Eu - Quem é esse cara? A ciência desvendou de átomos a

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Eu - Quem é esse cara?
A ciência desvendou de átomos a buracos negros, mas o maior mistério de todos continua onde sempre
esteve: na sua cabeça. Afinal, o que é a consciência?
Rodrigo Resende e Alexandre Versignassi
Sabe aquela pessoa que sempre morou na sua cabeça e que você apelidou de “eu”? Então, imagine que
um dia exista uma máquina que faça cópias perfeitas de você, com a sua cara, seu cérebro, suas
memórias. Tudo. Será que a sua consciência vai parar lá também? Ou sua cópia ganha outro “eu”? Se
você não conseguiu responder, fique tranqüilo: nada é mais misterioso que esse cidadão aí dentro. Uma
prova disso é o grande número de teorias que tentam explicar o que é a consciência. Muitas delas vão
bem fundo no problema, mas batem de cabeça umas com as outras. Uns acham que ela nem existe.
Outros, que está em todo lugar. Muitas perguntas continuam sem resposta – e, como você pode ver nas
colunas ao lado, nunca vão ter. Mas não faltam argumentos que nos deixem pelo menos mais perto de
esclarecer o mistério. Prepare-se para conhecer esse “eu” que mora em você.
Você, por você mesmo
Afinal, o que é a consciência? Foi esse o problema enfrentado pelo lingüista Ray Jackendoff, do Instituto
de Tecnologia de Massachusetts e pelo filósofo Ned Block, da Universidade de Nova York. Eles
chegaram a dois significados fundamentais.
Em primeiro lugar, consciência é o conhecimento que você tem de você mesmo. Nossa cabeça consegue
formar ótimos bancos de dados sobre tudo o que você vê e sente, certo? Lá estão informações sobre
todo mundo que você conhece. Então não seria nem um pouco surpreendente ela ter formado uma ficha
sobre você mesmo, uma que você compila na memória desde os primeiros anos de vida. Nesse sentido,
a consciência é um modelo interno do mundo com um “eu” inserido. “O acesso a informações sobre esse
„eu‟ é fácil de reproduzir. Um robô que possa se reconhecer num espelho não seria mais difícil de
construir do que um capaz de reconhecer qualquer outra coisa”, diz o neurocientista Steven Pinker, da
Universidade de Harvard, EUA, em seu livro Como a Mente Funciona.
Outra parte é a forma com que o cérebro acessa a infinidade de infomações que tem lá dentro. Numa
conversa, por exemplo, você pode falar do filme de ontem, de alguém que está passando na sua frente,
da chuva. Mas não tem como discorrer sobre a velocidade com que seu sangue está correndo agora ou o
jeito como enzimas estão sendo secretadas pelo seu estômago. Tudo o que você vê e boa parte do
conteúdo da sua memória são o que sua cabeça pode acessar. O resto fica “escondido” no seu cérebro.
Isso mostra que o sistema nervoso divide claramente o que vai e o que não vai para a consciência. Então
a gente fica com um outro jeito de definir o “eu”: ele é tudo a que você pode ter acesso pela sua cabeça
na hora. Ou, mais exatamente, tudo o que você precisa pensar para falar e fazer. Nesse processo,
informações da parte consciente às vezes são escondidas. Quando você está aprendendo a dirigir, por
exemplo, precisa pensar para trocar as marchas do carro. Operar o câmbio é uma preocupação que faz
parte da consciência do motorista de primeira viagem. Depois de alguma experiência, a troca de marchas
vira uma coisa automática, tão inconsciente quanto a respiração e o trabalho das enzimas do estômago.
E o “eu” fica liberado para matutar sobre o filme, os passantes, a chuva.
Essas definições explicam alguma coisa, mas deixa muita coisa de fora. Não explica questões que
parecem simples, mas que são impossíveis de responder, do tipo: como é ser um besouro, como seria
estar morto, ou qual o sentido do “eu”. E aí entram as teorias que mergulham fundo para resolver esses
problemões. Bem fundo, até a parte irracional da nossa mente.
Você, pela sua emoção
Lembra do que acontece quando você toma um susto? Primeiro vem uma espécie de chacoalhão no seu
corpo, depois um salto meio inconsciente e aí a sensação de medo. E não há nada que você possa fazer
para evitar essa reação em cadeia. Aliás, para ser bem sincero, não existe nem um “você” presente
nesse processo todo. A consciência de que o susto aconteceu só vem depois dele. E talvez não seja à
toa. Segundo um dos neurologistas mais respeitados do mundo, o português António Damásio, da
Universidade de Iowa, EUA, o processo que te levou a perceber o susto reproduz a história evolutiva da
mente, na qual a consciência é o último passo de todo o processo.
