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FACULDADE PAULISTA DE ARTES
Pós-Graduação Lato Sensu em Educação Musical
A aprendizagem musical no contexto da Psicomotricidade
Cássia Renata de Moraes Carnielli
São Paulo
2009
Cássia Renata de Moraes Carnielli
A aprendizagem musical no contexto da Psicomotricidade
Monografia apresentada à FACULDADE PAULISTA DE
ARTES como conclusão do curso de Pós-Graduação
Lato Sensu em Educação Musical, sob orientação da
Profª. Ms. Viviane Louro e com-orientação da Profª Drª.
Eliana Branco Malanga.
São Paulo
2009
Biblioteca José Carlos de Figueiredo Ferraz
C288a
CARNIELLI, Cássia Renata de Moraes.
A aprendizagem musical no contexto da Psicomotricidade. Orientação
da Profª Ms. Viviane Louro e co-orientação da Profª Drª Eliana Branco Malanga.
São Paulo: Faculdade Paulista de Artes, 2009
1. Educação Musical. 2. Aprendizagem musical – Psicomotricidade. 3.
Desenvolvimento cognitivo.
CDD.780.780.7
Dedicatória
Aos meus pais, Hélio e Eunice.
Agradecimentos
A Deus.
Aos meus pais, pelo apoio e incentivo.
Às amigas, pela colaboração e apoio ao
longo do curso.
Aos professores, pelo comprometimento.
À orientadora Profª Ms. Viviane Louro, pela paciência e
incentivo.
SUMÁRIO
Introdução..................................................................................................................2
1. Psicomotricidade..................................................................................................4
1.1 Definição...................................................................................................4
1.2 Aspectos psicomotores..........................................................................4
1.3 O desenvolvimento psicomotor na infância.........................................9
1.4 Aprendizagem e desenvolvimento cognitivo à luz da
Psicomotricidade.....................................................................................................10
1.4.1 Jean Piaget.................................................................................13
1.4.2 Lev Vygotsky..............................................................................14
1.4.3 Henry Wallon..............................................................................17
2. Música e Psicomotricidade.................................................................................21
2.1 Educação Musical e vivência do corpo sob um enfoque histórico....22
2.2 Educação Musical e Psicomotricidade..................................................35
2.3 A aprendizagem musical: Teorias do Desenvolvimento.....................42
2.3.1 Leda Osório Mársico..................................................................42
2.3.2 Edwin Gordon.............................................................................46
2.3.3 Keith Swanwick..........................................................................48
Considerações Finais..............................................................................................54
Referências...............................................................................................................56
Introdução
A Educação Musical é uma área que está crescendo significativamente em nosso
país. Porém, é comum encontrarmos, seja em escolas de ensino regular ou escolas de
música, crianças que apresentam algum tipo de dificuldade para percepção rítmica ou
melódica, na leitura, escrita ou execução no instrumento. Às vezes por considerar-se
incapaz de desenvolver-se musicalmente, não raro, acabam abandonando as aulas e,
quando mais velhas, repetem o discurso conhecido por qualquer professor de música: “Já
tentei aprender tocar um instrumento, mas não tenho talento”. Existem, é verdade,
pessoas talentosas e que conseguem desenvolver-se rapidamente. Porém, deve-se
lembrar que todos podem adquirir habilidades. O profissional da educação musical
precisa estar preparado e orientado para proceder diante dessas situações. É necessário
perguntar-se: quais habilidades precisam desenvolver-se? Como chegar a elas? E para
estruturar o trabalho: como se processa o desenvolvimento da aprendizagem musical?
Hoje, na área da educação, há uma grande valorização sobre a vivência e
exploração do corpo para desenvolver na criança a sensibilidade para adquirir
competências. Esta importância à vivência corporal como base do desenvolvimento está
ligado à Psicomotricidade, que estuda a relação do desenvolvimento psicológico,
cognitivo, motor e cronológico para o desenvolvimento humano. A música relaciona-se
com estes aspectos. Para desenvolver-se musicalmente é necessário que eles estejam
bem trabalhados. Fazendo uma análise sobre a história da Educação Musical, percebe-se
que, embora sem terminologia, com o tempo, surgem algumas metodologias que
baseiam-se na vivência corporal para o desenvolvimento das habilidades musicais.
Assim, baseando-se nessas idéias e concepções, buscaremos a relação entre as
habilidades musicais, o desenvolvimento musical e a Psicomotricidade. Para isso o
estudo foi dividido em dois capítulos. No primeiro, trataremos da Psicomotricidade: sua
definição, aspectos psicomotores e o desenvolvimento psicomotor na infância e as teorias
do desenvolvimento cognitivo. No segundo, faremos uma reflexão histórica sobre as
concepções da Educação Musical, a relação da música com Psicomotricidade de acordo
com as habilidades necessárias ao desenvolvimento musical e como acontece esse
desenvolvimento de acordo com algumas teorias. E, por último, faremos as considerações
finais.
1. Psicomotricidade
1.1 Definição
O indivíduo, desde seu nascimento, se forma gradativamente, de acordo
com suas experiências com o mundo, ou seja, suas vivências. Essas vivências são a
peça fundamental para o desenvolvimento humano, que engloba a emoção, o físico e a
cognição. O estudo da relação entre os aspectos sensório-motores, psicológicos e físicos,
denomina-se psicomotricidade.
Segundo Oliveira (2009 a , p. 28), esse termo surgiu em 1920, com Dupré
que, ao analisar uma relação entre as anomalias psicológicas e as anomalias motrizes,
formulou o termo psicomotricidade “significando um entrelaçamento entre o movimento e
o pensamento”.
1
A Sociedade Brasileira de Psicomotricidade (2009) , define a mesma como:
a ciência que estuda o homem através do seu corpo em movimento com o mundo
interno e externo. Está relacionada ao processo de maturação, onde o corpo é a
origem das aquisições cognitivas, afetivas e orgânicas. Sustenta-se por três
conhecimentos básicos: o movimento, o intelecto e o afeto.
De uma forma mais clara, Louro (2006) define como a relação do querer
fazer (psicológico), saber fazer (cognição) e poder fazer (capacidade motora). Assim,
mostra a relação dos aspectos motores, psicológicos e cognitivos no desenvolvimento
humano.
1.2 Aspectos psicomotores
O desenvolvimento psicomotor pode ser dividido em partes: esquema
corporal,
lateralidade,
lateralização,
estruturação
têmporo-espacial,
equilibração,
tonicidade e praxia global e fina. Estes aspectos devem estar integrados e estruturados
1
Informações: www.psicomotricidade.com.br
para que haja um bom desenvolvimento.
- Tonicidade: Está relacionado às contrações musculares para realização de
movimentos. Está presente no equilíbrio, na praxia global e fina, entre outros e seu
desenvolvimento está relacionado ao meio em que se está inserido. Tem ligação com as
emoções, pois todo movimento é baseado na tonicidade. Assim, Herren e Herren (apud
Oliveira, 2009 a, p. 27) exemplificam:
a audição de um som, o deslocamento ativo ou passivo de um membro, um a
perda de equilíbrio, uma dor de estômago, uma lembrança triste ou alegre, a
previsão de um acontecimento são capazes de induzir modificações do tônus de
fundo da musculatura geral, de influir em sua intensidade. Entre as fontes mais
constantes de manutenção permanente encontramos o estado de vigília e as
estimulações antigravitárias.
- Equilibração: está relacionada à sustentar o corpo sobre uma base. Dividese em dois tipos: equilíbrio estático (sem locomoção) e equilíbrio
dinâmico (com
locomoção) (Louro, 2006, p. 56). Está diretamente relacionado à coordenação motora, ou
seja, a praxia global. Segundo Oliveira (2009 a, p. 41) “este equilíbrio está subordinado às
sensações proprioceptivas cinestésicas e labirínticas. Através da movimentação e da
experimentação, o indivíduo procura seu eixo corporal, vai se adaptando e buscando um
equilíbrio cada vez melhor”. Está presente, também, o equilíbrio emocional, relativo à
parte psicológica de ação e reação diante de determinadas situações.
- Esquema corporal: através do corpo que a criança percebe e conhece o
mundo e vivencia suas experiências, servindo de base para o desenvolvimento global.
Para que os aspectos psicológicos, o emocional e físico se desenvolvam é necessário
que o indivíduo tenha uma 'organização' do corpo (IDEM, p.48). Essa organização provém
do 'conhecer' o corpo e suas partes: conhecer, identificar e nomear. Sobre isto, Oliveira
(2009 a, p. 49), citando Ajuriaguerra, afirma que a nominação “confirma o que é
percebido, reafirma o que é conhecido e permite verbalizar (por um mecanismo de
redução) aquilo que é vivenciado”.
O desenvolvimento do esquema corporal acontece de acordo com a
experiência corporal do indivíduo, ao longo de sua vida. Ao nascer, a criança conhece o
mundo através da audição, do tato, da visão, da boca e, depois, passa a utilizar as mãos,
os pés e assim sucessivamente. Para que estas experiências aconteçam normalmente, é
necessário uma boa maturação neurológica. Assim, conforme o seu desenvolvimento
neurológico e sua experiência com o corpo, a criança vai organizando as informações e
tomando consciência do esquema corporal.
- Lateralidade e Lateralização: Lateralidade está relacionado à divisão do
corpo em duas partes, à consciência de direção: direita/esquerda, frente/atrás.
Lateralização está relacionada com a dominância de um dos lados do corpo
(direita/esquerda). Ao realizar movimentos corporais percebemos que há a prevalência
de um dos lados do corpo, que faz a função principal do que se pede e o outro lado
auxilia. Podemos citar como exemplo, o ato de escrever. Quando escrevemos, temos um
lado dominante que irá segurar a caneta para escrever, o direito ou o esquerdo, enquanto
o outro irá segurar a folha para a realização da tarefa. Assim, existe a dominância dos
lados do corpo em níveis diferentes: dos membros superiores, inferiores, ocular e auditivo.
O desenvolvimento da lateralização acontece conforme a experimentação
da criança, desde o seu nascimento. Enquanto bebê, ela não demonstra dominância
ainda, mas já realiza movimentos e começa a desenvolvê-los. A dominância começa a
evidenciar-se entre 5 e 7 anos.
A lateralização deve surgir naturalmente e para seu bom desenvolvimento, a
criança precisa experimentar os dois lados. Segundo Oliveira (2009a, p. 67) a preferência
por um dos lados do corpo acontece através do aprendizado: pelo meio em que se está
inserido, por imitação, entre outros.
- Estruturação têmporo-espacial: Está relacionada à situar-se no tempo e no
espaço. É a consciência, orientação e organização do corpo no espaço em função do
tempo. De Meur e Staes (apud OLIVEIRA, 2009 a, p. 75) definem a estruturação espacial:
- a tomada de consciência da situação de seu próprio corpo em um meio
ambiente, isto é, do lugar e da orientação que pode ter me relação às pessoas e
coisas;
- a tomada de consciência da situação das coisas entre si;
- a possibilidade, para o sujeito, de organizar-se perante o mundo que o cerca, de
organizar as coisas entre si, de colocá-las em um lugar, de movimentá-las.
Assim, seu desenvolvimento acontece de acordo com “uma elaboração e
uma construção mental que se opera através de seus movimentos em relação aos objetos
que estão em seu meio” (OLIVEIRA, 2009 a, p. 77). Estrutura-se primeiramente
percebendo seu corpo no espaço, depois a outros objetos e, por fim, a relação de objetos
ou pessoas entre si.
Para que a criança tenha organização, ela precisa ter domínio de seu corpo
no espaço. Portanto, é necessário que tenha um boa imagem corporal, pois é através de
seu corpo que ela se situa em relação ao mundo que a rodeia. Outro aspecto importante
para o desenvolvimento deste, é a lateralidade para que as noções de posição do corpo e
de outros objetos em relação ao espaço possam ser comparados e assimilados.
A estruturação espacial está ligada à estruturação temporal, pois o corpo se
situa, organiza e orienta dentro de um espaço, em função do tempo. Por isso refere-se a
estruturação têmporo-espacial.
Este aspecto está relacionado à situar-se no tempo, na sucessão de
acontecimentos. É através dele que o indivíduo situa-se diante de acontecimentos
passados e projeta-se para o futuro.
Os conceitos que são necessários desenvolver são: simultaneidade, ordem
e sequência, duração dos intervalos, renovação cíclica de certos períodos e ritmo
(OLIVEIRA, 2009 a).
