Prática musical de DJs: um estudo sobre formação musical

Prática musical de DJs: um estudo sobre formação
musical e tecnologia
Juciane Araldi1 (UFPB)
Resumo:
Essa comunicação apresenta resultados de uma pesquisa que procurou
investigar a prática musical de DJs sob o ângulo da educação musical,
privilegiando seus modos de formação e prática musical. Teve como
questões: Quais aspectos integram a formação musical de DJs? Quais os
meios e materiais utilizados na sua formação musical? Onde e como atuam?
Há transmissão de conhecimentos para outros DJs? A temática desse
trabalho se relaciona com o interesse da área da educação musical em
investigar a formação musical sob uma abordagem sociocultural
relacionando as diferentes formas de “aprender música” advindas dos
materiais e ferramentas proporcionados pelas transformações tecnológicas.
Palavras-chave: DJs; aprendizagem musical; mídia.
Introdução
A prática musical de DJs (discjokeys) consiste em uma expressão artística que
envolve diversos elementos. Entre eles, destacam-se a produção musical, a
utilização de trechos de outras músicas, mixagens e samplers e o uso do tocadiscos como instrumento musical. A partir do momento em que o DJ começou a
utilizar o disco não apenas para reproduzir música, mas também para extrair e
recortar sons dele derivados, ele passou a ser considerado como um artista
(FIKENTSCHER, 1991). Dessa forma o uso do toca-discos proporcionou uma
redefinição de conceitos, sendo visto como um instrumento musical e do DJ como
performer.
Esse texto traz uma reflexão sobre tecnologia e formação Musical de DJs, a
partir dos dados da dissertação de mestrado “Formação e Prática Musical de DJs:
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um estudo multicaso em Porto Alegre”1. A pesquisa procurou investigar a prática
músical de DJs sob o ângulo da educação musical, privilegiando seus modos de
formação e prática musical. A metodologia utilizada foi o estudo multicaso, tendo
como participantes quatro DJs – Anderson, Duke Jay, Nezzo e Tom.
A realização dessa pesquisa foi entre os anos 2002 e 2004. Na época os DJs
faziam parte da cena hip hop da cidade de Porto Alegre, atuando também em
outros segmentos musicais como bandas de diversos gêneros e formações; produção
de bases para grupos de rap; radio, programas educativos de TV, dentre outros. Os
DJs tinham alguns pontos em comum na sua trajetória tais como: formação inicial
na cultura hip hop, primeiro contato com os toca-discos na década de 80. (ver:
Araldi, 2004; 2007; 2009; e Souza, Fialho e Araldi 2008). Como o acesso aos
equipamentos quando começaram a trabalhar com os toca-discos era difícil, foram
necessárias muitas adaptações nos equipamentos que tinham disponíveis, e a
medida que a tecnologia foi evoluindo, tanto o acesso quanto a forma de trabalhar
com os equipamentos também foi se modificando. Segundo Bacal (2003) as novas
tecnologias constituem um universo muito amplo no fazer musical. Segundo a
autora, este universo engloba:
As músicas concreta e eletrônica, no âmbito erudito, as experimentações
do rock com esses registros a partir de 1966, a invenção da fita cassete e
do LP, do rádio e do microfone, a disco music, a música pop e o desenlace
da dance music em múltiplos gêneros e subgêneros. Todas essas
manifestações musicais usam máquinas cada vez mais sofisticadas para
produzir música, e vão deixando de lado instrumentos musicais
convencionais. As máquinas entram não só nos estúdios, mas também no
lugar privilegiado da performance. (BACAL, 2003, p. 13)
A temática formação musical de DJs, vem ao encontro do interesse da área de
educação musical em entender as diferentes formas de transmissão e apropriação
musical (KRAEMER, 2000; SOUZA, 2009). Procurar entender a forma como cada ser
humano se relaciona com a música, tem sido estudado a partir das teorias do
cotidiano. Segundo Souza (2009) “A perspectiva dessas teorias analisa o sujeito
1
Dissertação de mestrado realizada no PPG Música da UFRGS sob orientação da Profa. Dra. Jusamara Souza,
período 2002-2004 com apoio da CAPES.
