O QUE É ANTROPOLOGIA? O QUE FAZEM OS ANTROPÓLOGOS? Alexandre Fernandes Corrêa (*) A ciência que estuda as culturas humanas é chamada antropologia. É uma disciplina que investiga as origens, o desenvolvimento e as semelhanças das sociedades humanas assim como as diferenças entre elas. A palavra antropologia deriva de duas palavras gregas: anthropos, que significa "homem" ou "humano"; e logos, que significa "pensamento" ou "razão". Os antropólogos comumente investigam as formas de desenvolvimento do comportamento humano, objetivando descrever integralmente os fenômenos sócio-culturais. Os Campos de Estudo da Antropologia A ciência antropológica é comumente dividida em duas esferas principais: a antropologia biológica (ou física) e antropologia cultural (ou social)1. Cada uma delas atua em campos de estudo mais ou menos independentes, pois especialistas numa área freqüentemente consultam e cooperam com especialistas na outra área. A antropologia biológica é geralmente classificada como uma ciência natural, enquanto a antropologia cultural é considerada uma ciência social. A antropologia biológica, como o nome já indica, dedica-se aos aspectos biológicos dos seres humanos. Busca conhecer as diferenças ditas raciais e étnicas, a origem e a evolução da humanidade. Os antropólogos desta área de conhecimento estudam fósseis e observam o comportamento de outros primatas. A antropologia cultural dedica-se primordialmente ao desenvolvimento das sociedades humanas no mundo. Estuda os comportamentos dos grupos humanos, as origens da religião, os costumes e convenções sociais, o desenvolvimento técnico e os relacionamentos familiares. Um campo muito importante da antropologia cultural é a lingüística, que estuda a história e a estrutura da linguagem. A lingüística é especialmente valorizada porque os antropólogos se apóiam nela para observar os sistemas de comunicação e apreender a visão do mundo das pessoas. Através desta ciência também é possível coletar histórias orais do grupo estudado. História oral é constituída na sociedade a partir da poesia, das canções, dos mitos, provérbios e lendas populares. A antropologia cultural e biológica conectam-se com outros dois campos de estudo: a arqueologia e a antropologia aplicada. Nas escavações, os arqueólogos encontram vestígios de prédios antigos, utensílios, cerâmica e outros artefatos pelos quais o passado de uma cultura pode ser datado e descrito (pesquisar Arqueologia). A antropologia aplicada, com base nas pesquisas realizadas pelos antropólogos, assessora os governos e outras instituições na formulação e implementação de políticas para grupos específicos de populações. Ela pode, em certa medida, ajudar governos de países em desenvolvimento a superarem as dificuldades que as populações destes países enfrentam no embate com a complexidade dos fluxos civilizacionais do século 21. E pode também ser usada pelos governos na formulação de políticas sociais, educacionais e econômicas para as minorias étnicas no interior de suas fronteiras. O trabalho da antropologia aplicada é freqüentemente desenvolvido por especialistas nos campos da economia, da história social e da psicologia. Pelo fato da antropologia explorar amplo conjunto de disciplinas, investigando diversos aspectos em todas as sociedades humanas, ela deve apoiar-se nas pesquisas feitas por estas outras disciplinas para poder formular suas conclusões. Dentre as disciplinas mais afins encontramos a História, Geografia, Geologia, Biologia, Anatomia, Genética, Economia, Psicologia e Sociologia, juntamente com as disciplinas altamente especializadas como a lingüística e a arqueologia, anteriormente mencionadas. O Problema das Terminologias Diferentes termos são usados para descrever os campos da antropologia nos EUA e na Europa, como já foi referido. Enquanto nos EUA o termo antropologia é usado mais amplamente, na Europa é mais comum o termo Etnologia. O que é chamado de "antropologia cultural" nos EUA é designado como "Etnologia" em diversos países da Europa Continental. No entanto, o termo antropologia biológica (ou física) é usado em vários países do Mundo. As