Assim como a estruturação. espacial, a temporal exige uma construção
mental que só é possível quando o desenvolvimento cognitivo está mais avançado. Ainda
segundo Oliveira (2009 a, p. 89) primeiro, é necessário que a criança vivencie seu corpo,
fazendo a aquisição dos elementos básicos. Depois ela toma consciência das relações do
tempo e, então, ela vai organizar e coordenar as relações temporais.
- Praxia global e fina: Sob um aspecto mais particular, diz respeito à
movimentação e manipulação de objetos no espaço. A praxia global está relacionada ao
movimento dos grandes músculos. Este, está relacionado ao equilíbrio que, conforme vai
se estruturando, a criança toma consciência do seu corpo e postura, coordenando melhor
seus movimentos. Relaciona-se, também, com o esquema corporal. Assim, a
experimentação e a coordenação fazem com que a mesma adquira a dissociação de
movimentos, ou seja, a realização de múltiplos movimentos ao mesmo tempo. Sob um
aspecto mais amplo, relaciona-se com a consciência e controle do corpo como um todo.
Controle envolvendo o emocional, o cognitivo, entre outros.
A praxia fina é um aspecto particular da praxia global e relaciona-se com as
habilidades manuais. Desde cedo, é através do tato que a criança percebe o mundo,
portanto, este aspecto é um facilitador para o conhecimento. E há ainda a coordenação
óculo-motora que diz respeito aos movimentos oculares e seu controle.
1.3 O desenvolvimento psicomotor na infância
Sánchez, Martinez e Peñalver (2003) afirmam que para um bom
desenvolvimento global da criança, é necessário que ela tenha o desenvolvimento da
inteligência e da personalidade organizados, estruturando o 'eu' no mundo.
O desenvolvimento psicomotor inicia-se desde o nascimento e vai se
desenvolvendo de acordo com a vivência de cada criança, baseando na estruturação do
'eu' no mundo. Esse desenvolvimento está diretamente ligado à maturação neurológica e
à idade da criança. Assim, Le Boulch (apud OLIVEIRA, 2009 b, p. 101) dividiu o
desenvolvimento psicomotor em três etapas: corpo vivido, corpo percebido ou
“descoberto” e corpo representado.
1º Corpo vivido – até 3 anos: Corresponde com a fase que Jean Piaget
denominou inteligência sensório-motora. Os elementos psicomotores e cognitivos
dependem um do outro para se desenvolver. Quando nasce, o bebê não tem consciência
do 'eu', confundindo-se com espaço em que vive. Conforme vai amadurecendo
neurologicamente e cronologicamente, suas experiências vão se ampliando e ele passa a
diferenciar-se em seu meio. Ele se movimenta muito, manuseia objetos, adapta-se às
situações novas, tudo isso explorando esse meio, conhecendo o mundo que o rodeia.
Essa é a fase da vivência corporal.
2º Corpo percebido ou “descoberto” - 3 a 7 anos : A criança passa a dominar
melhor o seu corpo, aperfeiçoando seus movimentos e adquirindo uma melhor
coordenação dentro de um espaço e do tempo. Por consequência da vivência na primeira
fase, chega à representação mental dos elementos no espaço. Assimila conceitos de
esquema corporal, lateralidade e de estruturação têmporo-espacial. Por estar focado em
parte na representação mental e, em parte, centralizado no próprio corpo, classifica-se no
período pré-operatório de Jean Piaget.
3º Corpo representado – 7 a 12 anos: A criança não tem mais como
referência o próprio corpo, ela se descentraliza. Os aspectos psicomotores estão bem
elaborados: é capaz de situar-se no espaço e no tempo, tem a noção de distâncias,
quantidades e formas, enfim tem um domínio corporal maior. A imagem do corpo passa a
ser antecipatória, mostrando a evolução das funções cognitivas, sendo correspondente
com a fase das operações-concretas de Jean Piaget. Assim, ela encontra soluções com
facilidade e se organiza melhor.
Percebemos que desde o nascimento a criança vai se estruturando,
descobrindo o mundo através das percepções, das relações com os objetos e pessoas,
das emoções, do movimento. Essa estruturação no mundo vai se acentuando e
aperfeiçoando ao longo das fases, sempre baseando-se no próprio corpo. É necessário
ressaltar que para que haja um bom desenvolvimento é preciso estimular estes aspectos
das diferentes fases. A criança para se desenvolver precisa passar por essas fases, ou
seja, vivenciar seu corpo. Se ela deixar de vivenciar alguma delas, certamente terá
problemas com seu desenvolvimento psicomotor e, consequentemente terá dificuldades
para adquirir habilidades e para aprender (LOURO, 2006, p. 57).
Portanto, esses aspectos e a Psicomotricidade como todo exercem um papel
determinante no desenvolvimento do indivíduo. Ora, a música e sua prática, como
observa-se no dia a dia, seja na função de professor ou aluno, requer um bom
desenvolvimento psicomotor. É necessário, portanto, que o professor conheça como se
processa o desenvolvimento e suas teorias.
1.4 Aprendizagem e desenvolvimento cognitivo à luz da Psicomotricidade
Segundo Carnielli (2007) aprendizagem é um processo que ocorre com o
indivíduo na interação com o mundo exterior e interior, de acordo com sua vivência
cognitiva, psicológica e física.
Hanze (apud CARNIELLI, 2007, p. 7) define aprendizagem como “um
processo de mudança de comportamento obtido através da experiência construída por
fatores emocionais, neurológicos, relacionais e ambientais. Aprender é resultado da
interação entre estruturas mentais e o meio ambiente”. A mesma autora afirma ainda que:
Os objetivos da aprendizagem são classificados em: domínio cognitivo (ligados a
conhecimentos, informações ou capacidades intelectuais); domínio afetivo
(relacionados a sentimentos, emoções, gostos ou atitudes); domínio psicomotor
(que ressaltam o uso e a coordenação dos músculos).No domínio cognitivo temos
a habilidades de memorização, compreensão, aplicação, análise, síntese e a
avaliação. No domínio afetivo temos habilidades de receptividade, resposta,
valorização, organização e caracterização. No domínio psicomotor apresentamos
habilidades relacionadas a movimentos básicos fundamentais, movimentos
reflexos, habilidades perceptivas e físicas e a comunicação não discursiva.
Falcão (IBIDEM) define como “uma modificação relativamente duradoura do
comportamento, através de treino, experiência, observação”. Essa definição nos remete
ao Behaviorismo, que reduz a aprendizagem a aspectos mecanizados, sem considerar o
indivíduo na sua totalidade como um ser integral. Quando o autor refere-se a “modificação
relativamente duradoura do comportamento” mostra-nos que esse tipo de aprendizagem
não é efetivo, fazendo com que o indivíduo não leve para sua vida o conhecimento hora
adquirido.
O mesmo
autor
afirma,
ainda, que
“outra
situação
que
propicia
aprendizagem é quando, embora o sujeito não vivencie propriamente a experiência,
observa alguém a vivenciá-la”. É possível perceber que a aprendizagem por modelos
acontece desde o nascimento. A criança aprende a falar, andar e desenvolver-se através
da observação.
Outra definição para aprendizagem nos dá Fernández (IDEM, p. 8)
afirmando que “aprender é apropriar-se, apropriação que se dá a partir de uma
elaboração objetivante e subjetivante”. Esta última palavra refere-se à interpretação do
indivíduo sobre algo e objetivante refere-se ao conhecimento que fica num âmbito válido
para todos e, então, o conhecimento torna-se próprio do indivíduo. Assim, cada um tem
seu modo de aprender, sendo que algumas pessoas desenvolvem-se mais rápido e,
outras, mais lentamente. Faz-se necessário respeitar o ritmo de aprendizagem de cada
um, propiciando condições, ou seja, estimulando o educando para que desenvolva seu
potencial.
Sobre isto a mesma autora afirma que “em cada um de nós, podemos
observar uma particular “modalidade de aprendizagem”, quer dizer, uma maneira pessoal
para aproximar-se do conhecimento e conformar seu saber”. Assim, cada pessoa possui
habilidades diferentes, sendo mais rápido ou não para aprender. Neste sentido, citaremos
a teoria das Inteligências Múltiplas elaborada por Howard Gardner, a saber: inteligência
linguística ou verbal, lógico-matemática, espacial, cinestésica corporal, naturalista,
intrapessoal, interpessoal e a musical.
Segundo Fonseca (2009 a, p.23) cognição é o ato ou processo de
conhecimento, envolvendo a articulação de vários componentes: atenção, percepção,
emoção, memória, motivação, integração e monitorização central, processamento
sequencial e simultâneo, planificação, resolução de problemas e expressão e
comunicação de informação.
Cognição compreende processos e produtos mentais superiores
(conhecimento, consciência, inteligência, pensamento, imaginação, criatividade,
produção de planos
e estratégias, resolução de problemas, inferência,
conceituação e simbolização etc.), através dos quais percebemos, concebemos e
transformamos o envolvimento...Não é uma coleção, mas um sistema complexo
de componentes.
Existem
muitas
pesquisas
sobre
o
desenvolvimento
cognitivo
e
aprendizagem. Nesta pesquisa abordaremos as teorias de Jean Piaget, Lev Vygotsky,
Henry Wallon.
1.4.1 Jean Piaget
Suíço, nasceu na cidade de Neuchâtel em 09 de agosto de
1896. Formado em biologia e filosofia, trabalhou como psicólogo experimental e dedicouse a estudar a mente humana, questionando “Como tem origem e evolui o conhecimento”.
Percebe-se em seu modo de estudo três momentos diferentes: primeiro, analisando os
protocolos de observação de seus filhos, estudando o pensamento através da linguagem;
segundo, estudando paralelamente o desenvolvimento cognitivo, o julgamento moral e a
linguagem, percebendo a relação entre as estruturas cognitivas e o desenvolvimento
social;
terceiro,
estudando
exclusivamente
a
cognição,
o
desenvolvimento
do
conhecimento.
Segundo Valentini2 , na teoria piagetiana, a construção de
estruturas mentais acontece na ação do sujeito com o meio. Nesta interação, ele age e
recebe a influência desta ação, interagindo e transformando a realidade. Este processo
denomina-se adaptação.
Nessa interação da realidade com o sujeito existem fatores
complementares: a maturação do organismo, a experiência física, a vivência social e o
processo de equilibração. Este último, para Piaget, é determinante por mostrar o
3
fundamento do processo de desenvolvimento humano. (TERRA ) , consistindo em
equilibrar os outros fatores do desenvolvimento entre si e com outro conhecimento novo
adquirido. Sobre isto Fonseca (2008, p. 85) afirma que “em termos de aprendizagem,
Piaget entende, pois, que esta só se verificará quando, face a uma nova situação, a
2 Disponível em: www.usc.br.
3 Disponível em: www.unicamp.br/iel.
criança se transformar, mas para isso, tem também de evocar funções de inteligência já
estabilizadas e adaptadas”. Neste processo
acontece os mecanismos internos de
assimilação e acomodação, onde:
- Assimilação: é o processo de incorporação, interpretação dos
acontecimentos para adaptar-se à realidade. (PIAGET apud VALENTINI)
pela assimilação, quando o sujeito age sobre o objeto este não é absorvido pelo
objeto , mas o objeto é assimilado e compreendido como relativo às ações do
sujeito...desde as coordenações mais elementares encontramos na assimilação
uma espécie de esboço ou prefiguração do julgamento: o bebê que descobre que
um objeto pode ser sugado, balançado ou puxado se orienta para uma linha
ininterrupta de assimilação, que conduzem até as condutas superiores, que usa o
físico quando assimila o calor ao movimento ou uma balança a um sistema de
trabalhos virtuais.
Portanto,
este
aspecto
compreende
a
tentativa
de
compreender, explicar, solucionar situações baseando-se nas estruturas cognitivas já
existentes.
- Acomodação: consiste na capacidade de transformação, de
modificação das estruturas mentais para adaptar-se ao meio ou dominar um
conhecimento novo.
