o monsTro e o abraÇo à beira do lago

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exatamente
O MONSTRO E O ABRAÇO
À BEIRA DO LAGO
foto cicero rodrigues
Imagine um casal à beira de um lago, contemplando uma processo) é diretamente proporcional à massa do objeto (estrela,
noite estrelada. Digamos que um deles estude astrofísica. As­- buraco negro etc.) e inversamente proporcional ao seu raio. Porsim, ele (ou ela) saberá que, para além do céu plácido dos namo- tanto, quanto mais maciço e compacto for o objeto, mais forte será
rados, há regiões catastróficas, plenas de fe­nô­
a luminosidade de acreção. Um cálculo simples
menos violentos, ambientes pouco acolhedores
mostra que, para uma estrela de nêutrons com masa qualquer ser vivo. Por exemplo, em uma região
sa igual à do Sol (ou seja, uma massa solar) e uns
bem pequena do céu, na galáxia Centauro A, po10 km de raio, a eficiência de conversão de uma da­
de-se observar, com radiotelescópios, um jato de
da massa em energia é 20 vezes maior por acre­matéria e radiação que se mantém coeso por
ção que por fusão nuclear – este último processo
quatro anos-luz, ou seja, 40 trilhões de quilômeocorre no interior das estrelas.
tros de extensão.
Hoje, consideramos a acreção como a fonte mais
Que fonte de energia impulsiona um fenômeeficiente de energia no universo.
no assim, algo absolutamente superlativo a 12
De todos os objetos celestes que se alimentam
milhões de anos-luz de nós?
de acreção, sem dúvida o mais exótico e mais preNo século 19, explicar a luminosidade do Sol
sente na mídia é o buraco negro. A recente detecção
era um problema, pois só se conhecia a gravidadireta de ondas gravitacionais pelo experimento LIGO
de como fonte de energia para os corpos celestes.
(ver CH 334) explicitou a existência desses corpos
Hoje,
consideramos
À medida que a idade da Terra passou a ser cocom massas dezenas de vezes maiores que a solar
a acreção como
nhecida com relativa precisão, estimativas mui– mas há evidências de que existam alguns com 100
a
fonte
mais
to inferiores para a idade do Sol feitas por físicos
bilhões de massas solares no núcleo de galáxias
eficiente de energia ativas. Um buraco negro se forma quando a autocontinuavam a causar controvérsias com os geólogos e os evolucionistas. Tal questão só foi regravidade faz uma quantidade de matéria colapsar
no universo
solvida no final da década de 1930, com base na
para densidades tão altas que nem mesmo a luz
hipótese da produção de energia nuclear no interior do Sol, o que consegue escapar do campo gravitacional dele.
garante a estabilidade dessa estrela por alguns bilhões de anos.
E aqui voltamos ao nosso casal à beira do lago: se pudésseNas voltas que o mundo dá, os físicos deste século tiveram que mos enxergar ondas de rádio, os dois poderiam ver uma enorme
recorrer de novo à gravidade para explicar a produção de energia mancha brilhante – 20 vezes mais brilhante que a Lua! – na
dos objetos mais luminosos no céu – e, nesse caso, fontes nuclea- direção da galáxia Centauro. E um deles – aquele com conhecires são totalmente inadequadas.
mento sobre astrofísica – saberia que, no centro daquele belo
Sabemos hoje que é a conversão da energia gravitacional ‘borrão’ cósmico, habita um desses buracos negros supermaciem radiação que está por trás de tais fenômenos extremos. Essa ços, o qual emite uma fração da matéria sugada na forma de
conversão, deflagrada e caracterizada pela captura de matéria, jatos colossais de matéria e radiação.
chama-se acreção, a qual ocorre,
E a imagem de tal monstro cósJato de matéria
por exemplo, quando uma estrela
mico, talvez, fosse uma boa descule radiação da
centauro-a
‘suga’ gravitacionalmente a ma­
pa (e um bom cenário de fundo)
téria de sua vizinhança – meio
para um abraço à beira do lago!
Jato
interestelar, nuvens moleculares
ou mesmo de outra estrela.
Contrajato
A luminosidade de acreção (a
JOÃO TORRES DE MELLO NETO |
Instituto de Física,
quantidade de energia por uniLocalização do
Universidade Federal do Rio de Janeiro |
buraco negro supermaciço
dade de tempo produzida nesse
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ciÊnciahoje | 340 | setembro 2016 | 5
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