Porque Eles Falam Tão Errado

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Porque Eles Falam Tão Errado
Por Israel Belo de Azevedo
O uso de expressões incorretas nos púlpitos brasileiros como “pra mim
fazer” e “a gente fomos criados” está se tornando tão comum quanto o das
corretas e usuais “aleluia” e “glória a Deus”. E se, espiritualmente, isso não
chega a prejudicar a comunicação da mensagem de Deus, esses pregadores,
no mínimo, ferem os ouvidos dos mais atentos e até de quem é mais moderno
e maleável em relação à lingüística. Expressões idiomáticas como “o cara tá
ferrado” ou “aquela família pirou de vez” são “moleza” diante dos absurdos.
É óbvio que o mau uso da língua em qualquer espécie de comunicação, e
aí se incluem os pregadores do Evangelho, provoca graves prejuízos aos
ouvintes. Erros de concordância, uso de terminologia inadequada, ambigüidade
ao falar, pobreza de estilo e vulgaridade vocabular estão entre os principais
problemas lingüísticos de muitos púlpitos. Outro reflexo do despreparo dos
pastores é em relação aos erros de interpretação da mensagem.
A professora da Faculdade de Letras da Pontifícia Universidade Católica
do Rio Grande do Sul (PUC/RS), Marisa Magnus Smith, explica que o padrão
culto do idioma, além de ser uma espécie de marca de identidade, constitui
recurso imprescindível para uma boa argumentação. “Em situações em que a
norma culta se impõe, transgressões podem desqualificar o conteúdo exposto
e até mesmo desacreditar o autor”, escreve ela no artigo intitulado “Autoaprimorando nosso conhecimento em língua materna”.
Foi o que aconteceu durante um casamento, quando, ao cometer inúmeros
erros durante a cerimônia religiosa, um pastor constrangeu tanto convidados
quanto noivos. “No início, pensei que ele tivesse a língua presa. Mas quando
disse ‘a gente fomos criados’, percebi que era mesmo um erro gritante e
inaceitável. Durante a festa, o pai da noiva tentou se justificar, alegando que
apesar de o pastor ser muito simples, era um homem muito bom. Reconheço
que nossa língua é difícil, mas são cada vez mais assustadores os erros de
português cometidos nos púlpitos”, lamentou uma corretora de seguros que
pediu para não ser identificada.
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A professora de Língua Portuguesa do Seminário Palavra da Vida, Denise
Terezinha Antunes Santiago, explica que o problema é de formação
educacional. Segundo ela, o ensino fundamental (1ª à 8ª séries) é deficiente.
“Desde cedo, eles deveriam aprender o português correto, mas como o nível
de quem ensina também não é o ideal, as crianças aprendem e se habituam a
falar errado. A formação ruim prejudica a interpretação do texto bíblico e a
transmissão correta da mensagem fica deformada”, ressalta ela.
Outro agravante, para Denise, é que muitos pastores repetem, no mundo
físico, um fenômeno resultante do mundo virtual, através do uso do
computador. Em outras palavras, a linguagem é quase cifrada, deixando o
conteúdo da frase incompleto. “Como muitos dos jovens de hoje, alguns
pastores e seminaristas também não conseguem completar a própria
argumentação”, observa. Ou seja, a cada dia que passa, ambos deixam mais
incompleto o pensamento. E, por conseqüência, claro, a mensagem.
O reitor da Faculdade Teológica Nazarena, Geraldo Nunes, afirma que há
um total desprezo pela língua portuguesa. “Acredito que o pastor pode usar o
púlpito para desafiar as novas gerações a resgatar o nosso idioma”, afirma ele,
que entende que a adoção de expressões como “a liderança chutou o balde
naquele evento” ou “o cara tá ferrado”, embora inadequada, até pode mostrar
identificação com certos auditórios, como os formados por jovens e
adolescentes. “Mas é preciso muito cuidado ao usá-las para não menosprezar
o conteúdo da mensagem apresentada”, aconselha.