Assim, a equilibração compreende o equilíbrio entre a
assimilação e a acomodação, o que explica a construção das estruturas da inteligência
(VALENTINI)
A ação humana consiste, portanto, no movimento contínuo de adaptação ou
equilibração. Em cada momento do seu desenvolvimento, a criança conta com a
estrutura mental que a auxilia no restabelecimento deste equilíbrio que, entretanto,
não é duradouro, porque novas necessidades surgem. Assim, toda necessidade
tende a incorporar as coisas e pessoas à atividade própria do sujeito – isto – é,
assimilar o mundo exterior às estruturas já construídas. Ao mesmo tempo, toda
necessidade tende a reajustar essas estruturas em função das transformações
ocorridas, ou seja, acomodá-las ao objeto externo. O equilíbrio entre as
assimilações e acomodações é denominado adaptação ou equilibração e este
processo
explica a organização progressiva do desenvolvimento
mental.(GOULART, 2008, p. 23, 24)
Segundo Fonseca (2008, p. 85) só há aprendizagem de
alguma competência básica quando a criança desenvolve a percepção (assimila) dos
pormenores e dos atributos sensório-motores dos símbolos. Portanto, “pode-se dizer que
a aprendizagem está para a percepção assim como a acomodação está para a
assimilação”.
De acordo com Goulart (2008, p. 22), dentro de sua pesquisa
sobre o desenvolvimento psíquico, Piaget distinguiu funções diferentes:
- Funções do conhecimento: relativo ao conhecimento do
mundo: pensamento lógico, organização da realidade;
- Funções de representação: relativo à representação de um
significado (pessoa, objeto, acontecimento) utilizando um significante (palavra, desenho,
gesto);
- Funções afetivas: relativo à relação com o outro.
Essas funções passam por períodos com características
próprias, que Piaget denominou estádios de desenvolvimento: sensório-motor (0 a 2
anos), pré-operatório (2 a 7-8 anos), operacional concreto (7 a 11-12 anos), operacional
formal (12 anos em diante). De acordo com Fonseca (2008, p. 85) esses estádios
“refletem mudanças, transições, transformações cognitivas qualitativas muito importantes,
isso é, induzem uma espécie de reorganização passo-a-passo com novas propriedades
emergentes, algo que é demasiado relevante para o processo de aprendizagem”.
- Sensório-motor (0 a 2 anos) – Centrado na própria criança.
Não há função simbólica, pois o bebê ainda não tem uma forma de pensamento que
possibilite fazer algo sozinho, interagindo com objetos ou pessoas. A ação é baseada no
movimento e na percepção.
- Pré-operatório (2 a 7 anos) – Para Piaget, o fato que
determina a passagem para este estágio é o aparecimento da função simbólica , dentre
elas, a linguagem. É o início da socialização da ação, da troca entre os indivíduos. Na
afetividade, aparecem os sentimentos interindividuais.
- Operacional concreto (7 a 11 anos) – É a fase onde a criança
começa a interiorizar as ações e a desenvolver a capacidade de reversabilidade. No
desenvolvimento cognitivo aparece o desenvolvimento lógico-matemático e as operações
infralógicas.
- Operacional formal (12 anos em diante) – caracteriza-se pela
capacidade de distinguir o real e o possível. Capacidade de formular hipóteses, formar
esquemas conceituais abstratos, executar operações metais dentro de princípios de
lógica formal. (TERRA)
1.4.2 Lev Vygotsky
Nasceu em 17 de novembro de 1896, na cidade de Orsha, em
Bielarus. Formado em Direito e Filologia, estudou medicina, foi professor e pesquisador.
Por motivos políticos, sua obra foi ignorada no Ocidente, porém, depois de divulgada,
ganhou destaque e vem sendo estudada e valorizada.
Segundo Oliveira (1997, p.56) em sua teoria, Vygotsky não
formula uma concepção estruturada do desenvolvimento humano, mostrando o processo
de desenvolvimento desde o nascimento até a idade adulta, mas mostra uma reflexão e
dados de pesquisa sobre aspectos do desenvolvimento humano.
Nesta abordagem, os processos de aprendizagem são de
fundamental importância para o desenvolvimento, sendo “um aspecto necessário e
universal do processo de desenvolvimento das funções psicológicas culturalmente
organizadas e especificamente humanas” (VYGOTSKY apud OLIVEIRA, 1997, p.56).
Através deste pensamento, faz-se a ligação do desenvolvimento do indivíduo com o
ambiente sócio-cultural em que está situado. Para compreender a relação do
desenvolvimento com o aprendizado, consideremos:
- Nível de desenvolvimento real: relativo à capacidade de
realizar tarefas de forma independente – quando a criança realiza alguma atividade
sozinha;
- Nível de desenvolvimento potencial: relativo à capacidade de
realizar tarefas com ajuda de alguém – quando a criança não consegue realizar alguma
atividade sozinha, mas consegue com instruções de alguém.
Assim,
pode-se
perceber
claramente
a importância
da
interação social para o desenvolvimento, segundo a teoria vygotskyana. Esse
desenvolvimento acontece num ambiente social, na interação com o outro.
Baseando nesses aspectos temos a zona de desenvolvimento
proximal (ZDP) que está relacionada “ao caminho que o indivíduo vai percorrer para
desenvolver funções que estão em processo de amadurecimento e que se tornarão
consolidadas, estabelecidas no seu nível de desenvolvimento real” (OLIVEIRA, 1997, p.
60), ou seja, é a distância entre o nível de desenvolvimento real e o nível de
desenvolvimento potencial.
Ainda sobre a ZDP, Fonseca (2008, p. 390) completa que ela:
atribui uma relevante importância à dimensão social da aprendizagem e do
desenvolvimento individual , na medida em que os instrumentos, os objetos, os
signos, os símbolos e todos os elementos impregnados de significado cultural do
ambiente mediatizam a relação do indivíduo ou da criança com o mundo exterior
onde ela se desenvolve.
1.4.3 Henry Wallon
Nasceu na França em 1879. Formado em Filosofia e Medicina.
Viveu no período das duas guerras mundiais: na primeira, atuou como médico; na
segunda, participou do movimento da resistência contra os invasores nazista. Dedicou-se,
primeiramente, à psicopatologia, registrando observações feitas com crianças de 02 a 15
anos,
com
perturbações
de
comportamento.
Posteriormente,
dedicou-se
ao
desenvolvimento da criança. Sua teoria do desenvolvimento formou-se baseado em
análises de observações, comparando semelhanças e diferenças no desenvolvimento de
crianças normais e patológicas. Assim, extraiu a base desse processo e identificou os
estágios do desenvolvimento, que estão ligados à fatores genéticos e sociais. Sobre isto
Mahoney (2008, p. 12) afirma que “será no mergulho do organismo em dada cultura, em
determinada época, que se desenvolverão as características de cada estágio. A interação
entre esses fatores define as possibilidades e os limites dessas características. A
existência individual como estrutura orgânica e fisiológica está enquadrada na existência
social de sua época”.
Os estágios, segundo a teoria de Wallon são: Impulsivo
Emocional (0 a 1 ano), Sensório-motor e Projetivo (1 a 3 anos), Personalismo (3 a 6
anos), Categorial (6 a 11 anos), Puberdade e Adolescência (11 anos em diante).
- Impulsivo Emocional (0 a 1 ano) – é subjetivo com
predominância da afetividade. Na primeira fase, temos a impulsividade motora que é
caracterizada por movimentos impulsivos e bruscos de relaxamento e tensão muscular.
Esses movimentos, que não são intencionais, “têm um efeito significativo no meio
ambiente, suscitando como resposta intervenções úteis e desejáveis. Inicia-se, assim, um
processo de comunicação entre a criança e seus envolventes” (DUARTE E GULASSA,
2008, p. 19), originando o campo das relações individuais. Na segunda fase, Emocional, a
comunicação criada entre a criança e o adulto na fase da impulsividade, cria um campo
emocional onde pode-se perceber cada vez mais claros e diversificados sentimentos de
alegria, raiva, dor, tristeza, entre outros. Assim, “inicia-se o processo de discriminação de
formas de formas de se comunicar pelo corpo” (MAHONEY, 2008, p. 13).
- Sensório – motor e Projetivo (1 a 3 anos) – ? a passagem do
ato motor para o ato mental. Caracteriza-se pela exploração do espaço, desenvolvimento
da função simbólica e da linguagem e início da representação. A exploração acontece ao
desenvolver a prensão e a marcha: andar, manipular, agarrar, sentar, entre outros.
Aparece, também, a linguagem que permitirá uma nova exploração do mundo e onde
acontece a discriminação entre objetos: comparar, agrupar de acordo com a cor,
tamanho, forma, etc. A segunda fase, Projetivo, caracteriza-se pela utilização dos gestos
para expressar os pensamentos. Para Wallon (apud COSTA, 2008, p. 33) “o ato mental
projeta-se em atos motores”.
- Personalismo (3 a 6 anos) – Centrada na diferenciação do eu
com o mundo exterior, na construção da personalidade. Passa por três fases: A oposição,
onde a criança confronta e contradiz as pessoas para afirmar sua independência, o eu; a
sedução, onde ela precisa ser admirada, prestigiada (nesta fase, os movimentos
aperfeiçoam-se pela maturação motora); a imitação, onde ela cria personagens baseados
em pessoas que ela admira, tomando-os por modelo (BASTOS E DÉR, 2008).
-
Categorial
(6
a
11
anos)
–
caracteriza-se
pelo
desenvolvimento intelectual. A criança começa a perceber-se como parte de um grupo e
aparece a capacidade de manter-se atento por mais tempo. Aos 9/10 anos já tem uma
formação mental que possibilita explorar o mundo com atividade que exigem capacidade
de abstração como: classificação, seriação, agrupamento categorização.
- Puberdade e Adolescência (11 anos em diante) – caracterizase pela passagem da infância para a adolescência, onde ocorre a crise da puberdade, os
questionamentos e confrontos que permitem uma exploração de si, para a estruturação
da identidade do adolescente e que afeta todos os aspectos da criança: motor, cognitivo e
afetivo. Ocorrem modificações corporais onde as diferenças do organismo feminino e
masculino acentuam-se, o que torna necessário que haja uma “reorganização do
esquema corporal que, como no estágio do personalismo, é condição para a construção
da pessoa, de sua personalidade” (DÉR E FERRARI, 2008, p. 61).
De acordo com Fonseca (2008, p. 53) o conceito central de
aprendizagem para Wallon está na concepção psicomotora de que o ato mental projeta o
ato motor. Assim:
a teoria walloniana suscita que a prática terapêutica e educacional seja enfocada
nas necessidades da criança e do jovem nos planos motores, afetivo-emocionais e
cognitivos, que , no seu conjunto, devem promover o desenvolvimento das suas
personalidades em todos os seus níveis e de forma verdadeiramente
integrada.(IBIDEM)
Podemos perceber através destas teorias, que o desenvolvimento
psicomotor acontece de acordo com o desenvolvimento global do indivíduo e, por esse
motivo, como parte do assunto aqui abordado é necessário conhecê-las.
Fonseca baseando em Hargreaves (2009, p. 67) afirma que “atualmente, a
psicologia da música tem encontrado confluências não apenas com a ciência cognitiva
nas também com a sociologia, antropologia, educação e ciências da saúde”. Assim, é
possível identificar relações das teorias aqui descritas com algumas teorias de
desenvolvimento e aprendizagem musical.
2. Música e Psicomotricidade
2.1 Educação Musical e vivência do corpo sob um enfoque histórico
A música está presente na vida humana desde as mais remotas épocas.
Seus valores, estéticas e concepções estão relacionados à sua época e cultura. Brito
(2003, p. 25) exemplificando isto, cita a questão do ruído, que foi por muito tempo
considerado “como não som ou som não-musical” e no século XX foi incorporado nos
valores estéticos musicais do Ocidente. Essas transformações modificam, também, o
valor da música e da educação musical, de acordo com cada período. Assim, “ver-se-á
que, em cada época, os valores, a visão de mundo, os modos de conceber a ciência dão
suporte à prática musical, à ciência da música e à educação musical” (FONTERRADA,
2008, p. 25). Fundamentando estas idéias, abordaremos a importância da música numa
perspectiva histórica.
Na Grécia, a prática da música era permitida não só aos artistas, mas a
todos os cidadãos livres, pois acreditava-se que ela influenciava o humor e o espírito dos
cidadãos, além de contribuir na formação do caráter e da cidadania. Segundo Fonterrada
(2008, p. 26) “os cantos conferiam aos jovens um senso de ordem , dignidade, obediência
às leis, além da capacidade de tomar decisões”. Assim, os gregos preferiam o modo
dórico, pois ele propiciava força moral, equilíbrio, temperança e simplicidade, que eram
consideradas características importantes na formação do cidadão. Platão, em suas idéias,
considera que a música tem grande influência no caráter humano e que propicia à alma
ritmo, harmonia e temperança. Para Aristóteles, a música imita as paixões e os estados
da alma, influenciando os desejos humanos e “tem tanta relação com a formação do
caráter humano, que é necessário ensiná-la às crianças” (ARISTÓTELES 384-332 a. C.)
