses marcadores tornam possível a diferenciação de amostras vacinais e de campo brasileiras. Essa discriminação é fundamental para estudos epidemiológicos, tendo em vista que o vírus vacinal pode causar enfermidade pela possibilidade de reversão de patogenicidade. No Brasil, devido à utilização da vacina com vírus vivo, a genotipagem das amostras de vírus da LTI por meio da PCR com enzimas de restrição (RFLP), possibilitou a diferenciação do vírus de campo do vírus vacinal na região de Bastos, SP. Em continuidade aos estudos moleculares, para comparação da sensibilidade analítica da PCR convencional, realizou-se uma ReTi-PCR, utilizando-se o kit Quantitect Probe PCR (Qiagen, Valencia, Califórnia, EUA). Nessa reação, os primers e o probe (marcador fluorescente) foram desenhados para amplificar um produto de 103 pb do gene que codifica para a glicoproteína C do envelope (gC) do vírus da LTI. Os resultados da reação estão na Tabela 1 e na Figura 6. Para cada reação, o número de ciclo threshold (valor CT) foi determinado como o número de ciclo do PCR no qual a fluorescência da reação excedeu 30 unidades de fluorescência, ou seja, a diluição mais alta do DNA viral no qual a fluorescência foi superior a 30 unidades de fluorescência. Os valores CT obtidos para cada diluição (10-1 a 106 cópias) do gene gC foram plotados contra o log10 do número de cópias do genoma viral (GCN) e uma equação linear (y = -0,294x + 12.059) foi gerada com um valor de R2 = 0,999. O limite de quantificação foi determinado ser de 100 cópias molde. Baseado nesses resultados, amostras com valores de CT menores ou iguais a 36.14 foram consideradas positivas, com a presença do DNA do vírus da LTI, correspondendo a uma quantidade de DNA maior do que 100 cópias, o qual no PCR convencional corresponde a 100 fg. Segundo considerações da Profa. García, os ensaios de PCR convencional e o ReTi-PCR são altamente FAM Ct 13,91 30,44 28,53 20,85 24,47 37,47 12,33 31,61 0 Resultados POS POS POS POS POS NEG POS POS NEG sensíveis e específicos para a detecção do vírus da LTI em amostras de campo, sendo que o ReTi-PCR requer menos tempo e proporciona uma análise final mais objetiva quando comparado ao PCR convencional. A reação de PCR para a identificação do vírus da LTI, quando comparada ao isolamento viral, demonstou ser altamente sensível e reprodutível. Tal fato ocorre porque a presença de bactérias e outros vírus não interferem na amplificação do DNA viral, o que não ocorre na cultura celular, que tem seu crescimento inibido na presença de interferentes. A reação de ReTi-PCR tem o limite mínimo de detecção de 100 cópias do vírus da LTI, enquanto que na cultura celular esse limite passa a ser de 100.000 cópias virais. Além de mais sensível que o isolamento viral, quando comparado a outros ensaios rápidos como a histologia e a IF, a ReTi-PCR permite quantificar o número de cópias amplificadas no genoma viral, além de permitir a diferenciação da doença na fase aguda e crônica e reduzir possíveis falsos positivos. No campo, casos de LTI geralmente são relatados quando a presença de sinais clínicos são confirmados pela detecção da lesão histopatológica característica, que aparece durante os estágios agudos da infecção. Nesses casos, o ensaio por ReTi-PCR pode ser utilizado como um teste rápido para confirmar o diagnóstico histopatológico. Em surtos da doença, é fundamental a caracterização biológica dos isolados do vírus da LTI em cultura celular com posterior confirmação por ensaio molecular O estudo, com o objetivo de desenvolver a técnica diagnóstica PCR-RFLP/LTI, capaz de diferenciar as cepas vacinais das cepas de campo encontradas no Brasil, foi realizado por Marcos Roberto Buim, na Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo, sob a orientação do Prof. Antônio Piantino, tendo sido uma sugestão da Profa. Maricarmen Garcia, da Universidade da Geórgia. Um programa de restrição enzimática utilizando 4 enzimas de restrição (ApoI, BccI, DpnI e HhaI) foi delineado para diferenciar as amostras, baseado nas sequências obtidas de estudos anteriores. Amostras de