ARTE E ESPETÁCULO LIDIANY CHIBANTE Inspirados em Mário de Andrade, Tarsila do Amaral, Santos Dumont e Pagu, que se reuniam para discutir as novas tendências artísticas no país e que levariam ao Movimento Modernista na década de 20, em Pouso Alegre artistas da cidade se reúnem há cinco anos, no Teatro Municipal, para expor suas obras e apreciar a arte local no chamado Sarau Artenativo. A idéia desta salada artística surgiu da iniciativa de duas artistas da cidade: a professora de história da arte Fernanda Tersi Andrietta e a musicista Juliane do Prado, que buscaram com a proposta a não elitização da cultura. “O sarau não tem nenhum compromisso de espetáculo. É um lugar para as pessoas se divertirem, para se mostrarem”, explica a organizadora Juliane do Prado. Ainda de acordo com a idealizadora, o nome “Artenativo” se deu pelo projeto de criar uma identidade artística espontânea, como acontece no carnaval de rua, ou seja, uma “arte nativa”. Desde sua primeira edição, vários artistas têm a oportunidade de mostrar seus talentos — música, poesia, pintura, desenho, escultura, dança, teatro ou manifestos. O único critério estabelecido pela organização é o tempo de cinco minutos para cada autor apresentar o seu trabalho. Sempre na abertura é exposto um tema para a discussão durante o sarau. No último, o referendo sobre armas de fogo e munição foi abordado pelos participantes. A reunião revela os talentos da cidade, como o caso do ex-coletor de lixo Antônio Francisco Cândido, que faz poesias sobre temas atuais e se apresenta com roupas sociais, o que chama a atenção da platéia para a sua atuação. A poesia “Cidadão Desarmado” traz ao público a discussão sobre o desarmamento. Cândido acredita que o espaço é o único para ele expor sua obra: “Imagine, eu, um ex-gari. Aonde iria mostrar o que faço se não tivesse esse apoio?”. No mesmo ambiente em que se apresenta o ex-gari, bandas de rock, músicos 10 Sarau reúne arte nativa “Holé” (acima) e Cândido: grafite e poesia nos saraus do Teatro Municipal de Pouso Alegre populares ou clássicos dão o seu show à parte. O improviso está presente nas apresentações, comenta o músico Guilherme Vieira. “Sempre aparece alguém de última hora querendo se apresentar. Às vezes, as bandas não têm a formação completa, não têm instrumentos e a gente acaba ajudando para que todos possam expor suas músicas”. A colaboradora Elisa Fonseca acredita que a diversidade de participantes é que “compõe a sensação da união das artes”. Para a estudante de música Monica Camargo, o sarau é uma oportunidade para os novos artistas. “A gente acaba incentivando os amigos, pois existe a diferença entre tocar para um grupo restrito e se apresentar para uma platéia de verdade”. As pinturas, desenhos, esculturas ou poesias escritas ficam expostas durante todo o tempo no saguão do Teatro Municipal. Onde é possível observar nas telas uma mescla de estilos. Como na proposta de arte suburbana do grafiteiro José Roberto, ou “Zé Holé”, como prefere ser chamado. Em seu quadro “Psicotronic”, ele utiliza de técnicas de pixação e grafites e faz questão de escrever as letras invertidas para compor a marca registrada de seu trabalho. “Em Pouso Alegre existe o movimento subsolo, que reúne a arte da rua, muitas vezes é vista com preconceito. Nossa idéia é valorizar o grafite, e para isso vamos organizar exposições nas ruas com os trabalhos de vários artistas da cidade e região”, diz o grafiteiro. Segundo Fernanda Tersi Andrietta, como o acontecimento reúne várias classes sociais, o evento combate as vaidades e as rivalidades que existem na arte. “Nós precisamos matar o ego do artista e nos deixar contagiar pela vida, só assim nos sentiremos úteis. Acho que isso não é utopia, o sarau está conseguindo os seus objetivos de democratização da cultura pousoalegrense”. PRIMEIRA PÁGINA, Novembro de 2005