Em Roma, as idéias e concepções musicais gregas fortaleceram e
transformaram-se ganhando características próprias com o “acréscimo de elementos
heterogêneos à música da nação conquistada, produzindo um misto de elementos greco-
romanos” (FONTERRADA, 2008, p. 29). Com o tempo, passa-se a valorizar o virtuosismo,
o grandioso. Porém, ainda há influências das idéias de Platão.
Na Idade Média, há diferentes concepções sobre a música. Pitágoras tornase um nome forte na área, por suas concepções que baseiam-se teoricamente nas
relações com os números, com simbolismo. Assim:
por influência dos neoplatônicos e neopitagóricos, a aceitação da música como
parte de uma estrutura cognitiva de base numérica e não-verbal fez que sua
função se ampliasse, indo além de sua missão de servir à moral e aos bons
propósitos. Isso, porém, refere-se ao aspecto teórico da música e não à sua
prática. Acreditava-se que, sem música, nenhuma disciplina poderia ser perfeita”
(IDEM, p. 32)
Santo Agostinho classifica a música como ciência, obedecendo à ordem
matemática.
Embora
considerada
disciplina
científica
“não
serve
a
propósitos
educacionais e morais, como queria o pensamento platônico e de outros filósofos gregos”
(Lang apud Fonterrada, 2008, p. 32). As artes liberais seriam “um meio de prevenção
contra as tentações oferecidas pelo mundo herético” (IDEM).
Ainda nesta época, Fonterrada baseando-se em Henry Lang, cita Boécio,
que interessava-se pelas proporções numéricas para basear a compreensão musical, no
fenômeno físico. Segundo Lang (IDEM, p. 33).
Boécio descreve os efeitos da música no homem e define seu domínio; de acordo
com ele, existem vários tipos de música: música mundana, música humana,
música constituta in instrumentus, a primeira referindo-se ao
movimento
dos
planetas, à organização dos elementos e à música das esferas; a segunda, que
une ao corpo o espírito eterno, incorpóreo, de modo semelhante à formação das
consonâncias de sons agudos e graves, a partir de determinada ordem numérica.
A última, segundo ele, é a única forma de música percebida sensorialmente.
A partir do século XI, época de Guido d'Arezzo, acontece profundas
transformações: desenvolvimento da polifonia, na área da composição surgem novas
formas que prenunciam o aumento do número de vozes, surgem tratados teóricos que
estabelece, e aceitam a prática musical.
Nesta época, segundo Ariès (apud FONTERRADA, 2008, p. 37) sobre a
função da família medieval diz que ela era “responsável pela conservação de bens, pela
prática de um ofício, pela ajuda mútua entre seus membros e pela proteção à honra e à
vida”. Assim, o conceito de infância não a tinha a valorização de hoje, sendo ligado à
dependência. Como não havia um limite entre infância e a adolescência, a sociedade era
indiferente aos processos biológicos e a criança era vista com um entretenimento para a
família e a sociedade.
A princípio as crianças que viviam sob custódia das igrejas tinham uma
educação baseada na filosofia grega. Posteriormente, o objetivo da música era louvar a
Deus e, para a Igreja, o cantochão deveria ser ensinado de forma correta “pois fazia parte
da disseminação da fé cristã, um dos principais elementos de unidade do culto num de
seus momentos de expansão” (FONTERRADA, 2008, p. 36). Assim,, buscavam as
crianças dotadas com boa voz para participar de seus coros. Ainda segundo Fonterrada
(2008, p. 37) “o conteúdo musical variava de igreja para igreja, ou de época para época,
mas sabe-se que eram ministradas aulas de canto, contraponto e improvisação, e que
muitos dos pequenos cantores eram extremamente hábeis na realização de suas tarefas
musicais”. Raynor (1981, p. 32) complementa que:
O ensino da música era ainda em sua quase totalidade, um ensino decorado;
havia já aperfeiçoamento na notação musical, realizado por Hucbaldo, Guido
d'Arezzo e Notker Balbulus , o que permitia grafar rigorosamente o cantochão em
papel, mas os livros eram ainda caros e raros, de modo que o livro do coro era o
amis das vezes um livro de referência para o chantre que preparava o coro; a
iconografia dos coros medievais mostra os cantores aglomerados em torno de
uma estante sustentando um gigantesco livro de coro para o qual o dirigente
aponta, aparentemente levando as suas forças através de uma obra nota por nota.
As propostas de Guido d'Arezzo revolucionaram a prática musical dessa
época. Seu objetivo era educar para que o cantor desenvolvesse a habilidade de cantar
canções desconhecidas através de notação musical.
No período Renascentista, acontecem mais mudanças na prática musical:
surge a harmonia através da percepção simultânea das proporções entre as partes;
reconheceu-se as terças maiores e menores como consonâncias e a tríade foi
estabelecida como fenômeno natural; a composição coral começa a se definir a quatro
vozes; é lançado os fundamentos da teoria da harmonia, onde as idéias de Boécio são
abandonadas. Sobre isto Fonterrada (2008, p. 41) explica:
O interesse pela teoria da música da música grega se justificava como revisão do
conhecimento, mas os fundamentos da música renascentista se firmaram e
constituíram a base do sistema moderno. Ela rompeu com os sistemas medievais
especulativo-simbólicos baseados em Pitágoras e Boécio, e estabeleceu outro,
fisicamente definido ematematicamente documentado, seguindo a valorização das
ciências peculiar à época.
Na área da educação, há uma mudança: a criança é aceita como um ser
que necessita de cuidados como saúde, lazer e educação. Assim,
esse período coincidiu com a mudança de ver a infância, por parte da sociedade e
da família; o hábito de deixar a criança por conta de aprendizes, em convivência
direta com os adultos, se modificou. A educação começou a ser organizada nos
colégios e seminários e a criança a ser encarada com maior responsabilidade pela
família e por autoridades da Igreja e do Estado do que fora nos séculos anteriores.
No século XVI, surgem, na Itália, escolas de formação básica em música,
que eram conhecidas como “conservatórios” - e eram orfanatos. Tinham princípios
diferentes do ensino da época medieval. Embora ainda formassem músicos para ia igreja,
ensinando em grande quantidade de disciplinas, visando o treinamento profissional, foram
modificando e adaptando-se à época.
Na Idade Moderna, a idéia medieval de Deus como centro do Universo é
abandonada e o homem volta-se para si e para o mundo. Na música, surgem novas
possibilidades: a melodia acompanhada e o melodrama; ênfase nos instrumentos de
teclado e baixo contínuo. Na concepção da época, a música só teria valor se tivesse a
poesia,
porque
representava
as
formas
dos
sentimentos
inferiores.
Assim,
hierarquicamente dentre as artes, estava em último lugar e a poesia, em primeiro.
Surgem, nesse período, duas teorias que favorecem a valorização da
música, confirmando a estética barroca:
- Teoria dos afetos: explica os eventos musicais através da sua relação com
os sentimentos;
- Doutrina das figuras: concebe a música como igual à retórica.
As duas teorias tinham a música como expressão dos sentimentos. Assim, no
Barroco a música:
a música reflete e sintetiza em si própria os valores da época, que podem ser
vistos na medida matemática do tempo, no emprego da tonalidade em substituição
à modalidade, na preponderância da melodia acompanhada em substituição à
multiplicidade de linhas, na estrutura formal “clara e distinta” e na valorização de
elementos de repetição, que são intrinsecamente dependentes da memória
(..).(FONTERRADA, 2008, p. 57)
Durante esses períodos, Fonterrada baseando-se no estudo de Philippe
Ariès, aponta a mudança de pensamento quanto à infância: há a especialização
demográfica das idades, dividindo a infância em classes: 5-7 à 10-11 anos. A Educação
Musical
baseava-se
na
relação
mestre-discípulo
e
os
conservatórios
italianos
caracterizam-se profissionalizantes. Como a criança passa a ser reconhecida, surgem
métodos educacionais onde já é possível perceber tentativas de colocar o ensino da
música na educação.
O Romantismo surge do subjetivismo e caracteriza-se pelo individualismo e
a busca pelo virtuosismo (técnica). A música passa, então, a ser valorizada, sendo
superior às outras artes por transmitir o que a linguagem comum não consegue.
Fonterrada (2008, p. 65) afirma que “para os românticos, a música é a revelação do
absoluto, sob a forma de sentimentos. Ela é capaz de expressar sentimentos particulares,
subjetivos, mas também, os próprios sentimentos em si, o que lhe confere dupla
interioridade”.
É criado o Conservatório de Paris, em 1794. Assim, surgem as primeiras
escolas particulares de música, com foco profissionalizante. No Brasil, cria-se o
Conservatório Brasileiro de Música, no Rio de Janeiro, em 1845 e em São Paulo, o
Conservatório Dramático e Musical, em 1906. As escolas privilegiavam a formação do
instrumentista virtuose, mostrando tendência ao individualismo. O ensino coletivo surgiu
quando, no ensino de composição, aumentou o número de pessoas não profissionais.
Começou, então, o ensino sistemático teórico/prático, surgindo estudos visando a
sistematização do saber musical: contraponto, harmonia e formas. Esses estudos tendiam
a “treinar” o aluno como objetivo de torná-lo competente na construção musical e na
orquestração. Na prática instrumental, há duas tendências: domínio técnico levado ao
limite e performance baseada em critérios individuais de interpretação.
No século XX, Lang (apud FONTERRADA, 2008, p. 92) afirma que “a virada
do século caracterizou-se pela perda dos ideais românticos e acelerada mudança nos
valores e sistemas, reconhecidos como sintomas da desintegração da vida mental da
época”. Busca-se, então, destreza técnica enquanto aparece a orquestra firmando-se
como grande conjunto. Há a virtuosidade cada vez mais ligada à técnica e o desgaste do
sistema tonal.
Com o crescimento populacional e os progressos individuais deixa-se o
individualismo pelo coletivismo. Surgem propostas educacionais, aproximando da arte e
atuando no coletivismo, buscando aperfeiçoar as qualidades e sensibilidades humanas. A
educação musical acompanha as tendências e surgem os “métodos ativos”.
E nos dias atuais, o que é música? Qual sua função? Faz-se necessário que
o educador musical reflita sobre a sua “matéria-prima” para que sua prática seja
significativa. Baseando-se nos questionamentos acima voltaremos nossa atenção à
concepção de música e educação musical na atualidade.
Existem várias definições para música. Brito (2003, p. 26) citando a definição
segundo o Dicionário Aurélio como “arte e ciência de combinar os sons de modo
agradável ao ouvido” e a de Pannain como “arte de combinar sons e formar com eles
melodia e harmonia”, considera-as inadequadas : a primeira, por valorizar somente o que
é agradável ao ouvido; a segunda, por considerar que toda música constitui-se de melodia
e harmonia. Cita, também, Koellreutter afirmando que “a música é uma linguagem, posto
que é um sistema de signos”. Assim, para esta autora, a música acontece através da
relação entre som e silêncio e que a melodia , o ritmo, a harmonia fazem parte dela, como
uma forma de organizar o material sonoro.
Penna
(2008,
p.
18)
primeiramente
define
arte
como
“atividade
essencialmente humana, através da qual o homem constrói significação na sua relação
com o mundo”. Afirma, também que a arte é atividade criativa e intencional para
construção de formas significativas. Assim, baseando-se nessas concepções, define
música como “uma atividade essencialmente humana, intencional, de criação de
significações” (2008, p. 20).
Schafer (1991, p. 25) , em seus ensaios, defende a idéia de que é
necessário uma definição útil. Assim, busca a resposta através de seus alunos, com
questionamentos. É princípio surgem várias definições que vão se moldando conforme
ocorre uma reflexão sobre estas. Assim, frases como: “música é alguma coisa de que
você gosta”, “é som organizado”, “é som agradável ao ouvido”, entre outras, vão se
modificando quando há a percepção de que: nem todos gostam de um mesmo estilo
musical; que o ruído pode, também, fazer parte de uma música; que, para ser música,
não é necessário ter melodia, entre outros. Chega-se à conclusão de que o que diferencia
a música de outros “materiais sonoros” é a intenção. Música, então, “é uma organização
de sons (ritmo, melodia, etc) com a intenção de ser ouvida” (Schafer, 1991, p.35).
