ISSN 1806-7727 Avaliação da infiltração marginal entre uma resina do tipo Flow e um cimento de ionômero de vidro modificado por resina Evaluation of marginal leakage between a flowable composite resin and resin-modified glass ionomer cements Álvaro VOLPATO* Andressa RAYMUNDO* Francisco BUJARDAO* Cleber Machado de SOUZA** Endereço para correspondência: Cleber Machado de Souza Rua Belém, 892 – ap. 1.306 – Cabral Curitiba – PR – CEP 80035-170 E-mail: [email protected] * Alunos de graduação do curso de Odontologia do UnicenP/PR * Professor Adjunto de clínica integrada do UnicenP/PR Recebido em 21/9/05. Aceito em 14/10/05. Palavras-chave: resina composta; infiltração marginal; ionômero de vidro. Resumo O objetivo do presente estudo foi avaliar, in vitro, a infiltração marginal entre uma resina do tipo Flow (Fill Magic Flow®) e um cimento de ionômero de vidro modificado por resina (Vitremer®). Selecionaram-se para este estudo 40 pré-molares humanos extraídos. Os dentes foram randomizadamente separados em dois grupos. Cavidades classe V foram preparadas com margem estendida apicalmente. Todos os dentes foram submetidos à ciclagem térmica com 250 ciclos e, em seguida, à fuscina básica 0,5%, para a análise do grau de infiltração ao longo de todas as paredes do preparo. A pesquisa mostrou que o cimento de ionômero de vidro modificado por resina apresentou os piores resultados (p < 0,05). Abstract The aim of the present study was to evaluate, in vitro, the leakage between a flowable composite resin (Fill Magic Flow®) and resin-modified glass ionomer 40 Volpato et al. – Avaliação da infiltração marginal entre uma resina do tipo Flow e um cimento de ionômero de vidro modificado por resina Keywords: composite resin; leakage; glass ionomer. cements (Vitremer®). Forty extracted human premolars were selected for this study. The teeth were randomly assigned into two groups. Class V cavities were prepared with margin extended apically. All teeth were subjected to thermocycling with 250 cycles. Afterwards, the teeth were submitted to a basic fuccina 0,5% to be analyzed to the infiltration degree throughout the walls of the preparation. The results showed that resinmodified glass ionomer cements present the worst results (p < 0,05). Introdução Inúmeros são os benefícios advindos de uma efetiva união dos materiais restauradores aos tecidos dentários. Entre eles citam-se: o preparo cavitário pode ser mais conservador, e a descoloração marginal é reduzida, bem como a infiltração marginal e o risco de injúrias pulpares [12]. Atualmente, as resinas compostas em conjunto com os adesivos dentinários, cimentos de ionômero de vidro modificados por resina e resinas compostas modificadas do tipo Flow ocupam um lugar de destaque na odontologia, em função das propriedades adesivas que apresentam. Entretanto, se a união ao esmalte é uma prática facilmente obtida e de sucesso, a união à dentina/ cemento é mais difícil e de longevidade ainda questionável [2, 12]. A grande falha das restaurações estéticas continua centrada nas margens cervicais localizadas em dentina ou cemento, em que a adesividade é mais difícil de ser obtida por causa da complexa estrutura dentinária e da contínua exsudação de fluidos advindos da polpa [1]. Outro fator importante é o vedamento das margens cavitárias localizadas em dentina e cemento. A utilização de materiais fotoativados também é comprometida pela contração de polimerização que sofrem [11]. Atualmente, os materiais estéticos constituem a melhor opção para restaurações classe V, mas o grande número de produtos disponíveis no mercado e a sua curta permanência muitas vezes dificultam uma longa avaliação clínica. O objetivo deste trabalho foi avaliar, in vitro, a infiltração marginal entre uma resina do tipo Flow e um cimento de ionômero de vidro modificado por resina. Material e métodos Foram avaliados 40 pré-molares humanos com pelo menos uma face hígida, extraídos e mantidos conservados em solução fisiológica. Os dentes foram separados em dois grupos de forma aleatória. Posteriormente foram realizadas cavidades classe V com margem estendida apicalmente em 1 mm [3] com broca diamantada número 1.013 em spray ar/ água. Para padronização dos preparos, utilizou-se matriz metálica fenestrada como guia, com as seguintes dimensões: 4 mm para a distância mésiodistal, 3 mm para a distância cérvico-oclusal e 2 mm de profundidade [2]. Todas as margens foram terminadas em 90º com a superfície externa. O sistema adesivo usado foi o Prime & Bond 2.1 (DENTSPLY®), aplicado conforme instrução do fabricante. Foram usados os seguintes materiais restauradores: resina do tipo Flow (Fill Magic Flow® – VIGODENT) e cimento de ionômero de vidro modificado por resina (Vitremer® 3M). Todas as restaurações receberam acabamentos imediatos com lâmina de bisturi número 12 (STERELI Med Blade ®) para eliminar excessos grosseiros. O polimento foi executado com discos Sof-Lex ® (3M) após 48 horas, exceto para o Vitremer®, para o qual o fabricante recomenda acabamento imediato. Todos os dentes tiveram seus ápices selados com resina composta fotopolimerizável. Para o isolamento dos dentes, delimitou-se a área ao redor da restauração com 1 mm aquém da interface dente/ restauração, procedendo-se então à pintura deles com esmalte de unha incolor (Riské®, secagem rápida), em três camadas, com intervalos de aplicação até secagem completa [2]. Para verificação da infiltração marginal, os espécimes foram submetidos a um processo de ciclagem térmica com 250 ciclos alternados entre 5 e 70 (+/- 2ºC). O tempo de permanência em cada estágio foi de 1 minuto. Após esse processo os dentes foram mergulhados em solução aquosa de fucsina básica a 0,5% (agente traçador) durante 24 horas a 37ºC. Em seguida os dentes foram lavados, abundantemente, em água corrente por 24 horas. Os dentes foram seccionados no sentido vestíbulo-lingual, através do centro da restauração, utilizando-se disco diamantado e flexível dupla face RSBO v. 2, n. 2, 2005 – para peça de mão (KG Sorensen®). Em um total de 80, cada face resultante era então submetida à análise do grau de infiltração ao longo de todas as paredes do preparo, com auxílio de lupa estereoscópica (40X). Dois examinadores calibrados determinaram os escores baseados no grau de penetração do agente traçador (figura 1) e, em caso de discordância, um consenso era obtido por eles. Graus: 0 – nenhuma penetração do agente traçador; 1 – penetração do agente traçador no início da restauração em esmalte/cemento; 2 – penetração do agente traçador até metade da profundidade da parede cervical da restauração; 3 – penetração do agente traçador até a parede axial; 4 – penetração do agente traçador ao longo da parede axial, em direção à câmara pulpar. 