PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS CENTRO DE ESTUDOS AVANÇADOS E FORMAÇÃO INTEGRADA ESPECIALIZAÇÃO EM FISIOTERAPIA PEDIÁTRICA E NEONATAL FLÁVIA LAGO PACHÁ DE ALMEIDA Exercício aeróbico com o uso do Nintendo Wii na Síndrome de Down Brasília 2012 FLÁVIA LAGO PACHÁ DE ALMEIDA Exercício aeróbico com o uso do Nintendo Wii na Síndrome de Down Artigo apresentado ao curso de Especialização em Fisioterapia Pediátrica e Neonatal do Centro de Estudos Avançados e Formação Integrada, chancelado Pontifícia Universidade Católica de Goiás. Orientador: Profa. Dra. Silvana Alves Pereira Brasília 2012 pela RESUMO Os benefícios da utilização do Nintendo Wii na Fisioterapia, como ferramenta terapêutica, incluem as correções da postura e do equilíbrio, o ganho da capacidade motora e de amplitude de movimento dos membros superiores e inferiores, além da motivação do indivíduo. Esse estudo propõe-se a verificar se as atividades propostas pelos jogos do console Nintendo Wii são capazes de elevar as frequências cardíaca e respiratória de crianças com síndrome de Down a níveis considerados aeróbicos. A atividade consistia em seguir os movimentos solicitados no jogo do console, fazendo uso do controle sensível a movimento Wiimote e, em alguns casos, do acessório Balance Board. A atividade teve duração média de 15 (quinze) minutos, sendo realizada 3 (três) vezes por semana, num período de 1 (um) mês, com 12 (doze) sessões previstas. Comparou-se as frequências cardíaca e respiratória do indivíduo participante com aquelas consideradas habituais, verificadas na bibliografia. O estudo em questão foi realizado com a participação de uma criança de 8 (oito) anos de idade, com síndrome de Down, não apresentando qualquer atraso em seu desenvolvimento motor que pudesse prejudicar a atividade. Concluiu-se que as atividades propostas pelos jogos do Nintendo Wii são capazes de elevar as frequências cardíaca e respiratória de crianças com síndrome de Down a níveis considerados aeróbicos. Ao final de cada atividade proposta utilizando-se o console, observou-se um aumento das frequências cardíaca e respiratória e no decorrer das sessões, como já era esperado, essas frequências tenderam a diminuir, demonstrando que a capacidade aeróbica do participante em realizar os exercícios melhorou substancialmente. Palavras-chave: Síndrome de Down. Frequência cardíaca. Exercício aeróbico. ABSTRACT The benefits of using the Nintendo Wii in physical therapy as a therapeutic tool include corrections of posture and balance, motor skills and gain range of motion of the upper and lower limbs, plus the motivation of the individual. This study aimed to assess whether the activities proposed by the Nintendo Wii games are able to elevate the heart and respiratory rates of children with Down syndrome at levels considered aerobic. The activity was to follow the movements required in the game console, using a Wiimote motion-sensitive controller, and in some cases, the Balance Board accessory. The activity lasted an average of fifteen (15) minutes, and held three (3) times per week for a period of one (1) month, being twelve (12) scheduled sessions. It was compared the heart and respiratory rates of the individual participant with those considered normal as recorded in the bibliography. This study was conducted with the participation of a child 8 (eight) years old, with Down syndrome, showing no delay in motor development that would prejudice the activity. It was concluded that the proposed activities for the Nintendo Wii games are able to elevate the heart and respiratory rates of patients with Down syndrome at levels considered aerobic. At the end of each proposed activity using the console, there was an increase in heart and respiratory rates and during the sessions, as expected, these frequencies tended to decrease, demonstrating that the aerobic capacity of participating in the exercises improved substantially. Keywords: Down syndrome. Heart rate. Aerobic exercise. INTRODUÇÃO ANÁLISE TEÓRICA Realidade Virtual Várias são as definições sobre a realidade virtual, mas, em geral, refere-se a uma experiência imersiva e interativa baseada em imagens gráficas tridimensionais (3D) geradas em tempo real por computador, simulando o mundo real ou apenas