PRINCIPAIS MEDIDAS DE CONVIVÊNCIA COM VIROSES NA CULTURA DA BANANEIRA - MUSA SPP. Addolorata Colariccio Pesquisador Científico/Laboratório de Fitovirologia e Fisiopatologia. Instituto Biológico, Centro de Pesquisa e Desenvolvimento de Sanidade Vegetal. E-mail: [email protected] O centro de origem das espécies de banana é o sudeste da Ásia. Nessa região, as bananas vem sendo usadas pela população ao longo da história. As comunidades primitivas provavelmente, usavam na alimentação os brotos e as bainhas do pseudocaule das bananas selvagens como vegetal, além dos frutos e provavelmente, a domesticação da banana como cultura de alimentação começou ao mesmo tempo, que a agricultura. A banana era bastante apreciada na antiguidade, existe inclusive uma lenda Hindu, contando que a banana era um fruto proibido e que as ilhas do Sri Lanka eram o paraíso. Assim, Linnaeus quando fez a classificação da maior parte das espécies vegetais, denominou a banana de Musa paradisiaca. Em nossos dias, a banana continua a ter um significado cultural profundo, sendo um símbolo de fertilidade e prosperidade para muitas comunidades. Na Índia, a banana é popularmente conhecida como planta para todos os usos, sendo esta uma afirmação verdadeira, pois todas as partes da planta podem ser usadas para alguma finalidade. Dentre elas podemos citar o uso na alimentação humana, de animais, na produção de álcool, de fibras, de medicamentos e de artesanato, entre outros. As diferentes espécies silvestres e as novas introduções nas principais regiões produtoras, visando a conservação do germoplasma de Musa, vem sendo realizada por meio de programas de colaboração internacional, como o “International Network for the Improvement of Banana and Plantain” (INIBAP), que possui uma coleção in vitro de Musa, considerada a maior do mundo. Para diminuir o risco de conservação e multiplicação de cultivos contaminados, o INIBP adotou um sistema no qual, se usa a cultura de meristemas ao invés da cultura de ápices, em associação com provas de assepsia. É um fato que a produtividade de bananeiras se reduz significativamente, em muitas regiões produtoras do mundo devido principalmente, às doenças causadas por vírus, sendo que estes, também impõe severas restrições ao intercâmbio seguro de germoplasma de Musa. Uma vez que, muitas das variedades produzidas em programas de melhoramento, estão infectadas por vírus e, portanto, não podem ser avaliadas nas diferentes regiões produtoras. A introdução de germoplasma vegetal no Brasil é importante tanto para o incremento do patrimônio genético de Musa, como para disponibilizar novos genótipos, que incrementam a agricultura nacional (MARINHO et al. Série 32 Documentos Embrapa, N° 50:1-17. 2001). Porém, mesmo se constitutindo em uma atividade importante, essa prática pode facilitar a introdução de pragas exóticas ou de importância econômica para o país. Nos últimos anos, a introdução de novos genótipos de banana tem sido intensificada, gerando preocupações para os órgãos de defesa fitossanitária. Com o objetivo de evitar a introdução de vírus exóticos para o Brasil, na cultura, todo germoplasma vegetal deve ser submetido aos procedimentos de indexação de vírus, que envolvem um grande número de testes sorológicos, principalmente o uso de kits desenvolvidos para o diagnóstico da maior parte do vírus descritos até o momento em Musa. O teste mais empregado é o “Enzyme immmunosorbent assay” (ELISA), mas podem ser empregados o Dot-Blot e o Western blot. Também pode ser usado o “Lateral Flow”. Embora, este último necessite ser adequado para os principais vírus que ocorrem em Musa, pode ser considerado indicado para programas de indexação de matrizes, em virtude da facilidade e rapidez na sua execução. No Laboratório de Fitovirologia e Fisiopatologia-Instituo Biológico, o teste foi empregado com sucesso, para diagnosticar o CMV em amostras de folhas de bananeira. Além dos testes sorológicos, podem ser usados os testes moleculares de “Reverse Transcriptase – Polymerase Chain Reaction (RT-PCR), RAPD e ImunoCaptura (IC-PCR), para a identificação de vírus em bananeira. Dentre os vírus de bananeira exóticos para o Brasil, encontram-se o Banana bunchy top virus (BBTV), família Circoviridae, gênero Nanavirus, praga de quarentena A1 para o