41 Gráfico 1 – Distribuição do número absoluto dos escores de infiltração Discussão Figura 1 – Escores dos graus de infiltração do agente traçador Resultados Após a fase laboratorial da pesquisa, os resultados encontrados foram tabulados e divididos nos grupos estabelecidos de acordo com a escala de infiltração, como mostram a tabela 1 e o gráfico 1. Os resultados mostraram que a resina do tipo Flow foi a que menos apresentou infiltração marginal in vitro nos maiores escores (3 e 4) de infiltração do agente traçador. O cimento de ionômero de vidro modificado por resina apresentou os piores resultados (p < 0,05). Tabela 1 – Resultados gerais nos graus de infiltração. Número e porcentagem das faces envolvidas dentro dos escores A microinfiltração marginal é uma das principais deficiências apresentadas pelas restaurações em resina composta. Como a infiltração marginal é a passagem de fluidos, moléculas ou íons através da interface dente/ restauração, o grau dela é dependente da eficiência do selamento entre o material e a cavidade. O selamento dessa interface está diretamente relacionado com propriedades inerentes ao material, como contração de polimerização e coeficiente de expansão térmica. A resina composta tem sido melhorada em relação a essas propriedades, mas até o presente momento os materiais não permitem a confecção de restaurações perfeitamente adequadas e seladas [13]. Esta pesquisa avaliou dois materiais restauradores. Os resultados mostraram que alguns espécimes não tiveram infiltração marginal na borda da restauração, discordando com o trabalho de Gomes [5], o qual indica que todos os espécimes apresentaram infiltração pelo agente traçador. St. Georges et al. [10] estudaram a microinfiltração em cavidades de classe V em dentes humanos (pré-molares) usando diferentes técnicas de restauração, materiais e tipos de polimerização. Encontraram maior infiltração na região da dentina do que na região de esmalte, independentemente da técnica e do material empregados. Os resultados obtidos neste trabalho discordam dos alcançados por vários autores [4, 6, 7, 8, 9], que consideram melhores os efeitos com a utilização do cimento de ionômero de vidro modificado por resina Vitremer®. 42 Volpato et al. – Avaliação da infiltração marginal entre uma resina do tipo Flow e um cimento de ionômero de vidro modificado por resina Conclusão Os parâmetros avaliados mostram que o cimento de ionômero de vidro modificado por resina Vitremer® apresentou, nesta avaliação, os piores resultados quando comparados com a resina do tipo Flow Fill Magic Flow®. Referências 1. Alberton S B et al. União entre resina composta e cimento de ionômero de vidro. Odonto 10. Caderno Documento 1991; 2(4): p. 290-3. 2. Araújo M A M et al. Avaliação da infiltração marginal na interface resina composta–cimento de ionômero de vidro e deste com a dentina. Rev Odontol UNESP 1995; 24(1): 69-78. 3. Black R. Technique for non-mechanical preparation of cavities and prophylaxis. J Am Dent Assoc 1945; 32: 955-65. 4. Carrara C E. Avaliação da infiltração marginal de dois cimentos de ionômero de vidro híbridos restauradores. [Dissertação – Mestrado]. Bauru: Faculdade de Odontologia de Bauru, Universidade de São Paulo; 1995. p. 74. 5. Gomes O M M. Análise “in vitro” da microinfiltração marginal em cavidades de classe V restauradas com três diferentes sistemas adesivos. [Dissertação – Mestrado]. Araraquara: Faculdade de Odontologia, Universidade Estadual Paulista; 1998. 164 f. 6. Miller M B et al. Effect of restorative materials on microleakage of class II composites. J Esth Dent 1996 May; 8(3): 107-13. 7. Oliveira A H. Avaliação da microinfiltração e da ação anticariogênica em restaurações com resina composta associada a outros materiais. [Tese – Doutorado]. Bauru: Faculdade de Odontologia de Bauru, Universidade de São Paulo; 1999. 135 p. 8. Pin M L G. Avaliação da infiltração marginal em restaurações classe II modificadas, confeccionadas com um cimento de ionômero de vidro convencional, dois cimentos de ionômero modificado por resina e uma resina composta modificada por poliácidos: Estudo in vitro. [Dissertação – Mestrado]. Bauru: Faculdade de Odontologia de Bauru, Universidade de São Paulo; 1979. p. 124. 9. Salles V. Avaliação in vitro da influência de dois adesivos dentinários na infiltração marginal de restaurações realizadas com um cimento de ionômero de vidro modificado por resina e uma resina modificada por poliácidos. [Dissertação – Mestrado]. Bauru: Faculdade de Odontologia de Bauru, Universidade de São Paulo; 1997. p. 108. 10. St Georges A J et al. Microleakage of class V composites using different placement and curing techniques: an in vitro study. Am J Dent 2002 Aug; 15(4): 244-7. 11. Taylor M J, Lynch E. Microleakage. J Dent 1992 Jan/Feb, 20(1): 3-10. 12. Tyas M J. Clinical evaluation of five adhesive systems: three-year results. Int Dent J 1996; 46: 10-4. 13. Vieira R S. Avaliação in vitro da infiltração marginal de restaurações classe II com resina composta fotoativada em molares decíduos. [Tese – Doutorado]. São Paulo: Faculdade de Odontologia, Universidade de São Paulo; 1991. p. 208. ISSN 1806-7727 Análise dos acidentes e complicações em cirurgias de terceiros molares inferiores retidos ocorridos em Curitiba (PR)1 Analysis of accidents and complications in surgical removal of impacted mandibular third molars occurred in Curitiba/PR Fabiano Geronasso SIMÕES* Gustavo Paizani SANTOS** Márcia OLANDOSKI*** Odilon GUARIZA**** Endereço para correspondência: Fabiano Geronasso Simões Rua Nicolau José Gravina, 65 CEP 82010-020 – Curitiba – PR * Acadêmico de Odontologia do Centro Universitário Positivo (UNICENP/PR). Chefe dos acadêmicos do serviço de cirurgia e traumatologia bucomaxilofacial do Hospital Universitário Evangélico de Curitiba (HUEC). ** Acadêmico de Odontologia do Centro Universitário Positivo (UNICENP/PR). *** Licenciada em Matemática (UFPR). Mestre em Estatística (UFRJ). Professora do UNICENP e coordenadora do Núcleo de Bioestatística dos cursos de Mestrado e Doutorado em Medicina da PUC-PR. **** Cirurgião-dentista graduado pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Especialista em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial. Professor Adjunto aposentado pela UFPR. Professor de Cirurgia Bucomaxilofacial do curso de Odontologia da PUCPR. Professor do curso de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial do curso de Odontologia do UNICENP/PR. Membro da Academia Paranaense de Odontologia. Membro Titular Praticante do Colégio Brasileiro de Cirurgia. Recebido em 17/8/05. Aceito em 11/9/05. Palavras-chave: retenção dentária; complicações cirúrgicas; terceiro molar inferior retido. 