A primeira forma de pensamento que existiu não vinha com o “eu” no pacote. Era só emoção. Para
Damásio, a emoção é uma imagem mental formada por várias coisas ao mesmo tempo, tipo a dilatação
da pupila, a descarga de adrenalina e a tensão muscular que acontecem na hora do susto. Quando a
mente processa tudo isso junto e vê que tem algum perigo por perto, faz você dar um salto, por exemplo.
Isso foi essencial para os animais primitivos na luta pela sobrevivência, já que permitiu reagir
automaticamente a ameaças.
Com o tempo, o cérebro aprendeu a lidar melhor com a tal emoção, criando um “eu” para administrá-la.
Que vantagem isso dá? Simples: imagine que você sempre tome um baita susto toda vez que vê uma
barata. E que comece a trabalhar num lugar infestado delas. Em vez de você passar a dia inteiro cheio de
adrenalina e com a musculatura tensa, gastando um monte de energia à toa, você usa a consciência e se
pergunta: “Por que eu tenho medo de barata?” E tenta arranjar um jeito de se livrar desse medo.
Mas por que não é fácil controlar o medo e outros sentimentos que só atrapalham a sua vida?
Exatamente porque a consciência é só a ponta do iceberg desse conjunto de reações irracionais e
automáticas que deu origem à mente. Para Damásio, a emoção e o sentimento compõem o grosso da
mente, e não o pensamento, a razão.
Essa teoria dá uma boa idéia da origem da consciência. Afinal, ela é útil para o controle das emoções, e
acaba ajudando na sobrevivência. Mas por que tem de existir um “alguém” aí dentro de você? Não daria
para a mente trabalhar no piloto automático? Alguns acham que é isso mesmo que ela faz, que não mora
ninguém dentro da sua cabeça.
Você, robô
Você já leu esta linha. E esta também. Faz meio segundo que o seu cérebro processou cada uma dessas
letras que você está lendo agora. Ele faz todo o trabalho antes que você tenha consciência do que está
acontecendo, sem perguntar nada. Sempre foi assim: todas as decisões da sua vida foram tomadas sem
que você fosse consultado. Todas. Se neste momento você resolver jogar esta revista pela janela, saiba
que seu cérebro já ordenou que você fizesse isso sem que a parte consciente da sua cabeça se desse
conta.
Essa é uma possibilidade aberta por pesquisas sobre o funcionamento do cérebro feitas pelo
neurocientista norte-americano Benjamin Libet, da Universidade da Califórnia, EUA. Entender o
experimento dele é fácil: levante seu braço agora mesmo. Levantou? Pois Libet concluiu que o impulso
que seu cérebro acabou de enviar para erguer o seu braço partiu um pouco antes de você ter decido
levantá-lo. Você, o legítimo dono do membro, pode não passar de um figurante nesse processo.
Mas espera um pouco. Se realmente não temos domínio sobre nossas ações, somos o que, então? Sinto
lhe dizer, mas, segundo Richard Dawkins, professor da Universidade de Oxford, Inglaterra, e um dos
papas da biologia moderna, você não passa de um robô, “ainda que um bem complexo”.
Essa posição tão simpática vem de uma idéia genial: a de que somos “máquinas de sobrevivência” dos
nossos genes. “Máquinas” porque eles usam nossos corpos para se reproduzir e depois vão embora. Por
essa visão, quem já teve o trabalho de arrumar parceiros sexuais e criar filhos pode morrer tranqüilo por
ter cumprido sua missão: ajudar suas moléculas de DNA a continuar sobre a Terra. E mais nada. Bom, se
os genes são os chefes dos nossos corpos, quem manda na nossa mente, nas nossas idéias? Para
Dawkins, a diretoria aí não é formada exatamente pelo genes, mas pelos memes – pelo menos esse é o
nome que o inglês inventou.
Um meme é basicamente uma idéia, um conceito qualquer. Mas, note bem, eles têm vida própria. E estão
na Terra com um objetivo único: se espalhar, igual os genes fazem. Quer ver um meme agora mesmo?
