FILO NEMATODA SISTEMÁTICA E EVOLUÇÃO ...Neste contexto, os nematódeos adquirem grande importância por serem considerados o grupo de metazoários mais abundante na biosfera, com estimativa de constituírem até 80% de todos os metazoários (Bongers, 1988), que incluem muitas formas parasitas de plantas e animais, inclusive do homem. O filo NEMATODA abrange os nematóides, vermes não segmentados, de corpo cilíndrico, alongado, cutícula resistente e estruturas bucais com arranjo trirradial. Com cerca de 27.000 espécies descritas (e um potencial estimado em 500.000-1.500.000) constituem uns dos grupos de metazoários mais abundantes. Existem umas 10700 espécies de vida livre (solo, água doce e mar) e umas 16300 parasitas de invertebrados, vertebrados e plantas. Alguns lodos do fundo do mar têm mais de quatro milhões de nematóides por metro quadrado, enquanto que um bom solo pode ter 3-9 bilhões por acre (uns 4000 m2). Sua dramática abundancia levou a Cobb a escrever em 1914: “Se toda a matéria do universo exceto os nematóides fosse varrida, nosso mundo ainda seria vagamente reconhecível, e se, como espíritos sem corpo, pudéssemos então pesquisa-lo, deveríamos encontrar montanhas, vales, rios, lagos e oceanos representados por um fino filme de nematóides”. São encontrados em qualquer lugar; talvez nenhum outro grupo taxonômico seja tão universal quanto ao habitat. Os nematódeos parasitas encontram-se em quase todas as espécies animais documentadas o que dá uma enorme variedade de habitats (Hodda, 2004). Muitos são generalistas, mas outros são muito especializados a habitats específicos como raízes de plantas, sementes de trigo, secreção de feridas de árvores e intestino, sangue e outros órgãos do corpo dos animais, até chegar ao extremo de uma espécie de nematóide que só foi encontrada em algumas cidades alemãs debaixo dos descansos para copos de feltro de canecas de cervejas. A maioria dos nematóides possui menos de cinco cm de comprimento e muitos são microscópicos (0,08 mm), mas alguns nematóides possuem tamanhos gigantescos como a espécie parasita da placenta dos cachalotes Placentonema gigantissima que alcança os nove metros de comprimento. São conhecidas umas 4000 espécies de nematóides marinhos podendo ser de vida livre ou endoparasitas. No mar são bentônicos, morando nos espaços intersticiais, algas e sedimentos. Todo tipo de sedimento pode ser colonizado pelos nematódeos, desde as secas dunas de areia das praias até os pisos hadais oceânicos. Os nematódeos são o componente principal da meiofauna, representando mais de 50% com uma densidade até de um milhão de indivíduos por metro quadrado e um tamanho entre 0,5-3 mm. Faltam na zona pelágica, mas muitas vezes entram em suspensão na coluna de água formando parte do seston, e também existem espécies associadas às algas Sargassum. As características do Filo Nematoda são: 1. Organismos triploblásticos com simetria bilateral, vermiformes, não-segmentados e blastocelomados. 2. Corpo cilíndrico (secção transversal redonda) e coberto por uma cutícula não celular em camadas. O crescimento de jovens muitas vezes envolve mudas. 3. Com órgãos sensitivos cefálicos exclusivos chamados anfídios; alguns têm órgãos sensoriais caudais chamados fasmídios. 4. Intestino completo; boca envolvida por seis lábios com órgãos sensoriais (freqüentemente reduzidos a três lábios, ou a um simples anel). 5. A maioria com sistema excretor, compreendendo uma ou mais células glandulares (célula renete) ou um feixe de tubos coletores que se abrem em um poro excretor ventral. 6. Sem estruturas especiais para circulação ou troca de gases 7. Parede do corpo tem apenas músculos longitudinais, sem músculos circulares. 