OFICINA DE MEMÓRIA: UM RELATO DA EXPERIÊNCIA DE ACADÊMICOS DE PSICOLOGIA Pâmela Horst Ruthes1 - PUCPR Maynara Cristina Costa2 - PUCPR Grupo de Trabalho – Didáticas: Teorias, Metodologias e Práticas Agência Financiadora: não contou com financiamento Resumo Atualmente espera-se que os estudantes de ensino superior sejam capazes de somar competências técnicas e humanas, de forma a promover, através de aparatos tecnológicos e metodologias de ensino, a sua verdadeira autonomia; porém não é sempre que isso ocorre. Muitos estudantes sentem dificuldade em sua criação de autonomia, devido ao déficit das competências técnicas e com isso surgem diversas queixas quanto a dificuldade na hora do estudo. A queixa de muitos estudantes sobre a falta de um acompanhamento e de técnicas que pudessem auxiliar no seu desempenho acadêmico nos motivou a criar um projeto que trabalhasse com diversas oficinas, as quais abordassem temas ligados a essas necessidades dos estudantes. O presente trabalho abordará o desenvolvimento da oficina de memória, que tem como objetivo instrumentalizar os estudantes com conhecimento e técnicas facilitadoras para melhor memorização de seus aprendizados. A oficina conta com a apresentação do funcionamento de nossa memória e com técnicas para fixação de conteúdo, ocorrendo através de encontros grupais e com atividades práticas, de modo a promover um intercambio entre estudantes de diferentes áreas, bem como estimular o autoconhecimento, organização e atenção, de modo a melhorar o desempenho acadêmico de nossos participantes. As oficinas são desenvolvidas na PUCPR, em encontros de 3 horas cada e conta com a participação de estudantes de diversos cursos da graduação, mestrado e doutorado. A partir de uma avaliação qualitativa, percebe-se que a oficina de memória está tendo resultados positivos, sendo capaz de conscientizar os estudantes quanto ao funcionamento dos processos de memorização e modos de estudar que utilizem todo o potencial da memória de cada um. Palavras-chave: Oficina de memória. Memória. Processos de aprendizagem. Introdução O presente trabalho apresenta uma oficina de memória realizada por acadêmicos do último ano de psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, durante o estágio de 1 2 Graduando de Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. E-mail: [email protected] Graduando de Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. E-mail: [email protected] ISSN 2176-1396 21235 consultoria escolar. A oficina é parte de um programa maior que abrange de modo amplo o desenvolvimento de habilidades estudantis, o programa aborda: hábitos de estudos, estilos de aprendizagens, branco na prova, ansiedade para apresentação de trabalhos e memória. Atualmente espera-se que os estudantes de ensino superior sejam capazes de somar competências técnicas e humanas, de forma a promover, através de aparatos tecnológicos e metodologias de ensino, a sua verdadeira autonomia. Através de contato com professoras e coordenadoras do SEAP – Serviço de Apoio Psicopedagógico da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) – notou-se que grande parte dos estudantes sentia a necessidade de um acompanhamento e de instrumentos que pudessem auxiliar no seu desempenho acadêmico. Deste modo, verificou-se a necessidade de criação de oficinas que contemplem os temas indicados pelos alunos como queixa. A PUCPR, como instituição de ensino, é pautada em cinco princípios direcionadores para seus estudantes, sendo: autonomia, dedicação, cooperação, honestidade e senso crítico. Através desses princípios elencados pela determinada instituição de ensino, acredita-se na possibilidade de auxiliá-los no desenvolvimento desses pressupostos. Foram verificadas várias queixas referentes a memorização dos conteúdos aprendidos em aula, as quais afetam diretamente os estudos destes acadêmicos. Estas vivenciadas pelos acadêmicos da universidade indicavam a necessidade de uma oficina que pudesse instrumentalizá-los com informações e técnicas facilitadoras para a fixação da aprendizagem. Muitas vezes a disfunção acadêmica do estudante sinalizava a falta de técnicas de estudo, concentração e memorização. A oficina em questão informa sobre memória e a forma como ocorre o processo de memorização, com o objetivo de instrumentalizar os estudantes com conhecimento e técnicas que auxiliem no processo de fixação dos conteúdos aprendidos, tornando o processo de ensino e aprendizagem dos acadêmicos mais