1 Resumo A retenção dentária, principalmente dos terceiros molares, apresenta-se como um problema de freqüência relevante que atinge indivíduos de todas as camadas sociais. Em termos estatísticos, o maior volume dessas inclusões fica por conta dos terceiros molares, os inferiores com maior incidência que os superiores. Acidentes e/ou complicações são inerentes a qualquer ato cirúrgico bucal. Tendo isso em vista, o objetivo deste trabalho foi analisar os acidentes e as complicações em cirurgias de terceiros molares inferiores retidos, por intermédio de questionário direcionado aos especialistas em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial. Neste estudo foram incluídos 28 cirurgiões-dentistas, cujo tempo médio como especialista em Cirurgia e Trabalho realizado no Centro Universitário Positivo (UNICENP/PR). 44 Simões et al. – Análise dos acidentes e complicações em cirurgias de terceiros molares inferiores retidos ocorridos em Curitiba (PR) Traumatologia Bucomaxilofacial foi de 15,1 anos, com desvio-padrão de 11,8 anos. O tempo mediano foi de 14,5 anos, o menor tempo de especialista observado foi de 1 ano e o maior foi de 47 anos. Considerando-se que o tempo como especialista apresentou grande dispersão entre os pesquisados, os resultados obtidos no estudo em relação às diversas perguntas do questionário foram analisados pelo número de casos por ano. Os resultados alcançados foram 61% de lesões do nervo alveolar inferior, 54% de hemorragia transoperatória e 50% de lesões do nervo lingual. Conclui-se com o presente estudo que o número de acidentes e complicações é baixo, tornando-se ainda menor quando o tempo do cirurgião-dentista na especialidade cresce. Keywords: dental retention; surgical complications; restrained inferior third molars Abstract The dental retention, mainly of the third molar ones, is presented as a problem of relevant frequency that reaches individuals of all the social classes. In statistical terms, the highest volume of these inclusions is for account of the third molar ones, being the inferiors in higher incidence than the superiors. Accidents and/or complications are inherent to any buccal surgical act. In view of this importance, the objective of this work was to analyze the accidents and complications in surgeries of restrained inferior third molars through questionnaire directed to the specialists in Surgery and Bucomaxilofacial Traumatology. In this study 28 dental surgeons, whose average time of specialist in Surgery and Bucomaxilofacial Traumatology was of 15,1 years, with shunting line standard of 11,8 years have been enclosed. The medium time was of 14,5 years, the shortest time of observed specialist was of 1 year and the longest was of 47 years. Considering that the time as specialist presented great dispersion among the searched ones, the results gotten in the study in relation to the several questions of the questionnaire have been analyzed for the number of cases per year. The gotten results have been 61% of injuries of the inferior alveolar nerve, 54% of transoperation hemorrhage and 50% of injuries of the lingual nerve. It is concluded with the present study that the number of accidents and complications is low and getting even lower when the time of the dental surgeon in the specialty grows. Introdução Dentes retidos são aqueles que, chegada a época de sua erupção, não a realizam, seja por razões mecânicas ou patológicas, mantendo ou não comunicação com a cavidade bucal [7]. A retenção dentária, principalmente dos terceiros molares, apresenta-se como um problema de freqüência relevante que atinge indivíduos de todas as camadas sociais [6]. Muitos fatores concorrem para que isso ocorra: o crescimento da caixa craniana em detrimento dos maxilares, a dieta cada vez menos exigente do aparelho estomatognático, a consciência de uma odontologia preventiva, em que o paciente não mais sofre mutilações em seu período de infância e adolescência, adentrando a idade adulta com todos os elementos dentários no arco, gerando falta de espaço etc. [1, 4]. A evolução da cirurgia odontológica, graças aos atuais conhecimentos de técnicas cirúrgicas requintadas, capacita o cirurgião-dentista a intervir com segurança, de modo a reduzir o número de acidentes e complicações. Acidentes e/ou complicações são inerentes a qualquer ato cirúrgico bucal [5]. Mas, apesar desse conhecimento, qualquer descuido ou inobservância de técnica poderá causar acidentes com conseqüências graves para o paciente, bem como as resultantes complicações [2]. Tendo em vista a gravidade e o desconforto das complicações locais e sistêmicas relacionadas à retenção do terceiro molar, a literatura odontológica tem indicado a extração profilática do dente retido. A maioria dos acidentes e complicações na cirurgia de dentes inclusos decorre de erros de avaliação, do mau uso de RSBO v. 2, n. 2, 2005 – instrumentos, da aplicação de força inadequada e de visualização dificultada. Essas intercorrências podem se dar no transoperatório ou no pósoperatório [3]. Material e métodos Após demonstrar os objetivos desta pesquisa por meio de carta, foram solicitados ao presidente Quadro 1 – Questionário 45 do CRO-PR o número de especialistas inscritos em Cirurgia e Traumatologia e seus respectivos dados para contato. Elaborou-se, com base na literatura, um questionário com 29 perguntas sobre os acidentes e as complicações em cirurgia de terceiro molar retido. O questionário (quadro 1) foi entregue em mãos a todos os especialistas da lista fornecida pelo CRO-PR e após o preenchimento foi recolhido. 