INTRODUÇÃO Triad é uma instalação interactiva que promove o esforço colaborativo entre dois participantes, na criação e controlo do ambiente sonoro e visual do espaço envolvente. É um projecto que funciona como ponto de cruzamento entre várias temáticas distintas relacionadas com a interacção colaborativa em ambientes imersivos, lógica de criação musical e sinestesia entre som e imagem. Poderá dizer-se que o elemento mais relevante na escolha do tema para o desenvolvimento do projecto é a dinâmica de criação de natureza colaborativa, primordialmente ao nível sonoro mas também visual. O principal propósito deste trabalho, concebido para a ser utilizado por duas pessoas em simultâneo, é a criação de um espaço em que os participantes se sentem impelidos a interagir com os objectos existentes e, numa dinâmica de contínua descoberta, geram de forma autónoma o som e a imagem que existe neste mesmo espaço. Aproximamo-nos aqui da ideia de instrumento musical; um dispositivo com as suas próprias lógicas de funcionamento gera conteúdos de estímulo sensorial numa sequência controlada pelo seu utilizador, potenciando qualidades de criação artística. O efeito pretendido é, para além do momento criativo irrepetível, dar aos participantes o controlo sobre os objectos e o espaço onde se encontram. Triad permite, de uma forma colaborativa, o controlo sobre a alteração do ambiente sonoro e visual do espaço, recorrendo a estímulos tácteis, auditivos e visuais. Existem dois sólidos geométricos complexos de faces triangulares sobre uma mesa, dispostos no mesmo plano paralelo à parede frontal. Da parede sobressai um objecto escultórico composto por pirâmides de tamanhos variáveis. Estes são os elementos físicos principais da instalação, em disposição triangular. A interacção é feita com os sólidos colocados na mesa através da pressão manual nas suas faces. Cada face lança sons de propriedades tonais diferentes que se traduzem numa expressão gráfica, gerando alterações visuais na construção de pirâmides através de videomapping. Um dos sólidos gera o suporte tonal através notas graves, como que um baixo que suporta a composição sonora. No outro sólido o participante pode interagir criando sequências de notas individuais num registo mais agudo, construindo assim uma melodia. COMPOSIÇÃO ESCULTÓRICA (PIRÂMIDES) OBJECTOS TÁCTEIS (INSTRUMENTOS) BASE CONCEPTUAL A sincronia entre ambos os sólidos é gerida pela aplicação de teoria musical. O baixo assume o controlo da direcção sonora; ao lançar a base harmónica, ela define a progressão musical utilizada na composição. Isto significa que os sons gerados pelo sólido melódico soam sempre bem em em função daquilo que o primeiro está a fazer. É neste jogo de interdependência que se atingem as dinâmicas de criação musical, conferindo-lhe um grau considerável de coerência e potenciando a interacção entre ambos os participantes. Na lógica de expressão visual são tidas em conta as considerações de Wassily Kandinsky sobre as qualidades espirituais do ponto, da linha e do plano (elementos geométricos básicos para a construção de imagem). O autor atribui propriedades sinestésicas a estes elementos gráficos; compara o ponto a uma entidade neutra e silenciosa, que pelo seu movimento forma linhas. Estas possuem uma carga dramática que varia consoante a dinâmica das tensões que lhe atribuem trajectória; neste sentido uma linha recta transmite estabilidade, uma linha quebrada e intermitente possui uma emocionalidade moderada, enquanto que uma linha curva possui um dramatismo mais acentuado. Ao nível do plano, Kandinsky considera as tensões horizontais e verticais que o definem, aumentando ou diminuindo o dramatismo consoante as conjugações entre si. O plano tende a caracterizar o ambiente geral de uma composição. O número 3 funciona como elemento de ligação dos aspectos teóricos à disposição formal da obra. No domínio harmónico, são necessárias três notas distintas, no mínimo, para gerar um acorde. É desta dinâmica musical que surge o mote para a utilização constante do triângulo (3 vértices). A planta da instalação evidencia uma disposição triangular dos objectos. Os dois sólidos lado a lado no plano paralelo à parede, de onde sobressai a construção de pirâmides ao centro. As faces dos objectos com os quais os participantes interagem possuem faces triangulares; as pirâmides à sua frente têm também faces triangulares, para além da sua base ser um triângulo equilátero. O acorde como entidade que transparece unidade é aqui a metáfora para uma obra que pretende ser mais do que apenas a soma das suas partes. Como conceitos de suporte ao desenvolvimento da instalação, são também resgatadas ideias diversas de autores que escreveram sobre as práticas artísticas contemporâneas. Nicolas Bourriaud avançou no final dos anos 90 o termo ‘estética relacional’. Este conceito parte da consciência de uma mudança de paradigma de execução e comunicação artística na contemporaneidade. Não se aplica apenas à arte interactiva, apesar de este ramo ser a sua manifestação mais óbvia; é por natureza uma teoria que situa a prática artística, no seu sentido mais lato, na sociedade contemporânea. O artista deixa de estar interessado apenas na criação de um objecto cujo significado vai ser obtido individualmente por cada pessoa que o observa, passando a comunicar uma ideia de comunidade através do desenvolvimento de um contexto em que os indivíduos são encorajados a estabelecer relações entre si. A obra não se completa sem estas relações, elas são parte integrante do seu significado. A definição do conceito de pós-digital de Mel Alexenberg é também uma referência importante como base teórica desta obra. Trata-se, segundo o autor, da humanização das tecnologias digitais. É um conceito aplicado na circunstância em que os processos digitais são utilizados com o intuito de formular uma expressão estética tendencialmente multi-sensorial e interactiva, e em que o aparato tecnológico aplicado deixa de ser relevante como mensagem da obra. Este mesmo aparato é encarado como o mecanismo que possibilita a existência da obra, mas é apenas um veículo de transmissão intermédio. Isto permite salientar os próprios conteúdos da mensagem artística; a obra de arte interactiva é considerada para além do seu aspecto tecnológico e passa a um plano completamente humanizado em que existe percepção de significados de cariz cultural ou espiritual. No fundo, a tecnologia potencia a capacidade de gerar emoções. A imersão é uma ideia relevante na experiência interactiva pretentida pela obra. Geralmente associada à aplicação de realidade virtual, neste contexto ela existe através do controlo do espaço para se aproximar de um ambiente responsivo. A luminosidade é propositadamente baixa para que o participante apure os sentidos, tornando-se mais sensível a estímulos. O ruído existente é baixo em volume numa situação inicial, não é intrusivo. Ao existir interacção com os sólidos, é obviamente perceptível a resposta imediata que é gerada, e o indíviduo sente que controla o espaço da instalação. Por estarem isolados neste espaço a interagir com a obra, os participantes focam-se unicamente na interacção e na contínua descoberta das dinâmicas de intervenção que vão desencadeando. É também traçado um paralelismo entre a arte interactiva e a arte da performance. A natureza espontânea e efémera de uma performance atribui-lhe uma qualidade única. Aquilo que acontece em determinado espaço e tempo é irrepetível, por esta ser uma actividade que requer uma presença física numa janela temporal limitada. A instalação pretende reter estas qualidades encontradas no domínio da performance através de uma interacção colaborativa de criação primordialmente musical, gerando sequências de sinais sonoros e visuais que surgem no momento e dificilmente serão replicadas.