imaginário. A Realidade Virtual apareceu com os simuladores de vôo da Força Aérea dos Estados Unidos, construídos após a 2ª Guerra Mundial e, em seguida, surgiu na indústria de entretenimento (BRAGA, 2001). Pimentel (1995) define Realidade Virtual (RV) como o uso de alta tecnologia para convencer o usuário de que ele está em outra realidade, promovendo completamente o seu envolvimento. Latta (1994) conceitua a Realidade Virtual como uma avançada interface homemmáquina que simula um ambiente realístico, permitindo que os participantes interajam com ele. Essa interface é considerada como sendo a mais avançada até agora disponível, pois busca levar ao usuário sensações que lhe dão informações sobre o mundo virtual como se ele realmente existisse. Segundo Braga (2001), as interfaces baseadas em Realidade Virtual têm como características, cinco fatores: imersão, intensidade, interatividade, ilustração e informação. Estando o usuário envolvido e totalmente imerso no ambiente virtual, ele poderá desenvolver um comportamento natural e intuitivo, buscando agir como se estivesse no mundo real e, através da interação, receber resposta ideal para suas ações. Um ambiente virtual imersivo é um cenário tridimensional dinâmico, armazenado em computador e exibido através de técnicas de computação gráfica, em tempo real, de tal forma que faça o usuário acreditar que está imerso nesse ambiente (REBELO, PINHO, 2004). O conceito da Wii Reabilitação é a utilização dos movimentos solicitados por jogos do console Nintendo Wii como instrumento facilitador em terapias. Este console faz promoção dos fisiogames, jogos digitais utilizados na área da saúde e reabilitação, que dispõem de atividades contínuas e dinâmicas, propiciando a utilização de grandes grupos musculares (SANTOS, 2010). A utilização deste instrumento é realizada por vários segmentos da saúde como fisioterapeutas, educadores físicos, terapeutas ocupacionais, psicólogos, entre outros. Cada um destes segmentos o utiliza com uma finalidade particular tendo em comum o fator lúdico como auxílio a objetivos terapêuticos a serem alcançados (SANTOS, 2010). Olivo apud Brasil (2005) afirma que a atividade lúdica constitui uma necessidade humana que facilita o processo das relações interpessoais, permitindo ao indivíduo desvelar e compreender as experiências dolorosas e mais conflituosas com espontaneidade, criatividade e prazer, ou seja, o aspecto lúdico é inerente ao ser humano. Vários estudos mostram em seus resultados respostas importantes de crianças tratadas com o adicional lúdico, indicando, assim, a necessidade de implementar atividades lúdicas em todas as áreas da saúde. É perceptível que, além dos benefícios físicos funcionais, há uma melhora no quadro emocional da criança, o que a permite encarar aquele momento como apenas uma fase e também uma necessidade para sua melhora (TOSTA, 2002; MACHADO, et al. 2002, RIBEIRO, 1993). A presença das atividades lúdicas deve ocorrer de maneira intencional e planejada pelo fisioterapeuta durante o atendimento. O fator lúdico na fisioterapia caracteriza-se como a “atividade-meio”, ou seja, um recurso que tem como finalidade facilitar ou conduzir aos objetivos estabelecidos, embora para a criança a atividade lúdica possa ser considerada uma brincadeira (FUJISAWA, 2000). A experiência lúdica se mostra um excelente artifício para ajudar no envolvimento dos pequenos cidadãos com a prática física, já que a ludicidade traz essencialmente prazer. A grande vantagem disso é a permanência da atividade física na vida da criança. A motivação no momento de se realizar as atividades trará como consequência maior satisfação, o que produzirá mais vontade de se exercitar. Dessa maneira, o exercício deixa de ter uma conotação martirizante (BORBA, 2006). Greghi (1999), ao pesquisar a importância do lúdico no tratamento, concluiu que os diversos aspectos do desenvolvimento infantil – social, emocional, cognitivo, linguístico, cultural e motor – podem ser beneficiados com a brincadeira e através dela a criança exercita os desafios referentes ao seu crescimento, tornando-se cada vez mais hábil para enfrentar etapas futuras de sua vida adulta. Síndrome de Down De acordo com Moreira et al. (2000) a síndrome de Down (SD) é uma condição genética, reconhecida