Percebemos que as concepções sobre o tema aqui expostas se entrelaçam.
Pode-se dizer, portanto que a música e sua prática constituem-se da relação entre
diferentes sons – e seus parâmetros – e o silêncio com intenção, com significação.
Baseando-se nestas concepções, vejamos o que dizem os autores sobre a Educação
Musical.
Gainza (1988, p. 101) coloca o objetivo da Educação Musical como
musicalizar - “tornar um indivíduo sensível e receptivo ao fenômeno sonoro, promovendo
nele, ao mesmo tempo, respostas de índole musical”.
Sobre musicalizar, Penna (2008, p. 29) faz uma reavaliação do tema e,
abordando a música como uma linguagem que é construída, afirma que o processo da
musicalização deve trabalhar e preparar o potencial musical do indivíduo para adquirir a
sensibilidade.
“Portanto,
musicalizar
é
desenvolver
instrumentos
de
percepção
necessários para que o indivíduo possa ser sensível à música, apreendê-la, recebendo o
material sonoro/musical como significativo” (IDEM, p. 31).
Para Feres (1989, p. 3), a Educação Musical deve ter amplo sentido para
viabilizar o desenvolvimento da sensibilidade para perceber fenômenos musicais e a
expressão através da música, seja tocando, cantando, assobiando ou movimentando-se
com ela.
Koellreutter (apud BRITO, 2001, p. 40) considera que a Educação Musical
deve valorizar a “importância e o porquê da música (e da arte) na vida humana,
lembrando o fato de que cada sociedade, com suas características e necessidades
típicas, condiciona um tipo de arte”. Assim considera que:
a educação musical como meio que tem a função de desenvolver a personalidade
do jovem como um todo; de despertar e desenvolver faculdades indispensáveis ao
profissional de qualquer atividade, como por exemplo, as faculdades de
percepção, as faculdades de comunicação, as faculdades de concentração
(autodisciplina), de trabalho em equipe, ou seja, a subordinação dos interesses
pessoais aos do grupo, as faculdades de discernimento, análise e síntese,
desembaraço e autoconfiança, a redução do medo e da inibição causados por
preconceitos, o desenvolvimento da criatividade, do senso crítico, do senso de
responsabilidade, da sensibilidade de valores qualitativos e da memória,
principalmente, o desenvolvimento do processo de conscientização do todo, base
essencial do raciocínio e da reflexão.
As concepções aqui descritas baseiam-se em desenvolver a sensibilidade
para a música, desenvolver potencialidades globais, entre outros. O desenvolvimento das
habilidades musicais supõe que o indivíduo tenha desenvolvido – de acordo com sua
faixa etária – suas funções cognitivas, físicas, motoras e psicológicas. Portanto, como
professor, é necessário conhecer e levar em consideração as fases de desenvolvimento
do aluno. Numa perspectiva de desenvolvimento global, temos a Psicomotricidade que
engloba vários aspectos a serem considerados mo desenvolvimento humano. Através de
pesquisas, verifica-se que as concepções dessa área têm influenciado e contribuído com
vários ramos da educação, entre eles podemos citar a Educação Física. Abordaremos,
então, a Psicomotricidade e a Educação Musical, buscando relações e contribuições para
uma prática pedagógica efetiva.
Relacionando a Educação Musical com a Psicomotricidade, fazendo uma
reflexão sobre as habilidades musicais e a filosofia de alguns educadores musicais em
uma perspectiva histórica, percebe-se que, embora não com esse nome, há uma
preocupação em se desenvolver o corpo como todo e suas faculdades para o
desenvolvimento das competências musicais.
A partir do séc. XVII, há uma tendência na educação musical em que para a
sensibilização para o processo ensino-aprendizagem utiliza-se o corpo. Com o tempo
surge a necessidade de agregar a dimensão corporal e emocional à educação. Acontece,
então, a implantação da pedagogia ativa.
Entre os pensadores da educação baseados nessa proposta, citamos
Jean-Jacques Rousseau (1712 – 1778) que valorizando o afeto, a personalidade e o culto
à vida interior, “defende a idéia de que a educação se constitui a partir da natureza da
criança e que, portanto, a vida moral deveria ser um prolongamento da vida biológica”
(FONTERRADA, 208, p. 60).
Rousseau é o grande inspirador da psicologia moderna, porque seu naturalismo o
leva a enfatizar as diferenças individuais , a psicologia do crescimento e a
adequação dos processos educacionais aos interesses espontâneos da criança.
Elabora currículos escolares a partir de uma suposta organização do
desenvolvimento psicológico e abre espaço para oaprendizado e a prática da
estética, o ensino profissional, e a educação moral e a educação política, filiados
aos princípios revolucionários de Liberté, Egalité, Fraternité. (IBIDEM)
Assim, em sua próprias palavras:
É medida que o ser sensitivo torna-se ativo, adquire um discernimento
proporcional às suas forças, e é somente coma força que excede aquela de que
precisa para conservar-se que se desenvolve nele a faculdade especulativa
própria para empregar esse excesso de força em outros usos. Quereis, então,
cultivar a inteligência de vosso aluno; cultivai as forças que ele deve governar.
Exercitai de contínuo seu corpo; tornai-o robusto e sadio, para torná-lo sábio e
razoável; que ele trabalhe, aja, corra e grite, esteja sempre em movimento; que
seja homem pelo vigor, e logo o será pela razão. (ROUSSEAU, 1999 apud LIMA;
RÜGER, 2007, p. 100)
Rousseau é o primeiro a apresentar um esquema pedagógico para
educação musical, baseado em canções simples para assegurar flexibilidade, sonoridade
e igualdade às vozes, sem incluir leitura musical. (FONTERRADA, 2008).
Após ele, surge Pestalozzi (1746 – 1827), suíço, acreditava que a
educação no desenvolvimento natural, simétrico e harmonioso de todas as faculdades da
criança, buscando a construção e expressão de idéias, concepção que influenciou a
educação moderna.
Na educação musical enfatizou a utilização de canções por sua
influência no caráter humano. Segundo Fonterrada (2008, p. 61) seus princípios são:
- Ensinar sons antes de ensinar signos e fazer a criança aprender a cantar antes
de aprender a escrever as notas ou pronunciar seus nomes.
- Levá-la a observar auditivamente e a imitar os sons, suas semelhanças e
diferenças, seu efeito agradável ou desagradável, em vez de explicar essas coisas
ao aluno – em suma, tornar o aprendizado ativo, e não passivo.
- Ensinar uma coisa de cada vez: ritmo, melodia, expressão, antes de fazer a
criança executar a difícil tarefa de praticar todas elas de uma vez.
- Fazê-la trabalhar cada passo dessa divisão até que os domine, antes de passar
para o próximo.
- Ensinar os princípios e a teoria após a prática.
- Analisar e praticar os elementos do som articulado para aplicá-los na música.
- Fazer que o nome das notas correspondam aos da música instrumental.
Segundo Lima e Rüger (2007) surgem então, educadores musicais
que criaram metodologias baseadas na vivência corporal. Assim,
ao utilizar o corpo para sensibilizar o aluno a aprender conceitos teóricos-musicais,
eles intuíram a relação estreita existente entre a ação corporal e o
desenvolvimento das estruturas cognitivas e, mais ainda, o quanto de emocional
estava agregado ao movimento corporal.(IDEM, p.100-101).
Dentre esses educadores citaremos Dalcroze e Willems.
- Èmile-Jacques Dalcroze (1865 - 1950)
Suíço, foi educador musical e professor do Conservatório de
Genebra. Propôs um trabalho sistemático baseado na habilidade de escuta e no
movimento corporal, ao constatar problemas na educação da época, que desconsiderava
as relações entre a atividade cerebral e as sensações auditivas, não deixando que os
alunos vivenciassem os elementos musicais.
De acordo com Fonterrada (2008, p. 123), em seu trabalho há duas
preocupações: “a educação musical e a necessidade de sistematização das condutas, em
que música, escuta e o movimento corporal estivessem estreitamente ligados e
interdependentes”. Baseando-se nisso, elaborou seu sistema de educação musical,
conhecido como “Rythmique”. Este, está relacionado coma educação geral, estimulando o
desenvolvimento integral da pessoa, através da música e do movimento. Desenvolve,
também, a escuta ativa, a voz cantada, o movimento corporal e o uso do espaço. Assim,
“estão fundamentalmente interligados, em Dalcroze, a escuta e os aspectos psicomotores
como instrumentos da compreensão/ação/sensibilidade musicais” (FONTERRADA, 2008,
p.131). A autora completa, afirmando que:
O sistema de Dalcroze parte do ser humano e do movimento corporal estático ou
em deslocamento, para chegar à compreensão, fruição, conscientização e
expressão musicais. A música não é um objeto externo, mas permanece, ao
mesmo tempo, ao fora e ao dentro do corpo. O corpo expressa a música, mas
também transforma-se em ouvido, transmutando-se na própria música. No
momento em que isso ocorre, música e movimento deixam de ser entidades
diversas e separadas, passando a constituir, em sua integração com o homem,
uma unidade. Esse é o modo pelo qual Dalcroze supera o dualismo em sua busca
pelo todo.
Assim, com atividades corporais busca-se o desenvolvimento da
escuta ativa, da sensibilidade motora, o sentido rítmico e a expressão. Para isso, utilizamse movimentos como correr, andar, saltar, deslocar-se em direções diferentes, livre ou
com ritmo. Nas atividades musicais, organizadas pela escuta, os exercícios são: bater
palmas no tempo rítmico, interrompendo ou recomeçando, criar movimentos expressivos
para trechos musicais, entre outros. Esses exercícios têm como objetivo alternar,
dissociar ou combinar movimentos, estimular a concentração, a memória, e a audição
interna.
Sobre isto, Lima e Rüger (2007) citam Marie-Laurie Bachmann
(1998), professora licenciada no Instituto Dalcroze e seguidora de seus ensinamentos.
Segundo ela (apud LIMA e RÜGER, 2007, p. 101):
(...) para se obter uma boa execução instrumental e uma percepção sonora mais
aguçada eram necessários bons reflexos, reações rápidas aos estímulos como a
regência, além de uma boa resistência física. Assim estimular a prática corporal
como meio facilitador para o aprendizado musical, resolveria questões práticas da
execução musical, treinando
habilidades motoras e suas conexões mentais
antes mesmo da execução sonora.
Assim, a metodologia Dalcroze trabalha três aspectos musicais: a
rítmica, fundamentada no movimento físico e na percepção auditiva, coordenando ouvido,
mente e corpo; o solfejo, unindo habilidades auditivas, visuais, vocais, cognitivas, rítmicas
e corporais; a improvisação, utilizando e explorando todas as faculdades: movimento
corporal, criatividade, consciência de espaço e tempo, entre outros.
- Edgar Willems (1890 – 1978)
Nasceu na Bélgica e radicou-se na Suíça. Foi aluno de Dalcroze. Em
sua concepção, “existe uma ordem construtiva, natural e necessária à criação, que
ordena natureza, ser humano, música e audição” (FONTERRADA, 2008, P. 138). Baseiase na ciência e na psicologia para a compreensão do ser humano. Rocha (1990, p. 16)
cita os princípios básicos da metodologia Willems:
- as relações psicológicas estabelecidas entre a música e o ser
humano;
- não utilizar recursos extra-musicais no ensino musical;
- Enfatizar a necessidade do trabalho prático antes do ensino
musical propriamente dito.
Segundo Lima e Rüger (2007) ele considera que o ritmo está implícito
em ações como andar, respirar, na pulsação, nos movimentos causados pela emoção ou
pensamentos. Sobre o movimento, ressaltam que ele acontece no tempo e no espaço e
devem ser executados de forma natural e vivenciada. Assim, é necessário que a
imaginação motora tenha experiências rítmicas baseadas em experiências efetivas.