produtivo. Desenvolvimento Fundamentação Teórica Observa-se a necessidade de que os ambientes educacionais, principalmente universidades, combinem o ensino de matérias específicas com o ensino de habilidades que 21236 tragam benefícios aos estudantes e possam ser utilizadas em diversas áreas de trabalho. Tratase aqui de habilidade no trabalho em equipe, em assumir responsabilidades, em estar atento as mudanças e atuais necessidades no trabalho, facilidade na comunicação, entre outras. (FALLOWS e STEVEN, 2000 apud ZULAUF, 2006). Delors (2001 apud JARDIM, 2007) resume em quatro pilares as habilidades e competências que os estudantes devem adquirir: aprender a conhecer, ou seja, adquirir instrumentos de compreensão; aprender a fazer, podendo então agir sobre o meio; aprender a viver juntos, assim participando e cooperando com os outros, e; aprender a ser. que é essencial e considera-se a integração das outras três. Ao realizar o Plano de Desenvolvimento da Graduação, a Pontifícia Universidade Católica considera sua missão institucional, que preza: excelência profissional; liderança transformadora e; atuação ética e cidadã, orientada pelos valores cristãos maristas. (PUCPR, 2014). Percebe-se que há alguns fatores mais específicos relacionados à instituição, porém, tem-se a intenção de abranger as competências vistas anteriormente como importantes para os estudantes. Os universitários da PUCPR são vistos pela instituição como estudantes, e não alunos, considerando-se que estudante é aquele capaz de criar conhecimento, que pensa no futuro, tem iniciativa própria, autonomia, é participativo, crítico e capaz de trabalhar em grupo. (PUCPR, 2014). Ao considerar as necessidades dos estudantes universitários, pensa-se na necessidade de criação de um programa para abranger hábitos de estudo e memória, facilitando a educação de modo autônomo e crítico. O programa criado é composto por uma oficina de hábitos de estudo, de ansiedade em apresentação, branco na prova e sobre memória, sendo este trabalho referente a oficina de memória. A memória é um conjunto de sistemas de armazenamentos, sendo apresentada pelos psicólogos de forma a referir-se a processos e estruturas que se encontram envolvidos no armazenamento e na recuperação de experiências. (DAVIDOFF, 2001 apud TAVARES, 2008). Assim como, no ponto de vista da neurociência, a memória é descrita como a capacidade dos sistemas nervosos de beneficiar a experiência. (TULVING, 2000 apud TAVARES, 2008). Em 1968 Richard Atkinson Shiffnn propõe uma maneira de pensar e descrever a memória até hoje muito utilizado, através de um sistema de três estágios, que envolvem a 21237 memória sensorial, memória de curto prazo e memória de longo prazo. (GAZZANIGA. 2005). A memória sensorial, é a memória breve, que está presente o tempo todo; por exemplo, quando se olha para alguma imagem, as pessoas são capazes de lembrar alguns detalhes, isso acontece através das informações sensórias, como luzes e cheiros, que deixam um traço no sistema nervoso por alguns segundos e logo desaparecem. (GAZZANIGA, 2005). Já as informações que prestamos atenção são transmitidas dos depósitos sensoriais para a memória de curto prazo ou memória imediata, sendo este um sistema de memória que tem uma capacidade limitada, o qual mantém informações na consciência por um breve período. Essa memória não consegue manter a informação por mais de 20 segundos, depois desse período elas desaparecem, a menos que impeçamos que isso aconteça, através de repetições e pensando sobre a informação. (GAZZANIGA, 2005). A memória de longo prazo é o armazenamento relativamente permanente de informações, que nos permite lembrar de acontecimentos da infância, a roupa usada há uma semana, etc. Há uma espécie de filtro para o armazenamento das memórias de longo prazo, uma das maneiras da informação entrar no armazenamento permanente é através da repetição. (GAZZANIGA. 2005). A memória pode ser dividida em três processos: codificação, armazenamento e recuperação. Crowder (1976 apud TAVARES, 2008) diz que: “Como processo, a memória refere-se aos mecanismos dinâmicos associados à retenção e à recuperação da informação sobre a experiência passada”. (p. 15). No processo de codificação nossas experiências perceptivas são transformadas em representações que são armazenadas, essas informações podem ser simples ou complexas. O armazenamento é a retenção de representações codificadas ao longo do tempo e corresponde a alguma mudança no sistema nervoso que registra o evento. Essas representações armazenadas são denominadas memórias; elas representam um tipo diferente de informação como imagens visuais, fatos, ideias e sabores. A recuperação é o ato de recordar ou lembrar-se da informação armazenada. (GAZZANIGA. 