46 Simões et al. – Análise dos acidentes e complicações em cirurgias de terceiros molares inferiores retidos ocorridos em Curitiba (PR) Os resultados obtidos no estudo foram expressos por médias e desvios-padrão ou por freqüências e percentuais. Para a comparação de dois grupos em relação a variáveis quantitativas, foi usado o teste não-paramétrico de Mann-Whitney. Valores de p < 0,05 indicam significância estatística. Resultados e discussão Neste estudo foram incluídos 28 cirurgiõesdentistas cujo tempo médio como especialista em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial foi de 15,1 anos, com desvio-padrão de 11,8 anos. O tempo mediano foi de 14,5 anos, o menor tempo como especialista observado foi de 1 ano e o maior foi de 47 anos. Considerando-se que esse parâmetro apresentou grande dispersão entre os pesquisados, os resultados obtidos no estudo em relação às diversas perguntas do questionário foram analisados pelo número de casos por ano. Os resultados são apresentados na tabela 1 e na figura 1. Tabela 1 – Resultados descritivos dos acidentes ou complicações em cirurgias – Freqüências e percentuais de cirurgiões-dentistas que relataram ter tido acidentes ou complicações e número de casos por ano entre os relatos (*) A mediana do tempo de duração da parestesia foi de 10 horas, com valor mínimo de 2 horas e valor máximo de 48 horas. Em 64% dos casos foi usada medicação. RSBO v. 2, n. 2, 2005 – 47 Figura 1 – Acidentes ou complicações relatados por pelo menos 35% dos cirurgiões pesquisados Para cada tipo de acidente ou complicação relatada por pelo menos 35% dos cirurgiõesdentistas, investigou-se a associação entre o tempo de experiência como especialista em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial (até 10 anos ou mais de 10 anos) e o número de casos de acidentes ou complicações por ano. Para isso, testou-se a hipótese nula de que o número de casos por ano entre os cirurgiões com até 10 anos de experiência é igual ao número de casos por ano entre os cirurgiões com mais de 10 anos de experiência, versus a hipótese alternativa de resultados de número de casos por ano diferentes. Os resultados são apresentados na tabela 2. Tabela 2 – Número de casos por ano de acidentes ou complicações, de acordo com o tempo de especialista do cirurgião-dentista Os valores de p em negrito indicam os tipos de acidente ou complicação para os quais há diferença significativa entre cirurgiões com até 10 anos como especialista e cirurgiões com mais de 10 anos como especialista. Observando-se os resultados descritivos na tabela 2, percebe-se que, para esses acidentes ou complicações, o número mediano de casos por ano é menor para os cirurgiões com mais de 10 anos como especialista. 48 Simões et al. – Análise dos acidentes e complicações em cirurgias de terceiros molares inferiores retidos ocorridos em Curitiba (PR) Conclusão Pelos resultados obtidos, conclui-se que o número de acidentes e complicações relacionados à cirurgia de terceiros molares retidos é baixo, sendo diretamente proporcional ao tempo de especialidade do cirurgião-dentista. Referências 1. Kruger G O. Cirurgia bucal e maxilofacial. 5. ed. 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Cirurgia de terceiros molares inferiores retidos. RGO 2000 Abr/Maio/Jun; (2): 102-8. ISSN 1806-7727 Os efeitos dos fatores hormonais nos tecidos periodontais The effects of sexual hormone factors in periodontal tissues Maria Dalva de Souza SCHROEDER* Constanza Marin ODEBRECHT** Maurício Colin Barbosa CORDEIRO*** Claudia Gastaldi de M. M. Lopes CORREA**** Endereço para correspondência: Maria Dalva de Souza Schroeder Universidade da Região de Joinville (UNIVILLE) Departamento de Odontologia Campus Universitário, s/n.º – Bom Retiro Joinville – SC – Caixa Postal 246 * Professora da disciplina de Periodontia e Atividades Clínicas do curso de graduação em Odontologia da UNIVILLE. ** Professora da disciplina de Periodontia e Atividades Clínicas do curso de graduação em Odontologia da UNIVILLE. *** Professor da disciplina de Periodontia e Atividades Clínicas do curso de graduação em Odontologia da UNIVILLE. **** Professora da disciplina de Endodontia e Atividades Clínicas do curso de graduação em Odontologia da UNIVILLE. Recebido em 13/10/05. Aceito em 31/10/05. Palavras-chave: gengivite; fatores hormonais; placa bacteriana. Keywords: gingivitis; factors sexual hormones; dental plaque. Resumo Os autores apresentam um caso clínico de gengivite associada à placa bacteriana, provavelmente influenciada por fatores hormonais (puberdade). São abordados no presente relato os aspectos clínicos, bem como o resultado obtido após a realização de tratamento adequado. Abstract The authors present a clinical case of gingivitis associated to dental plaque, probably influenced by sexual hormones (puberty) factors. Clinical aspects, as well as the results after adequate, treatment are approached in the present report. 50 Schroeder et al. – Os efeitos dos fatores hormonais nos tecidos periodontais Introdução A doença periodontal tem sido definida como aquela que apresenta uma série de alterações que afetam as estruturas do periodonto de proteção e sustentação, com características infecciosas dependentes da agressividade dos fatores da placa bacteriana em relação à resposta imunológica do hospedeiro [7, 9]. As doenças periodontais comumente conhecidas são a gengivite e a periodontite. A gengivite é uma doença inflamatória que acomete o periodonto de proteção, enquanto a periodontite resulta na perda de inserção e/ou reabsorção do osso alveolar. Os fatores hormonais são aqueles que atuam sobre o corpo em determinadas fases da vida de um indivíduo, sendo capazes de modificar a resposta dos tecidos à irritação bacteriana, influenciando o progresso, a intensidade e a resposta da doença periodontal ao tratamento. As alterações nos níveis de hormônios durante a puberdade, a gestação e a menopausa podem modificar a resposta do hospedeiro em relação à placa bacteriana, aumentando a intensidade de progressão da doença periodontal [1, 2, 8]. A puberdade é caracterizada por uma série de mudanças fisiológicas no organismo, fase na qual podem ser detectadas algumas alterações transitórias no metabolismo tecidual [7, 11]. A incidência de gengivite alcança seu extremo na puberdade, mesmo que o índice de placa se mantenha o mesmo no indivíduo. Alguns autores demonstraram que o desequilíbrio na secreção de certos hormônios em homens e mulheres na adolescência é um dos fatores que promovem a gengivite na puberdade, podendo iniciar na infância e progredir na adolescência, porém sem resultar na perda de dentes na fase adulta [1, 2, 7, 8]. Entretanto alguns estudos na literatura têm mostrado que a influência da higiene oral na condição gengival durante a puberdade poderia ser mais importante do que o aumento dos níveis de hormônios esteróides [9, 11, 14]. A alta concentração de hormônios sexuais no tecido gengival, saliva e fluido crevicular gengival poderia exacerbar a resposta tecidual, e os hormônios esteróides parecem ser capazes de influenciar a flora bacteriana normal induzindo alterações na flora subgengival, aparecendo comumente a gengivite na puberdade (30%) e na gravidez (75%) [3, 5, 10]. Relato do caso clínico A paciente S. S. M., de 15 anos, compareceu à clínica odontológica da UNIVILLE com sinais e sintomas clinicamente de uma gengivite severa. Feita a anamnese completa, observou-se que o estado geral da paciente era normal. Ela apenas relatou que alguns meses atrás sua gengiva costumava ficar muito vermelha quando menstruava e que procurou o dentista porque esta estava