Discurso pronunciado pelo Deputado MURILO ZAUITH (PFL/MS), na Sessão Solene de 21 de Agosto de 2003. Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, Inicialmente, desejo saudar a iniciativa do nobre Deputado Vicentinho, do nobre Deputado Jamil Murad e dos demais cosignatários do requerimento desta sessão. A Casa, ao realizá-la, fortalece a prática saudável, o hábito democrático de voltar suas atenções para as minorias, cuja existência nem sempre é percebida e raramente é compreendida, em sua dimensão histórica, social e política. Ao homenagearmos aqui a comunidade muçulmana no Brasil é por certo um pouco disso que tentamos fazer, aproximando-nos de uma realidade mal conhecida, demonstrando o nosso respeito e o nosso apreço, irmanando-nos não só nas diferenças, mas também no muito que por certo temos em comum: a elevação espiritual; os valores humanísticos; a busca da felicidade; o exercício do bem coletivo; a vida constituída com dignidade e moral; os princípios de honestidade, caridade, fraternidade, lealdade e amor ao próximo. 2 O estabelecimento dos muçulmanos no País remonta ao período escravagista, quando da chegada dos chamados maleses, nome genérico com que se identificavam os negros praticantes do islamismo. Visto pelos brancos cristãos como expressão religiosa fadada à extinção, o Islamismo era já então vítima do fato de ser minoritário e, como tal, ignorado, do ponto de vista sociológico. Mais tarde, em face do predomínio de árabes cristãos, nas várias etapas do período imigratório, os árabes muçulmanos continuaram “esquecidos”, por assim dizer, fechando-se em pequenos grupos e dedicando-se a seus ritos e estudos, dentro das respectivas comunidades. Essa situação, porém, tenderia a se reverter, ao longo do século XX, em reflexo, de um lado, à expansão mundial dos seguidores do Islã, de outro, à chegada ao País de grandes levas de árabes muçulmanos, notadamente entre 1945 e 1985. Como grupo religioso que professa a fé islâmica, os muçulmanos, no Brasil, formam hoje uma população de mais de 1,5 milhão de pessoas. Entre seus adeptos encontram-se muitos brasileiros sem laços de sangue com os povos árabes. São os chamados conversos, numerosos a ponto de, por exemplo, a mesquita do Brasil, a mais antiga existente no País, fundada em 1942 e localizada em São Paulo, onde se concentra a maior parte da comunidade muçulmana, usar o Português durante os sermões. 3 O Islamismo, Senhoras e Senhores Deputados, está assim definitivamente desvinculado do velho rótulo, que tanto o marcou, de religião étnica, professada apenas por nãobrasileiros e descendentes – primeiramente, escravos vindos do continente africano; árabes, a seguir. Fosse verdadeira, Senhor Presidente, a relação de proporcionalidade inversa entre discriminação e tamanho do universo discriminado, a comunidade muçulmana no Brasil poderia festejar uma perfeita integração com os demais segmentos religiosos, étnicos e sociais que compõem a moldura da vida nacional. Ocorre, infelizmente, no entanto, que a esse salto de crescimento não correspondeu, como seria de esperar, um processo de aceitação plena e incondicional. O vizinho, o amigo, o parente ou quem quer que tenha feito uma opção de profissão de fé diferente da nossa – e aqui me refiro também a outras religiões – em geral é visto com olhos desconfiados. Boa parte das pessoas se mantém despercebida a esse direito básico do cidadão, direito, nobres Colegas, que deflui, em última análise, do próprio direito à liberdade. Em nome de convicções pífias, persegue, reprime, repele, ironiza, desrespeita, desqualifica e despreza. O preconceito, Senhor Presidente, quaisquer que sejam origem, alvo e forma, é antes de tudo um comportamento da mais absoluta ignorância. No caso, denota desconhecimento da 4 História, desinformação da doutrina, desinteresse pelos fenômenos de seu tempo, incorreção quanto à interpretação das belíssimas tradições que perpetuaram o Islã como fonte de sabedoria e justiça. Os muçulmanos, no Brasil, bem como no mundo, sustentam-se em uma forte noção de comunidade universal, em que pese o amplo leque de centros, escolas, mesquitas e sociedades. Refletindo a proporção existente no plano mundial, no qual 90% dos fiéis são sunitas e 10% são xiitas, a comunidade muçulmana brasileira divide-se numa maioria sunita e uma minoria xiita. O mapa do Islã, com suas organizações e número de adeptos, computados segundo um critério geográfico, permite observar uma concentração maior na Região Sudeste, em especial os Estados de São Paulo e Rio de Janeiro, onde se somam mais de trinta instituições. Em segundo lugar, vem a Região Sul, com dezesseis instituições, predominando os Estados do Paraná e de Santa Catarina. Em Foz do Iguaçu, existem pelo menos três grandes mesquitas construídas em estilo característico. A realidade das comunidades muçulmanas no Brasil está toda ela, Senhor Presidente, trespassada de uma riqueza histórica, cultural, religiosa e humana formidável, ainda por ser devidamente esquadrinhada. O texto do Alcorão contém muitas das mais belas páginas produzidas pela literatura, em todos os 5 tempos. A palavra do Profeta Maomé está repleta de ensinamentos que se destinam ao ser humano, atemporal e universal, dissociado de raça ou religião. Seus adeptos e estudiosos têm por certo muito a nos transmitir, bastando para tanto que lhes sejamos receptivos. Neste tortuoso início de milênio, tolerância, Senhor Presidente, parece ser a palavra-chave. É preciso aceitar e conviver, conviver e amar, amar e construir – construir vidas melhores, mentes melhores, um mundo melhor e um País melhor. À comunidade muçulmana os nossos elogios, meus, pessoais, assim como do PFL, pelo muito que tem feito, na busca desse ideal. Muito obrigado ! Deputado MURILO Zauith Vice-Líder do PFL