há mais de um século por John Langdon Down, que constitui uma das causas mais frequentes de deficiência mental. Dentre as anormalidades cromossômicas, a SD é a mais comum e bem conhecida das síndromes malformativas, consistindo numa alteração cromossômica nas células do indivíduo em que há um cromossomo a mais, formando o par 21, dessa forma podendo ser chamada também de Trissomia do Cromossomo 21. Os sinais específicos mais frequentes, presentes em indivíduos com SD de qualquer idade são: fissura palpebral oblíqua, ponte nasal achatada, prega palmar única, estatura baixa, mãos e pés pequenos, hiperflexibilidade e língua relativamente grande e protusa. Além destas características, há diversas anomalias congênitas presentes na SD, sendo que as cardiopatias estão em pelo menos metade das pessoas com essa deficiência (MARCONDES, 1999). Visto que a criança, em geral, apresentando ou não SD, tem um nível de atenção e concentração diferente do adulto, é necessário o incremento lúdico para que as mesmas realizem satisfatoriamente o programa estabelecido. Não foram encontrados relatos na literatura especificamente voltados para fisioterapia cardiovascular sobre o uso de fisiogames como adicional na terapêutica. Portanto, situações encontradas em outras áreas da saúde nos permitiu o embasamento dessa pesquisa. Segundo o dicionário de língua portuguesa Michaelis, é denominado lúdico algo que se refere a jogos ou brinquedos. Profissionais das áreas da saúde e da educação têm atribuído um valor significativo ao uso da brincadeira na realização de seus trabalhos. Nas escolas, em clínicas e em hospitais, o lúdico vem sendo utilizado como técnica específica de trabalho com crianças. É inegável que a brincadeira é a atividade primordial da infância (GREGHI, 1999). Exercício Aeróbico na Síndrome de Down Exercícios físicos aeróbicos ou submáximos são definidos como todo aquele no qual o metabolismo aeróbico é a via predominante para a ressíntese de trifosfato de adenosina (ATP), sendo este garantido por atividades contínuas e dinâmicas com a participação de grandes grupos musculares; exemplos bem conhecidos de tais atividades são a natação, a caminhada, o trote e a corrida (American College of Sports Medicine Position Stand, 1998, apud ANDRIOLO, 2007). O treino aeróbico segue os princípios de condicionamentos fisiológicos básicos do treinamento desportivo. Os princípios da especificidade e da sobrecarga promovem um aumento do grau do desempenho, visando provocar alterações fisiológicas, principalmente, nos sistemas cardiocirculatório e respiratório (PINHEIRO, 1998). Segundo Pechar (1974, In MC ARDLE et al., 1998, In PINHEIRO, 1998), a especificidade do treinamento aeróbico está relacionada aos músculos específicos que participam do desempenho desejado, já que as solicitações neuromusculares e motoras exigidas promovem adaptações fisiológicas específicas e correspondentes; a sobrecarga deve ser aplicada de modo a exercitar os grupamentos musculares específicos requeridos no desporto e com intensidade suficiente, estimulando aumentos no volume de ejeção e no débito cardíaco e atuando como facilitadora, tanto no transporte de oxigênio quanto na utilização no nível local dos músculos treinados. Os programas de treinamento físico aeróbico são considerados a estratégia mais indicada para melhorar a capacidade cardiorrespiratória a fim de se alcançar a máxima oxidação de ácidos graxos (ROBERTS et al., 1996; VAN AGGEL-LEIJSSEN et al., 2002; ACHTEN, JEUKENDRUP, 2003, apud ANDRIOLO, 2007). Assim, na população em geral, recomenda-se a manutenção da frequência cardíaca durante a atividade física aeróbica na faixa aproximada de 55% a 90% da frequência cardíaca máxima (AHMAIDI et al., 1993; SWAIN et al., 1994, ANDRIOLO, 2007). Este intervalo é considerado como sendo a zona alvo de treinamento individual, que é delimitada pelos limites superior e inferior da frequência cardíaca que deverá ser mantida durante o exercício. Essa faixa é definida pela existência de um limite mínimo de intensidade, para o exercício ser eficaz, e de um limite máximo, para que haja boa tolerância. O limite superior também é estabelecido porque intensidades acima dele provocam acúmulo de ácido láctico nos músculos recrutados durante a atividade, o que provoca