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imerso e envolvido numa teia de relações presentes na realidade histórica prenhe
de significados culturais. Logo, a aprendizagem não se dá num vácuo, mas num
contexto complexo” (SOUZA, 2009, p. 7). Tendo em vista que os DJs investigados
iniciaram sua prática de maneira informal, aprendendo com os amigos, com a
comunidade em que viviam, com os programas de radio e de tv, com a internet, os
dados sobre sua formação musical contribuem sobremaneira para a compreensão
das diversas formas de aprender e consumir música e suas mudanças diante das
transformações tecnoógicas.
Como essa pesquisa foi realizada entre 2002 e 2004, e diante do crescimento
veloz das novas tecnologias, esse texto traz os dados dialogando com o avanço
tecnológico destes seis anos. Orienta-se basicamente na pergunta: E como seria a
relaçao dos DJs com a tecnologia se essa pesquisa fosse realizada hoje? Ao procurar
ententer que transformações essa prática musical pode ter sofrido durante esse
tempo, podemos também compreender e buscar alternativas para dialogar com as
diferentes formas de ouvir e aprender música hoje.
Essas relações que os DJs apresentam com a tecnologia são resultantes das
adaptações e utilizações dos aparatos eletroeletrônicos que surgem decorrentes
das transformações tecnológicas. Segundo Souza (2003a, p. 111), “as mudanças
sociais e tecnológicas trouxeram também mudanças nas experiências musicais,
contribuindo para outros modos de percepção e apreensão da realidade e os
próprios modelos de formação musical”.
Para tanto, esse texto está dividido em três partes: na primeira apresento os
resultados da pesquisa, na segunda uma análise sobre a aprendizagem musical e
mídia e na terceira, as considerações finais apresentando os desdobramentos desta
pesquisa e seus aspectos pedagógico-musicais.
A formação e prática musical a partir das experiências de 4 DJs.
Compreender a formação e a prática musical de DJs implicou em desvendar a
complexidade e a estrutura desse fazer musical, a partir dos seus modos de
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aprender. O estudo mostrou que a formação musical dos DJs entrevistados é
determinada
pelos
meios
e
estratégias
que
desenvolvem
nas
relações
socioculturais. Além disso, ficou evidente as diferenças entre a forma como faziam
música na época da pesquisa e como faziam na década de 80, quando iniciaram.
“Toda essa trajetória de formação demonstra como a prática pode se transformar e
quais os elementos que se mantêm a partir das transformações tecnológicas
vivenciadas por eles dese que iniciaram essa prática musical“ (ARALDI, 2009, p.
120).
Sobre essas transformações, Lévy (1999, p. 11) aponta para um “novo espaço
de comunicação e cabe apenas a nós explorar as potencialidades mais positivas
deste espaço nos planos econômico, político, cultural e humano”. Esse espaço o
autor denomina “ciberespaço”, que surge da “interconexão mundial dos
computadores” (p. 17).
Os quatro DJs entrevistados apresentam2 uma relação de curiosidade,
experimentação e adaptação com relação aos aparelhos na sua formação musical.
Isso está relacionado à própria forma de trabalhar com os elementos e a matériaprima que compõe a prática musical de DJs. Eles destacam em vários momentos de
suas falas a infinidade de materiais que precisam pesquisar para fazer as escolhas e
integrá-las nas suas performances, discotecagens e produções. O termo “pesquisa”
aparece sempre como a motivação para o trabalho.
Além da experimentação com o equipamento disponível, surgem as relações
de trocas com outros músicos, cursos e festivais que fazem parte da formação
musical destes DJs. Mesmo passando a maior parte do tempo treinando sozinhos,
eles destacam a importância de tocar e aprender juntos.
Os DJs mostram a importância de estar em contato com o equipamento,
treinando, tocando e pesquisando para aprimorar cada vez mais a sua prática. Para
que isso aconteça, é preciso ter os aparelhos, ou então ter a oportunidade de
treinar na casa de alguém que forneça esse equipamento. Isso revela a qualidade, a
importância e o envolvimento com o toca-discos.
2
Alguns dados da pesquisa vou trazer em tempo presente, visando um maior diálogo com a época atual.
