sociologia urbana

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2009
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© 2009 – IESDE Brasil S.A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito
dos autores e do detentor dos direitos autorais.
S586
Silva, Angelo. / Sociologia Urbana.
— Curitiba : IESDE Brasil S.A. , 2009.
188 p.
/
Angelo Silva.
ISBN: 978-85-387-0151-4
1.Sociologia urbana. 2.Sociologia – Origem. 3.Urbanização.
I.Título.
CDD 307.76
Capa: IESDE Brasil S.A.
Imagem da capa: Digital Juice.
Todos os direitos reservados.
IESDE Brasil S.A.
Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200
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Angelo Silva
Doutor em História pela Universidade Federal do
Paraná (UFPR). Mestre em Ciência Política pela Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp). Bacharel em Ciências
Sociais pela Unicamp.
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Sumário
As origens da Sociologia: os pais fundadores.............................................11
Os antecedentes do surgimento da Sociologia.............................................................................11
A sociedade transforma-se em objeto de estudo.........................................................................12
Os precursores............................................................................................................................................13
Karl Marx e a revolução . ........................................................................................................................13
Émile Durkheim e a institucionalização da Sociologia................................................................15
Max Weber e a Sociologia compreensiva.........................................................................................17
As grandes cidades industriais inglesas
do século XIX e a crítica de Friedrich Engels................................................31
O contexto da época................................................................................................................................32
Um pouco da biografia do autor.........................................................................................................33
Sobre o texto de Engels .........................................................................................................................34
“As grandes cidades” ...............................................................................................................................35
Comentários sobre o texto....................................................................................................................37
Reforçando algumas ideias....................................................................................................................38
Sobre a metrópole capitalista e seus efeitos no indivíduo.....................45
Georg Simmel e a Sociologia................................................................................................................45
O que é que a grande cidade tem de especial?.............................................................................46
Conclusão.....................................................................................................................................................52
Max Weber e a cidade..........................................................................................57
Sobre o autor..............................................................................................................................................57
Max Weber e a cidade..............................................................................................................................58
Alguns elementos para a definição de cidade................................................................................59
A cidade e o campo..................................................................................................................................60
A cidade como local de defesa.............................................................................................................61
Observando mais de perto....................................................................................................................62
Reunindo os fios........................................................................................................................................63
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A Sociologia Urbana e a Escola de Chicago: Robert Ezra Park.......67
Sobre o autor em foco...................................................................................................................67
Uma pequena síntese da obra de Robert Park.....................................................................68
Conclusão...........................................................................................................................................73
Louis Wirth e o urbanismo como modo de vida................................79
Uma pequena apresentação.......................................................................................................79
Sobre seu texto mais conhecido no Brasil.............................................................................79
Buscando uma conclusão............................................................................................................86
Paul Singer e a Sociologia Urbana no Brasil.........................................91
Uma base marxista para pensarmos o Brasil.........................................................................92
Alguns aspectos teóricos sobre o processo de migração.................................................95
O perfil das cidades recortado pelo tipo de desenvolvimento capitalista.................97
Uma conclusão que se impõe aos olhos................................................................................98
Henri Léfèbvre e a Sociologia Urbana pela ótica marxista.......... 105
Sobre o autor................................................................................................................................. 105
A revolução urbana..................................................................................................................... 106
Discussão metodológica........................................................................................................... 107
Análise histórica . ......................................................................................................................... 108
Algumas suposições teóricas sobre a fase crítica............................................................. 110
Manuel Castells e a Sociologia Urbana............................................... 117
Sobre o autor................................................................................................................................. 117
Sua produção na temática urbana......................................................................................... 117
Contribuição para os estudos urbanos................................................................................ 118
O debate sobre a teoria do espaço........................................................................................ 119
Delimitação teórica do urbano............................................................................................... 122
Consumo como processo de reprodução da força de trabalho.................................. 123
Instrumentos teóricos para o estudo da política urbana.............................................. 125
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Ilhas de felicidade no meio do caos urbano............................................. 135
Um pouco mais sobre a autora e o tema........................................................................................135
Construindo muralhas para esconder a diferença......................................................................136
A transformação do espaço público em espaço privado.........................................................139
Uma comparação esclarecedora: São Paulo e Los Angeles.....................................................141
A modernidade invade as cidades:
os shopping centers e as mudanças do urbano...................................... 149
O começo da história.............................................................................................................................150
Recriando identidades..........................................................................................................................153
O mundo cabe dentro de um SC.......................................................................................................155
Redesenhando a fisiognomia da metrópole moderna......................... 161
O livro das passagens ...........................................................................................................................161
Uma primeira volta pela quadra para reconhecimento . .........................................................163
Um olhar mais próximo.........................................................................................................................165
A cidade que sobrepõe texto e imagens........................................................................................167
No Brasil, São Paulo e Minas Gerais..................................................................................................168
Gabarito.................................................................................................................. 175
Referências............................................................................................................ 185
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Apresentação
O objetivo principal deste trabalho é situar o leitor na
discussão acadêmica sobre a Sociologia Urbana.