certo desconforto e antecipa a fadiga, sendo fundamental, portanto, determinar a zona alvo. Diante das alterações metabólicas e neuropatológicas existentes na síndrome de Down, torna-se importante incluir a análise do perfil cardiorrespiratório dessa população no uso da terapia lúdica. Há evidências de que pessoas com déficit cognitivo e déficit de atenção apresentam quadro de senilidade precoce e maior frequência de distúrbios cardiovasculares, em consequência de seu estilo de vida predominantemente sedentário (OLIVER, HOLLAND, 1986; PITETTI, CAMPBELL, 1991; DRAHEIM et al., 2002). Assim, é valiosa para essa população a mensuração do grau de comprometimento da capacidade cardiorrespiratória para uma maior compreensão dos fatores limitantes da condição física que potencialmente estejam presentes (BASSET, HOWLEY, 2000, apud ANDRIOLO, 2007). Entretanto, para Andriolo (2007), os dados disponíveis na literatura sugerem a predominância da incerteza quanto à efetividade e a segurança de programas de treinamento aeróbico isolados para pessoas com síndrome de Down, ressaltando a necessidade de estudos rigorosos. Nintendo Wii O Wii é um console de jogos eletrônicos (games) lançado no final de 2006 pela empresa Nintendo, trazendo consigo a novidade de captar os movimentos corporais para realizar determinadas ações nos jogos. Para tanto utiliza um controle sem fio (Wiimote) dotado de acelerômetro capaz de detectar os movimentos em três dimensões do jogador, transmitindo-os para que uma ação correspondente seja processada no jogo. O controle também serve para mirar algum objeto na tela, quando necessário. Com isso, acaba exigindo precisão e coordenação do jogador em desempenhar os desafios de cada jogo. Alguns acessórios também são utilizados para aumentar a experiência imersiva nos jogos. Um deles é o Nunchuk, que é acoplado ao Wiimote para que o jogador realize movimentos com ambos os membros superiores. A Balance Board é outro complemento ao console, que funciona como uma balança, medindo o peso do jogador, ao mesmo tempo em que serve de plataforma para que o mesmo realize movimentos equilibrando-se sobre ela, o que sugere inúmeras possíveis funções nos jogos. Figura 1 – Console Nintendo Wii* com os controles Wiimote e Nunchuk e, à direita, o acessório Balance Board * Modelo RVL-001 (USA) Fonte: Imagem da internet Cada vez mais a Fisioterapia se utiliza de recursos tecnológicos a fim de se tornar menos enfadonhas e mais interativas as sessões para reabilitação de indivíduos. A criação de um ambiente lúdico demonstra grande importância na recuperação dessas pessoas, podendo encurtar o tempo de tratamento, bem como estimular uma melhor resposta às atividades propostas. JUSTIFICATIVA Os benefícios da utilização do Nintendo Wii na Fisioterapia, como ferramenta terapêutica, incluem as correções da postura e do equilíbrio, o ganho da capacidade motora e de amplitude de movimento dos membros superiores e inferiores, além da motivação do indivíduo (MERIANS et al., 2002). Foram encontrados poucos registros na literatura sobre estudos referentes ao ambiente virtual para o tratamento de pacientes pediátricos e com disfunções neurológicas, o que estimula a realização de futuras pesquisas científicas, permitindo uma melhor comparação dos efeitos reabilitadores proporcionados pelo Nintendo Wii (SCHIAVINATO et al., 2009). OBJETIVO Verificar se as atividades propostas pelos jogos do Nintendo Wii são capazes de elevar as frequências cardíaca e respiratória de crianças com síndrome de Down a níveis considerados aeróbicos. METODOLOGIA Essa pesquisa foi realizada conforme as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisa envolvendo seres humanos (resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde), conforme aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) do UniCEUB/DF, sob número de protocolo 0161/11 em 22/11/2011. Trata-se de um estudo comparativo entre os dados obtidos de frequências cardíaca e respiratória do indivíduo participante com aqueles considerados habituais, verificados na bibliografia. Para a realização da pesquisa foram utilizados um console Wii, da marca Nintendo, modelo RVL-001 (USA), ligado a um monitor LCD de 17” da marca Samsung, modelo SyncMaster 732N, juntamente com o acessório Balance