sangrando muito. Feito o exame radiográfico, constatou-se que não havia perdas ósseas, o que mostrava não se tratar de periodontite agressiva. A presença de placa bacteriana e cálculo era generalizada em todos os sítios da boca, indicando que a paciente não tinha um controle eficiente de higiene oral e necessitava de tratamento periodontal e acompanhamento profissional com instrução de técnicas de higiene oral, para que o problema fosse debelado e controlado. A figura 1 apresenta o exame clínico inicial, em que se constatou hiperplasia gengival generalizada com acúmulo de placa bacteriana. Figura 1–Hiperplasia gengival generalizada com acúmulo de placa bacteriana Sinais e sintomas • • • • • Presença de sangramento gengival durante a escovação sem sintomatologia dolorosa; O exame clínico extra-oral apresentava-se normal; O exame clínico intra-oral apresentava hiperplasia gengival generalizada em toda a boca, com pouca presença de cálculo supragengival; O IPV (índice de placa visível) e o ISG (índice de sangramento gengival) estavam alterados em todos os sextantes da boca. No exame radiográfico não foi evidenciada nenhuma alteração óssea. Diagnóstico Doença gengival associada à placa modificada por fatores hormonais (puberdade). RSBO v. 2, n. 2, 2005 – Tratamento realizado • • • • • Terapia periodontal básica; Raspagem supra/subgengival; Alisamento corono-radicular; Aplicação tópica de flúor; Educação em saúde com instrução de higiene oral. Resultados Após tratamento realizado, a paciente retornou em duas semanas, denotando sinais de saúde periodontal. Não foram observados aumento de sangramento gengival e placa visível, e a paciente não apresentava mais hiperplasia gengival generalizada (figura 2). 51 autores [9, 11]. Entretanto essas alterações ocorrem sem haver necessariamente um aumento no acúmulo da placa bacteriana na gengiva [7, 11, 14, 15]. Os desequilíbrios endócrinos sistêmicos produzem importante impacto no equilíbrio periodontal, alterando a resposta do hospedeiro ante a placa bacteriana e na cicatrização da ferida periodontal [2, 3, 6, 7]. A saúde dos tecidos periodontais encontrase intimamente ligada ao equilíbrio entre fatores agressores e protetores do periodonto [1, 4, 9]. A ocorrência da doença gengival e/ou periodontal está relacionada à susceptibilidade do hospedeiro e, na presença de placa bacteriana, poderá exacerbar-se quando associada a fatores ou condições sistêmicas, como as produzidas pelos hormônios sexuais femininos, produzindo um desequilíbrio na homeostasia do periodonto [1, 3, 4, 5, 7, 15]. É importante que o paciente mantenha um excelente controle de placa para reduzir o risco de desenvolver problemas periodontais nessa fase da vida e durante o uso de outros tipos de terapia hormonal que possam alterar o equilíbrio fisiológico da gengiva [1, 6, 11, 12, 13, 15]. Conclusão • Figura 2–Ausência de hiperplasia gengival generalizada Discussão A placa bacteriana e a doença periodontal estão devidamente correlacionadas [10]. A gengivite que se desenvolve durante a puberdade representa um resultado da ação de irritantes locais e da alteração do metabolismo tecidual do periodonto, provocado pelos distúrbios hormonais que ocorrem nesse período. Tais condições contribuem para diminuir a resistência local, favorecendo a ação dos produtos da placa bacteriana [2, 3, 6, 9]. O diagnóstico diferencial com outros tipos de patologias periodontais é importante, para se ter uma diretriz básica no tratamento a ser realizado com controle da placa bacteriana pelo paciente e pelo profissional [1, 9, 12]. O aumento da concentração dos hormônios sexuais femininos na circulação pode desencadear um processo reacional na gengiva, segundo alguns • • Existe uma interação entre os hormônios sexuais e os tecidos periodontais durante a puberdade, exercendo assim um papel importante no estabelecimento e na progressão da gengivite, quando esta for induzida pela placa bacteriana. O diagnóstico diferencial com outras doenças é fundamental para instituir o tratamento adequado. A terapia periodontal básica deverá ser capaz de eliminar a resposta inflamatória, e o controle de manutenção do tratamento será feito por intermédio de instruções de higiene oral eficiente. Referências 1. Axelsson P et al. The effect of various plaque control measures on gingivitis and caries in Scholchildren Community. Comun Dent Oral Epidemiol 1976; 4: 232-9. 2. Carranza F A. Periodontia clínica de Glickman: Prevenção, diagnóstico e tratamento da doença periodontal na prática da odontologia geral. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1986. 52 Schroeder et al. – Os efeitos dos fatores hormonais nos tecidos periodontais 3. Clerehugh V. Periodontal disease in children and adolescents. Dental Update 1991 Jul/Ago; 18(6): 230-4. 10. Morishita M et al. The concentration of salivary steroid. Hormones and the prevalence of gingivitis at puberty. ADV Dent Res 1988 Nov; 2(2): 397-400. 4. De Liefde B. The dental care of pregnant women. NZ Dent J 1984; 80(360): 41-3. 11. Rose L F. Sex hormonal imbatances oral manifestations and dental treatment. In: Genco R et al. Contemporary periodontics. ST. Louis: The CV Mosby Company; 1990. p. 221-7. 5. Hugoson A. Gingival inflammation and female sex hormones. 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ISSN 1806-7727 Retratamento endodôntico de incisivo central inferior com “ilha de dentina” e portador de lesão periapical: relato de caso Endodontic retreatment of inferior central incisor with “dentin island” and periapical lesion: case report Renata Grazziotin SOARES* Luis Eduardo Duarte IRALA** Alexandre Azevedo SALLES*** Orlando LIMONGI**** Endereço para correspondência: Renata Grazziotin Soares Rua Pinheiro Machado, 2.463 – sala 6 – Bairro São Pelegrino Caxias do Sul – RS – CEP 95020-412 E-mail: [email protected] *Aluna do curso de Especialização em Endodontia da Sociedade Brasileira de Cirurgiões-Dentistas SOBRACID/SOBRACURSOS, Porto Alegre (RS). ** Especialista em Dentística Restauradora. Especialista e Mestre em Endodontia. Professor de Endodontia da Universidade Luterana do Brasil/ULBRA, Canoas (RS), e da SOBRACID/SOBRACURSOS, Porto Alegre (RS). *** Especialista e Mestre em Endodontia. Professor de Endodontia da ULBRA, Canoas (RS), e da SOBRACID/SOBRACURSOS, Porto Alegre (RS). **** Especialista, Mestre e Doutor em Endodontia. Professor de Endodontia da ULBRA, Canoas (RS), e da SOBRACID/SOBRACURSOS, Porto Alegre (RS). Recebido em 12/10/05. Aceito em 31/10/05. Palavras-chave: anatomia; retratamento; incisivo. Resumo Na Endodontia é de extrema importância que o profissional tenha conhecimento minucioso da anatomia interna