Temos aqui dois caminhos que seguirão em paralelo,
pelo menos inicialmente, até que venham a convergir no
sentido de termos uma ideia clara do surgimento da Sociologia como ciência e da Sociologia Urbana como um
ramo no tronco da ciência maior.
Com este objetivo, organizei o trabalho de uma maneira cronológica, por um lado, e monográfica, por outro.
Isto quer dizer que organizei os capítulos do livro a partir
do surgimento da Sociologia como ciência, passando
pelos precursores da Sociologia Urbana, depois pelos seus
fundadores propriamente ditos. Isto posto, chegamos
aos autores contemporâneos e ao Brasil. Mantivemos aqui
uma cronologia não muito rigorosa.
Outro aspecto relativo à forma de organização do trabalho é que procurei trabalhar com os principais autores
dos respectivos temas. Tanto no caso da cronologia quanto
da autoria, não segui com rigidez essas determinações.
Elas funcionaram mais como um parâmetro geral do que
como uma lei imutável, algo próximo das características
relacionadas às ciências sociais em geral e à Sociologia em
particular. Não estamos tratando das Ciências Exatas aqui,
da Matemática, Física etc. Podemos, portanto, trabalhar
com uma flexibilidade maior. Foi o que procurei aplicar na
própria construção do texto, em suas partes e no conjunto
que estas partes formam.
Temos, então, ao longo dos capítulos, um arranjo
próximo do seguinte: uma parte introdutória sobre as
origens da Sociologia, seguida dos precursores da Sociologia Urbana, para depois chegarmos aos principais
autores contemporâneos. Dedico uma parte do trabalho
para refletirmos sobre os problemas urbanos mais atuais,
articulados com a realidade brasileira.
Boa leitura!
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A Sociologia Urbana e a Escola de Chicago:
Robert Ezra Park
A sociologia urbana contou com um impulso muito marcante para o seu desenvolvimento com a criação da assim chamada “Escola de Chicago”. No interior daquela
universidade norte-americana, uma série de autores debruçou-se sobre os estudos da
Sociologia nas primeiras décadas do século XX, produzindo uma extensa bibliografia
que marcou a história dessa ciência. Um dos principais integrantes desse grupo de
autores foi Robert Park.
Sobre o autor em foco
Robert Ezra Park1 (14 de fevereiro de 1864 – 7 de fevereiro de 1944), um dos fundadores da Escola de Chicago, estudou na Universidade de Michigan. Seu interesse
pelas questões sociais, especialmente as questões raciais e urbanas, levou-o a trabalhar como jornalista em Chicago. Depois de ser jornalista, estuda Psicologia e Filosofia
em Harvard. Vai à Alemanha onde permanece por quatro anos estudando com Simmel
e Wilhelm Windelband. Retorna aos Estados Unidos em 1903, tornando-se assistente
em Filosofia em Harvard em 1904-1905.