Estudou a audição sob o aspecto sensorial – o nervo auditivo passa
pela sede das ações reflexas (bulbo), afetivo – vai para a sede das emoções (concha
ótica) e mental – chega ao cérebro, repetindo (ou confirmando) os domínios naturais
(considerados por ele diferentes entre si): o físico, o afetivo e o mental. Nesse sentido,
Rocha (1990, p. 17) afirma que “o ritmo é realizado pelas funções fisiológicas, a melodia,
pela sensibilidade afetiva e a harmonia pelas funções intelectuais”. No aspecto teórico,
englobou os elementos fundamentais da audição e da natureza humana; no aspecto
prático, organizou o material didático para sua aplicação. Ainda segundo a mesma autora
observa que para Willems:
A capacidade auditiva depende de um conjunto de fenômenos que apelam cada um, para
uma faculdade diferente e se identificam com a natureza do ser humano. A audição, de
acordo com o autor, apresenta aspectos que Willems denomina sensorialidade, sensibilidade
afetiva auditiva ou afetividade auditiva e inteligência auditiva, que estão em estreita relação
com a capacidade sensório-motora, a sensibilidade afetiva e a inteligência do homem,
prosseguindo, além disso, para uma dimensão espiritual. (IDEM,p. 13)
Assim, ele recomenda iniciar a prática educacional pelo aspecto
sensorial, incentivando a escuta e compreensão do som (sensorialidade auditiva),
apresentando exercícios especiais para distinção auditiva dos parâmetros sonoros –
altura, intensidade, timbre e duração. Para Willems a capacidade sensorial é uma forma
de despertar outras faculdades humanas e maior parte de suas atividades concentra-se
na sensorialidade e na inteligência auditiva.
Na sensibilidade afetiva auditiva caracteriza-se pela escuta sensível,
que é sempre acompanhada “por efeitos autônomos consecutivos de ordem física e
mental” (FONTERRADA, 2008, p. 144). Na questão da afetividade, explica que os
elementos presentes na sensorialidade auditiva fazem parte da escuta sensível –
memória, imaginação e audição interior.
A inteligência auditiva permite-nos tomar consciência do universo
sonoro. Assim ela:
constitui-se, também, em uma síntese abstrata das experiências auditivas
sensoriais e afetivas, pois se constrói sobre seus dados. Os fenômenos que a
inteligência auditiva comporta são a comparação, o julgamento, a associação, a
análise, a síntese, a memória e a imaginação criativa, além da escuta interior.
Willems, classifica o desenvolvimento infantil em estágios (como
Piaget), considerando que esta estrutura está presente na música, no ser humano e na
vida. Assim, eles “vão do material/sensorial ao intelectual, passando pelo afetivo”
(FONTERRADA, 2008, p. 149). De acordo com Rocha (1990, p. 23), ele aconselha a
ênfase na prática interiorizada, obedecendo a ordem natural de “viver os fenômenos
musicais; senti-los sensorialmente e afetivamente; saber o que vivi e mais tarde viver
conscientemente”.
Percebemos que, ao longo do tempo, progressivamente, aparece
uma relação das habilidades musicais com a vivência corporal. As vivências, em suma,
caracterizam-se por atividades que envolvam o movimento corporal, o ritmo, a audição,
entre outros, envolvendo os aspectos psicomotores e que darão bases para o
desenvolvimento de habilidades para a prática musical. Podemos encontrar uma
explicação para essa relação nas idéias de Zampronha (2007, p. 42) quando afirma que a
música “é indutora das atividades motora, afetiva e intelectual, em razão de seus
elementos constitutivos - ritmo, melodia, harmonia, timbre -, de seus parâmetros
formadores - duração, altura, intensidade, densidade, textura - e de seus movimentos
sintáticos e relacionais“.
2.2 Educação Musical e Psicomotricidade
Vejamos, então, algumas habilidades musicais que são necessários
trabalhar para desenvolver-se musicalmente e suas relações com o desenvolvimento
psicomotor.
Mársico (2003) descreve as habilidades musicais sobre a Educação do
senso Músico-Rítmico e a Educação do Ouvido Musical, que se desenvolve em três
planos diferentes, mas que se completam: percepção sensorial, percepção rítmicomelódica, percepção harmônica e polifônica. Nas palavras da autora:
No primeiro nível – percepção sensorial – trata-se de desenvolver o funcionamento
do órgão auditivo e predispô-lo para receber as impressões sonoras. A criança é
levada a reagir sensorialmente aos sons, em geral presentes no seu mundo
sonoro.
No nível da percepção rítmico-melódica, a criança é estimulada a perceber os
desenhos rítmicos e rítmico-melódicos presentes nas canções ou frases musicais
e reproduzí-los, bem como identificar fragmentos melódicos contidos em
canções já conhecidas.
No nível da percepção harmônica e polifônica, (..) trata-se de desenvolver a
perceptiva da criança de modo a permitir-lhe explorar o campo sonoro de uma
composição tanto harmônica quanto polifônica, dando-lhe mobilidade, rapidez e
amplitude necessárias.
Na Educação do senso rítmico temos como elemento principal o ritmo.
Definindo-o como movimento sonoro ordenado, percebe-se sua ampla extensão
englobando vários aspectos: biológico, psicológico, estético, criador. Considerando-o
como elemento pré-musical, Zampronha (2007, p. 43) afirma ainda que “a organização
rítmica pode existir independentemente de qualquer realização auditiva”. Assim,
considera, também, que:
O ritmo é antes de tudo ação, fazendo parte do que o musicoterapeuta Edgar
Willems (1979) chama de consciência motriz, dinâmica, vegetativa. Estruturandose como forma – no movimento e com o movimento -, o ritmo (e seu elemento
disciplinador, o pulso) é recurso pelo qual o indivíduo aprende a viver o tempo que
passa, um tempo que é percebido, aceito, dominado e experienciado em cada
nova escuta musical. (IDEM, p. 44)
Le Boulch (1987, p. 100) diz que “o ritmo traduz uma organização dos
fenômenos sucessivos, tanto no plano da motricidade quanto no plano da percepção dos
sons emitidos no curso da linguagem”. Sobre o desenvolvimento rítmico, ele afirma que
na vida intra-uterina o corpo da criança adapta-se aos biorritmos maternos. Após o
nascimento até os 3 anos a motricidade espontânea vai se organizando pela atuação da
função de ajustamento , representando uma característica essencial do movimento eficaz.
Assim considera que “o que comumente é chamado de movimento coordenado,
corresponde a uma resposta motora harmoniosa e rítmica” (IDEM, p. 331).
Shinca (1991, p. 81) afirma que “o corpo se move em um espaço e em um
tempo, realidades que se correspondem, pois cada gesto ou signo no espaço também se
desenvolve no tempo. E cada movimento no tempo necessita manifestar-se no espaço”.
Assim, em uma análise mais profunda, existe o ritmo fisiológico do movimento, constituído
pelo trabalho muscular; o ritmo interior, relacionado com fatores ambientais e
circunstanciais e o ritmo exterior “como relação de valores sonoros. Como manifestação
temporal, nos permite ordenar o corpo no tempo e no espaço simultaneamente”.
Para Gainza (1964, p. 67) o ritmo é capaz de provocar uma resposta física
direta e espontânea no indivíduo, trabalhando o psicomotor. Isto porque, ao escutar uma
música com predominância rítmica, os músculos do corpo começam a se mexer. A rítmica
e sua vivência corporal exercem, portanto, um papel importante na Educação Musical.
Sobre isto, Zampronha (2007, p .45) completa que:
a música rítmica dá ao educando o sentido e a emoção do movimento, ampliando
sua concepção de mundo. Essa sensação de movimento antecede provavelmente
a possibilidade de realizá-lo, se levamos em conta que, do ponto de vista
embriológico, o sistema motor é o primeiro a se desenvolver.
SHINCA (1991, P. 82) defende que, para que a criança entenda os
elementos métrico-rítmicos com mais facilidade, deve-se trabalhá-los com a aplicações de
palavras, sem utilizar “valores musicais de figuras abstratas”. Segundo a autora “levando
em conta que os princípios sonoros estão contidos na palavra: duração das sílabas,
intensidade (acentuação), altura (inflexões da voz) e timbre, esta é uma auxiliar
inestimável para conduzir a criança à vivência da expressão rítmica”.
Mársico (2003, p. 58) considera que se chega à educação do senso rítmico
através da atividade rítmica. Assim:
A expressão do ritmo através do movimento, é pois, uma atividade que faz parte
da educação musical moderna. Movimentando-se através da música, a criança
aprende a ouvi-la e a responder a ela com imaginação, explorando as idéias
expressivas que contém. Por isso, o movimento deve ser visto como uma forma de
expressão musical e criadora (...) O ponto de partida para a busca da expressão
musical por intermédio do corpo é a descoberta do próprio corpo em movimento, o
domínio e a segurança desses mesmos movimentos. Para isso, a educação
musical moderna busca apoio na expressão corporal, a qual não só promove a
liberação total das energias do ser humano como as canaliza para a expressão,
pela união orgânica do movimento, da voz e da instrumentação corporal.
A autora, citando a definição de Stokoe, afirma que o objetivo da expressão
corporal é “desenvolver no aluno a capacidade física, ritmo próprio e maneira própria de
ser” (MÁRSICO, 2003, p.58).
Sobre trabalhar a coordenação motora (praxia global) Feres (1989, p. 22) diz
que ela sempre acompanha os exercícios de ritmo, não podendo separar um do outro: “a
criança que tem dificuldade de realizar um ritmo geralmente não tem boa coordenação
motora, e, na maioria das vezes é uma criança tensa”. A autora ainda ressalta que as
pessoas, em sua vida diária, usam pouco as mãos e “a ausência do trabalho manual
contribui para o pouco desenvolvimento motor e incapacidade de coordenação”.
Completando seu pensamento afirma que:
é muito comum encontrar instrumentistas que possuem uma técnica perfeita e
que, no entanto, não conseguem transmitir para o público o que sentem. Ao
mesmo tempo, existem pessoas que, embora não tendo domínio completo do seu
instrumento, são capazes de sensibilizar-nos com sua interpretação.
Quando a pessoa sabe se expressar com movimentos corporais, tem mais
facilidade em se comunicar através da musica e das artes em geral. É muito
importante fazer com que a criança aprenda a soltar o seu corpo ao sabor da
música, para que seja capaz de se expressar por meio dela.
Completando esta idéia, Mársico (2003, p.58) diz que “a expressão do ritmo
pelo movimento contribui para desenvolver no aluno a imaginação e o controle corporal,
bem como a formação dos conceitos de rápido/lento, forte/fraco, longo/curto, em termos
de movimento corporal, predispondo-o para a experiência e favorecendo a prontidão e
precisão de suas respostas rítmicas”.
Mas que habilidades são necessárias para desenvolver o senso rítmico?
Ora, sob um olhar da psicomotricidade e seus aspectos, o desenvolvimento rítmico está
diretamente relacionado com a estruturação temporal e espacial, coordenação global, fina
e óculo-manual. Sob um sentido mais amplo, envolve os demais também, visto que eles
se desenvolvem (ou devem desenvolver) juntos.
Analisando diferentes metodologias e propostas para Educação Musical,
enfocando o desenvolvimento do senso rítmico – noções de pulsação, tempo, compasso,
subdivisão e tempos -, e atividades para o desenvolvimento dos aspectos psicomotores,
em literaturas especializadas, observa-se que para sensibilizar e se chegar na execução
rítmica, seja corporal ou instrumental, leitura e escrita há descrições de atividades com
movimento corporais de locomoção como: andar, correr, saltar, galopar, caminhar,
arrastar-se, engatinhar, bater palmas utilizando vários membros do corpo e fazendo
combinações entre eles: mãos, joelhos, pés, pernas. Como lembra Mársico (2003, P. 60),
para se atingir os objetivos propostos, “esses movimentos precisam estar, desde o início,
relacionados com a música. Assim, com objetivo de buscar a simultaneidade das batidas
e a prontidão, as ações devem acompanhar um trecho musical, seguindo os elementos
rítmicos: pulsação, acentuação (métrica), subdivisão, entre outros, associados a jogos e
canções para acompanhamento rítmico (FERES, 1989, p. 9; GAINZA, 1964, p.79; LE
BOULCH, MÁRSICO, 2003, p. 59 1987; SHINCA, 1991).
Na Educação do Ouvido Musical, o elemento principal é a percepção
sonora, envolvendo a melodia, os parâmetros sonoros – altura, intensidade e timbre –
afinação, harmonia, entre outros. Zampronha (2007, p. 45, 46), define melodia como
“sucessão temporal de sons e silêncios com sentido e direcionalidade”, sustentada (no
caso do Ocidente) “por uma estrutura acordal presente e/ou subtendida”. Vincula-se à
nossas tendências e inclinações, à consciência afetiva, à transformação de impressões
em expressões e a um contexto cultural. Quanto a sua natureza, a autora considera que:
Tendo o ritmo como denominador comum, sua natureza é física (sensorial) e
psicológica (afetiva). Física, porque as relações sonoras, base material da
melodia, induzem prazer e/ou desprazer, ou seja, falam à nossa sensibilidade,
essa propriedade psicofísica do indivíduo que lhe permite experimentar estímulos.