dos dentes, a fim de obter sucesso nos seus tratamentos, evitando acidentes e complicações. No presente trabalho foi apresentado um caso clínico em que havia sido concluída a endodontia de um incisivo central inferior há mais de um ano, no entanto não regrediram os sinais e os sintomas, bem como persistia a imagem radiolúcida indicativa de lesão periapical. Após encaminhamento ao endodontista para retratamento, constatou-se a presença de um segundo canal não tratado. Isso vem a aclarar que a consciência meticulosa da anatomia dos canais radiculares e das suas possíveis variações ajuda sobremaneira o profissional, desde a cirurgia de acesso até a obturação. Soares et al. – Retratamento endodôntico de incisivo central inferior com “ilha de dentina” e portador de lesão periapical: relato de caso 54 Keywords: anatomy; retreatment; incisor. Abstract In endodontics, it’s of extreme importance that the professionals have meticulous knowledge of the teeth inner anatomy, in order to have success in their treatments, avoiding accidents and complications. In this study one clinical case, which had the endodontic treatment of an inferior central incisor finished just about one year, was reported, however, the signs and symptoms hadn’t receded, as well as persisted the radio lucid image indicating the periapical lesion. After forwarding the patient to the endodontist for retreatment, the presence of a second non-treated canal was verified. That comes to clarify that the meticulous conscience of the root anatomy of the canals and of their possible variations is of extreme help for the professional, from the access surgery to the filling. Introdução Para a realização de um tratamento endodôntico correto pressupõe-se o conhecimento da anatomia interna do elemento dental. Executar um tratamento de canal sem a consciência detalhada da anatomia dentária favorece a ocorrência de insucessos (Scaini et al. [10]). Dentes que normalmente são portadores de uma raiz e um canal podem exibir variações nesse número, tornando a terapia de canal mais trabalhosa e, às vezes, levando à ocorrência de acidentes que provocam o fracasso do tratamento (Bramante et al. [2]). O incisivo central inferior é o menor dente da arcada dentária humana. Apresenta uma raiz fortemente achatada no sentido mésio-distal, com sulcos longitudinais em suas faces proximais. Em conseqüência, o canal radicular também é bastante achatado no sentido próximo-proximal, o que lhe confere uma acentuada dimensão vestibulolingual (Soares e Goldberg [12]; Roldi et al. [9]). Em virtude desse grau de achatamento radicular, é comum notarem-se “ilhotas de dentina” ou bifurcações do canal (Picosse [8]). O acentuado achatamento mésio - distal determina a divisão do canal radicular em dois: um vestibular e outro lingual. Na maioria das vezes, esses canais convergem para um único forame apical. Em alguns casos, no entanto, seguem trajetórias independentes e terminam apicalmente em forames separados. Cohen e Burns [3], ao analisarem os incisivos inferiores do sentido proximal, encontraram diversas variações na anatomia do conduto radicular, conforme mostra a figura 1. Figura 1 – Variações na anatomia dos canais de incisivos inferiores. Fotografia do livro Caminhos da polpa (Cohen e Burns [3]) Apesar de suas pequenas dimensões, o canal radicular do incisivo central inferior não oferece dificuldades à realização do tratamento endodôntico, uma vez que é, quase sempre, retilíneo. Todavia, quando da presença de dois canais, os procedimentos operatórios tornam- se mais complicados (Soares e Goldberg [12]). Pécora et al. [6] estudaram a anatomia interna de 300 incisivos centrais inferiores por meio de diafanização e constataram a seguinte porcentagem de distribuição dos tipos de canais encontrados nos incisivos centrais inferiores: 68% para um conduto, 29,67% para um canal que se divide e se une em nível apical, terminando em apenas um forame, e 2,33% para dois canais distintos com dois forames. A técnica da diafanização para estudo da anatomia dos canais dos dentes incisivos inferiores também foi a metodologia empregada por Malvar et al. [5]. Estudaram tanto incisivos centrais como laterais e concluíram que a anatomia interna desse grupo de dentes é complexa, sendo encontradas RSBO v. 2, n. 2, 2005 – altas incidências de dois canais. Além disso, afirmaram que a ocorrência de canais laterais, acessórios e anastomoses é maior nos incisivos centrais do que nos laterais. Já de acordo com Roldi et al. [9], os incisivos centrais inferiores apresentam 100% de chance de ter uma raiz, 73,4% dos dentes apresentam um conduto e 26,6% têm dois canais, incluindo elementos com um e dois forames. Relativamente aos fracassos endodônticos, Bramante e Garcia [1] afirmam que, segundo tem mostrado a literatura, um grande percentual dos insucessos dos tratamentos endodônticos se deve a canais deficientemente obturados. É importante lembrar que a sobrevivência ou não dos microrganismos em um canal radicular está na dependência das medidas de desinfecção empregadas, da escassez de nutrientes, da possibilidade ou não de atingir com a instrumentação as distintas áreas do conduto, do uso de agentes antissépticos e, finalmente, da resistência intrínseca do organismo. Eventuais microrganismos que persistam no canal, após sua obturação, poderão ser reativados, caso ocorra percolação entre o material obturador e a parede do canal, levando nutrientes a eles. Ou seja, durante e após o tratamento endodôntico, problemas inerentes à anatomia do dente e à instrumentação muitas vezes contribuem para a manutenção ou a recidiva de um processo periapical. Canais extranumerários, por exemplo, podem passar despercebidos pelo profissional, que não executará seu tratamento, podendo levar ao aparecimento ou à perpetuação de uma lesão perirradicular (Bramante et al. [2]). A presença de uma lesão em um exame radiográfico não tem muito significado. É fundamental que se analisem, antes de optar por um retratamento, o tempo decorrido do tratamento anterior, o tamanho atual da lesão e os sinais e sintomas. Decidir por um retratamento apenas porque o dente exibe uma área radiolúcida apical, sem considerar esses fatores, pode fazer com que se incorra no erro de realizar uma terapêutica sem necessidade. Indispensável é que, em razão das variações anatômicas canaliculares, diante de um fracasso endodôntico, se verifique se o dente não é portador de dois canais e se certifique de que apenas um deles tenha sido obturado (Bramante e Garcia [1]). Desse modo, a meta do presente trabalho foi relatar o caso clínico de um incisivo central inferior (dente 31) que apresentava lesão periapical, bem como sinais e sintomas persistentes após um ano da conclusão da terapia endodôntica; quando do retratamento, observou-se a presença de um segundo canal não tratado. 