Park lecionou em Harvard até quando, por um convite de Booker T. Washington,
passou a trabalhar no Instituto Tuskegee, desenvolvendo estudos sobre questões
raciais do sul do país. Ingressou no departamento de Sociologia na Universidade de
Chicago em 1914 onde permaneceu até sua aposentadoria em 1936. No entanto,
Park continuou a lecionar na Universidade Fisk, até sua morte, ocorrida em Nashville,
Tennessee, aos 79 anos de idade. Figura reconhecida nos círculos acadêmicos, foi presidente da Associação Sociológica Americana e da Liga Urbana de Chicago, além de
membro do Conselho de Pesquisa em Ciências Sociais.
Influenciou no desenvolvimento da teoria da assimilação que era pertinente aos imigrantes dos Estados Unidos ao defender quatro passos no ciclo de relações raciais do imigrante em seu contexto: o primeiro era chamado de “contato”, o segundo “competição”, e
1
Informações retiradas do site: <http://forum.g-sat.net/showthread.php?t=117550>. Acesso em: 19 ago. 2008.
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no terceiro passo cada grupo deveria se acomodar aos outros. Caso isso não ocorresse,
o grupo imigrante passaria por um processo de assimilação.
Durante a estadia de Park na Universidade de Chicago, seu departamento de Sociologia começou a usar a cidade que a cercava como uma espécie de laboratório de
pesquisa. Seu trabalho, conjuntamente com o de seus colegas, acabou por acrescentar
outra qualificação à Sociologia Urbana. Essa Sociologia praticada lá nos Estados Unidos
ficou conhecida como a Escola de Chicago.
Uma pequena síntese da obra de Robert Park
Robert Ezra Park é considerado o principal autor americano que se preocupou
em sistematizar um corpo de reflexões já em 1916, através da publicação no Jornal
Americano de Sociologia do artigo intitulado “A Cidade: sugestões para investigação do
comportamento humano no meio urbano”, no qual formula uma proposta de estudo
sobre a cidade. Posteriormente, esse texto será tomado como o roteiro indicativo dos
estudos da Sociologia Urbana, na perspectiva da Escola de Chicago.
Sua proposta nesse texto objetiva definir um ponto de vista sobre a cidade e a
indicar um programa para o estudo da vida urbana, destacando sua organização física,
suas ocupações e sua cultura. Lá encontramos a seguinte passagem:
[...] a cidade é um estado de espírito, um corpo de costumes e tradições e dos sentimentos e atitudes
organizados, inerentes a esses costumes e transmitidos por essa tradição. Em outras palavras,
a cidade não é meramente um mecanismo físico e uma construção artificial. Esta, envolvida nos
processos vitais das pessoas que a compõem; É um produto da natureza, e particularmente da
natureza humana. (PARK, 1979, p. 26)
Para Park, a cidade pode ser analisada em uma dimensão geográfica, de ecologia humana, ou ainda de um ponto de vista econômico, mas o que a torna objeto de
uma análise sociológica é o fato de ser o habitat do homem civilizado, ou seja, uma
área cultural.
Sociologia Urbana
O autor é um dos primeiros a fazer uma crítica às concepções econômica, ecológica e arquitetônica, porque entende a cidade como além de um mero artefato. Diz ele:
68
Mas essas coisas, em si mesmas são utilidades, dispositivos adventícios que somente se tornam parte
da cidade viva quando, e enquanto, se interligam através do uso e do costume, como uma ferramenta
na mão do homem, com as forças vitais residentes nos indivíduos e na comunidade. (PARK, 1979, p.
27)
Seu trabalho está organizado em quatro eixos: a planta da cidade e a organização
local; a organização industrial e a ordem moral; as relações secundárias e o controle
social, e o temperamento e o meio urbano.
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A planta da cidade e a organização local
Park e os demais autores da Escola de Chicago tomam a cidade americana como
referência e, a partir dela, propõe uma explicação para todos os demais fenômenos
urbanos. Para ele a base física da cidade se expressa no binômio xadrez-quarteirão,
enraizada nos hábitos e costumes das pessoas que a habitam. Assim, a cidade possui
uma organização moral bem como uma organização física e as duas interagem mutuamente de modos característicos para se moldarem e modificarem uma a outra.