E natureza psicológica pelo fato que as relações sonoras, dotadas que são de
sentido, induzem movimentos afetivos correspondentes, em que os elementos
duração e intensidade acabam por se tornar vitais na ação do poder emocional no
discurso melódico. (IBIDEM)
De acordo com Gainza (1964, p. 110), a criança percebe toda melodia como
uma unidade sonora que afeta diretamente sua sensibilidade e, em determinado
momento, pode incorporar-se em sua vida interior.
Sobre a percepção, Mársico (2003, p. 26) baseando-se no estudo Abbadie e
Gillie, aponta que, nas relações do universo sonoro com a criança , “o universo sonoro é
um espaço-tempo”. Assim, o sujeito percebedor pode identificar a fonte sonora e fazer
sua localização no tempo e no espaço. O estudo aponta, ainda, que:
nos primeiros anos de vida, os dados sensoriais recolhidos pelos órgãos dos
sentidos são confusos, cabendo à atividade sensório-motora ordená-los. E,
somente quando as impressões sonoras causadas por um agente exterior
transformam-se em sensação auditiva e esta é interpretada pelo cérebro, tem-se
então o que se convencionou chamar de percepção.
A percepção, então, é “uma interpretação de dados que chegam ao
indivíduo através dos sentidos, um processo no qual interferem as disposições pessoais
do indivíduo, tanto orgânicas quanto afetivas”, considerando suas vivências e
experiências. Completando, “graças à atividade perceptiva, o indivíduo ultrapassa o
simples contato sensorial com o mundo e passa a compreendê-lo” (IBIDEM). Portanto,
para Abbadie e Gillie (apud MÁRSICO, 2003, P. 27) “a educação auditiva vai muito além
da aquisição de uma simples virtuosidade sensorial: é um poderoso meio de
conhecimento posto pela natureza à disposição do indivíduo”.
No desenvolvimento da percepção auditiva (sensorial, rítmico-melódica e
harmônica-polifônica) busca-se atividades de exploração, discriminação e identificação de
sons, determinando sua localização e direção. Através de exercícios como estes, ela vai
se estruturando musicalmente, compreendendo a música e chega no nível em que podese aplicar atividades de percepção para organização dos sons como:
- estabelecer as relações entre os sons que compõem a melodia (intervalos) e
entre o tema ou temas (idéia musical);
- acompanhar o movimento dos sons, ou seja, seu fluir;
- apreender o momento culminante da frase ou frases musicais;
- detectar o número de frases presentes, por exemplo, numa canção;
- identificar os pontos de repouso (cadências), etc.
(MÁRSICO, 2003, p. 41)
Para que a criança possa realizar estas atividades é necessário que ela
saiba se situar no tempo e no espaço e tenha noção de direção. Portanto precisa ter
desenvolvido, principalmente, a estruturação têmporo-espacial e a lateralidade. Ora, se
um desses elementos não estiver bem estruturado, certamente ela terá dificuldades para
entender e se desenvolver musicalmente. Como Louro (IDEM, p. 62) ainda exemplifica:
Quantas vezes um professor de música se depara com um aluno inteligente, com
as funções físicas intactas, que enxerga e ouve bem, mas que, por algum motivo
não consegue compreender conceitos musicais simples, distinguir intervalos
melódicos, possui grande dificuldade motora ao instrumento? Tudo isso, entre
outros problemas, pode ser falta de uma estimulação, pode ser um problema
psicomotor.
Refletindo sobre estas idéias, percebe-se a necessidade de se conhecer
como se processa o desenvolvimento musical na criança. Sobre isto Mársico (2003, p. 18)
afirma que “esse conhecimento oferece, assim, ao professor, um ponto de referência para
avaliar se um grupo de determinada idade está tendo um desempenho musical de acordo
com sua idade mental, desenvolvimento social, emocional e físico". No primeiro capítulo,
há a descrição, sob diferentes conceitos (que se entrelaçam), de como acontece o
desenvolvimento sob um sentido amplo. Veremos, então, como acontece a aprendizagem
e o desenvolvimento musical e a relação com o desenvolvimento Psicomotor.
2.3 A aprendizagem musical: teorias do desenvolvimento
Abordaremos neste assunto as idéias de três autores: Leda Osório Mársico
que, baseada em diversos autores da psicologia do desenvolvimento humano e musical,
faz uma descrição sobre o processo de aprendizagem musical em crianças de 0 a 12
anos; Edwin Gordon que fez um estudo profundo sobre os processos influenciadores do
desenvolvimento musical e estabelece fundamentos teóricos para o processo ensinoaprendizagem; e Keith Swanwick que elaborou u,a teoria do desenvolvimento musical,
conhecida como a Teoria da Espiral..
2.3.1 Leda Osório Mársico
A autora (2003, p. 11), baseando-se em Mursell afirma que o
desenvolvimento musical inicia-se com experiências concretas encaminhando-se de
modo contínuo, até chegar ao conhecimentos abstratos da linguagem musical. Aborda,
também, a existência da musicalidade - capacidade de dar respostas a padrões rítmicos
e melódicos.
Ao referir-se à natureza do desenvolvimento musical, Mursell destaca que, no
decorrer desse desenvolvimento, a resposta à música, relativamente informe,
imprecisa no começo, transforma-se, pouco apouco, em uma resposta
estruturada. E, à medida que se processa essa modificação, verifica-se também
um aumento na complexidade e especificidade estrutural: os conceitos musicais,
inicialmente aprendidos de modo muito vago, pelo processo de aprendizagem, vão
progressivamente sendo compreendidos e assimilados.
Ainda segundo Mursell (apud MÁRSICO, 2003, p.13) é necessário a
diferenciação progressiva para que ocorra a integração dos elementos musicais , fato que
contribui para a compreensão mais aprofundada dos conteúdos musicais – domínio de
estruturas rítmicas e melódicas, relações tonais, entre outros.
É através da diferenciação que se estabelece a diferenciação entre
motivos musicais, os sons – altura , duração, intensidade, timbre, entre outros. Na
integração dos elementos musicais é necessário a capacidade de identificação e
reconhecimento perceptivo
Mársico (2003) baseando-se em vários autores, faz uma descrição
das características do desenvolvimento musical de acordo com a faixa etária,
classificando por estágios: 0 a 2 anos – 1º estágio, 3 a 6 anos – 2º estágio, 7 a 12 anos –
3º estágio, adolescência – 4º estágio. Para isso, considera que:
a) o desenvolvimento musical é um continuum no qual ocorrem mudanças à
medida que se processa;
b) tendo-se presente que o ser humano passa, necessariamente, por estágios de
desenvolvimento, nos quais sem sempre ocorre correspondência entre o nível de
idade e o nível de qualidade daquilo que o indivíduo é capaz de fazer e,
c) verificando-se que os estudos já realizados sobre o desenvolvimento humano
não dispõem de unidades absolutas, optou-se por estabelecer um ciclo de
desenvolvimento musical como uma sucessão de quatro estágios, com fins
didáticos (..). (IDEM, p. 17)
Segundo a autora, muitos estudiosos do desenvolvimento infantil
afirmam que as aptidões musicais manifestam-se muito cedo, já sendo observada no
primeiro ano de vida. Gesell (apud MÁRSICO, 2003, p. 19) afirma que com 18 meses “a
criança já é capaz de emitir sons musicais, espontaneamente, empregando sílabas, de
prestar atenção a certos sons (campainhas, apitos, relógios, etc) e reage ritmicamente à
música como uma atividade total do corpo”. Assim, nesse período, o comportamento
infantil classifica-se como vocal, rítmico e auditivo.
Para Howard (IDEM, p. 22) “o contato da criança como mundo, desde
seus primeiros momentos de vida, constituíra a base para e o desenvolvimento de suas
capacidades de percepção e o alimento para sua vida futura”. Assim, faz-se necessário
que a s impressões sonoras sejam variadas e com mudanças frequentes para que a
criança possa ter possibilidade de comparar.
A criança dos três aos seis anos é mais sensorial que as crianças
maiores, sendo um período propício para estimular o desenvolvimento dessa percepção.
Sobre isso Mársico cita Tomatis (IDEM, p. 26) afirmando que “a criança pequena
intelectualiza sua sensorialidade”. Nessa faixa etária, juntamente com a percepção
sensorial, é necessário trabalhar também a percepção rítmico-melódica.
No sentido da percepção musical a autora, citando as pesquisas
realizadas por Zenatti, (IDEM, p. 40) mostra que crianças de 6 anos “é capaz de
classificar
sons em agudo e grave, comparar dois sons quanto aos seus atributos,
diferenciar sons equidistantes de um tom ou semitom, reproduzir batimentos regularmente
(pulsação rítmica)” mas “ainda não possui o ouvido harmônico”. Assim, conclui dizendo
“que o desenvolvimento da percepção melódica e harmônica depende da assimilação
progressiva da própria linguagem musical.”
Na educação do senso rítmico Mársico (IDEM, p.58) destaca que este
“é o elemento musical que parece estar mais próximo da criança”. Assim, baseando-se
nos princípios de Dalcroze (já abordados nesta pesquisa), considera o movimento “um
meio pedagógico direto, útil e indispensável para o desenvolvimento do instinto rítmico”.
Porém, na faixa etária hora abordada, devido às características do desenvolvimento, é
necessário que as atividades envolvam
movimentos físicos utilizando os músculos
maiores (IDEM, p.60).
Aos 7 anos a criança é capaz de realizar vários movimentos pois sua
habilidade motora já está bem desenvolvida. Com a coordenação bem definida pode-se
introduzir jogos cantados e danças mais elaboradas. Paralelo ao sistema nervoso,
amadurece a capacidade de ouvir. Assim, apoiando a aprendizagem nas experiências
anteriores e utilizando materiais concretos, a autora considera que:
A prática da música, nesse momento, permite não só dar expansão à atividade da
criança, aliviar suas tensões e cansaço, como introduzí-la no vocabulário musical
específico, expandir o número e os tipos de experiência
em todas as áreas
de abrangência da educação musical e, se for o caso, iniciar a criança na
alfabetização musical. (IDEM, p. 92)
A partir dos 8/9 anos a atenção está mais desenvolvida. Há o
aperfeiçoamento das coordenações motoras (praxia fina e global)4 e a concentração para
atividades com pequenos músculos (mãos, pés e olhos, principalmente) está mais
refinada. É propício, então, a introdução de atividades com uso de instrumentos de
percussão. Há uma melhora na qualidade e extensão da voz, sendo o canto um dos
objetivos centrais da educação musical nesse período. Faz-se importante lembrar que
Por volta dos 8 anos, as relações de ordem temporal (ante e depois) coordenamse com as durações (mais ou menos tempo) e geram a noção de tempo comum
aos diversos movimentos de velocidades distintas (interiores e exteriores). Nesta
fase constituem-se, sobretudo, as operações qualitativas que estruturam o espaço:
ordem de sucessão espacial. (IDEM, p.95)
Completando sobre o desenvolvimento dessa faixa etária, Mársico
(2003, p.94) afirma que:
A criança que já é capaz de inventariar sons, discriminar e identificar sons do meio
ambiente e de objetos sonoros, bem como caracterizá-los, reconhecer e reproduzir
a direção de movimentos sonoros, classificar sons quanto à altura, à intensidade,
à duração e ao timbre, reproduzir melodias e canções, deverá, no domínio da
sensorialidade auditiva, organizar sons no espaço e no tempo.
A partir dos 10 anos, valendo-se do interesse por invenções, humor,
mistério, aventura, típicos dessa idade, pode-se utilizar dramatizações, atividades que
4 Ver capítulo I: Psicomotricidade.
utilizem música com conteúdo que estimule a imaginação, leitura de livros, entre outros.