8. Epiderme celular ou sincicial formando feixes longitudinais que abrigam cordões nervosos 9. Dióicos, machos freqüentemente com um par de espículas copulatórias posteriores. O compartilhamento entre espécies de nematódeos de características sinapomórficas tais como presencia de estruturas sensórias exclusivas (como anfídios e fasmídios), espículas copulatórias e poro excretor ventral sustentam a monofilia do grupo. A parede corporal e o tubo digestivo provem vários caracteres úteis na identificação conjuntamente com o sistema nervoso, excretor e reprodutivo. As quatro características utilizadas na identificação dos nematódeos marinhos são a cavidade bucal (boca), a forma da cauda, os anfidios e o padrão da cutícula. O filo Nematoda tem uma historia dividida. Os grandes nematódeos parasitas foram naturalmente bem conhecidos desde muitos anos atrás, mas os de vida livre, muitos dos quais são microscópicos, não foram descobertos ate a invenção do microscópio. Linné no seu Systema Naturae (1758) colocava os vermes cilíndricos junto com outros grupos de vermes na Ordem Intestina da classe Vermes e mencionava muitos gêneros de nematódeos parasitas atuais tais como Ascaris e Filaria. Com ajuda dos primeiros microscópios Goeze conseguiu estudar as enguias do vinagre, nematódeos de vida livre que vivem num meio constituído por 50% vinagre de maçã, assim como outros nematódeos de vida livre, e foi o primeiro a distinguir vários tipos diferentes de vermes. Rudolphi começou o estudo dos nematóides em 1793 baseado nos trabalhos de Goeze, e em 1808 nomeou aos vermes cilíndricos como Nematoidea ao distinguir vários grupos diferentes de vermes parasitas dentro da categoria Entozoa de Cuvier, separando também outros grupos de vermes como os Acanthocephala, Trematoda e Cestoida. Em 1819 publicou sua Entorzoorum synopsis listando 11 gêneros e 350 espécies de nematódeos. A nova localização no reino animal não agradou a comunidade científica e ficou arquivada até 1859 quando Gegenbaur criou a classe Nemathelminthes sob o Filo Vermes agrupando as ordens Acanthocephala e Nematoidea, esta última dividida em Nematodes e Gordiacei. Vejdovsky (1866) separou adequadamente aos gordiaceos dos nematódeos, criando a classe Nematomorpha sob o Filo Nemathelmintes, abolindo o grupo polifilético dos Vermes. O marco para o estudo dos nematóides foi no ano 1919 quando Cobb criou uma nova disciplina da ciência, a Nematologia localizando os nematodes em um filo próprio que chamou de Nemata. Em 1951 Hyman agrupou as classes Rotifera, Gastrotricha, Kinorhyncha, Nematoda, Nematomorpha, em um filo chamado Aschelmintes (Askos, bexiga, helmins, verme). Este grupo parafilético, artificial, estava baseado apenas em características comuns que poderiam ter resultado de estratégias evolutivas semelhantes, tal como a existência de um blastoceloma em vez dum verdadeiro celoma. Não obstante, a maioria dos autores agora considera que as diferenças entre os grupos são suficientes para merecerem o status de filo para cada um deles, embora alguns aceitem o conceito de Aschelmintes como um superfilo. Este mega-grupo pode ter sido derivado originalmente da linhagem dos protostômios via um ancestral acelomado comum. Porem, a análise de seqüências de genes que codificam a subunidade menor do RNA ribossomal suporta uma hipótese filogenética diferente (Aguinaldo et al., 1997). Esta evidência sugere que algum tempo depois que o ancestral deuterostômio divergiu do ancestral protostomio, no Pré-Cambriano, os protostomios dividiram-se novamente em dois grandes grupos (ou superfilos) monofiléticos: os Ecdysozoa, contendo os filos que passam por uma serie de mudas durante seu desenvolvimento, e os Lophotrochozoa, incluindo os filos de lofoforados e os filos cujas larvas são assemelhadas as trocoforas. Dentro deste esquema os filos Nematoda, Nematomorpha, Kinorhyncha e Priapulida estariam incluídos dentro do superfilo Ecdysozoa e os filos