Cartografia: importância na formação do professor de Geografia

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CARTOGRAFIA: IMPORTÂNCIA NA FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE
GEOGRAFIA
Eliane Ferreira Campos Vieira
Departamento de Geociências
Universidade Estadual de Montes Claros
Email: [email protected]
Rachel Inêz Castro de Oliveira
Departamento de Geociências
Universidade Estadual de Montes Claros
Email: [email protected]
Romana de Fátima Cordeiro Leite
Departamento de Geociências
Universidade Estadual de Montes Claros
Email: [email protected]
RESUMO
Diversos autores vêm se dedicando a compreender as possibilidades da Cartografia nas séries
iniciais e têm concluído que a Cartografia deve ser utilizada não como um conteúdo, mas sim
como uma linguagem. Isso significa dizer que nas séries iniciais, não vamos ensinar a Cartografia,
vamos ensinar através da Cartografia. A linguagem cartográfica deve ser trabalhada como uma
metodologia para a construção do conhecimento geográfico. O objetivo desse trabalho é discutir
a importância da Cartografia na Formação do Professor de Geografia. Os resultados preliminares
apontam que há uma deficiência na alfabetização cartográfica dos alunos egressos da escola
básica, que nos cursos de graduação em Geografia, há distância entre a Cartografia que se
aprende na academia e a que é necessária que os alunos dominem ao final do ensino básico.
INTRODUÇÃO
A representação do espaço é uma tarefa realizada desde os primórdios da humanidade. Antes da
escrita, o homem já registrava a rota percorrida para localizar-se mais tarde bem como delimitar
o ambiente ao seu redor, para demarcar vias de comunicação, definir lugares de caça entre outros
objetivos (Oliveira, 1999; Salichtchev apud Martinelli, 1998). Essa necessidade de (re)conhecer
o espaço foi surgindo nas condições do trabalho humano. A partir daí surgiram os primeiros
mapas que vieram, posteriormente, a constituir o objeto de estudo da Cartografia.
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A Cartografia direcionada aos educandos nos primeiros anos de escolarização tem ocupado um
lugar de destaque em pesquisas cujos autores vêm concentrando seus esforços na busca de uma
Cartografia que visa desenvolver habilidades espaciais relacionadas à leitura e compreensão da
evolução da paisagem (Paganelli, 1982; LeSann, 1989; Simielli, 1993; Almeida, 1994; Passini,
1994). Essas pesquisas têm comprovado, que através do uso de material didático-pedagógico e
dos recursos tecnológicos disponíveis, é possível trabalhar a aquisição de habilidades que
envolvem os conceitos geográficos e a representação espacial, contribuindo para o processo de
ensino-aprendizagem.
Diversos eventos científicos têm reunido especialistas do Brasil e do exterior para discutir o
desenvolvimento da Cartografia para escolares nos vários níveis de ensino. Os grupos de
pesquisa brasileiros estão vinculados à Associação Internacional de Cartografia (ACI OU ICA),
na comissão de Cartografia para Criança.
Apesar de todo desenvolvimento teórico relacionado à Cartografia como uma linguagem na
aprendizagem espacial, as grades curriculares de vários cursos de graduação em Geografia não
demonstram a importância desse conteúdo. Neste contexto, o objetivo desse trabalho é discutir a
importância da Cartografia na Formação do Professor de Geografia. Os objetivos específicos
são: (i) Discutir a importância da Cartografia na Educação Básica; (ii) comparar grades de
diversos cursos de graduação em Geografia e traçar o perfil do egresso desse curso quanto aos
conhecimentos cartográficos; e (iii) discutir as implicações de se abordar a Cartografia como um
conteúdo a mais a ser ministrado e desenvolvido com os alunos do Ensino Básico.