Da combinação dos dois elementos (físico e moral) cada cidade assumirá uma
feição própria. E, dependendo da maior ou menor segmentação, da atividade econômica predominante e da maior complexidade da malha urbana, pode ser estudada
inicialmente a partir da vizinhança, das colônias e das áreas segregadas. Como hipótese de trabalho afirma que “a organização da cidade, o caráter do meio urbano e da
disciplina por ele imposta são, em última análise, determinados pelo tamanho da população, sua concentração e distribuição dentro da área citadina” (1979, p. 30).
A vizinhança tem como características principais o fato de estar assentada no princípio da associação; de ser a menor unidade local dentro da cidade; de ser diferente de
comunidade porque pressupõe o princípio da racionalidade e, além disso, porque visa
dar expressão ao sentimento local, em face de assuntos de interesse local.
A organização industrial e a ordem moral
Da mesma forma que Max Weber, Park define a cidade moderna como lugar do
mercado e da troca. Para ele o mercado é a base da competição industrial e da divisão
do trabalho. Utiliza-se do exemplo das cidades livres da Europa, que resultam da combinação entre lei e mercado aberto. Da definição de cidade como lócus do mercado
sugere os seguintes temas de estudo: classes sociais e tipos vocacionais; as notícias e a
mobilidade do grupo social e a bolsa de valores e a multidão.
Ao tratar das classes sociais e tipos vocacionais, o autor afirma que a cidade é o ambiente natural do homem livre, onde o indivíduo pode desenvolver seu potencial. Cita
um velho adágio alemão o qual afirma que “o ar da cidade liberta os homens” indicando
que o mesmo permanece válido “na medida em que o indivíduo encontra nas possibilidades, na diversidade de interesses e tarefas, e na vasta cooperação inconsciente da vida
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A Sociologia Urbana e a Escola de Chicago: Robert Ezra Park
As colônias e áreas segregadas formam a antítese da vizinhança, na medida em
que minam os laços de vizinhança, como os grupos raciais ou de imigrantes. “Onde
indivíduos da mesma raça ou da mesma vocação vivem juntos em grupos segregados,
o sentimento de vizinhança tende a se fundir com antagonismos de raça e interesses
de classe” (PARK, 1979, p. 34).
69
citadina a oportunidade de escolher sua vocação própria e de desenvolver seus talentos
individuais peculiares” (PARK, 1979, p. 36).
Na cidade, toda vocação tende a assumir o caráter de profissão. Isso leva a um ato
extremo de racionalização, especialização na ocupação e ao desenvolvimento de uma
técnica consciente e específica para chegar a tal profissionalização. O desenvolvimento de tipos vocacionais dará origem a outras formas de associação, sendo a principal
os sindicatos, que se organizam de forma diferente das associações de vizinhança.
Para o autor em foco, a divisão do trabalho leva a maior interdependência das
diversas vocações, ou seja, cada vez mais o indivíduo depende do grupo no qual se
insere. O efeito da divisão do trabalho é que essa crescente interdependência das
partes, sob condições de competição pessoal, cria na organização industrial certo tipo
de solidariedade social fundada sobre uma comunidade de interesses. Nesse ponto de
sua obra fica clara a aproximação ao conceito de solidariedade orgânica, elaborado por
Émile Durkheim.
Em relação à diferenciação, ele aponta para estruturas polares que se diferenciam: na vizinhança desenvolve-se uma forma de sociabilidade apoiada no sentimento, enquanto nas associações e nos grupos vocacionais a forma que predomina
é a do interesse.
Para Park, sentimento é a incapacidade de agir com relação a algo de uma maneira completamente racional: há motivos para ação, mas estes não se apresentam
de forma plenamente consciente. Por outro lado, o interesse implica na existência de
meios e de uma consciência da distinção entre meios e fins. Dessa discussão sobre
mobilidade social emergem conceitos considerados por ele fundamentais: dinheiro,
grupos sociais e equilíbrio.
