Legenda/foto: A higienização das mãos do profissional de saúde com álcool é uma medida simples que ajuda a evitar a infecção hospitalar Controle da infecção hospitalar será discutido em Salvador Fórum e congresso a serem realizados na capital baiana, na próxima semana, colocam em debate novas práticas de prevenção A infecção hospitalar representa grande risco para a saúde do paciente. A promoção de um ambiente seguro nas unidades de saúde e a formação de profissionais para tratar do assunto são formas eficazes de combater o problema. Para discutir o atual modelo de controle de infecção e a implementação de Novas Práticas de Prevenção de Infecções Hospitalares, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a Associação Brasileira de Profissionais em Controle de Infecção e Epidemiologia Hospitalar (ABIH) realizam em Salvador, de segunda (30 de agosto) a sexta-feira (3 de setembro), o IX Congresso Brasileiro de Controle de Infecção e Epidemiologia Hospitalar. Nos dois primeiros dias do Congresso, será realizado o I Fórum Nacional sobre o Modelo Brasileiro de Infecção Hospitalar. A organização espera mais de três mil pessoas para o evento. Participarão profissionais da área de controle de infecção e representantes das vigilâncias sanitárias estaduais de todo o País, dos prestadores de serviços e do Ministério Público, além de especialistas norteamericanos, europeus e latino-americanos. Os convidados estrangeiros falarão sobre as experiências de países como os Estados Unidos, Portugal, Uruguai, Suíça e Itália no controle da infecção hospitalar. O fórum e o congresso serão oportunidades para que se discuta um assunto de peso na saúde pública. Dados dos especialistas mostram que, se não prevenida, a infecção hospitalar pode atingir até 80% dos pacientes em estado grave de uma unidade de saúde. “O fórum é um evento inédito no mundo. Nunca um órgão regulador promoveu discussão desse porte sobre infecção hospitalar”, afirma Adélia Marçal dos Santos, gerente de Investigação e Prevenção de Infecção em Serviços de Saúde da Anvisa. “Na ocasião, vamos debater sobre como devem ser estruturadas ações administrativas, de gestão de saúde, e a regulação pela sociedade da questão da infecção hospitalar”, adianta. Para a Anvisa, é preciso lançar um novo olhar sobre o modelo de controle de infecção hospitalar. O atual modelo surgiu com a Portaria 196 do Ministério da Saúde, de 1983. A medida tornou obrigatória a existência, em todos os hospitais públicos e privados, de comissões de controle de infecção hospitalar. A portaria foi seguida da Lei 9.431, de 1997, que obrigou os hospitais a desenvolverem programas e ações para reduzir a freqüência e a gravidade das infecções. Pela lei, as comissões de controle de infecção deveriam ser formadas por representantes dos médicos, dos enfermeiros e da administração, assim como do laboratório de microbiologia e da farmácia, em hospitais de maior porte. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária vê alguns problemas no funcionamento dessas comissões. Um deles é trabalhar as ações com base em um modelo de internação dos pacientes. Pensa-se a infecção apenas na lógica dos hospitais e não nas demais unidades de saúde. Necessidades locais – No final de 1999, aconteceu a transferência do controle da infecção hospitalar do Ministério da Saúde para a Anvisa. No ano seguinte, a agência desenvolveu, em parceria com a Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP), inquéritos para avaliar a situação das comissões de controle de infecção nos estados e municípios e nos hospitais brasileiros. Uma parte dos inquéritos foi concluída e ainda há outros em andamento. Alguns resultados importantes vieram à tona. Em 2000, apenas 12 estados brasileiros possuíam comissões estaduais. A partir de um trabalho intensivo para sensibilizar as secretarias estaduais de Saúde, a Anvisa contribuiu para que, no fim de 2002, os 26 estados e o Distrito Federal reorganizassem suas comissões. Em 2004, entretanto, quatro estados perderam essa estrutura e há outros que não conseguem manter atividades regulares. “No atual modelo, as comissões estaduais e municipais não atendem às necessidades locais”, observa Adélia Santos. “Há enorme carência de profissionais capacitados para trabalhar no controle de infecções na estrutura da gestão de saúde”, assinala. A Anvisa acha importante manter as comissões onde elas funcionam bem, mas considera fundamental pensar em alternativas para locais onde não se consegue implementá-las. Por essa ótica, alguns municípios poderiam desenvolver programas inseridos em áreas bem estruturadas, ao invés de criar as comissões. Segundo a Anvisa, as comissões funcionam melhor nos hospitais federais e estaduais. Os municípios são os que têm mais dificuldades para operacionalizálas nos serviços de saúde de sua abrangência administrativa. Dados da agência mostram que algo entre 60% e 70% dos hospitais municipais brasileiros não implementaram ou não mantêm as comissões funcionando adequadamente. Além da dificuldade de capacitação, várias cidades não conseguem financiar projetos para esse fim. Bactérias – Nos últimos anos, a Anvisa tem investido em cursos de formação na área de controle da infecção hospitalar. A programação é ministrada por universidades. A agência também discute com o Ministério da Educação e associações profissionais para que a infecção hospitalar seja incluída desde a graduação no currículo dos cursos da área de saúde e se torne parte da cultura do futuro profissional de saúde. A Anvisa acredita que precisa haver uma mudança de filosofia em relação à ação dentro das unidades de saúde. Adélia Santos diz que as atuais taxas usadas para medir a infecção nessas unidades nem sempre refletem a situação real. “Os critérios e a metodologia não são homogêneos. Um hospital com taxa de 30% de infecção pode ter descoberto esse dado pelo investimento na notificação, enquanto um outro, com baixo índice, pode estar sub-notificando os casos. É preciso voltar os olhares para a prevenção”, observa. A infecção hospitalar é um problema grave não apenas para o Brasil, mas para o mundo inteiro. Nos Estados Unidos, é a principal causa de morte entre os pacientes internados. Uma das causas da gravidade das infecções é a resistência cada vez maior das bactérias aos antimicrobianos. Os microorganismos possuem fácil capacidade de adaptação. O excesso de produtos antimicrobianos (artigos de limpeza, esponjas, chinelos e até tábuas de carne com produtos contra bactérias) termina promovendo uma seleção natural e a proliferação de bactérias mais resistentes. As bactérias sofrem mutação rapidamente e podem transmitir as informações sobre resistência a antibióticos para outras bactérias. Nesse contexto, o uso indiscriminado de antibióticos também contribui para aumentar a resistência de muitos microorganismos. Recomenda-se um uso mais racional desses medicamentos, tanto por parte dos profissionais de saúde quanto pela população. A automedicação deve ser evitada, pois o impacto do remédio vai além do usuário e influencia o meio ao seu redor. Na opinião de Adélia Santos, o controle da infecção precisa ser levado a todas as unidades de saúde públicas e privadas. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária considera também como locais de risco para a infecção os consultórios odontológicos. “Os odontologistas lidam com secreção e sangue o tempo todo e nem sempre as condições de higiene e proteção nesses ambientes são as ideais”, lembra Adélia. A gerente da Anvisa reforça a importância do combate à infecção hospitalar para o bem-estar dos pacientes e também para a redução de gastos nos sistemas de saúde. Nos Estados Unidos, ganham-se US$ 6 para cada US$ 1 investido no controle da infecção hospitalar. Esse controle reduz a incidência de doenças como infecções urinárias, pneumonias, infecções em cirurgias e sepse, e diminui o tempo de internação de pacientes. Medidas simples, como a higienização das mãos do profissional de saúde com álcool e a limpeza e boa conservação do ambiente, diminuem sensivelmente a incidência e a gravidade da infecção hospitalar.