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No que se refere à prática musical de DJs nos seus diferentes espaços de
atuação e produção musical, os dados revelam características importantes, tais
como: aprender com a platéia no momento da discotecagem; relações de trocas
com outros músicos e instrumentos quando tocam nas bandas; escolha de materiais
e pesquisa sonora e produção de grupos de rap.
É comum o DJ circular por diversos espaços e estilos, tais como o pop rock,
MPB, bossa nova e rap, demonstrando assim a sua interação como performer. Nas
produções, há a preocupação estética com “o que” e “como” utilizar os materiais
sonoros com criatividade, o que resulta, por exemplo, em criações a partir de
trechos musicais já gravados.
O desprendimento para ser eclético se revela no uso de vários estilos
musicais em suas colagens. Eles declaram que o “universo é o nosso limite”, “todo
o disco é nota” é só “escolher e fazer, o DJ trabalha com uma alquimia perfeita”,
“é preciso entrar na música, e sentir a música, a partir daí tu sabe o que fazer”.
Assim para os DJs, músicas gravadas são material sonoro a ser transformado e
recriado. Isso pode ser visto na fala de DJ Nezzo:
pegamos por exemplo, um som, não necessariamente um bumbo, mas a
gente pode bater numa mesa (bate na mesa, uma batida curta) e sampleia
isso, e modifica esse som, e cria dali um bumbo ou uma caixa. Podemos
pegar uma nota de um teclado, subdividir, ou no toca-discos mesmo, em
várias escalas e trabalhar ela de forma aleatória, e daí por diante, nós
vamos construindo a música. Por isso que se diz, o DJ de verdade sabe
trabalhar um som de tal maneira que cria um determinado produto, a
partir de, às vezes, peças isoladas. Ele monta um mosaico, de timbres,
sons, efeitos, e desse mosaico cria uma lógica musical. (DJ Nezzo).
No que se refere à transmissão de conhecimentos para outros DJs, os
entrevistados revelam uma preocupação em socializar “a cultura do DJ”, e para
isso utilizam workshops, “dicas” para amigos e oficinas. Além da preocupação com
a prática musical, os DJs também buscam desenvolver um trabalho social através
da música, dando oportunidade para jovens em situação de rua ou detentos, o
contato com os toca-discos, como ocorreu nas oficinas na Escola de Porto Alegre e
na FASE, antiga FEBEM.
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O desprendimento nas criações dos DJs, a pesquisa de inúmeros sons para
suas produções e performances, a abertura para ouvir diversos estilos e gêneros
musicais, são questionamentos também presentes no nosso cotidiano. A partir
dessa pesquisa, foi possível rever algumas formas de se trabalhar com a música,
bem como um "encontrar-se" nas falas e experiências trazidas por estes DJs. A
forma como eles aprenderam, a importância da experimentação, dos contatos e
aprendizagens com outros DJs, da preocupação com a matéria-prima utilizada nas
suas composições, do tempo de treino e estudo com o equipamento, revelam e
validam vários dos aspectos pedagógicos discutidos e vivenciados pela área da
educação musical.
Estes aspectos sugerem uma "pedagogia do DJ" que pode ser ilustrada com as
seguintes falas: “o universo é o nosso limite”, “todo o disco é nota” é só “escolher
e fazer, o DJ trabalha com uma alquimia perfeita”, “é preciso entrar na música, e
sentir a música, a partir daí tu sabe o que fazer”, "Porque a música toda é assim, é
bumbo e caixa, então tu tem que largar dentro do tempo, tu tem que contar", "não
é só tocar, tem que sentir a alma e a essência da música”, “tu tem que ser a
música naquele momento”.
Prática musical de DJs, mídia e educação musical
A mídia, juntamente com o avanço da tecnologia, possibilitou igualmente uma
mudança na forma como estes DJs produzem e consomem música. Por exemplo,
mesmo com a preferência pelo sistema analógico, o surgimento do sistema digital,
bem como a utilização de computadores nas suas produções, acabaram por
interferir e contribuir para sua prática.