Sociologia Urbana
O autor irá tratar o dinheiro como um “mediador social”, mediação esta que enfatiza a racionalização de valores e o interesse ao invés do sentimento. A Bolsa de Valores
é, para Park, uma instituição que sintetiza, na cidade, este argumento, pela extrema
mobilidade e a instabilidade da vida social, baseadas na variação de recursos e na possibilidade de crise permanente e de manipulação financeira. Nessa forma de organização social, vemos que os grupos sociais ali existentes são compostos por indivíduos
em competição, isto é, em equilíbrio instável, possível de ser mantido apenas através
de um contínuo reajustamento.
70
Desse conjunto de conceitos sugere que cabe à Sociologia Urbana realizar estudos sobre as mudanças social, espacial e residencial. Afirma que “mede-se mobilidade
num indivíduo ou numa população não apenas pela mudança de localidade, mas antes
pelo número e variedade dos estímulos a que o indivíduo ou a população responde”
(PARK, 1979, p. 41).
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A partir da discussão da divisão do trabalho o autor construirá um quadro comparativo das diferenças entre a cidade grande e o campo ou comunidades de vizinhanças.
Somente na cidade, para Park, é que se encontra o fenômeno da multidão, conjunto
de indivíduos que perdem a sua capacidade de manifestação de interesses individuais,
torna-se um ente irracional e, portanto, pode ser manipulada e controlada. A multidão
só é possível na cidade, pois exige alto estágio de mobilidade, bem como relações
modernas e industriais.
Uma das principais conclusões de Park, que permite que se afirme que a Sociologia é essencialmente uma ciência do urbano, é que ele afirma que a cidade é o
laboratório por excelência para investigação do comportamento humano. Vejamos
o que ele diz:
A cidade, e especialmente a grande cidade, onde mais do que qualquer outro lugar as relações
humanas tendem a ser impessoais e racionais, definidas em termos de interesse e em termos de
dinheiro, é num sentido bem real um laboratório para a investigação do comportamento coletivo.
As greves e movimentos revolucionários menores são endêmicos no meio urbano. As cidades, e
especialmente as cidades grandes, estão em equilíbrio instável. O resultado é que os enormes
agregados casuais e móveis, que constituem nossas populações urbanas, estão em estado de
perpétua agitação, varridos por todo novo vento de doutrina, sujeitos a alarmas constantes e, em
consequência, a comunidade está numa condição de crise crônica. (PARK, 1979, p. 45. Grifo nosso)
Relações secundárias e controle social
A sociedade moderna, os meios de transportes e de comunicação levam a mudanças, cada vez mais rápidas e intensas, com a substituição das relações primárias,
diretas, face a face, por relações indiretas, secundárias.
Uma vez que na cidade há o enfraquecimento das relações íntimas do grupo primário, com a perda das funções da família e igreja, a fusão de individualidades em um
todo comum não mais ocorrerá. Com o afrouxamento dos laços comunais, o principal
fenômeno social que explica a existência dos vícios e crimes nas grandes cidades, a
vida social se alterará significativamente.
Park tratará essas alterações como temas de estudo, enfocando temas como o
enfraquecimento da família e da igreja; a crise e os tribunais; o vício comercializado
e o tráfico de bebidas; política partidária e publicidade; propaganda e controle social
na cidade, como espaço da racionalidade e em função da heterogeneidade, muitos
indivíduos diferentes se cruzam, mas não se veem. Isso provoca o enfraquecimento
do controle social a partir das instituições clássicas. Para controlar a crise social latente
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A Sociologia Urbana e a Escola de Chicago: Robert Ezra Park
Entendo por grupos primários aqueles caracterizados por associação e cooperação íntimas face
a face. Eles são em vários sentidos primários, mas principalmente no de que são fundamentais
na formação da natureza social e dos ideais de cada indivíduo. Psicologicamente, o resultado da
associação íntima é uma certa fusão de individualidades em um todo comum, de tal forma que
o próprio ser individual, pelo menos para muitos fins, é a vida e o propósito comuns do grupo.
(PARK, 1979, p. 47)
71
(necessária para a mobilidade e a mudança social) a cidade só pode funcionar apoiada
na ideia de uma lei positiva, em que a norma jurídica substitui o controle antes feito
pelo costume, tradição e moral.