traqueias e cabeças (n = 52) de galinhas foram Biológico, São Paulo, v.73, n.1, p.61-68, jan./jun., 2011 Capacitação técnica de pesquisadores do Instituto Biológico para o diagnóstico laboratorial do vírus da Laringotraqueíte Infecciosa das Galinhas (LTI). maceradas e submetidas à extração de DNA usando o kit Brazol®. Como controles positivos foram utilizadas as vacinas CO e TO. As PCRs convencionais foram realizadas para detectar um segmento parcial (688pb) do gene da proteína reguladora da transcrição de células infectadas (ICP4) do vírus da LTI. As amostras positivas na PCR foram submetidas à RFLP utilizando a enzima de restrição HhaI. No segmento amplificado das cepas vacinais ocorre um sítio de restrição para essa enzima, clivando-o em dois fragmentos, enquanto que nos segmentos das cepas de campo não ocorre esse sítio e, consequentemente, não haverá clivagem. Das 52 amostras examinadas, 12 (23,07%) apresentaram amplificação do produto de 688 pb sendo, então, consideradas como positivas para o vírus da LTI. Após a realização da RFLP, todas as 12 amostras foram identificadas como cepas de campo, pois não houve clivagem do produto amplificado. Na fase final de padronização dessa técnica com a enzima HhaI foi realizado o sequenciamento das amostras positivas de campo, assim como as vacinais, para melhor estudar as diferenças entre as amostras, localizar os sítios de restrição e assim confirmar a técnica. Quanto às demais enzimas (ApoI, BccI e DpnI), que devem ser empregadas para diferenciar e permitir um agrupamento filogenético das amostras, os resultados obtidos foram inconclusivos e requerem uma melhor padronização e otimização da técnica. A PCR convencional de um fragmento menor, seguida da RFLP utilizando uma enzima mostrou-se rápida, de menor custo e eficiente na diferenciação de cepas vacinais e de campo. Fig. 1 - Células epiteliais sinciciais no lúmen da traqueia, contendo corpúsculos de inclusão intranuclear eosinofílica (seta) com a presença do vírus da LTI (HE 1000x). Fig. 2 - Cultura de células primárias de rim de galinha de 3 semanas de idade. Diagnóstico sorológico O treinamento nas técnicas sorológicas de ELISA e IDGA para a detecção de anticorpos para o vírus da LTI foi realizado no Laboratório de Doenças Aviárias, do Laboratório Nacional Agropecuário – LANAGRO, em Campinas, SP. Ensaio de ELISA para detecção de anticorpos para o vírus da LTI O teste de ELISA-LTI é um ensaio indireto, sendo utilizado como triagem sorológica, pois mede o nível relativo de anticorpos para ILT em amostras de soro de aves. O kit utilizado foi o CIVTEST AVI ILT®. Fig. 3 - Fotos ilustrativas do processo de isolamento do vírus da LTI em cultura de células primárias de rim de galinha de 3 semanas de idade células. A- Cultura celular normal, B- Cultura celular 24h após a inoculação do vírus, C- No 2º dia após a inoculação do vírus, o efeito citopático é observado através de células arredondadas e gigantes com inclusões intranucleares. Biológico, São Paulo, v.73, n.1, p.61-68, jan./jun., 2011 65 66 N.M. Soares et al. Fig. 4 - Fotos ilustrativas de lesões na membrana corioalantoide de ovo embrionado de 9-11 dias de idade causado pelo vírus da LTI. A- Inoculação na MCA de ovo embrionado, B- MCA, após 3 dias de inoculação do vírus, apresentando numerosas lesões brancas, circunscritas e com necrose central, C- Necrose na CAM de ovo embrionado inoculado com o vírus da LTI (extraída de Versteeg, 1985). Fig. 5 - Perfil eletroforético da amplificação por PCR, do fragmento de 688 pb pertencente ao gene ICP4 do vírus da LTI. Linhas 1 a 17 = amostras clínicas, linha 18 = controle positivo, linha 19 = controle negativo, M = Marcador de peso molecular de 10 kb (Condições da eletroforese: 10 µL do produto de PCR, gel de agarose a 1,5% em TBE corado com brometo de etídeo (0,02 mg/µL). Corrida a 100 v/30 minutos. Fig. 6 - Gráfico óptico do Real-Time PCR para detecção do vírus da LTI. Biológico, São Paulo, v.73, n.1, p.61-68, jan./jun., 2011 Capacitação técnica de pesquisadores do Instituto Biológico para o diagnóstico laboratorial do vírus da Laringotraqueíte Infecciosa das Galinhas (LTI). Fig. 7 - Resultado da prova de IDGA para pesquisa de anticorpos para o vírus da LTI. Legenda: Ag – Antígeno do vírus LTI. 1, 3, 7 e 9: soros controle positivos, 2, 4 e 6: amostras positivas, 8 e 10: amostras negativas. 