Board (balança), uma cinta para se prender o controle do console à cintura, um monitor cardíaco da marca Polar, modelo FT40, um oxímetro de pulso, modelo OxyWatch C20, um medidor de tempo (timer) para marcar o minuto em que era medida a frequência respitatória. A coleta de dados aconteceu num espaço amplo o suficiente para se evitar esbarrões em quaisquer objetos durante os exercícios, com a criança trajando roupas leves. A atividade consistia em seguir os movimentos solicitados no jogo do console Nintendo Wii, fazendo uso do controle sensível a movimento Wiimote e, em alguns casos, do acessório Balance Board. Sua duração foi, em média, de 15 (quinze) minutos, sendo realizada 3 (três) vezes por semana, num período de 1 (um) mês, sempre com um intervalo mínimo de 24 horas entre cada sessão, das 12 (doze) previstas. Houve uma orientação inicial de como se realizar a atividade, além de um alongamento, a fim de se evitar qualquer desconforto muscular. Foram utilizados os jogos Wii Fit (modalidade corrida – basic run), Wii Sports Resort (modalidade basquete – basketball 3-point contest), Exerbeat (modalidades “soco no muro” – wall smasher), de acordo com o cronograma previsto para cada sessão. Porém, ressalta-se a existência de vários outros jogos, cada qual com uma ou mais modalidades, que poderiam ter sido utilizados com a finalidade de estimular a atividade aeróbica do participante. Os exercícios propostos foram selecionados considerando o fato de que fossem usados, além dos membros superiores, também os inferiores para que a atividade fosse o mais intensa possível. Em média, para cada sessão, foram realizadas três modalidades de exercícios, podendo ou não serem repetidas. A modalidade de corrida foi a mais executada, pois era a que mais aumentava a frequência cardíaca do participante, sendo, portanto, considerada a atividade aeróbica ideal. Inicialmente, foi realizado um percurso curto (de aproximadamente 3 minutos) e no decorrer das sessões foi utilizado um trajeto mais longo (que durava cerca de 6 minutos). Nesse exercício, o jogador precisa executar o movimento de correr num ritmo regular, ditado por seu instrutor virtual, com o controle preso à cintura por uma cinta, deixando as mãos livres para realizar o movimento requerido pelo exercício. Na modalidade basquete, realiza-se rapidamente o movimento de saltar e arremessar bolas em direção à cesta várias vezes e o objetivo é acertar o máximo de bolas possível num curto período de tempo. Na modalidade “soco no muro”, o jogador devia realizar o movimento de socar um muro virtual até que o mesmo fosse abalado até cair, e para tanto o ritmo era aumentado durante a atividade. A intensidade de cada modalidade realizada era de 5 METs. MET é uma unidade metabólica que equivale ao número de calorias que um corpo consome enquanto está em repouso, em função do peso corporal, e corresponde a aproximadamente 3,5 ml/kg·min. Para se determinar o valor aproximado de calorias gastas pelo participante em cada sessão o próprio jogo (Wii Fit) sugere a seguinte fórmula: número de METs x peso (kg) x tempo de atividade (h) x 1,05 = calorias gastas. A frequência cardíaca foi medida no decorrer das atividades usando-se um monitor cardíaco, que se encarregava de registrar continuamente as frequências, através da comunicação com a cinta posicionada na região peitoral da criança, apresentando ao final dos exercícios as frequências média e máxima. O participante teve aumentada a sua frequência cardíaca de maneira controlada, evitando-se assim que a frequência máxima pré-estabelecida fosse ultrapassada. A frequência respiratória foi aferida antes, com a criança ainda em repouso, e após a atividade, no instante posterior ao término da mesma, por meio de observação do movimento da caixa torácica do indivíduo pelo período de um minuto. A saturação de oxigênio foi mensurada no início e no fim de cada sessão. Para a definição da frequência cardíaca máxima (FCM) teórica do participante foi utilizada nesse estudo a fórmula de Tanaka: 208 - (0,7 x idade). De acordo com Tanaka et al. (2001), o valor da fórmula de Karvonen (220 - idade) superestima a FCM em indivíduos jovens, especialmente para aqueles abaixo dos 20 anos. Em seu estudo, o autor demonstra que nessa população a frequência