Segundo Park, o controle social sob as condições de vida citadina talvez possa
ser estudado melhor nas suas tentativas de eliminar o vício e de controlar o tráfico,
uma vez que os vícios, mesmo não sendo típicos (naturais) da cidade, encontram no
habitat urbano os estímulos para sua livre expressão. Assim, o autor também propõe
estudos para investigar esforços de regulamentação e supressão dessas formas de
exploração e tráfico.
Outra dimensão importante das relações secundárias é a política partidária e a publicidade. O crescimento da cidade e sua organização complexa exigem que sua administração não fique apenas na mão do indivíduo eleito. Há a necessidade de um corpo
de funcionários, não conhecidos dos eleitos e longe dos interesses dos indivíduos.
Nesse ponto de sua argumentação, Park revela outra preocupação que é a da
importância da publicidade e da propaganda para a vida moderna, como a forma
contemporânea de controle social. Desenvolve a noção da “organização para um
bom governo”, ou seja, a emergência de escritórios de pesquisa que buscam representar os interesses da cidade como um todo, fazendo apelo a um sentimento que
nem é local nem pessoal.
Na cidade a publicidade passa a ser a forma de controle social reconhecido, emergindo, então, como profissão, sustentada por um corpo de conhecimentos específicos
que são uma forma eficiente de controle da opinião pública nas sociedades baseadas
em relações secundárias. Seus principais instrumentos são os jornais diários e os escritórios de pesquisas que, segundo ele (é bom lembrar que o autor escreve na Chicago
de 1916!)
[...] são os mecanismos para o uso da publicidade como meio de controle social mais interessantes
e promissores [...] O jornal é o grande meio de comunicação dentro da cidade, e é na base da
informação fornecida por ele que se baseia a opinião pública. A primeira função que um jornal
preenche é a que anteriormente o falatório desempenhava na aldeia. (PARK, 1979, p. 60-61)
Sociologia Urbana
O temperamento e o meio urbano
72
A cidade, pela extensa mobilidade social que provoca, gera novos contatos e
formas mais sutis de interação, com a existência não só dos tipos vocacionais, mas
também dos tipos temperamentais. Partindo dessa constatação, Park destaca três eixos
de estudos: a mobilização do homem individual, a região moral e o temperamento e
contágio social. No primeiro eixo, da mobilização do homem individual, destaca que a
cidade proporciona muitos contatos, mais transitórios e menos estáveis, a substituição
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das associações mais íntimas e permanentes da comunidade por uma relação casual e
fortuita, o peso do status, ou seja, da aparência.
A cidade é o ambiente para a emergência de outro temperamento humano apoiado em elementos do acaso e aventura, funcionando como atração especial aos “nervos
jovens e frescos”. A cidade é sinônimo de um clima moral que lhe dá liberdade, é o
espaço para excentricidade e para a livre manifestação dos talentos.
Do estudo desses tipos excepcionais e temperamentais, deveríamos distinguir
entre as qualidades mentais abstratas em que se baseia a excelência técnica e as características inatas mais fundamentais que encontram expressão no temperamento.
Esta outra dimensão da cidade como região moral é importante para os estudos sobre
a cidade, pois para Park a segregação ocorre não apenas por interesses, mas de acordo
com os gostos e temperamentos de seus habitantes. Assim, pode ser tomada também
como apenas um ponto de encontro, um local de reunião ou um local de moradia.
Para entendermos o surgimento da região moral é necessário perceber o que o autor
chama de teoria dos impulsos latentes do homem.