A IMPORTÂNCIA DA CARTOGRAFIA
Num mundo globalizado, os conhecimentos cartográficos e a habilidade de leitura e interpretação
da realidade espacial assumem um lugar de destaque. A Cartografia, neste contexto, passou por
avanço com a introdução das inovações tecnológicas que disponibilizaram um conjunto de
produtos, permitindo a aquisição de representações gráficas cada vez mais aprimoradas em
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técnica e exatidão. Muitas dessas representações constituem importantes recursos no ensino de
Geografia, e podem auxiliar no processo de construção de conceitos essenciais na exploração do
espaço geográfico. A habilidade em lidar com representações gráficas e cartográficas é
imprescindível nos dias atuais marcados pelo ritmo intenso dos acontecimentos. Tais
conhecimentos demandam uma leitura rápida dos fenômenos e das relações que se processam
entre a escala local e global, como bem coloca IANNI (1992) em Sociedade Global.
Para desenvolver a capacidade de aprender a pensar o espaço, é preciso ser alfabetizado
espacialmente. Conforme Callai (2005:243), “para ler o espaço, torna-se necessário um outro
processo de alfabetização. [...] que é a linguagem cartográfica.”
Diversos autores vêm se dedicando a compreender e discutir as possibilidades da Cartografia nas
séries iniciais e têm concluído que a Cartografia deve ser utilizada não como um conteúdo, mas
sim como uma linguagem. Isso significa dizer que nas séries iniciais, não vamos ensinar a
Cartografia, vamos ensinar através da Cartografia. Conforme Pontuschka (2007:39), é preciso
considerar a “cartografia como representação e linguagem, e não como disciplina escolar ou
como item de um programa [...]. A aprendizagem dessa linguagem deve se dar a partir da
realidade concreta dos alunos. Conforme Callai (2005):
“Desenhar trajetos, percursos, plantas da sala de aula, da casa, do pátio da escola
pode ser o início do trabalho do aluno com as formas de representação do espaço. São
atividades que, de um modo geral, as crianças dos anos iniciais da escolarização realizam,
mas nunca é demais lembrar que o interessante é que as façam apoiadas nos dados
concretos e reais e não imaginando/fantasiando. Quer dizer, tentar representar o que existe
de fato.” (Callai, 2005, p, 244).
Os Parâmetros Curriculares Nacionais também ressaltam a importância dessa linguagem:
“O estudo da linguagem cartográfica, por sua vez, tem cada vez mais reafirmado
sua importância, desde o início da escolaridade. Contribui não apenas para que os alunos
venham a compreender e utilizar uma ferramenta básica da Geografia, os mapas, como
também para desenvolver capacidades relativas à representação do espaço” (Brasil, 1998:
118).
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O mesmo documento, Parâmetros Curriculares Nacionais, aponta que:
“a escola deve criar oportunidades para que os alunos construam conhecimentos
sobre essa linguagem nos dois sentidos: como pessoas que representam e codificam o
espaço e como leitores das informações expressas por ela”. (Brasil, 1998: 119).
A linguagem cartográfica deve então ser trabalhada como uma metodologia para a construção do
conhecimento geográfico. Nesse caminho três etapas devem ser obrigatoriamente respeitadas: a
percepção da criança a partir de seus sentidos, a percepção do espaço em três dimensões
através do faz de conta da maquete; e, a percepção do espaço representado numa folha de papel
(Lesann, 2005).
A CONSTRUÇÃO DA NOÇÃO DE ESPAÇO NAS CRIANÇAS
A noção de espaço é construída nas crianças gradativamente, conforme o esquema abaixo:
Espaço vivido →
espaço percebido→ espaço concebido
O espaço vivido refere-se ao espaço físico, vivenciado através do movimento e do deslocamento.
O espaço percebido é aquele que não precisa mais ser experimentado fisicamente. “A análise do
espaço passa a ser feito através da observação”. A noção do espaço concebido ocorre volta dos
11-12 anos em que as crianças são capazes de estabelecer relações espaciais através de sua
representação. Nesta etapa, a criança “ é capaz de raciocinar sobre uma área retratada em um
mapa, sem tê-la visto antes” (ALMEIDA E PASSINI, 1994, p. 27).