55 Caso clínico A endodontia do dente 31 havia sido concluída há mais de um ano, porém o paciente apresentava fístula (figura 2), dor à palpação na mucosa da região apical e imagem radiográfica compatível com lesão periapical (figura 3). Figura 2 – Aspecto clínico Figura 3 – Radiografia de diagnóstico Após encaminhamento ao endodontista para retratamento, constatou-se a presença de um segundo canal não tratado que se dividia em sua parte mais larga – em decorrência de uma “ilha de dentina” – e se unia novamente, terminando em um forame apical. A radiografia de confirmação da odontometria (figura 4) após a desobturação mostra a presença da “ilha de dentina” no terço médio da raiz. Figura 4 – Confirmação da odontometria após desobturação Soares et al. – Retratamento endodôntico de incisivo central inferior com “ilha de dentina” e portador de lesão periapical: relato de caso 56 Confirmada a presença de dois canais, a abertura coronária deve ser ampliada para possibilitar a máxima liberdade do instrumento na direção vestibulolingual (Cohen e Burns [3]). O instrumento, ao ser inserido no canal, deve ter sua ponta encurvada e voltada para o lado lingual, onde geralmente se encontra o canal extranumerário (Bramante e Garcia [1]). Os passos da cirurgia de acesso para os incisivos inferiores são esquematizados no desenho (figura 5), segundo Pécora et al. [7]. Em razão da existência do canal lingual no dente 31, a abertura foi ampliada (figura 6). Figura 7 – Limas memórias posicionadas nos condutos O hidróxido de cálcio (nome comercial: Calen®) foi empregado como curativo de demora e permaneceu por 7 dias, com a intenção de contribuir para a máxima redução da microbiota endodôntica, conforme a figura 8 (Siqueira Jr. et al. [11]). Figura 5 – Passos da cirurgia de acesso para incisivos inferiores, conforme Pécora et al. [7] Figura 8 – Fase de medicação intracanal com hidróxido de cálcio Após esse período, havendo regressão da fístula e da sintomatologia, procedeu-se à obturação dos canais com o cimento endodôntico Sealer 26 ® (figura 9). Figura 6 – Abertura coronária ampliada Após a desobturação, a instrumentação dos dois canais foi feita pela técnica coroa-ápice sem pressão (Soares e Goldberg [12]), auxiliada pela irrigação com hipoclorito de sódio a 2,5% associado ao EDTA (Siqueira Jr. et al. [11]; Lopes et al. [4]). A modelagem do batente apical foi feita até o instrumento de calibre 25 no canal vestibular e até o instrumento de calibre 30 no conduto lingual. A fotografia (figura 7) mostra as referidas limas memórias posicionadas nos canais. Figura 9 – Obturação dos canais Referências Considerações finais 1 Segundo Bramante e Berbert (apud Bramante e Garcia [1]), alguns sinais radiográficos podem levar à suspeita da presença de canais extras, tais como: descentralização da imagem radiolúcida representativa do canal radicular; estreitamento abrupto da imagem do canal em um dos níveis da raiz; dificuldade de visualização da imagem do canal em toda a sua extensão. No entanto, em casos indicados para retratamento, essa constatação fica difícil, por causa da presença de material obturador no conduto radicular tratado. Scaini et al. [10] deixam claro que nem sempre uma tomada radiográfica será suficiente para a detecção das variações morfológicas, em função da sobreposição de imagens. As radiografias deverão ser feitas com uma incidência mésio ou distorradial (Bramante et al. [2]). No que tange à cirurgia de acesso, a eliminação do ombro lingual constitui o desgaste compensatório nos incisivos inferiores. Ainda pode ser necessária a remoção do esmalte na base do triângulo que fica para incisal, proporcionando um acesso reto e liberando o instrumento para trabalhar de forma correta em todas as paredes do canal radicular. Nesses desgastes podem ser utilizadas as brocas Endo Z ou pontas diamantadas cilíndrico-cônicas, tal como foi empregado no caso clínico exposto. O desgaste compensatório adicional no sentido cervicoincisal é imperioso para facilitar a localização e o preparo dos canais vestibular e lingual (Roldi et al. [9]). Embora seja possível obter uma redução considerável no número de células bacterianas da luz do canal principal pelo efeito químico-mecânico da instrumentação e da irrigação, microrganismos podem permanecer viáveis em regiões inacessíveis a estes. Um medicamento intracanal dotado de atividade antimicrobiana, no caso o hidróxido de cálcio, por permanecer mais tempo no interior do canal radicular, tem maiores chances de atingir áreas não afetadas pela instrumentação (Siqueira Jr. et al. [11]). O conhecimento das variações anatômicas dos canais radiculares ajuda sobremaneira o profissional, desde a cirurgia de acesso até a obturação, e é uma rota segura para obter muito sucesso nesses procedimentos e evitar situações desagradáveis (Pécora et al. [7]). 1 1. Bramante C M, Garcia R B. Quando falha o tratamento endodôntico, quais são as alternativas terapêuticas. In: Cardoso R J A, Gonçalves E A N. Endodontia e trauma. São Paulo: Artes Médicas; 2002. cap. 16, p. 323-68. 2. Bramante C M, Garcia R B, Berbert A. Acidentes e complicações de causas não iatrogênicas. In: Bramante C M, Berbert A, Bernardineli N, Moraes I G, Garcia R B. Acidentes e complicações no tratamento endodôntico: Soluções clínicas. São Paulo: Santos; 2003. cap. 9, p. 169-202. 3. Cohen S, Burns R C. Caminhos da polpa. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2000. cap. 7. 4. Lopes H P, Siqueira Jr. J F, Elias C N. Substâncias químicas empregadas no preparo dos canais radiculares. In: Lopes H P, Siqueira Jr. J F. Endodontia biologia e técnica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2004. cap. 18, p. 535-79. 5. Malvar M F G, Gomes M R, Pereira M R S. Estudo da anatomia interna dos incisivos inferiores através da diafanização. JBE 2002 Jul/Set; 3(10): 202-7. 6. Pécora J D, Murgel C A F, Savioli R N. Estudo da incidência de dois canais nos incisivos inferiores. Rev Bras Odontol 1990; 47(4). 7. Pécora J D, Savioli R N, Vansan L P. Endodoncia [serial online] 2004 Nov 3. Available from: http:// www.forp.usp/restauradora/anat.htm. 8. Picosse M. Anatomia dentária. 4. ed. São Paulo: Sarvier; 1990. 9. Roldi A, Pereira R S, Azeredo R A. Anatomia interna, cavidade de acesso e localização dos canais. In: Lopes H P, Siqueira Jr. J F. Endodontia biologia e técnica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2004. cap. 5, p. 121-42. 