Então pense em alguma música do Balão Mágico – ou em qualquer uma que você gostava quando era
pequeno, claro. Se ela começa a tocar sozinha na sua cabeça, é que você está testemunhando um
meme em ação. Se você resolver cantar a música e alguém que estiver do seu lado ficar com ela na
cabeça, você está vendo um meme se reproduzir, passar de um corpo para outro. Como se fosse um
gene!
Essa lógica serve para tudo no mundo. Um filósofo, do ponto de vista “memético”, é o meio que uma
biblioteca tem de produzir outras bibliotecas. E por aí vai. Vivemos numa “memosfera” carregada de
idéias que lutam para se reproduzir.
E em que lugar uma idéia tem melhores condições de procriar? Num cérebro humano. É ele quem tem o
trabalho de espalhar idéias por aí, não é? Cérebros são o paraíso dos memes. Um conceito que esteja
em várias cabeças, entrando por muitas orelhas e saindo por muitas bocas, fica com chances melhores
de crescer e de se reproduzir no “mundo das idéias”. Para Dawkins, então, a mente é um emaranhado de
memes em busca de um lugar ao Sol. E você, o dono do cérebro, não tem nada a ver com isso. A briga
para ver o que se passa na sua cabeça é entre eles, caro robô.
Se você achou isso difícil de engolir, não é o único. O filósofo Daniel Dennett, do Centro de Cognição da
Universidade Tufts, nos EUA, também achou. Mas é uma idéia que se encaixa tão bem em outras teorias
da biologia que até ele acabou engolindo. E criou uma explicação da consciência baseada nos memes.
Para ele, o nosso cérebro é um emaranhado quase infinito de memes que estão agora mesmo no seu
inconsciente. O que eles fazem é ficar brigando uns com os outros lá no escuro até que um ganha
vantagens sobre os outros e consegue “ver a luz”. Quer dizer: ele emerge na sua cabeça em forma de
uma idéia consciente, pronta para sair da sua boca e se reproduzir em outras cabeças.
O modelo de Dennett é bastante complexo, mas tem uma essência simples. Para ele, o cérebro tem
dificuldade em lidar com o turbilhão de idéias que moram lá. Então a consciência não seria exatamente
um meme qualquer que pula para fora, mas uma “máquina virtual” criada para controlar o jorro de idéias,
uma espécie de “filtro” dos memes que estão enterrados em sua cabeça. E o nome que você dá para
essa máquina, enfim, é “eu”, amigo robô.
A conclusão, mais uma vez pouco animadora, é que a sua consciência não passa de ilusão. O que você
chama de “eu”, na verdade, é uma estratégia dos milhões de memes para se regularem. Tudo certo
então? Claro que não. Uma teoria da consciência pelo menos tão instigante quanto essa fala exatamente
o contrário. Vamos lá.
Você, em todo lugar
Se você está preocupado com a possibilidade de ser apenas um robô sem controle sobre si mesmo,
chame o neurocientista e filósofo David Chalmers, da Universidade do Arizona. Para ele, esse tipo de
argumento é coisa de gente preguiçosa. “A maneira mais fácil de desenvolver uma teoria da consciência
é negar que ela existe”, afirma ele em seu livro The Conscious Mind (“A Mente Consciente”, inédito em
português). Chalmers, você vê, acredita que a consciência não seja só uma ilusão e bate de frente com
Dennett, seu mais ferrenho rival acadêmico.
Pense bem, a consciência é um fenômeno bastante poderoso, mas que ninguém sabe muito bem onde
está. Mesmo sendo o centro da existência de todo mundo, nenhum cientista conseguiu matar a charada e
dizer de onde ela surge, ou sequer afirmar com certeza quais seres têm ou não consciência.
Um jeito científico de tentar detectá-la é colocar animais na frente de um espelho para ver se eles
conseguem se reconhecer. Por esse critério, bebês humanos de um ano não têm consciência. E os
únicos animais conscientes seriam os gorilas, orangotangos, chimpanzés (só no auge da fase adulta) e,
segundo experimentos menos ortodoxos, pombos. Nem precisa dizer que são resultados nada
satisfatórios. Mas por enquanto não dá para ir mais longe.
Para Chalmers, ninguém conseguiu achar a resposta por um motivo bem simples: ela estava embaixo do
nariz de todo mundo. A consciência para ele é uma propriedade das coisas. De qualquer coisa: de um
ganhador do Nobel a um caixote, tudo tem consciência.