2.3.2 Edwin Gordon
Pesquisador
norte-americano,
desenvolveu
pesquisas
sobre
a
observação de processos cognitivos-musicais aplicando à área musical uma estrutura
sequencial de desenvolvimento (FREIRE, 2005, p. 125). Inicialmente interessa-se pela
aptidão musical e os processos que o influenciam e, posteriormente, amplia seus estudos
para o processo ensino-aprendizagem da música, estabelecendo a Teoria da
Aprendizagem Musical (figura 1), que influenciou outros pesquisadores da área. Sua
proposta tem como objetivo explicar como as pessoas aprendem música, fornecendo
subsídios para o ensino da mesma. Assim, Gordon
dedicou-se a estabelecer uma estrutura de competências musicais nas quais ficam
evidente os processos sequenciais da aprendizagem. (...) Tais orientações
perpassa, pelo conceito central de audição, ou seja, os processos cognitivos
fundamentais para a compreensão e retenção do conhecimento musical. (IDEM, p.
128)
Para ele, a aprendizagem pode acontecer de duas maneiras:
- Discriminação: quando, partindo da imitação e comparação, há a
consciência de estar aprendendo;
- Inferência: sem imitação, descobre-se individualmente soluções
próprias para o que se pede.
Em suas palavras: “embora possa ensinar aos alunos como e o que
aprender no nível da discriminação, o professor, no nível da inferência, só pode guiar os
alunos quanto ao modo de aprender ao nível da inferência” (IBIDEM).
Assim, dividiu a aprendizagem em vários níveis de acordo com sua
classificação de discriminação e inferência. Na discriminação, temos os estágios
aural/oral, associação verbal, síntese parcial, associação simbólica e síntese composta.
Na Inferência, temos a generalização, criatividade/improvisação e compreensão teórica.
(FREIRE, 2006)
- Aural/Oral – refere-se a apresentar os sons musicais para que seja
percebidos e, depois, reproduzidos com canto e sílaba neutra.
- Associação verbal – os sons explorados no estágio anterior deverá
associar-se com sílabas para solfejo (melódico) ou sílabas métricas (rítmico). Assim,
estabelece o vínculo entre os sons e o nome das notas.
- Síntese parcial – refere-se a diferenciar estruturas em diferentes
modos rítmicos ou melódicos.
- Associação simbólica – neste estágio, o processo trabalha o som
(ouvir), a leitura (ler o que cantou) e escrever.
- Síntese composta - baseando-se nas competências já trabalhadas,
diferencia modos e métricas contrastantes, partindo da leitura e da escrita.
Percebe-se que, em cada estágio, há sempre um vínculo com o
anterior. Gordon (apud FREIRE, 2005, p. 130) explica:
Imagine uma sala de aula na qual a música é ensinada de acordo com princípios
de uma teoria da aprendizagem musical. Uma vez que as aulas são desenvolvidas
como parte de um programa sequencial, tudo o que os estudantes então
aprendendo é construído logicamente a partir do que ele já aprenderam, e desta,
maneira os estudantes descobrem que o conhecimento apreendido faz sentido e
eles podem aplicar este conhecimento imediatamente na performance de todos os
tipo de música.
5
Figura 1 – Níveis e subníveis de sequências de competências musicais5.
2.3.3 Keith Swanwick
Elaborou uma teoria do desenvolvimento musical (figura 2), conhecida
como Teoria da Espiral, que “contempla os elementos comuns a toda experiência musical
significativa: material sonoro, caráter expressivo, forma e a possibilidade de se conceber a
música como um sistema simbólico (SWANWICK e TILLMAN apud FONSECA, 2009 b,
p.80). Segundo Fonseca (2009 b) forma analisadas composições (principalmente
instrumentais) de crianças de 3 a 11 anos, que, nas palavras de Swanwick (apud
FONSECA, 2009 b, p. 80), foi “um estudo transversal das músicas criadas por crianças de
diferentes idades em um estudo longitudinal das composições de algumas crianças
durante um certo período de tempo”. Assim, “esses grupos revelaram uma sequência de
mudanças
qualitativas
da
compreensão
musical,
ou
seja,
mostraram
que
o
desenvolvimento musical acontece a partir de níveis ordenados e cumulativos (FRANÇA e
SILVA, apud FONSECA, 2009 b, p. 80),
Na Teoria da Espiral, faz uma sequência do conhecimento musical,
baseando na filosofia de que “o conhecimento artístico não é um domínio separado das
outras atividades da mente, mas extrai sua substância do mesmo material psicológico que
a ciência , a filosofia, e as outras formas do discurso simbólico”. (FONTERRADA, 2008, P.
112). Ainda segundo a autora, há uma releitura das idéias piagetianas, utilizando conceito
de intuição e análise (assimilação e acomodação).
Nesse modelo, passa-se por 4 blocos: material, expressão, forma e
valor, experimentando a atividade ou ação, seguindo tendências ora assimilativas e
intuitivas ora acomodativas e analíticas, o que resultou nos oito níveis de
desenvolvimento. Esses níveis, segundo França e Silva (apud FONSECA, 2009 b, p.81)
são cumulativos, não sendo possível atingir os mais altos sem passar pelos inferiores.
Fonterrada (2008, p.113) conclui que:
5 FREIRE, 2006, p. 897.
Pode-se dizer que o modelo de Swanwick parte do intuitivo para se chegar ao
lógico, e do individual para chegar ao universal, constituindo-se, portanto, em um
exercício de interpretação pessoal da experiência de vida. Sendo assim, para ele,
nenhum tipo de experimento é neutro, pois vem marcado pelas experiências do
sujeito e por sua própria interpretação.
Assim temos os blocos, já citados, e seus níveis que, segundo
Fonseca (2009 b, p. 82,83 e 84)) se classificam da seguinte maneira (baseadas na
análise feita através das composições):
- Materiais (0 a 4 anos)
Sensorial: Caracteriza-se pelo prazer intuitivo de brincar,
explorar e reagir às descobertas com os sons, sendo eles muito intensos ou muito suaves
e com pulsação instável.
Manipulativo: Há controle dos sons e do pulso, mantendo-se
regular e partindo da intuição para a análise, da assimilação para a acomodação.
- Expressão (4 a 9 anos)
Pessoal: A expressão torna-se possível pelo controle dos sons,
sendo a música intuitiva e espontânea. Há sinais de pequenas frases e gestos musicais e
o domínio para acelerar, ralentar e alterar a dinâmica.
Vernacular: Imitação do que se ouve com repetições de
padrões melódicos e rítmicos. Apresentação de estereótipos métricos, repetição de
temas, ostinatos, acomodação às exigências locais.
- Forma (10 a 15 anos)
Especulativo: Transcendência da repetição de padrões. Há a
especulação, a criação de novo temas, a experimentação de outras possibilidades
estruturais para criação de finas inusitados.
Idiomático: Utilização de perguntas e repostas e elaboração de
sessões contrastantes.
- Valor (a partir de 15 anos)
Simbólico: Habilidade técnica objetivando a expressividade
musical. Manifestação de comprometimento pessoal com a música.
Sistemático: Expansão do discurso musical, sendo objeto de
reflexão e celebração. Busca por estudos e pesquisas sobre materiais e técnicas para
basear novas composições.
Sobre o processo de desenvolvimento desta teoria Swanwick (apud
FONSECA, 2009 b, p. 84) afirma que:
Ao lado esquerdo está a dimensão lúdica da motivação interna; começando pela
quase completa exploração intuitiva das qualidades sensoriais do som, as quais se
transformam de acordo com a expressividade de cada indivíduo, evoluindo então
para especulações estruturais, e finalmente, atingindo o compromisso pessoal
com a significância simbólica da música. Essa compreensão intuitiva é expandida
e alimentada pelo lado direito de espiral, com tendências imitativas e analíticas: a
partir do domínio de habilidades, segue-se a incorporação das convenções e, a
seguir, dos estilos, chegando à expansão sistemática das possibilidades musicais.
Assim, percebe-se uma relação com as teorias de desenvolvimento
de Piaget e Vygotsky. Para Piaget, há o trabalho da própria criança para o seu
desenvolvimento e Vygotsky coloca como principal fator o meio social em se está inserido
(FONSECA, 2009 b, P.84). Sobre isto, França e Silva (apud FONSECA, 2009 b, p. 84)
colocam que:
a relação do lado esquerdo do Modelo Espiral com a teoria piagetiana de
desenvolvimento cognitivo, e o lado direito com as idéias de Vygotsky (...) Os
insights de Piaget e Vygostsky se amalgaram ao Modelo Espiral, conferindo-lhe
significância teórica e empírica. O impulso em direção ao desenvolvimento
musical, inicialmente auto-gerado, é logo complementado e aperfeiçoado pelas
trocas com o meio ambiente.
Figura 2 – Modelo Espiral de Swanwick.6
Ainda sobre teorias de desenvolvimento musical, Zampronha, (2007, p. 131
e 132) cita o educador Gonzalo Brenes (1954) que classificou o desenvolvimento musical
infantil em quatro etapas: ritmo, melodia, harmonia e forma.
- Fase do ritmo – corresponde à fase sensório-motora de Piaget. Através de
movimentos mais livres e, posteriormente, com movimentos mais coordenados, a criança
reage e percebe ao ritmo musical.
- Fase da melodia – corresponde à fase pré-operacional. A criança mostrase sensível à linha melódica, começando a emitir série de sons com intervalos pequenos.
Inventa e reproduz música e trecho com características já conhecidas.
- Fase da harmonia – corresponde à fase operacional-concreta. Há o
interesse pelos efeitos pela combinação simultânea dos sons, a harmonia.
− Fase da forma – corresponde à fase operacional-formal. Com a
percepção ampliada, passa-se a entender as estruturas e formas
musicais elementares (IBIDEM).
6 FONSECA, 2009 b, p. 81.
Através destas idéias, percebe-se que a Educação Musical deve ser
trabalhada de forma concreta, com a vivência corporal. Os métodos a serem utilizados
devem estar adequados às necessidades do aluno, visto que é um ser em
desenvolvimento
sob
vários
aspectos
e
os
conceitos
aprendidos
vão
sendo
compreendidos e assimilados progressivamente. Como ainda afirma Mársico (2003, p.
155) “o desenvolvimento musical da criança processa-se de modo contínuo em função da
própria “musicalidade”. Coloca em atividade os domínios afetivo, psicomotor e cognitivo e
implica mudança”. Assim, a autora coloca que (IDEM, p. 94) o professor conhecendo os
níveis de desenvolvimento musical nas diferentes etapas do desenvolvimento
no que se refere ao crescimento vocal, às respostas rítmicas, ao desenvolvimento
do ouvido musical, às respostas criativas em música e as
níveis
de
compreensão musical , após analisar cada um dos seus alunos em termos de
habilidades, capacidades, necessidades e nível de desempenho, pode organizar
uma programa de música para cada série, de modo a atender às diferenças
individuais e à áreas de abrangência da disciplina, dando oportunidade a todos de
progredir de acordo com suas possibilidades.
Considerações Finais
No decorrer do estudo, observou-se que a Educação Musical, quer na prática de
instrumento ou no entendimento teórico, requer um bom desenvolvimento psicomotor e,
de
acordo
com
as
atividades
propostas
musicalmente,
estas
estimulam
o
desenvolvimento os aspectos psicomotores. Assim, pode-se dizer que a relação da
Educação Musical com a Psicomotricidade é estreita, uma dependendo da outra.
Ao fazer uma 'retrospectiva' da Educação Musical e suas concepções sob um
enfoque histórico, percebe-se a mudança de filosofia que embasa sua prática e o novo
olhar sobre a vivência corporal, surgindo novas metodologias. Assim, pode-se concluir
que é necessário partir do concreto para depois chegar aos níveis que exigem maior
capacidade de abstração do aluno.
Analisando as idéias aqui expostas, percebemos que há uma estreita relação entre
o desenvolvimento humano e o desenvolvimento musical. É necessário que o professor
de música conheça estes processos, para que saiba onde e como atuar e possa buscar
soluções para as dificuldades apresentadas pelos alunos. É válido lembrar que é preciso
respeitar o nível de desenvolvimento do aluno. Algumas teorias aqui descritas fazem
alusão à idades e seu potencial de desenvolvimento, mas nem todos se desenvolvem da
mesma maneira. Este, depende de fatores psicológicos, físicos e sociais para acontecer.
Assim, estando com um grupo é necessário considerar que cada aluno terá sua maneira e
tempo de aprender o que lhe é proposto.
Considerando estes aspectos, pode-se dar ao educando, em qualquer nível de
desenvolvimento (independente de sua idade cronológica) a oportunidade de desenvolver
suas habilidade musicais e vivenciá-las e, consequentemente, de desenvolver seus
aspectos psicomotores, que estão ligados ao desenvolvimento global.
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