No que se refere à forma como esses DJs tomaram contato e aprenderam esta
prática musical, o “ouvir” aparece como um meio fundamental. Os quatro
entrevistados detectaram os efeitos ouvindo os discos e só foram se certificar de
“como eram feitos” quando tiveram a oportunidade de “ver” outro DJ tocando. Isto
aconteceu primeiramente nos shows de rap que assistiram, principalmente de
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Thaíde e DJ Hum, e seguidamente com o aparecimento de DJs na TV. Duke Jay
conta:
tinha coisas que eu ouvia antes, no início, quando eu comecei trabalhar
com isso, que, eu ouvia aquele tipo de som, aquele tipo de efeito, tentava
fazer e nunca saía igual. Aí eu disse: “poxa, mas por que não sai igual?”
era muito rápido, sei lá, o jeito de fazer era muito rápido, eu tentava
acompanhar com a mão e disse “bah, mas o cara é muito rápido, muito
rápido, a coordenação do cara é muito... como é que ele consegue?” (DJ
Duke Jay).
Esse tipo de dificuldade só foi sanada no momento em que teve contato com
os efeitos utilizados para cada técnica, nas ocasiões em que pôde ver um DJ
tocando e saber o que ele utilizou de som. A partir de então, aprendeu a discernir
o que é feito pelo DJ e o que já vem pronto no som escolhido. Para Duke Jay, o
contato visual com determinada técnica esclarece o processo utilizado para a
mesma. Isso parece ser uma constante nas aprendizagens mediadas pela
tecnologia.
Assim, não só a TV mas igualmente outras mídias, tais como jornais, revistas,
zines, fitas de vídeo de campeonatos, videoaulas, TV e internet fazem parte do seu
fazer musical e da forma como procuram estar se aprimorando na sua prática.
Sobre a mídia impressa – jornais, revistas e zines – Duke Jay, Tom e DJ Nezo
destacam a sua importância no início da sua prática, onde esses meios contribuíram
para conhecer sobre os estilos, compositores e no caso de Duke Jay, sobre o
aparelho MK II que ele conheceu por meio de revistas.
A relação que estabelecem com a mídia é de parceria devido às contribuições
para o aprimoramento de sua prática. Contudo, mesmo com a chegada do CD, MD,
MP3, entre outros meios de veiculação sonora, a importância e a função do vinil
continuam fundamentais para a prática musical destes DJs.
Outra forma que os 4 DJs afirmaram como fundamenatis na sua formaçao
muscal foram os videos dos campeonatos de DJs. Na época da pesquisa em fitas
VHS. Essa motivação em tocar, após assistir as fitas, aparece também na fala de
Tom, que destaca a possibilidade de ver a “evolução das técnicas”. Isso porque as
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fitas começaram a circular desde os campeonatos de 1991 e apresentavam
mudanças em relação aos primeiros campenatos.
Essas mudanças estão atreladas aos avanços tecnológicos presentes em
qualquer prática. Segundo Kenski (2003, p. 91), o “conceito usual com que
definimos ‘tecnologias’ refere-se às ferramentas que auxiliam as pessoas a viverem
dentro de um determinado contexto social e espaço-temporal”. Assim, os grupos
sociais “organizam-se de acordo com os avanços e possibilidades de utilização e de
exploração econômica das ‘novas tecnologias’ de cada época”.
DJ Nezo destaca também a dificuldade de “reproduzir tudo o que está
assistindo” principalmente pela velocidade das manobras. Para ele, o conteúdo
mais importante nas fitas é a “criatividade” que cada DJ utiliza em suas manobras.
Assim, a sua opinião difere em relação aos outros DJs entrevistados, no sentido da
dificuldade que aponta para reproduzir as técnicas, porém sem desvalorizar a
importância das fitas para a prática musical de DJ, que fica evidente na sua fala
sobre a “criatividade”.
DJ Anderson comenta também sobre uma videoaula de DJs, com a qual teve
contato. Mesmo a videoaula sendo toda em inglês, e mesmo não entendendo o
idioma, conseguiu entender o que está sendo explicado pela própria linguagem
visual.
Esse sistema de videoaulas é uma importante forma de estar em contato com
as performances e práticas musicais de diversos instrumentos. Gohn (2003, p. 121)
destaca a importância das videoaulas “para os processos de auto-aprendizagem,
não apenas como ilustração dos movimentos necessários para a performance
musical instrumental, mas também como um meio contextualizador, seja em
aspectos históricos, estéticos, ou outros”.