cardíaca máxima foi significativamente inferior ao obtido pela equação de Karvonen. O intervalo considerado ideal para variação da frequência cardíaca durante as atividades aeróbicas (zona alvo) foi obtido utilizando-se o percentual de 55% a 90% da frequência máxima calculada a partir da fórmula de Tanaka. Para controle da intensidade do exercício foi utilizada uma escala de Percepção Subjetiva do Esforço (PSE), a escala de Borg adaptada (VIVACQUA, 1992), apresentada na Figura 2, aplicável quando se deseja verificar como a pessoa está se sentindo durante um exercício, sendo especialmente útil para aquelas pessoas em que a frequência cardíaca não é um parâmetro confiável, como é o caso dos cardiopatas, tendência seguida pelas pessoas com síndrome de Down. Figura 2 - Escala de Borg adaptada (VIVACQUA, 1992) Fonte: Imagem da internet CARACTERIZAÇÃO DO ESTUDO E CRITÉRIOS DE INCLUSÃO O estudo foi realizado com a participação de uma criança de 8 (oito) anos de idade, com síndrome de Down, não apresentando qualquer atraso em seu desenvolvimento motor que pudesse prejudicar a atividade, possuindo a autorização dos pais e/ou responsáveis a participar voluntariamente da pesquisa por meio de assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). RESULTADOS Pela equação de Tanaka, 208 - (0,7 x idade), constatou-se que a frequência máxima teórica do participante foi de 202 bpm. Para determinação da zona alvo, considerando o intervalo já definido (55% a 90%), as frequências calculadas foram de 111 bpm (mínima) e 182 bpm (máxima). O peso do participante medido na sessão inicial foi de 30 kg e como sua altura atual é de 1,24 m, o índice de massa corporal (IMC) verificado foi de 19,51 kg/m2 – utilizando-se a razão entre o peso e a altura elevada ao quadrado (IMC = peso/altura2). Na derradeira sessão, o peso mensurado foi de 29 kg, que resulta num IMC de 18,86 kg/m2. A tabela 1 mostra os dados coletados durante todas as sessões de atividades. Sessão 1 2 3 4 5 6 8 9 10 11 12 FC repouso 92 90 108 103 106 109 92 101 94 90 95 FC média 123 132 131 116 107 120 130 106 115 101 129 FC máxima 142 152 164 147 135 161 163 147 131 122 153 FR inicial 22 23 27 24 22 25 26 21 23 22 23 FR final 28 29 28 36 31 27 33 25 26 27 26 Duração 12m14s 17m31s 17m57s 17m09s 18m52s 15m17s 15m57s 13m06s 17m08s 06m40s 05m37s Intensidade Leve Moderada Moderada Leve Muito Leve Leve Calorias 32 46 47 45 50 40 Moderada Muito Leve 42 Tabela 1 – Dados coletados durante a pesquisa Fonte: Autor do artigo 34 Leve 45 Muito Leve Leve 18 15 DISCUSSÃO Na primeira sessão, o participante, ao criar um boneco virtual que o representaria nos jogos (Mii), mostrou-se bastante empolgado. Participou ativamente na escolha de suas características físicas, como altura, formato de rosto, olhos, nariz e boca, tonalidade da pele, tipo de cabelo, cor da roupa, dentre outras, de maneira que ficasse parecido com ele próprio. Assim que o Mii ficou pronto já queria partir para jogar, mas antes disso foi mensurado o seu peso, com a utilização do acessório Balance Board, e informada a sua altura a fim de se estabelecer o IMC. O jogo apresenta um teste corporal (body test) simples em que sugere uma idade para o Mii, que pode ou não coincidir com a idade real do jogador. No caso dele foi de 37 anos, indicando que o mesmo não atingiu os parâmetros esperados para a sua faixa etária. No início das atividades mostrou-se bastante participativo, porém ao longo das sessões foi necessário acrescentar outros jogos além dos previamente definidos, já que a criança não conseguiu realizar, por exemplo, uma das atividades em que é simulado o uso do bambolê. Teve sua atenção reduzida durante os jogos sempre que ouvia sons alheios aos emitidos pelo console. Em algumas sessões, apresentou tosse ao ter sua frequência cardíaca aumentada, porém mantida abaixo da máxima calculada. Quase sempre não conseguia imprimir um ritmo constante durante as atividades, fazendo várias pausas, por mais que tivesse a orientação para continuar a realização das mesmas. Com isso, fez-se necessário incentivá-lo a correr mais rápido ou mesmo instigar um clima competitivo que o levasse a chegar ao final como vencedor, além de apresentar um déficit de atenção, bastante comum a crianças com SD. De acordo com Voivodic (2004), os