Foi a constatação do mau uso da língua portuguesa que fez com que o
pastor Cesar Augusto Arruda abordasse o assunto no livro Socorro! Tenho que
Preparar um Sermão!, da Editora AD Santos. Segundo ele, o desconhecimento
da língua portuguesa e o conseqüente erro de interpretação textual por falta de
conhecimento das palavras lidas provocam distorções teológicas.
Arruda lembra que um dos sermões que o surpreenderam negativamente
foi o de um irmão pregando sobre a assunção (subida, elevação) de Jesus
Cristo aos céus. No entanto, infelizmente, o pregador estava querendo dizer
que “naquele dia, Jesus era o assunto do céu. Não havia outra conversa no
céu, porque Jesus era o assunto do dia!” Outro exemplo que menciona como
verdadeiro atentado à Bíblia e ao idioma, é a seguinte declaração: “Jesus não
veio perdoar os pecados. Veio só dar uma olhada neles, porque está escrito
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que Jesus veio espiar o nosso pecado...” Se essas situações não fossem
lamentáveis, até seriam engraçadas.
“Pastores não devem fugir do ensino e do conhecimento da língua natal
porque, para conseguir entender a Palavra de Deus, é preciso compreender
primeiro a nossa língua. Evitaríamos disparidades”, escreveu Arruda em seu
livro, que reúne também diversas pérolas, como o uso de pleonasmo nos
púlpitos brasileiros. “Subir para cima e descer para baixo” são expressões
triviais, de acordo com ele. Cacófatos também contribuem para o demérito do
conteúdo, pois frases do tipo “eu vi ela passando por ali”, além de
imperdoáveis, causam ruídos na comunicação.
Todo
esse
pacote
de
falhas
na
emissão
da
mensagem
tem
progressivamente frustrado ouvintes que poderiam estar sendo motivados a
aprender mais de Deus. Ao contrário, em vez de se sentirem atraídos para a
boa qualidade da forma e do conteúdo do que se quer comunicar, visitantes e
membros mais atentos acabam se sentindo incomodados com o pouco valor
atribuído a uma missão tão nobre: falar de Cristo. “Já deixei de freqüentar
certas igrejas, até na zona sul, porque os pastores não sabiam falar, não se
esmeravam no cuidado com a língua portuguesa e até usavam expressões
chulas no culto, provavelmente em busca de uma imagem mais popular”,
comenta Mauro Chaves, interessado no Evangelho, mas avesso às
irresponsabilidades lingüísticas percebidas nos púlpitos. E ele não é o único.
“Se a principal atividade do pastor é pregar, ele precisa estar altamente
preparado para tanto. Um bom sermão precisa de, no mínimo, seis horas de
estudo. Mas muitos pastores chegam aos púlpitos para bater papo e, sem
perceber, acabam permitindo a contaminação de muitos erros de português e
de expressão na pregação”, reclama Izadora Buarque, formada em
Comunicação Social e membro de uma igreja batista.
O gramático Evanildo Bechara avalia que a norma culta tem sido atingida
pela diminuição das fontes de cultura da sociedade. “Hoje, praticamente, o
último baluarte cultural é a escola, degustada do seu valor, vilipendiada pelos
poderes práticos e desprestigiada pela própria sociedade”, lamenta. Segundo
ele, a conseqüência é o aumento da distância entre a fala espontânea e o texto
redigido dentro da tradição culta. “Essa produção ‘natural’ que nasce do
conhecimento que cada um de nós tem de sua língua atende às primeiras
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necessidades que, quase sempre, são suficientes quando falante ou ouvinte
está presente, porque aí elementos extralingüísticos participam e garantem a
comunicação. A função da escola é transformar esse conhecimento intuitivo da
língua numa competência reflexiva”, comenta, discorrendo sobre a defesa que
algumas pessoas fazem de que o importante não é falar certo, mas sim,
comunicar.