Hoje, sete anos após o término dessa pesquisa, o acesso aos campeonatos de
DJs está muito mais fácil. A internet possibilita em um toque as mais diversas
performances, em diferentes locais, e de diferentes gêneros musicais.
A internet permeia o trabalho dos DJs não somente no que diz respeito às
informações e pesquisas que realizam como também está intimamente ligada à
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prática de música com recursos eletroeletrônicos, na sua combinação audiovisual
digitalizada. O surgimento das comunidades virtuais possibilitou uma outra forma
de acesso aos mais diferentes materiais e meios de fazer música.
Com o avanço das comunicações mediadas por computadores, assistimos à
evolução das comunidades virtuais, levando parte daquela população de
aprendizes a entrar em contato com seus pares e quebrando as barreiras
geográficas que antes os separavam. Essa realidade possibilitou trocas de
informações entre os indivíduos e participações nas aprendizagens uns dos
outros, incluindo a indicação de novos repertórios para apreciação. A
facilidade e o baixo custo de envio de arquivos sonoros pela Internet,
compactados no formato MP3, e a recomendação de sites contendo
materiais sobre um artista ou gênero musical foram determinantes para
tornar o computador um elemento aglutinador de experiências musicais.
(GOHN, 2008, p. 114).
Dessa forma, as relações que estes DJs têm com a mídia a evidenciam como
mais uma instância formadora em sua prática musical. O contato estabelecido com
a mídia se dá tanto pela transmissão dos produtos da sua prática quanto pela
recepção no instante que a utilizam para se aprimorar como DJs.
Assim, na sociedade permeada pela tecnologia, surgem novas formas de fazer
e consumir música. A esse respeito, Lévy (1999) aponta para uma “nova oralidade”.
A produção musical, e o fluxo de distribuição da mesma, mediada pelas tecnologias
que permitem e modificam tanto o seu fazer musical quanto a sua distribuição,
permitem uma “apropriação pessoal da produção musical que eram próprias da
tradição oral” (p. 141). O autor explica que isso se dá devido à facilidade que
qualquer pessoa tem em colocar “na rede os produtos de sua criatividade sem
passar pelos intermediários que haviam sido introduzidos pelos sistemas de
notação e de gravação (editores, intérpretes, grande estúdios, lojas)”.
O sistema digital, bem como outros meios que integram a cibercultura,
acabam por fazer parte diretamente da arte pós-moderna. Essa, segundo Lemos, se
diferencia dos movimentos do alto modernismo à medida que se utiliza de “formas
lúdicas, disjuntivas, ecléticas e fragmentadas”. Isso resulta em uma “única
possibilidade, já que tudo já foi feito, é combinar, mesclar, re-apropriar”, e assim,
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o “digital vai trazer possibilidades novas e radicais para essa mistura e reapropriação de estilos” (LEMOS, 2001, p. 212).
Com o advento dos sites de redes sociais muitas conexões estão sendo
estabelecidas e inclusive diminuindo as fronteiras entre as pessoas e, no caso da
música, suas formas de produzir e pensar o conhecimento musical. São espaços
virtuais onde cada sujeito contribui e interage com os pares diante de interesses
comuns. De acordo com Recuero “Para entender os fluxos de informação dentro
das redes sociais na internet, é preciso compreender também os valores percebidos
nos sites de redes sociais e as conexões estabelecidas entre os atores em cada um
desses espaços“ (RECUERO, 2009, p. 117). Exemplos disso são os fóruns, e blogs,
onde além de divulgar e expor idéias e conhecimentos, seus participantes podem
inclusive elaborar estratégias - seja musicais ou não - em conjunto.
DJ Tom
DJ Anderson
Foto: Juciane Araldi setembro 2003
Considerações finais
Ao trazer essa temática para o debate sobre tecnologia digital e formação
musical, é possível perceber, a partir da prática musical dos quatro DJs aqui
investigados, uma estreita relação com a tecnologia, tanto na prática musical,
quanto na forma de produzir música, ouvir, divulgar e conhecer outros trabalhos.