que têm essa síndrome apresentam déficit de atenção, causado por alterações neurológicas, déficit de memória, relacionado à memória auditiva imediata, o que pode afetar a produção e o processamento da linguagem, e déficit na memória de longo prazo, o que pode "interferir na elaboração de conceitos, na generalização e no planejamento das situações". Buscou-se em todas as sessões, incentivar o participante a manter um nível de intensidade das atividades de moderada a intensa. Todavia, segundo a escala de Borg adaptada (VIVACQUA, 1992), a condição de esforço verificada pelo avaliado foi de uma atividade física leve a moderada, com alguns poucos picos de exercício intenso. Com isso, os resultados mensurados de frequência cardíaca foram discretamente subestimados, mas ainda assim demonstraram a efetividade aeróbica da atividade. Em alguns dias, por iniciativa própria, quis realizar atividades além das que lhe foram propostas, demonstrando um certo vislumbramento com a ação lúdica que os jogos proporcionavam. E isso ficava bastante evidente quando se aproximava muito da tela do jogo – quase como se quisesse adentrá-la – para realizar as atividades, indicando uma profunda imersão no ambiente virtual. A atmosfera lúdica poderia ter sido incrementada caso fosse utilizada uma tela ainda maior para realização das atividades. Houve uma certa dificuldade ao se constatar a frequência respiratória, no intervalo de um minuto, pois o mesmo não conseguia manter-se em repouso total, movimentando-se bastante, além de conversar e buscar objetos ao redor, incluindo aqueles usados para realizar as medidas da pesquisa. A cinta do monitor cardíaco por vezes deslocava-se de sua posição correta quando era puxada pelo participante durante as atividades, prejudicando a marcação dos valores de FC até que fosse novamente ajustada. Mostrou-se motivado em todos os momentos a realizar as atividades propostas nos jogos, apresentando melhora na maneira de se expressar e realizar suas atividades em grupo. Foi possível perceber uma discreta diminuição de peso e, consequentemente, do IMC após efetuar a diferença entre as medições realizadas na sessão inicial e final com a utilização do acessório Balance Board, mesmo não havendo mudanças significativas nos hábitos alimentares da criança. Porém, esta poderia ter sido mais notória se as sessões tivessem seu tempo prolongado ou aumentando-se a intensidade dos exercícios. Das 12 (doze) sessões previstas, uma não pôde ser realizada, a sétima sessão, já que o avaliado não compareceu nesse dia, sem justificativa para sua ausência. E não foi possível repor tal sessão, pois além de haver um cronograma das atividades previamente definido, o participante não dispunha de outro horário para fazer a reposição. Entretanto, esse fato não invalida nem altera significativamente o resultado dessa pesquisa. Nas últimas duas sessões, o participante realizou um tempo menor de atividades, o que não contribuiu para um aumento expressivo das frequências cardíaca (média) e respiratória, mostrando-se indisposto, provavelmente por excesso de atividades alheias ao estudo em questão, como por exemplo natação, uma vez que foi relatado pelo seu responsável legal que as realizava. A modalidade de corrida foi a mais priorizada, pelo fato de que estudos demonstram relação direta entre a força dos membros inferiores e o condicionamento cardiovascular (FLEG, LAKATTA, 1988; FRONTERA et al., 1990; SUZUKI et al., 1997). Entretanto tais capacidades são virtualmente sempre inferiores em pessoas com síndrome de Down, mesmo quando comparadas àquelas com comprometimento cognitvo por outras causas (PITETTI, BONEH, 1995). Nessa modalidade, atingiu-se a zona alvo de frequência cardíaca praticamente em todas as sessões. Gráfico 1 – FC Média Fonte: Autor do artigo De acordo com o gráfico 1, o pico de frequência média se deu em 132 bpm e a mínima foi de 101 bpm, considerada uma FC baixa, levando-se em conta que a criança não conseguia manter um ritmo regular das atividades realizadas nem reproduzir todos os movimentos propostos pelo jogo. Apesar de haver valores abaixo do considerado no intervalo da zona alvo, esses foram muito próximos ao limite inferior da mesma (55%). Gráfico 2 – FC de Repouso Fonte: Autor do artigo Gráfico 3 – FC Máxima