Rotifera, Entoprocta e Gastrotricha dentro de Lophotrochozoa. Os filos Loricifera e Acanthocephala ainda não foram determinados, assim como o novo filo Cycliophora proposto por Funch & Kristensen em 1995. A posição relativamente basal dos Aschelmintes entre os Bilatéria tem sido historicamente justificada pela interpretação de que esse grupo não apresentaria celoma. Sua origem filogenética, portanto, teria que ser anterior à origem do celoma. No entanto, o conjunto de evidencias disponíveis atualmente mostra que, mais provavelmente, essa cavidade corresponde à hemocele de um animal que perdeu o sistema circulatório, como é muito claro nos Tardigrada. Dentro de essa perspectiva, o grande número de modificações necessárias para gerar um mecanismo de muda ou ecdise que os Aschelmintes (com excesão dos Rotifera) também apresentam, teria surgido uma única vez na base dos Ecdysozoa, tornando esta teoria mais parsimoniosa (Christoffersen, 1998). Antigamente considerou-se aos nematódeos como um grupo isolado evolutivamente. Hoje não existem duvidas sobre sua proximidade com o filo Gastrotricha, cujos representantes marinhos apresentam claras afinidades com os nematódeos, especialmente pela faringe e cutícula. Possivelmente também tenham afinidades com os nematomorfos. Segundo alguns zoólogos, os gastrotricos, nematódeos e nematomorfos derivam de um único grupo de platelmintos turbelarios acélicos. Em geral, se considera que os gastrotricos som mais primitivos. As relações evolutivas com outros grupos de blastocelomados são menos claras e muito de seus caracteres comuns poderiam dever-se a fenômenos de convergência evolutiva. É muito difícil traçar a historia evolutiva do grupo devido a sua alta diversidade e principalmente a falta de registros fósseis. Apesar de não possuírem partes duras, foram encontrados fósseis de nematódeos do período Carbonífero (com mais de 280 milhões de anos) mas, uma vez que alguns grupos relacionados com eles foram encontrados em formações do período Cambriano (550 milhões de anos) é provável que eles tenham aparecido no mesmo período durante a explosão cambriana (Waggoner 2004). Sin embargo, se han descrito varias especies del Terciario, y especialmente Mermítidos parásitos del Oligoceno Inferior, encontrados en insectos conservados en ámbar (resina fossilizada) en el Báltico. También se conocen Nematodos parásitos de mamíferos del Pleistoceno. A palavra Nematoda vem das palavras gregas nematos que significa fio e eidos, forma. Ao longo da historia este filo recebeu vários nomes diferentes: Nematoidea, Nemata e Nematoda. A classificação dos organismos acima da categoria família não está governada pelas regras do Código Internacional de Nomenclatura Zoológica. Em essência as categorias superiores da classificação zoológica estão baseadas na opinião dos especialistas. Todos os nomes foram usados (e são usados) ao longo do tempo, mas muitos autores (Maggenti, Luc, Raski, Fortuner, Geraert, Brusca & Brusca) acreditam que Nemata seja o nome mais preciso. Vários sistemas de classificação foram propostos para os nematódeos. A classificação tradicional do filo Nematoda (Rudolphi, 1808) proposta por Chitwood & Chitwood em 1950 divide ao grupo em duas classes: Adenophorea (= Aphasmida) e Secernentea (= Phasmida). Adamson (1987) indicou que a tradicional classe Aphasmida era parafilética e propôs uma nova classificação, também em duas classes: Rhabditea e Enoplea. A biologia molecular abriu o jogo na classificação dos nematódeos, um estudo com a subunidade grande (18S) do DNA ribossomal realizado por Kampfer et al. (1998) suporta a classificação tradicional com as duas classes em um clado monofilético; já no ano 2002 De Ley & Blaxter propuseram uma nova classificação baseada na análise da subunidade pequena (16S) do DNA ribossomal (SSU rDNA) dividindo o filo em duas novas classes propostas: Enoplea e Chromadorea. A maioria dos textos didáticos atuais como o Brusca & Brusca (2003), o The Taxonomicon & Systema Naturae 2000 e o Tree of Life Web Project; e varios centros referenciais mundiais em nematologia como o Depto. de Nematologia da Universidade da California e o Instituto de Zoología da Universidade de Viena utilizam a classificação tradicional. CLASSE SECERNENTEA (= Phasmida) 1. Anfídeos labiais, aberturas em forma de poro ou fenda. 