2005). O psicólogo George Miller observou que é mais fácil lembrar-se de informações significativas do que informações sem maiores sentidos, isso denomina-se alcance de memória. Esse processo de organizar conteúdos em unidades é chamado de agrupamento, ou 21238 seja, quanto mais capazes somos de agruparmos as informações, mais conseguiremos lembrar. (GAZZANIGA, 2005). As memórias que apresentam fortes conteúdos emocionais, são mais facilmente memorizadas e consequentemente lembradas, pois estas tiveram a participação de vias nervosas reguladoras das emoções, as quais agem em aréas do hipocampo; e indiretamente estarão formando novas sinapses, de forma a sustentar essas memórias, assim são capazes de persistir por mais tempo. (IZQUIERDO et al., 2006). Porém, deve-se compreender também, a necessidade que temos de esquecer. Izquierdo et al. (2006) refere-se a importância do esquecimento, pois o armazenamento da memória tem um limite, chega a um ponto de saturação, ou seja, em determinado momento há a possibilidade de que memórias já consolidadas impeçam o armazenamento de novas memórias. Para mantermos uma memória viva por mais tempo, é necessário que esssa seja utilizada sempre que possível, pois assim evita-se que ela seja esquecida. Metodologia Criou-se o programa “Pump Up Your Brain” na PUCPR, envolvendo oficinas de hábitos de estudos, branco na prova, memória e ansiedade na apresentação, a partir de queixas de estudantes. Este trabalho refere-se exclusivamente a oficina de memória, mesmo que esta seja parte de um programa maior. A oficina de memória ocorre na Pontifícia Universidade Católica do Paraná, com duração de aproximadamente 3 horas, e turmas de no máximo 20 alunos, atualmente a clientela é exclusivamente de estudantes da PUCPR, tanto graduação como pós-graduação, porém pretende-se abrir para público externo devido a grande procura pela oficina. As inscrições são realizadas via e-mail ([email protected]) e caso haja mais de 20 inscritos para a mesma data, a prioridade é dada para os primeiros 20 inscritos. Inicia-se as oficinas com uma sensibilização, com o objetivo de sensibilizar os participantes de que em nossa memória pode ocorrer falhas e isso é natural, mas que ela também pode ser estimulada para que os conteúdos aprendidos sejam melhor fixados. A partir disso a oficina conta com uma explanação teórica sobre a temática memória, apresentando os tipos de memória, a forma como esta funciona e fatores que auxiliem uma memória mais sólida. Por tratar-se de estudantes de diferentes cursos, tomou-se o devido cuidado para que os 21239 conteúdos teóricos fossem expostos de maneira mais clara e objetiva, para que pudessem ficar de fácil entendimento para todos os participantes. Diversas atividades práticas são empregadas, sendo estas intercaladas com os conteúdos teóricos. Utiliza-se de vídeos, atividades em grupos, músicas, exposições de opiniões dos participantes, e as já mencionadas explanações verbais. A seguir, o quadro 1 apresenta de forma mais objetiva as atividades desenvolvidas nas oficinas de memória, assim como seus objetivos, recursos materiais e a duração aproximada. Quadro 1 – Atividades da Oficina de Memória ETAPA OBJETIVO TÉCNICA Apresentação Apresentar a oficina aos estudantes Apresentação dos integrantes e explicação do objetivo proposto pela oficina. Papel sulfite e caneta. 15 minutos. Sensibilização Sensibilizar aos participantes o quanto a nossa memória é falha. Apresentação de vídeo. Computador e data show. 15 minutos. O que é a memória? Auxiliar na compreensão dos estudantes sobre o conceito da memória. Apresentar o conceito de memória; expor os diferentes tipos de memória. Computador e data show. 20 minutos. Atenção Desenvolver atenção Apresentação do vídeo “Truques da Mente”; fazer uma correlação entre atenção e memória. Computador e data show. 20 minutos. Como memorizamos? Auxiliar na compreensão do funcionamento básico da memória. Exposição a maneira como ocorre a memorização. (Vídeo explicativo) Computador e data show. 20 minutos. Esquemas, categorias e nodos Instrumentalizar os estudantes com técnicas de memorização. Atividade de palavras com a letra N, e de frutas, com explicação posterior. Computador, data show, papel sulfite e caneta. 