A verdade parece ser que os homens são trazidos ao mundo com todas as paixões, instintos e
apetites, incontrolados e indisciplinados. A civilização, no interesse do bem-estar comum, requer
algumas vezes a repressão, e sempre o controle, dessas disposições naturais. No processo de impor
sua disciplina ao indivíduo, de refazer o indivíduo de acordo com o modelo comunitário aceito,
grande parte é completamente reprimida, e uma parte maior encontra uma expressão substituta
nas formas socialmente valorizadas ou pelo menos inócuas. É nesse ponto que funcionam o esporte,
a diversão e a arte. Permitem ao indivíduo se purgar desses impulsos selvagens e reprimidos por
meio da expressão simbólica. É esta a catarse de que Aristóteles escreve em sua Poética, e à qual
têm sido dadas significações novas e mais positivas pelas investigações de Sigmund Freud e dos
psicanalistas. (PARK, 1979, p. 65)
Conclusão
Podemos afirmar que Park, ao construir a categoria de região moral como explicativa
para as diferentes associações (por interesse) presentes na sociedade, desloca do campo
econômico para o psicossocial as explicações para a segmentação presente na cidade e,
por conseguinte na sociedade. Se sua leitura da estrutura física e econômica caminha no
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A Sociologia Urbana e a Escola de Chicago: Robert Ezra Park
Somente a vida na cidade permite “contágio” de tipos excêntricos, em que os tipos
diferentes podem se associar com outros de sua laia, pois a cidade lhes dá o suporte
moral. Dessa forma, a região moral é uma categoria analítica para se aplicar a regiões
onde prevaleça um código moral divergente, por uma região em que as pessoas que a
habitam são dominadas, de uma maneira que as pessoas normalmente não o são, por
um gosto, por uma paixão, por algum interesse que tem suas raízes diretamente na
natureza original do indivíduo.
73
mesmo sentido dos autores clássicos da Sociologia, a introdução da dimensão moral
como constitutiva das relações sociais citadinas desloca-o do campo dos “ecologistas”
para o campo dos “culturalistas”. A influência que esta abordagem terá sobre os autores da Escola de Chicago será a de fortalecer a cisão entre essas duas correntes. Nas
décadas de 1920 e 1930 elas se afastarão gradativamente, dando origem praticamente
a “duas Escolas de Chicago”, com respectivamente Louis Wirth assumindo a vertente
culturalista e Ernest Burgess a ecologista.
Com o quadro a seguir, fizemos uma pequena síntese das categorias analíticas
formuladas por Robert Park.
Quadro das categorias propostas por Park
Cidade
Campo/comunidades de vizinhanças
Interesse
Sentimento
Mobilidade
Isolamento
Divisão do trabalho
Simplicidade do trabalho
Raciocínio abstrato
Raciocínio concreto
Homem síntese: judeu
Homem síntese: camponês
Competição
Cooperação
Mores (usos sociais, maneiras de agir
racionais)
Folkways (costumes tradicionais, derivados de agrupamentos homogêneos e simples)
Excentricidade
Conservadorismo
Aventura
Acomodação
TEXTO COMPLEMENTAR
A organização moral e a cidade
Sociologia Urbana
(PARK, 1979, p. 62-63)
74
Não somente o transporte e a comunicação, mas também a segregação da população urbana tendem a facilitar a mobilidade do homem individual. Os processos
de segregação estabelecem distâncias morais que fazem da cidade um mosaico de
pequenos mundos que se tocam, mas não se interpenetram. Isso possibilita ao indivíduo passar rápida e facilmente de um meio moral a outro, e encoraja a experiência
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fascinante, mas perigosa, de viver ao mesmo tempo em vários mundos diferentes
e contíguos, mas de outras formas amplamente separados. Tudo isso tende a dar à
vida citadina um caráter superficial e adventício; tende a complicar as relações sociais e a produzir tipos individuais novos e divergentes. Introduz, ao mesmo tempo,
um elemento do acaso e aventura que se acrescenta ao estímulo da vida citadina e
lhe confere uma atração especial para nervos jovens e frescos. O atrativo das cidades grandes é talvez uma consequência de estímulos que agem diretamente sobre
os reflexos. Enquanto tipo de comportamento humano, pode ser explicado, num a
espécie de tropismo, como a atração de uma mariposa pela chama.