2. Fasmídios presentes, geralmente posteriores. 4. Sistema excretor tubular 5. Cutícula com 2 a 4 camadas, estriada. 6. Esôfago variado com 3 glândulas esofágicas 7. Macho geralmente com um testículo 8. Asa caudal freqüente 9. Papilas sensoriais cefálicas, e caudais em alguns machos. 10. Compreendem parte das espécies que habitam o solo, a maioria das parasitas animais e quase todos as parasitas dos vegetais, raramente aquáticos. Entre os fásmidos encontram-se os Ascaris, oxiúros e filarias. 8 ordens. Subclasse Rhabditia no solo e parasitas animais. Mamíferos marinhos (pinípedes) Subclasse Spiruria todos parasitas animais Ordem Ascaridida (parasitas de peixes e mamíferos marinhos família Anisakidae) Ordem Drilonematida (parasitas de anelídeos e moluscos) Ordem Spirurida parasitas de mamíferos marinhos (pinípedes, belugas, baleias e cachalotes, Placentonema gigantissima) Ordem Camallanida – (parasitas de vertebrados terrestres e aquáticos, com copépodos como hospedeiros secundários) Condrictios principalmente tubarões Subclasse Diplogasteria. No solo, parasitas de insetos e plantas. CLASSE ADENOPHOREA (= Aphasmida) 1. Anfídeos pós-labiales de formas variáveis (poro a elaborada). 2. Fasmídeos ausentes. 3. Sistema excretor simples, não tubular, células glandulares. 4. Macho geralmente com dois testículos 5. Asa caudal geralmente ausente 6. Papilas sensoriais cefálicas e ao longo do corpo. 7. Maioria de vida livre. Compreendem quase todas as espécies aquáticas, tanto de água doce como oceânicas, parte das espécies do solo, parte das parasitas animais e alguns parasitas dos vegetais. 12 ordens. Subclasse Enoplia: de vida livre e parasita, terrestre, marinho e raramente de água doce. Parasitas de invertebrados marinhos (poliquetas, priapúlidos, crustáceos, holoturias) Subclasse Chromadoria todos de vida livre, a maioria marinhos Dentro do grupo dos nematódeos é difícil determinar linhas filogenéticas, ainda se discute acerca de quais devem se considerar mais primitivos. Considera-se que os nematódeos marinhos de vida livre (classe Adenophorea) seriam mais primitivos pela presencia de sistema excretor glandular associado mais à síntese de proteínas que a osmoregulação. Outra condição considerada primitiva nas espécies marinhas é a presença de 6 lóbulos em forma de lábio que rodeiam a boca, 3 a cada lado. Devido a fusão, as formas terrestres e parasitas acostumam ter só 3 lábios. Primitivamente os lábios e a superfície anterior externa possuem 18 cerdas. Em relação ao habito livre/parasita, estudos genéticos com DNA ribossomal confirmaram que a parasitose animal surgiu umas 6 vezes na evolução do grupo e a vegetal umas três, pelo qual fica difícil estabelecer padrões evolutivos em relação ao habito de vida dos nematódeos (Leroy-Boissier et al, 2005) No Brasil segundo o estudo da Avaliação do estado do conhecimento da diversidade biológica do Brasil de Invertebrados Marinhos (Migotto & Marques, 2003) Brasil tem entre 200-430 espécies de nematódeos marinhos. Existindo pouquíssimos especialistas no Brasil: Liliana Rúbia de A. Medeiros (Universidade de Ibirapuera) e Thais Navajas Corbisier (Instituto de Oceanografia da USP), e nos últimos anos na UFPE o laboratório de Meiofauna coordenado pela Prof. Verônica Genovois vem trabalhando com taxonomia de nematódeos livres marinhos.