12: soro controle negativo. Tabela 2 - Resultados do ensaio de ELISA para diagnóstico do nível de anticorpos para o vírus da LTI. Coeficiente M/P Menor ou igual a 0,15 Entre 0,15 e 0,25 Maior que 0,25 Título ILT 0-387 388-688 ≥689 Os soros foram diluídos em 1:500 e transferidos para uma microplaca de 96 cavidades previamente sensibilizada com o antígeno de LTI, sendo adicionado, também, soros-controle positivo e negativo nas cavidades específicas. A reação colorimétrica, diretamente relacionada à quantidade de anticorpos presentes no soro, foi mensurada por meio de espectrofotometria em filtro de 405 nm. Os resultados obtidos foram validados, por meio dos valores obtidos pelos controles e as amostras classificadas como positivas, negativas e suspeitas, conforme mostra a Tabela 2. Ensaio de IDGA para pesquisa de anticorpos para LTI Com a utilização dessa técnica é possível detectar anticorpos precipitantes para o vírus da LTI. A difusão do antígeno e do soro a ser testado ocorre em uma placa de petri contendo ágar gel, com a formação de uma linha de precipitação. O kit utilizado foi proveniente da empresa Charles River Laboratories (CT, EUA). As amostras foram consideradas positivas, quando houve formação de uma linha contínua, linha de identidade, similar entre a linha formada entre as cavidades do controle-positivo e o antígeno. Nas amostras negativas houve ausência Resultado Negativo Suspeito Exposição (vacinação ou enfermidade) de linha de identidade. Os resultados dessa prova estão na Figura 7. CONSIDERAÇÕES FINAIS É importante ressaltar que o processo de capacitação dos pesquisadores foi complementado com as palestras e orientações de Fernando Gomes Buchala, coordenador do Programa Estadual de Sanidade Avícola do Estado de São Paulo e Masaio Mizuno Ishizuka, Coordenadora do Comitê Estadual de Sanidade Ávícola. Após a capacitação técnica dos pesquisadores do Instituto Biológico foram implantadas as técnicas laboratoriais para o diagnóstico do vírus da LTI, no Laboratório de Anatomia Patológica, a histopatologia e no Laboratório de Imunologia, os ensaios moleculares. Esses laboratórios integram o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento de Sanidade Animal – IB/SP. A unidade de Pesquisa e Desenvolvimento de Bastos/CAPTAA/IB, obteve o credenciamento, junto ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento - MAPA, para a realização das técnicas sorológicas de IDGA e ELISA. O Centro Avançado de Pesquisa Tecnológica do Agronegócio Avícola/IBDescalvado, SP, encontra-se apto para a realização de Biológico, São Paulo, v.73, n.1, p.61-68, jan./jun., 2011 67 68 N.M. Soares et al. ensaios moleculares e, atualmente, está em processo de obtenção do credenciamento para realização das provas sorológicas de ELISA e IDGA. Sendo assim, o Instituto Biológico é capaz de realizar o diagnóstico laboratorial da enfermidade Laringotraqueíte das Galinhas, não apenas para o Estado de São Paulo, mas também para auxiliar o diagnóstico dessa doença para todos os Estados do Brasil. Segundo o Médico Veterinário Fernando Gomes Buchala, coordenador do Programa Estadual de Sanidade Avícola do Estado de São Paulo, a utilização de testes diagnósticos para o monitoramento da LTI, permite a detecção das fontes de infecção e o melhor conhecimento da condição epidemiológica das regiões onde ocorre a laringotraqueíte, assim como avaliar a eficácia das medidas de profilaxia adotadas. Ressalta, ainda, que é fundamental a padronização dos procedimentos técnicos e científicos, no sentido de subsidiar a legislação de Defesa Sanitária Animal. BIBLIOGRAFIA BRANDÃO, P.E.; CHACÓN, J.L. Laringotraqueíte infecciosa. In: REVOLLEDO, L.; FERREIRA, A.J.P. (Ed.). Patologia aviária. São Paulo: Editora Manole, 2009. p.276-281. 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