Entretanto, a atração da metrópole é em parte devida ao fato de que a longo
prazo cada indivíduo encontra em algum lugar entre as variadas manifestações da
vida citadina o tipo de ambiente no qual se expande e se sente à vontade; encontra,
em suma, o clima moral em que sua natureza peculiar obtém os estímulos que dão
livre e total expressão a suas disposições inatas. São motivações desse tipo, suspeito
eu, que têm suas bases não no interesse, nem mesmo no sentimento, mas em algo
mais fundamental e primitivo, que trazem muitos, se não a maioria dos jovens e mulheres, da segurança de suas casas no interior para a grande e atordoante confusão
e excitação da vida citadina. Na comunidade pequena, o homem normal, o homem
sem excentricidade ou gênio, é o que parece mais tendente a se realizar. Poucas
vezes a comunidade pequena tolera a excentricidade. A cidade, pelo contrário, a recompensa. Nem o criminoso, nem o defeituoso, nem o gênio, têm na cidade pequena a mesma oportunidade de desenvolver sua disposição inata que invariavelmente
encontra na cidade grande.
(KAUFFMANN NETO, 2008)
Folkways: Sumner denominou folkways (modos do povo, costumes) aos modos
de agir que condicionam o comportamento do homem na sociedade, gerando uma
etiqueta social que caracteriza o que é certo ou errado, rude ou refinado, adequado ou inadequado dentro de determinados contextos. Esses códigos podem ser
expressos no jeito de falar, no relacionamento pessoal (inclusive na distância física
entre os indivíduos), no tipo de roupa e aparência visual. O grupo a que pertence
uma pessoa pode muitas vezes ser deduzido a partir dos trajes, corte de cabelo,
postura corporal e de outros detalhes que se tornam verdadeiros “uniformes” de um
ambiente ou procedência. O “jeitinho brasileiro”, mecanismo de adaptação das relações pessoais informais à sociedade moderna, que procura garantir os direitos dos
cidadãos através de normas impessoais, é uma forma de manifestação de folkways.
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A Sociologia Urbana e a Escola de Chicago: Robert Ezra Park
Os conceitos de folkways e mores
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Nem todos os folkways, entretanto, possuem igual importância perante o grupo,
pois não são posturas rígidas. Podem ser modificados sem que a sociedade reaja
vigorosamente contra as mudanças. As práticas do namoro (da troca de olhares,
mãos dadas e abraços ao período razoável de relacionamento para decisões quanto
a noivado e casamento) têm passado por muitas transformações, sem que isso afete
a instituição “casamento”.
Mores: Alguns folkways, contudo, são considerados especiais. A sua omissão
pode gerar situações de inquietação e conflito dentro do grupo. O motivo dessa
distinção deve ser procurado na forma latente que os interesses tomam no corpo
social. São os valores morais, as crenças, os princípios norteadores da conduta e os
códigos de comportamento, bem como a filosofia de vida de determinado agrupamento social que definem o grau de importância de cada ato praticado. A esses
folkways diferenciados Summer denominou mores. O uso da aliança, simbolizando a
união matrimonial, é uma prática que pertence à categoria dos mores. Um conjunto
de folkways e mores relativos a um determinado interesse vital dá origem a uma
Instituição.
ATIVIDADES
Sociologia Urbana
1. Por que Robert Park considera possível a existência de uma Sociologia da cidade ou Sociologia Urbana?
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2. Como o autor em pauta encara a divisão do trabalho do ponto de vista das
relações humanas?
3. Qual relação o autor estabelece entre propaganda e controle social para a época em que viveu?
A Sociologia Urbana e a Escola de Chicago: Robert Ezra Park
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Gabarito
A Sociologia Urbana e a Escola de Chicago: Robert Ezra Park
1. Para uma resposta apropriada o aluno deve mencionar que esse autor se propõe a estudar o espaço urbano, tendo como principal motivação o fato de ser o
habitat do homem civilizado, ou seja, uma área cultural.
2. A expectativa é de que o aluno desenvolva sua resposta, mostrando que o autor
afirma que com a acentuada divisão do trabalho e especialização desenvolvese uma espécie de solidariedade entre os indivíduos porque, cada vez mais, uns
dependem dos outros para viver.
3. O importante é que o aluno desenvolva a ideia de que, para Park, o controle social dá-se através da propaganda, ou seja, que as pessoas são conduzidas pelos
governos através da propaganda.
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