10 minutos. Redes associação, forma memorização Instrumentalizar os estudantes com técnicas de memorização. Exposição o conceito de redes de associação; trabalhar a memória semântica; realizar atividade. Computador, data show, papel sulfite e caneta. 30 minutos. Expor a ligação entre o sono e a memória Exposição dos conteúdos. Computador e data show. 10 minutos. de uma de Memória e sono a RECURSOS DURAÇÃO 21240 Jogo da memória Trabalhar memorização a Esquecimentos Trabalhar importância esquecimento memorização a do na Fechamento Encerrar a oficina e receber feedback dos participantes Realização do joga da memória. Computador, data show, papel sulfite e caneta. 10 minutos. Apresentação do conceito de esquecimento e seu funcionamento na memória. Computador e data show. 10 minutos. Roda de conversa. 20 minutos. Fonte: informações realizadas pelos autores, para desenvolvimento da Oficina de Memória Resultados e Discussão Os resultados referem-se, basicamente, à percepção dos participantes quanto a oficina de memória, a partir de uma análise qualitativa, realizada através da etapa de feedback ao fim de cada oficina. No decorrer de 3 oficinas, os resultados obtidos na etapa de feedback foram satisfatórios. Os participantes apresentaram diversos comentários sobre a proposta realizada; no geral as opiniões dos participantes foram sobre o método que foi utilizado no desenvolvimento da oficina, onde muitos declararam ter gostado da forma com que os conteúdos foram apresentados, sendo estes referidos por eles como “uma linguagem de fácil compreensão”, ao referirem-se às explicações teóricas sobre o funcionamento da memória. Diante das técnicas apresentadas, os participantes demonstraram satisfação e interesse, declarando que passariam a usar algumas das técnicas mencionadas e que acharam muito interessante poder compreender como as técnicas funcionam. No feedback, além dos elogios, também recebemos algumas sugestões para o decorrer das próximas oficinas, como a utilização de mais atividades práticas que viessem a facilitar o entendimento da técnica, e assim a possibilidade de compreender na prática a sua utilização no dia-a-dia dos estudantes e utilizar mais tempo nas atividades, para que se tenha um melhor aproveitamento. Devido ao fato de uma avaliação qualitativa apresentar informações que pode sofrer interferências de fatores como humor e pressões sociais, fez-se necessário a elaboração de um questionário anônimo para avaliação da oficina de memória, o qual será utilizado futuramente, nas demais oficinas a serem realizadas. 21241 Considerações Finais Considerando a análise qualitativa, percebe-se que do ponto de vista dos participantes, a oficina contribuiu para recordar técnicas de memórias já conhecidas, assim como o aprendizado de novas técnicas, e a compreensão do funcionamento das mesmas, fator motivador para a utilização do que foi aprendido. Observou-se, também, a valorização da oficina de memória pelos participantes, enquanto espaço de socialização e aprendizagem mútua a partir da troca de experiências entre os participantes e mediadores. Assim, percebe-se que mesmo havendo a necessidade de uma avaliação mais objetiva, a oficina de memória está atingindo seu objetivo de instrumentalizar os estudantes com informações e técnicas facilitadoras para a fixação da aprendizagem. REFERÊNCIAS GAZZANIGA, Michael S.; HEATHERTON, Todd F. Ciência psicológica: mente, cérebro e comportamento. Porto Alegre: Artmed, 2005 IZQUIERDO, Ivan. Questões sobre memória. São Leopoldo: Editora da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – USINOS, 3ª edição, 2006. JARDIM, Manuel J. A. Programa de desenvolvimento de competências pessoais e sociais: estudo para a promoção do sucesso académico. 2007. 596 f. Tese apresentada para obtenção de grau de Doutor em Ciências da Educação – Universidade de Aveiro, 2007. PUCPR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná). Princípios orientadores do processo de ensino e aprendizagem. Pró-reitoria de graduação. Plano de desenvolvimento da graduação. 2014. TAVARES, Naraiana O. Memória, ciclo de sono-vigília “época de avaliações” em estudantes universitários. 2008, 130f. Tese (Mestrado – Departamento de ciências da educação). Universidade de Aveiro, 2008. ZULAUF, Monika. Ensino superior e desenvolvimento de habilidades para a empregabilidade: explorando a visão dos estudantes. Sociologias: Porto Alegre, nº 16, p. 126155, 2006.