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Retomando a questão que trago no início desse artigo: como seria fazer essa
pesquisa hoje, com todo o avanço tecnológico ocorrido nestes seis anos que
separam a realizaçao da pesquisa com a época atual? É possível perceber que muito
do que esses DJs já faziam mesmo com falta de recursos, agora só tende a
melhorar. Enquanto eles se debatiam para encontrar uma fita K7 de um
campeonato de DJs, hoje no youtube é possível ter acesso as mais variadas
performances. Além disso, é por meio das redes virtuais (orkut) blogs (myspace)
comunicadores instantâneos (msn, Skype) que tenho me comunicado e de certa
forma acompanhado o trabalho destes DJs.
Nesse sentido, essa pesquisa teve muitos desdobramentos, configurando quase
uma parceria entre pesquisadora e pesquisados. Logo ao final da pesquisa, em
2004, os DJs participaram de oficinas de hip hop para as escolas de Porto Alegre, a
partir de um projeto de extensão universitária desenvolvido pela UFRGS, onde
minsitramos cursos e oficinas para a comunidade escolar. Em 2005, a união dos
resultados desta dissertaçao e de uma colega que investigou a formação e atuação
de grupos de rap participantes do programa Hip Hop Sul, com nossa orientadora do
mestrado, resultou em um livro intitulado Hip Hop: da rua para a escola, que tem
sido muito utilizado por professores e alunos de educação básica. Em 2007
participei de um encontro de hip hop promovido na cidade de Caxias do Sul, onde
pude apresentar os resultados dessa pesquisa e configurar novas redes. Em 2009,
vivenciamos outra parceria entre o DJ Nezzo e uma universidade estadual
paranaense, e sua participação ministrando um curso no Congresso Nacional da
Associação Brasileira de Educação Musical. E, para completar, neste ano DJ Tom
está concorrendo a um prêmio de rádio, com o programa que ele fez no dia
seguinte a defesa da dissertação, quando socializamos os resultados dessa pesquisa
com a comunidade local.
A continuidade de contatos com os participantes dessa pesquisa, bem como o
meu interesse na área de educação musical e tecnologia, permitiu, de certa forma,
continuar acompanhando as mudanças e avanços nas formas de fazer música destes
DJs. Essa foi a motivação para trazer essa temática para este simpósio.
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Cabe salientar que o acesso facilitado as diferentes performances de DJs
espalhados pelo mundo, modifica a forma de estudar e aprender as técnicas básicas
e avançadas dos toca-discos. Na época que os DJs entrevistados iniciaram seus
estudos, o referencial que eles tinham era apenas em audio, o acesso aos videos
veio quando eles já dispunham de equipamentos profissionais. Hoje, com tanta
disseminação das técnicas, e com velocidade cada vez maior - um virtuosismo dos
toca-discos, certamente as adaptações nos aparelhos convenvionais já não dariam
conta de objetr os efeitos hoje assistidos e acompanhados pela internet. Isso
implica em novas formas de adaptações de equipamentos, e inclusive plataformas
virtuais para obter sons e efeitos.
Segundo Palacios apud Duarte Souza (2001, p. 56), “há toda uma nova
Sociologia por ser inventada; uma nova Sociologia inextricavelmente ligada às
novas tecnologias de Comunicação neste final de milênio. Ignorar as novas formas
de Comunicação e seus efeitos equivale a abdicar da compreensão das formas do
existir social contemporâneo”.
Essa relaçao com a aprendizagem a partir do universo disponível nas
comunidades virtuais, nas redes sociais, nos sites específicos de divulgaçao
musical, que os DJs aqui entrevisados apresentam, tem se tornado cada vez mais
próxima dos nossos alunos. Assim, toda essa cena contemporânea nos instiga a nos
apropriarmos dessa forma de trabalhar com a tecnologia, enquanto educadores, e
dialogarmos com uma linguagem já estruturada e instituída socialmente.
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Universidade Federal da Paraíba (UFPB)
Departamento de Educação Musical
[email protected]
Universidade Federal de Pernambuco - Núcleo de Estudos de Hipertexto e Tecnologias na Educação
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