FERRAMENTAS
Para evitar constrangimentos e garantir que os pregadores manejem com
maestria a língua portuguesa, o escritor Augusto Gotardelo, já falecido, dedicou
um livro aos pastores – Português para Pregadores Evangélicos, de Edições
Vida Nova. “Pregando, evangelizando por carta, redigindo artigos, boletins e
convites, sejam precisos e dêem ao recado de Deus a beleza que ele deve ter”,
adverte. A publicação reúne desde dúvidas sobre gramática até textos
meditativos, além de trazer exercícios.
O pastor batista Antônio Carlos Dias concorda que a língua materna deve
merecer atenção especial do pregador. “É lamentável, tanto para o pregador
quanto para a mensagem, cometer graves falhas de português. Não é preciso
ser um erudito, mas é imprescindível evitar erros primários. Quanto mais
cultura e preparo o pastor tiver, mais fácil e mais eficiente será o seu
ministério”, garante. O pastor deve conhecer bem o homem e a cultura de seu
tempo – suas idéias, seus costumes, seus problemas, sua personalidade e sua
psicologia. “O pregador não pode contentar-se em estudar apenas sua Bíblia.
Não deve ser um ‘homem de um livro só’. Tem que ser um leitor insaciável de
informações. Ler jornais, revistas, livros. Quem afirma que o pregador deve
estudar só a Bíblia revela ignorância ou preguiça mental”, complementa.
Denise Terezinha concorda que o caminho para corrigir a deficiência
educacional é a leitura. “Ao ler bastante, tendo acesso a bons livros, ele se
familiariza com a forma de linguagem utilizada e automaticamente passa a
usar, de forma mais adequada, a língua portuguesa, mesmo sem saber a
gramática”, ressalta.
O professor da Universidade Metodista de São Paulo Leonildo Silveira
Campos disse que no protestantismo clássico, o pastor, por mais escolaridade
que tenha, perdeu a capacidade de moldar a linguagem de sua comunidade.
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Segundo ele, quem faz a forma de pensar e de falar das comunidades
protestantes são os meios de comunicação de massa. “Muitos desses meios
estão nas mãos de seus concorrentes (os pastores pentecostais), que não
estão interessados na fala correta e sim na linguagem que comunica bem sua
mensagem às massas”, sinaliza Campos, também autor do livro Teatro,
Templo e Mercado: Organização e Marketing de um Empreendimento
Neopentecostal.
O professor avalia, ainda, que a perda do hábito de ler a Bíblia, tanto nos
cultos ou fora deles, quanto as revistas de Escola Dominical – e até o hábito de
cantar os louvores congregacionais através de transparências nas paredes e
nos telões, em substituição aos hinos nos hinários – contribuem para o uso
indevido da língua portuguesa. Ele chama a atenção para o fato de ser muito
comum, na hora do louvor nas igrejas, o público ler as letras de cânticos com
erros crassos de grafia e concordância.
Já no século 19, segundo ele, existiam duas situações nos púlpitos
brasileiros: a do português precário do missionário americano e a do esforço
que o pregador leigo fazia para acompanhar a forma de falar do pastor
americano.
Campos
reconhece,
entretanto,
que
houve
pastores
que
desenvolveram formas refinadas de falar a língua portuguesa. Um exemplo
citado por ele é o de Eduardo Carlos Pereira, que foi pastor da Igreja
Presbiteriana de São Paulo e se tornou um dos maiores gramáticos da língua
portuguesa na primeira metade do século 20. “Os pregadores leigos, porém,
expressavam a falta de cultura escolarizada no uso da língua. Mesmo assim, o
protestante daquela época, devido ao uso da Bíblia em traduções clássicas
(português clássico) inseria no seu linguajar termos que não eram próprios de
sua classe social. Eram até considerados pedantes pela maioria da população.