Se, a essa altura, você já está segurando o seu chapéu e achando isso tudo um absurdo, pense de novo
na idéia. Largue o seu chapéu e tente responder: por que essa benção, essa força tão poderosa, só
apareceria no cérebro humano? Não parece muita pretensão nossa? É por isso que, para Chalmers, ela
pode, sim, estar em tudo: seja numa pedra, num pedaço de papel ou numa estrela. O motivo pelo qual
você nunca percebeu essa habilidade neles é que existem diferente graus de consciência. Para ele,
quanto mais complexa for a atividade de uma coisa, quanto maior for o número de diferentes
“experiências” que ela vivencia – em outras palavras, quanto mais complexo for o objeto – maior sua
“quantidade” de consciência. Um cérebro experimenta bilhões de impulsos elétricos por segundo. É a
coisa mais frenética do Universo conhecido. Então ele tem um grau alto de consciência. Já uma pedra
não passa por muitas emoções ao longo da vida. A única coisa que ela faz é esfarelar com o tempo, bem
devagarinho. Então seu grau de consciência seria minúsculo. Uma estrela, digamos, é grande e agitada
por dentro, mas não faz nada de complexo: é só uma bolona que gera energia fundindo hidrogênio, uma
rotina bastante tediosa. Então seu grau de consciência não seria lá essas coisas.
Por esse ponto de vista, a consciência é nada mais que uma propriedade do mundo físico, como a massa
e a velocidade. Do mesmo jeito que uma coisa pode ser mais rápida ou mais pesada, ela também pode
ser mais consciente que outra.
Mas a teoria não faz sentido para todo mundo. Na verdade, Daniel Dennet, o arquiinimigo de Chalmers,
acha tudo isso tão absurdo que se preocupa basicamente em tirar sarro da teoria. Ele propõe a seguinte
cena: um bebê brincando com um filhote de cachorro. O que os dois têm em comum? São fofos. E muito.
Assim como a consciência, a fofura é uma força poderosa, que pode estar em qualquer lugar e que é
bem difícil de conceitualizar (tente, por exemplo, explicar o que é fofura sem usar os dedos. Difícil, não?)
“Já que é assim, por que não considerar a fofura uma propriedade fundamental da matéria?”, disse o rival
Dennett em um artigo recente.
O problema é que não existem meios de provar nem a teoria de um, nem a do outro. A biologia fica de
mãos atadas na hora de debater a consciência. Mas a física talvez não.
Você, atômico
A gente pensa num cérebro como se fosse um grande computador. É até natural. Afinal, os dois têm
memória, processam informações e travam de vez em quando. Além disso, a estrutura do cérebro, com
bilhões de neurônios, axônios e sinapses, lembra o emaranhado de fios e transistores que temos nas
nossas máquinas. E existe um sinal elétrico correndo lá dentro, seja na máquina seja na cabeça.
Mas existe uma coisa que os cérebros manjam e que computador nenhum consegue fazer: abstrações.
Uma partida de xadrez, por exemplo, tem um número absurdo de caminhos diferentes. O que um
computador faz na hora de jogar? Tenta um número enorme de jogadas até achar uma que tenha boas
chances de sucesso. Já você, antes de cada lance, pensa só nas três ou quatro jogadas mais sensatas.
Mesmo sem perceber, você de alguma forma conseguiu tirar um sentido do jogo e agir de acordo com
alguma lógica – algo que fios, transistores e eletricidade não conseguem fazer sozinhos.
Outro ponto em que somos bem diferentes das máquinas é que nós nunca pensamos em apenas uma
informação por vez. Você pode até estar aqui processando as informações desse texto, mas ao mesmo
tempo está ligando essas idéias ao cheiro que você está sentindo, às memórias do que você fez nos
últimos tempos, à sensação do lugar em que você está e aos barulhos que está ouvindo. Cada momento
que você vive é processado ao mesmo tempo por vários neurônios, em diferentes partes do cérebro. É
como se o mesmo sinal passasse por vários processadores intimamente ligados, como se todos fossem
um só.
E é claro que um computador não consegue fazer uma reprodução exata disso. Mas por que não? Para
responder essa pergunta, o matemático Roger Penrose, da Universidade de Oxford, Inglaterra, buscou
inspiração em um mundo quase tão estranho quanto nosso cérebro: o da física quântica, que descreve o
comportamento das coisas ultramicroscópicas. Lembre-se do que acabamos de dizer sobre o cérebro: é
uma máquina que processa informações como se elas estivessem em vários lugares ao mesmo e que, de
alguma forma, consegue extrair uma força maior, um sentido de tudo isso. É algo que poderia ser
comparado a um elétron, por exemplo. Ele nunca está em um lugar definido. É como se estivesse sempre
indeciso sobre onde ficar e, enquanto não “resolve”, se mantém em vários lugares ao mesmo tempo. E,
de alguma forma, é dessas interações que saem as leis da física com as quais lidamos no dia-a-dia.