10. Scaini F, Braga F L, Figueiredo Júnior I C, Ferreira R B, Baratto Filho F, Sousa Neto M D. Condições atípicas da anatomia de canais radiculares em pré-molares inferiores. RSBO 2005 Maio; 2(1): 39-43. 11. Siqueira Jr. J F, Rôças I N, Lopes H P. Tratamento de dentes despolpados (necropulpectomia). In: Lopes H P, Siqueira Jr. J F. Endodontia biologia e técnica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2004. cap. 12, p. 289-306. 12. Soares I J, Goldberg F. Endodontia técnica e fundamentos. Porto Alegre: Artmed; 2002. cap. 4, p. 41-55. Bramante C M, Berbert A. Recursos radiográficos no diagnóstico e no tratamento endodôntico. 2. ed. São Paulo: Pancast; 1997. NORMAS PARA PUBLICAÇÃO A Revista Sul-Brasileira de Odontologia – RSBO –, dirigida à classe odontológica, destina-se à publicação de artigos científicos originais, resumos de teses e dissertações, relatos de casos clínicos e de revisões de literatura. Estas normas baseiam-se no Uniform Requirements for Manuscripts Submitted to Biomedical Journals (The Vancouver style). Os artigos devem ser encaminhados ao editor da revista, de preferência por Sedex ou carta registrada, no seguinte endereço: Revista Sul-Brasileira de Odontologia – RSBO Ao Editor da RSBO Departamento de Odontologia da UNIVILLE Campus Universitário – Bom Retiro CEP 89201-972 – Joinville – SC E-mail: [email protected] 1– Normas gerais 1.1 – A Revista Sul-Brasileira de Odontologia tem publicação semestral, e a divulgação dos artigos é feita em português ou inglês. 1.2 – Os artigos enviados para publicação devem ser originais, não sendo permitida a sua apresentação simultânea em outro periódico (meio impresso e/ou eletrônico). A revista terá direitos autorais reservados sobre o trabalho publicado, em português ou inglês, e é permitida a sua reprodução ou transcrição com a devida citação da fonte. 1.3 – Os trabalhos que envolvam seres humanos, incluindo órgãos (dentes) e/ou tecidos isoladamente, bem como prontuários clínicos ou resultados de exames clínicos, deverão estar de acordo com a resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde e seus complementos e ter sido aprovados pelo Comitê de Ética da Instituição. É necessário enviar uma cópia da aprovação do Comitê de Ética e anexar o número do protocolo na seção “material e métodos”. 1.4 – Os trabalhos deverão ser enviados em três vias: uma em DISQUETE (ou CD) e duas cópias impressas, acompanhadas cada uma das respectivas figuras. Recomenda-se que os autores retenham uma cópia em seu poder. 1.5 – Todos os autores deverão assinar uma Declaração de Responsabilidade Pública pelo conteúdo. 2 – Apresentação dos artigos 2.1 – Os trabalhos devem ser apresentados em folhas de papel tamanho A4, corpo 12 pontos, Times New Roman, com espaço duplo, margens laterais de 3 cm e margens superior e inferior com 2,5 cm, com no máximo 20 (vinte) laudas (incluindo as figuras), com 25 (vinte e cinco) linhas cada. Os trabalhos deverão ser digitados (Word 6.0 ou versão superior) e entregues também em disquete (ou CD), devidamente identificado. 2.2 – Tabelas e quadros deverão ser numerados em algarismos romanos, com apresentação resumida e objetiva, para compreensão do trabalho. 2.3 – Figuras (desenhos, fotografias e gráficos) deverão ser numeradas em algarismos arábicos. Imagens deverão ser apresentadas como fotografias ou arquivos digitais identificados e em preto e branco. As figuras também deverão ser entregues nas cópias impressas. As figuras, tabelas e gráficos e suas legendas deverão estar inseridas no próprio texto. Radiografias poderão ser enviadas digitalizadas, desde que apresentem boa qualidade de imagem. 2.4 – A numeração de páginas deve constar no canto inferior direito, sem contar a página de rosto. 3 – Estrutura do trabalho 3.1 – Abertura • Título do trabalho: em português e em inglês – corpo 14 pontos, letras maiúsculas. • Nome do(s) autor(es): nome completo, e no final asteriscos indicativos das notas de rodapé. Exemplo: Érica Lopes FERREIRA*. • Enviar endereço do autor principal para correspondência, bem como e-mail. • Notas de rodapé: principal titulação dos autores, bem como a instituição de origem. Exemplo: Luiz Fernando FARINIUK*. Na nota de rodapé: *Professor adjunto da PUC/PR, Doutor em Endodontia. • Resumo: Deve indicar resumidamente o que foi feito, em um só parágrafo. • Palavras-chave: 3 a 5 expressões que identifiquem o conteúdo do trabalho. • Abstract: resumo em inglês. • Keywords: palavras-chave em inglês. • Artigos em inglês também devem conter um resumo e palavraschave em português. 3.2 – Texto • Devem constar introdução, material e métodos, resultados, discussão, conclusão, referências bibliográficas. • Os nomes de medicamentos e materiais registrados, bem como de produtos comerciais, devem aparecer entre parênteses, após a citação do material, e somente uma vez (na primeira). 3.3 – Referências: • As referências devem ser listadas em ordem alfabética de nomes, com letras minúsculas numeradas em ordem crescente. • A menção das referências no texto deve ser feita entre colchetes e numerada de acordo com a lista de referências (podendo ser acrescida dos nomes dos autores e data de publicação). Se houver dois autores, devem-se citar ambos no texto, separados pela conjunção “e”. Se houver mais de dois autores, citar o primeiro autor seguido da expressão et al. • Já na listagem das referências, quando houver mais de seis (6) autores deve-se acrescentar et al. • Periódicos: Wilcox L R. Thermafill retreatment with and without chloroform solvent. J Endod 1993 Feb; 19 (4): 563-6. Wilcox L R, Juhlin J J. Endodontic retreatment of Thermafill versus laterally condensed gutta-percha. J Endod 1994 Jul; 20 (6): 115-7. Baratto-Filho F, Ferreira E L, Fariniuk L F. Efficiency of the 0.04 taper ProFile during the re-treatment of gutta-percha-filled root canals. Int Endod J 2002 Ago; 35 (8): 651-4. • Livros: Soares I J, Goldberg F. Endodontia técnica e fundamentos. Porto Alegre: Artmed; 2001. p. 201-5. • Capítulos de livros: Valle L L, Costa Filho A S. Tratamento endodôntico em dentes com rizogênese incompleta. In: Berger C R. Endodontia. Rio de Janeiro: Publicações Científicas, 1989, p. 199-209. • Teses: Baratto Filho F. Estudo “in vitro” da capacidade de limpeza do canal radicular com achatamento através de instrumentação rotatória e com irrigação com hipoclorito de sódio em três diferentes concentrações – Análise histológica. [Dissertação – Mestrado]. Ribeirão Preto: Universidade de Ribeirão Preto; 2002. • Obras da internet: Morse S S. Factors in the emergence of infectious diseases. Emerg Infect Dis [serial online] 1995 Jan-Mar [cited 1996 Jun 5]; 1(1): [24 screens]. Available from: URL:http://www.cdc.gov/ncidod/EID/eid.htm.