subáreas da antropologia cultural nos EUA são três: antropologia histórica (etnologia), pré-história (ou arqueologia pré-histórica) e lingüística (ou antropologia lingüística). Na Europa as subáreas são: etnologia (descrição histórica e comparada das "raças"), pré-história (ou etnologia pré-histórica) e lingüística (ou etnologia lingüística). No Brasil encontramos um misto das duas tradições referidas. No Nordeste do país, temos uma tradição mais vinculada a antropologia cultural norte-americana, principalmente devido a influência de Gilberto Freyre, que estudou em Colúmbia nos EUA com Franz Boas. No Centro-Sul do país há um predomínio da nomenclatura britânica: antropologia social (USP, UNB, Museu Nacional/UFRJ, etc.). Mas isso não demarca as atuais influências e hegemonias teóricas. Etnografia, Etnologia e Antropologia Uma tentativa de universalização do significado dos termos pode ser encontrada na obra do antropólogo francês Claude Lévi-Strauus Antropologia Estrutural. Sua proposta é a seguinte: A etnografia - corresponde aos primeiros estágios da pesquisa: observação e descrição, trabalho de campo (field-work). Uma monografia, que tem por objeto um grupo suficientemente restrito para que o autor tenha podido reunir a maior parte de sua informação graças a uma experiência pessoal, constitui o próprio tipo do estudo etnográfico. A etnologia - representa um primeiro passo em direção à síntese. Sem excluir a observação direta, ela tende para conclusões suficientemente extensas paea que seja difícil funda-las exclusivamente nem conhecimento de primeira mão. Esta síntese pode operar-se em três direções: a) geográfica, quando se quer integrar conhecimentos relativos a grupos vizinhos; b) histórica, quando se visa reconstituir o passado de uma ou várias populações; c) sistemática, enfim, quando se isola, para lhe dar uma atenção particular, determinado tipo de técnica, de costume ou de instituição. A etnologia compreende a etnografia como seu passo preliminar, e constitui seu prolongamento. É o que encontramos tanto no Bureau of American Ethnology da Smithsonian Instituion, como na Zeitschritft für Ethnologie ou no Institut d`ethnologie de L`Université de Paris. Em toda parte onde encontramos os termos antropologia cultural ou social, eles estão ligados a uma segunda e última etapa da síntese, tomando por base as conclusões da etnografia e da etnologia. Nos países anglo-saxônicos, a antropologia visa um conhecimento global do homem, abrangendo seu objeto em toda sua extensão histórica e geográfica; aspirando a um conhecimento aplicável ao conjunto do desenvolvimento humano desde, digamos, os hominídeos até as raças modernas, e tendendo para conclusões, positivas ou negativas, mas válidas para todas as sociedade humanas, desde a grande cidade moderna até a menor tribo melanésia. Podese, pois, dizer, neste sentido, que existe entre a antropologia e a etnologia a mesma relação que se definiu acima entre esta última e a etnografia. Por fim, Lévi-Strauss escreve: etnografia, etnologia e antropologia não constituem três disciplinas diferentes, ou três concepções diferentes dos mesmos estudos. São, de fato, três etapas ou três momentos de uma mesma pesquisa, e a preferência por este ou aquele destes termos exprime somente uma atenção predominante voltada para um tipo de pesquisa, que não poderia nunca ser exclusivo dos dois outros. Ver Antropologia Biológica (Física), Antropologia Social e Cultural, Teorias e Escolas: Evolucionismo, Funcionalismo, Estruturalismo, Culturalismo, etc. * Alexandre Fernandes Corrêa é professor adjunto em Antropologia no DEPSAN/UFMA e doutor em Ciências Sociais pela PUC/SP. ______________________ NOTAS: 1 - A preferência por uma ou outra nomenclatura depende da tradição teórica do país. Por exemplo, o que se faz em nome da antropologia cultural nos EUA, na França se reconhece como Etnologia e na Grã-Bretanha como Antropologia Social. 2 - A Etnologia é definida como a ciência que estuda as heranças biológicas (ditas raciais), costumes e línguas da humanidade, isto é, suas características, suas origens, diferenças e distribuição espacial.