Nas séries iniciais são desenvolvidas habilidades de leitura e escrita da língua oficial e de lidar com
os números. É nessa fase que, segundo, diversos autores (ALMEIDA E PASSINI (1994);
LESANN (2009); CALAI (2005)) deve-se desenvolver também a habilidade de lidar com a
leitura do espaço. A figura a seguir ilustra diferentes concepções de ensino e o papel da
cartografia:
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Tripé do Ensino Tradicional
Literacia
Numeracia
Tripé do Ensino proposto por Biddle
Literacia e articulacia
Articulacia
Numeracia
Graficacia
Figura 2: Tripé do Ensino Tradicional e Proposto por Biddle
Adaptado de Lesann (2009, p. 65 e 66).
Nesta figura, vemos os princípios fundamentais do Ensino Fundamental tradicional. No ensino
tradicional são privilegiadas as habilidades básicas: Literacia, habilidade da escrita; articulacia,
habilidade da fala; numeracia, habilidade de lidar com os números. A proposta de Biddle citado
por Lesann (2009), a habilidade de lidar com o espaço é tão fundamental quanto saber ler e lidar
com os números e deve ser trabalhada nas séries iniciais. Callai (2005), aponta que
Fazer a leitura do mundo não é fazer uma leitura apenas do mapa, ou pelo mapa,
embora ele seja muito importante. É fazer a leitura do mundo da vida, construído
cotidianamente e que expressa tanto as nossas utopias, como os limites que nos são
postos, sejam eles do âmbito da natureza, sejam do âmbito da sociedade (culturais,
políticos, econômicos). Ler o mundo da vida, ler o espaço e compreender que as
paisagens que podemos ver são resultado da vida em sociedade, dos homens na busca
da sua sobrevivência e da satisfação das suas necessidades. Em linhas gerais, esse é o
papel da geografia na escola. ( Callai, 2005, p. 228 e 229)
Percebe-se então que a construção dessa habilidade é uma tarefa muito abrangente. Exige
comprometimento que só acontece quando o facilitador, neste caso o professor de Geografia,
tem clareza dos objetivos que deseja alcançar e das noções que espera construir com seus
alunos.
METODOLOGIAS
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O objetivo desse trabalho é discutir a importância da Cartografia na formação do professor de
Geografia. Essa discussão pautou-se a partir da análise das grades curriculares de diversos cursos
de Geografia de algumas instituições de ensino superior que oferecem a formação de licenciatura
em Geografia.
Foram analisadas as grades de nove instituições, entre elas 3 estaduais e 6 federais, dos seguintes
estados São Paulo, Santa Catarina, Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro e Goiás. A escolha das
instituições concentradas na região centro-sul se justifica pelo fato de serem essas instituições
importantes e influentes centros difusores de diversas concepções que norteiam a construção de
grades curriculares dos cursos de Licenciatura em Geografia, tanto para outras regiões do país
como para outras instituições. A análise das grades curriculares esteve centrada na identificação
de disciplinas obrigatórias cujos títulos estivessem associados á Cartografia e os seus temas
correlatos.
RESULTADOS PRELIMINARES
A partir da análise das grades curriculares dos cursos de Licenciatura foi possível organizar o
quadro 1 que contém as Instituições e disciplinas relacionadas à Cartografia nos cursos de
Licenciatura.
Quadro 1: Instituições e disciplinas relacionadas à Cartografia nos cursos de Licenciatura
Instituição A
Cartografia - 4
Cartografia Temática - 4
Instituição D
X
Instituição B
Cartografia Geral
Cartografia Temática
OPTATIVAS
Cartografia Aplicada ao ensino de
Geografia
Instituição E
Cartografia
Cartografia II
Fotogeografia
Expressão Gráfica em Geografia
Instituição C
Cartografia
Instituição F
Elementos de Topografia
Introdução ao Geoprocessamento
Cartografia Geral
Instrumentação de Recursos
Didáticos
Introdução ao Sensoriamento
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Instituição G
Cartografia Temática
Remoto
Cartografia Temática
Instituição I
Cartografia
Geocartografia
Geoprocessamento
Instituição H
Cartografia
A análise das grades curriculares permitiu identificar que a Cartografia é contemplada em todos
os cursos de graduação como já era esperado. As disciplinas obrigatórias relacionadas à
Cartografia nas nove grades de cursos de graduação analisadas foram: Cartografia, Cartografia
Temática, Cartografia Geral, Fotogeografia, Expressão Gráfica em Geografia e Geocartografia.
DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
O reduzido número de disciplinas nas grades curriculares nos cursos de Licenciatura em
Geografia pode ser interpretado como um aprofundamento deficiente na Cartografia como uma
linguagem. Diversas pesquisas apontam um desconhecimento ou a pouca familiaridade de alunos
egressos do Ensino Médio com representações gráficas. Esse fato demonstra que provavelmente
não houve o desenvolvimento de habilidades e competências relacionadas à leitura e à
representação do espaço como concluiu o estudo de França (2004). A incapacidade de leitura
dessas representações implica em prejuízos na aprendizagem que inviabilizam a apropriação de
uma série de conteúdos e conceitos que auxiliarão o aluno a refletir sobre sua realidade.
É evidente que o nome da disciplina não impede que nela sejam discutidas questões relacionadas
à cartografia como uma linguagem para conhecimento do espaço. Mas, quando comparamos a
grade curricular da modalidade licenciatura com a de bacharelado, observa-se que há um
aprofundamento maior na questão da Cartografia no bacharelado quando constata-se inúmeras
disciplinas tais como Geoprocessamento, Fotointerpretação, Sensoriamento, Interpretação de
Fotografias Aéreas e Imagens Orbitais, entre outras.
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Deve-se considerar que algumas disciplinas sugerem que a Cartografia possa ser trabalhada em
disciplinas tais como Metodologia do Ensino de Geociências, Recursos Didáticos em Geociências
e outras. Porém, em todas as nove grades curriculares de cursos de licenciatura em Geografia
analisadas, foi identificada apenas uma disciplina cujo título permite inferir a abordagem da
Cartografia direcionada ao Ensino (Cartografia Aplicada ao ensino de Geografia). Essa disciplina,
contudo, é optativa, ou seja, não compõem o núcleo considerado básico e obrigatório a ser
desenvolvido com os acadêmicos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar de a análise ser parcial e ainda estar em andamento, algumas questões podem ser
levantadas. Essas questões devem ser objeto de reflexão dos formuladores das grades dos cursos
superiores.
Se a Universidade não está instrumentalizando os formandos nos cursos de licenciatura quanto à
Cartografia e seu potencial como linguagem para interpretação do espaço geográfico, o que
esperar da atuação desses professores na atuação no Ensino Fundamental e Médio?
As representações cartográficas têm muito a contribuir na construção de habilidades, conceitos,
atitudes e valores básicos para a formação integral dos alunos, e pode ser um elemento central e
impulsionador do desenvolvimento dos alunos em relação à leitura do espaço geográfico. Se a
formação superior não está construindo bases para ensinar, não está cumprindo o seu papel que é
ensinar a pensar, e especificamente no caso da Geografia, não está atingindo um dos seus
objetivos que é possibilitar a leitura e a compreensão das informações expressas na linguagem
cartográfica.
É urgente repensar o papel da Cartografia nos cursos de Licenciatura em Geografia, bem como
refletir sobre que saberes são necessários que esse professor seja capaz de construir quando
formado.
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AGRADECIMENTOS
Agradecimento especial à FAPEMIG pelos recursos financiados para a participação no XVI
ENCONTRO NACIONAL DE GEÓGRAFOS, sem a qual tal participação seria improvável.
REFERÊNCIAS
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geográficos. 1994. 289 f. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação da
UNESP, São Paulo.
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Curriculares Nacionais: Geografia (PCN's - 5ª à 8ª séries). Brasília: MEC/SEF, 1998.
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ensino fundamental. Cad. Cedes, Campinas, vol. 25, n. 66, p. 227-247, maio/ago. 2005
Disponível em http://www.cedes.unicamp.br, acesso dia 10 de fevereiro de 2010, as 17:53h.
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