As estranhezas da física quântica não param por aí. As partículas podem se comportar como pequenos
bonecos de vudu. Exatamente: se você “espetar” uma aqui, outra “sente a dor” em outro lugar, não
importa a distância que separe as duas. Bizarro, não?
O mesmo aconteceria no cérebro. Dentro da sua cabeça, tudo o que você sente e pensa está espalhado
em áreas distantes. O que você vê agora é processado perto da sua nuca e as coisas de que você
lembra ficam no meio do cérebro.
Para Penrose, então, os sinais que os neurônios transmitem poderiam ficar em vários lugares ao mesmo
tempo, que nem os elétrons dos experimentos quânticos, por uma fração de segundo. A junção dessas
pequenas flutuações resultaria no jeito como você e eu sentimos a cor azul e a sensação de segurar esse
papel simultaneamente. Em suma, ela formaria a sensação do “eu”.
O problema é que nenhum desses argumentos fez a idéia de Sir Penrose ganhar crédito. Uns contestam
a matemática da teoria. Outros falam que os fenômenos quânticos não poderiam existir dentro de um
cérebro, um ambiente grande e quente que dá condições para que os átomos se comportem de um jeito
tão estranho. Tem ainda quem diga que Penrose só substituiu um mistério por outro e não tem nada que
tentar explicar o inexplicável. “Mas estou aberto para qualquer um que venha e me mostre que eu estou
errado. E ainda estou esperando!”, desafiou a matemático para a Sapiens. Vai encarar?
Com certeza, muita gente vai. Essa é uma daquelas questões centrais a qualquer área da ciência – e que
nunca vai morrer. Enquanto existir essa voz aí na sua cabeça que você se acostumou a chamar de “eu”,
existirá quem tente descobrir de onde ela vem, do que ela é feita. Quem sabe o “eu” de algum deles
ainda desvende o seu?
1. Por mais que os cientistas se esforcem para estudar a consciência, existem algumas perguntas
relacionadas ao assunto que ainda não têm resposta. Como saber, por exemplo, que você não é um
mero cérebro em um vidro de laboratório, e que essa revista, as suas mãos e o lugar em que você está
sentado agora não passam de ilusões feitas por cientistas. Não é uma idéia absurda por um simples
motivo: não existem meios de responder essa pergunta com um sim ou não. E, para piorar, é possível
que isso nunca venha a existir. As demais perguntas desse tipo – que não têm resposta e que
provavelmente nunca vão ter – aparecerão nessas colunas no resto da reportagem
2. Como ter certeza de que as cores que você vê aí em cima são as mesmas que outra pessoa veria? E
se a sensação que você tem do vermelho for idêntica à que eu tenho do verde, por exemplo? Para a
física, o que chamamos de vermelho é apenas uma freqüência de uma onda eletromagnética, mas nada
garante que a representação mental dessa cor seja a mesma para nós dois.
3. Imagine se a gente pudesse tirar um dos neurônios do cara da foto aí ao lado e o substituir por um chip
de computador com as mesmas funções. O cérebro dele ia continuar funcionando perfeitamente, certo?
Agora, imagine que continuamos trocando células por chips equivalentes. O resultado seria uma máquina
idêntica ao nosso cérebro, mas... ela teria alguma consciência? E seria a mesma do cérebro original?
4. Aparelhos de ressonância magnética, tomografia e encefalograma são instrumentos com os quais os
cientistas estudam a mente. Só que nenhum deles possibilita leitura direta do conteúdo da consciência de
uma pessoa. A única a que um cientista tem acesso é a dele mesmo. O problema é que a ciência precisa
de evidências do mundo físico para comprovar teorias. Se pensar a consciência a partir da própria
consciência contraria os valores científicos fundamentais e extrapola os limites da ciência, como é
possível explicá-la cientificamente?
• Mente, Cérebro e Cognição, João de Fernandes Teixeira, Vozes, 2000
• O Mistério da Consciência, Antônio Damásio, Cia das Letras, 2001
• The Conscious Mind, Daniel Dennett, Back Bay Books, 1991
• Como a Mente Funciona, Steven Pinker, Cia das Letras, 1997
• The Conscious Mind, David Chalmers, Oxford, 1996
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