Fonte: Autor do artigo Nesse estudo, a FC de repouso variou de 90 a 109 bpm (gráfico 2) e a FC máxima foi de 122 a 164 bpm (gráfico 3). Valores similares foram encontrados por Lammers et al. (2008) em seu estudo, no qual define que a FC de repouso para crianças de oito anos é de 99 ± 15 bpm, enquanto a FC máxima de 133 ± 10 bpm. A saturação de oxigênio sempre variou na faixa de 98% a 95%, considerada adequada em comparação com os valores de saturação encontrados no estudo de Lammers et al. (2008) que foram de 97 ± 1 %, em repouso, e a mínima de 95 ± 2 %. Gráfico 4 – FR inicial e final Fonte: Autor do artigo De acordo com o estudo de Oliveira (2007), os valores de FR inicial e final são, respectivamente, 20 ± 5 irpm e 31 ± 7 irpm. Já os valores de FR inicial mensurados nesse estudo (gráfico 4) variaram entre 21 e 27 incursões respiratórias por minutos (irpm), enquanto que a FR final oscilou entre 25 e 36 irpm. A tabela 2 resume a comparação entre os dados obtidos na pesquisa e aqueles considerados valores de referência na literatura. Frequência Obtida Teórica FC média 101 a 132 bpm ≥ 55% FCM FC repouso 90 a 109 bpm 99 ± 15 bpm FC máxima 122 a 164 bpm 133 ± 10 bpm FR inicial 21 a 27 irpm 20 ± 5 irpm FR final 25 a 36 irpm 31 ± 7 irpm Tabela 2 – Comparativo entre dados obtidos e teóricos Fonte: Autor do artigo Em todos os gráficos apresentados acima existe uma linha de tendência linear (pontilhada) que indica que as frequências seguem um determinado grau de declínio desde a primeira até a última sessão, indicando que com o passar das atividades o avaliado realizava exercícios similares, porém aumentando menos suas frequências cardíaca e respiratória para tanto, indicando assim uma ligeira melhora da condição cardiovascular do mesmo. Igualmente favorável foi o resultado em relação à parte lúdica, já que foi possível notar o comprometimento do participante em realizar as atividades propostas, demonstrando bastante entusiasmo e contentamento. Apesar da escassez de estudos científicos publicados e tendo como base a revisão da literatura já realizada, constatou-se que o uso do Nintendo Wii auxilia as crianças com síndrome de Down a manterem um bom condicionamento cardiovascular durante a atividade aeróbica e com isso o console poderá ser utilizado na reabilitação desses indivíduos, evitando o sedentarismo e, consequentemente, a obesidade dessa população, reduzindo o padrão hipotônico com uma maior segurança sobre o sistema cardiorrespiratório. Porém, muito ainda se tem a pesquisar a respeito de um tema bastante amplo e inovador, seja com o uso do Nintendo Wii ou até mesmo outras plataformas que criem um ambiente virtual inspirador para os usuários que necessitem ser reabilitados, especialmente aqueles que têm uma síndrome tal como a Down. Seria necessário um número maior de participantes, a fim de se comprovar melhor tais resultados, o que nesse estudo não foi possível pela dificuldade em se recrutar uma população tão específica sem a colaboração de uma entidade de crianças com a síndrome interessada na pesquisa. CONCLUSÃO Verificou-se que as atividades propostas pelos jogos do Nintendo Wii são capazes de elevar as frequências cardíaca e respiratória de crianças com síndrome de Down a níveis considerados aeróbicos. Ao final de cada atividade proposta utilizando-se o console, observou-se um aumento das frequências cardíaca e respiratória e no decorrer das sessões, como já era esperado, essas frequências tenderam a diminuir, demonstrando que a capacidade aeróbica do participante em realizar os exercícios melhorou substancialmente. REFERÊNCIAS ANDRIOLO, R. B. Programas de treinamento físico aeróbico para as saúdes física e psicossocial em adultos com síndrome de Down: Revisão Sistemática. Tese apresentada à Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina, para obtenção do Título de Mestre em Ciências. São Paulo, 2007. BARBOSA, F. P.; OLIVEIRA, H. B.; FERNANDES, P. R.; FERNANDES FILHO, J. Estudo comparativo de equações de estimativa da frequência cardíaca máxima. Fitness and Performance Journal, v.3, n.2, p.108-114,Rio de Janeiro, 2004. BORBA, P. C. S. A importância da atividade física lúdica no tratamento da obesidade infantil. Monografia, Janeiro de 2006. 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