Esse protestantismo também desenvolveu uma linguagem própria de uma
subcultura evangélica em um país católico. A linguagem se tornou então quase
que uma gíria protestante. Os seus termos diziam muito para os de dentro da
comunidade
protestante
e
pouco
para
os
demais”,
explana.
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CURIOSIDADES
Os tipos de língua falada se dividem em culta, coloquial, vulgar, regional e
grupal.
Culta: falada por pessoas de instrução. Obedece à gramática da línguapadrão.
Exemplo: “Temos conhecimento de que alguns casos de delinqüência
juvenil no mundo hodierno...”
Coloquial: espontânea, usada para satisfazer as necessidades vitais do
falante sem muita preocupação com as formas lingüísticas. É a língua
cotidiana, que comete pequenos – mas perdoáveis – deslizes gramaticais.
Exemplo: “Cadê o livro que te emprestei? Me devolve em seguida, tá?”
Vulgar: Própria de pessoas sem instrução. É natural, colorida, expressiva,
livre de convenções sociais. Infringe totalmente as convenções gramaticais.
Exemplo: “Nóis ouvimo falá do programa da televisão”.
Regional: Está circunscrita a regiões geográficas, caracterizando-se pelo
acento lingüístico, que é a soma das qualidades físicas do som (altura, timbre,
intensidade).
Exemplo: “A la pucha, tchê! O índio está mais por fora do que cusco em
procissão – o negócio é a tal de comunicação, seu guasca!”
Grupal: Pertence a grupos fechados, como médicos, advogados, jovens,
etc...
Exemplo:
“Aí,
mano,
o
show
de
ontem
tava
irado!”
A HISTÓRIA DO PORTUGUÊS BRASILEIRO
O português é uma língua derivada do latim.
Quando o Brasil foi descoberto pelos portugueses, havia mais de mil
línguas no país, faladas por índios de diversas etnias, segundo o lingüista
Aryon Cabral, do Laboratório de Línguas Indígenas da Universidade de
Brasília. Para estabelecer uma comunicação com os nativos, os portugueses
aprenderam os dialetos e idiomas indígenas.
A partir do tupinambá, falado pelos grupos mais abertos ao contato com os
colonizadores, criou-se uma língua geral entre índios e não-índios. Essa língua
foi a primeira influência exercida sobre o idioma dos portugueses no Brasil.
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Outro contato que influenciou a língua portuguesa na América foi com os
negros que desenvolveram um português crioulo.
A predominância do português começa a se dar a partir da segunda
metade do século 18, com o aumento de imigrantes portugueses.
Em 17 de agosto de 1758, a língua portuguesa torna-se o idioma oficial do
Brasil através do decreto do Marquês de Pombal, que também proíbe o uso da
língua geral. No entanto, os falantes brasileiros já haviam incorporado diversas
palavras de origem indígena e africana em seu vocabulário. Abacaxi, caatinga,
caju, capim, capivara, Parati, são palavras que tiveram origem na língua
indígena.
A influência indígena também acabou propiciando a criação de expressões
idiomáticas, como “andar na pindaíba” e “estar de tocaia”.
As palavras “acarajé” e “vatapá”, por exemplo, são influências dos
africanos.
As diversas variedades regionais da língua existentes no Brasil são resultado
da miscigenação com os imigrantes europeus, como alemães e italianos.
FICHA DE ATIVIDADES:
1. Faça uma redação com o Tema: Obreiro Aprovado.
De acordo com o novo acordo ortográfico:
1. Quais letras passam a fazer parte do alfabeto?
2. Qual acento deixou de existir na língua portuguesa?
3. Cite 8 ditongos abertos que não precisam mais ser acentuados em palavras
paroxítonas.
4. Cite três hiatos que não são acentuados.
5. Quando se usa o hífen? Cite 16 palavras com hífen.
6. Quando não se usa o hífen? Cite 16 palavras que perderam o hífen.
OBS: Esta atividade deve ser entregue para correção.
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