Brasil (MAPA, Instrução Normativa SDA N° 38, 14 de outubro 1999), que ocorre em vários países da Ásia, África, Oceania e Havaí, transmitido de forma persistente pelo afídeo Pentalonia nigronervosa Coquerel, e o Banana bract mosaic virus (BBrMV), família Potyviridae, gênero Potyvirus, que, não ocorre no Brasil e não está regulamentado como praga de quarentena (MARINHO & BATISTA, 2005). O CMV conhecido como a clorose infecciosa foi descrito pela primeira vez na Austrália por MAGEE em 1930. Posteriormente, a doença chamada simplesmente de mosaico ou “heart rot” foi observada em outros importantes países produtores de banana, como Filipinas, Ïndia, Porto Rico, Colombia e Estados Unidos (PALUKAITIS et al., 1992). No Brasil, a ocorrência do CMV em bananeira foi relatada nos estados de Pernambuco (MEDEIROS, 1963), Rio de Janeiro (RIBEIRO et al., 1975), Ceará (LIMA & GONÇALVES, 1988), Minas Gerais (MACIEL-ZAMBOLIM et al., 1994), São Paulo (COLARICCIO et al., 1996), e Pará (TRINDADE et al., 1998). O Cucumber mosaic virus (CMV), família Bromoviridae, gênero Cucumovirus é o agente causal do mosaico da bananeira e possui partículas isométricas, com cerca de 30nm de diâmetro, é o vírus mais comum na cultura, os sintomas manifestam-se como estrias amarelas que se iniciam na nervura principal e se desenvolvem paralelas às nervuras secundárias, nas folhas mais velhas; podem causar estrias necróticas nas folhas, redução do limbo foliar dandolhes uma aparência atrofiada e lanceolada; as plantas podem apresentar nanismo e necrose do cartucho central, embora o vírus possa ser transmitido 33 pelos rizomas, as plantas infectadas podem produzir brotações de perfilhos com ausência dos sintomas do vírus. Nos frutos o vírus causa um entumescimento, provocando um sintoma conhecido como ‘marca de dedos’, a redução do tamanho e ainda a ocorrência de estrias amareladas ou necrose interna dos frutos (CORDEIRO & MATOS, 2003). O CMV é um vírus cosmopolita, que possui um grande número de estirpes e infecta um grande número de hospedeiras cerca de 900, pertencentes as famílias das asteráceas, cucurbitáceas, solanáceas, passifloráceas, musaceas entre outras. O vírus pode ser transmitido mecanicamente e por uma ampla gama de afídeos vetores, dentre eles Aphis gossypii, de modo não persistente, mas não pode ser transmitido pelo pulgão da bananeira, Pentalonia nigronervosa. Dentre as diversas medidas recomendadas para o controle do CMV, destacam-se a utilização de material propagativo sadio, erradicação das plantas com sintomas de mosaico, inspeções periódicas, controle químico dos afídeos vetores ou a eliminação das plantas colonizadoras dos afídeos vetores, eliminação de hospedeiras silvestres como Commelina spp.; Physalis spp; Ricinus communis; Cucumis spp.; Crotalaria spp. hospedeiras do CMV (CORDEIRO & MATOS, 2003). No estado de São Paulo, foram descritos isolados de CMV em diferentes cultivares de banana (grupos genômicos AA, AAA, AAB, ABB, AAAB, AABB) provenientes de diferentes regiões produtoras do estado. Sendo que, um dos isolados de CMV em banana Nanica (AAA), descrito em São Paulo, proveniente do município de Miracatu, foi caracterizado biológica, sorológica e molecularmente como a espécie CMV-I sub-grupo Ia, tendo apresentado homologia de cerca de 98% com os isolados de Porto Rico, Havaí, Colômbia e Austrália sugerindo um ancestral comum para este vírus (EIRAS et al., 2002). Os resultados obtidos ressaltaram a importância dos estudos da identificação e caracterização das espécies ou estirpes de vírus presentes na cultura, na principal região produtora do estado, para possibilitar o desenvolvimento de testes de diagnóstico para a indexação destes vírus, nas coleções de germoplasma. O BSV conhecido como, estrias-da-bananeira foi relatado pela primeira vez, na Costa do Marfim e já está presente em bananais da Ásia, Austrália e América Latina. No Brasil sua ocorrência foi descrita pela primeira vez em associação com o CMV (BRIOSO et al., 2000) e foi relatado em diferentes cultivares de banana pertencentes a diversos grupos genômicos AA, AAA, AAB, ABB, AAAB, AABB, em infecções simples ou em associação com o CMV, na Bahia, Ceará, Espírito Santo, Góias, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Santa Catarina e São Paulo (BRIOSO, 2004). O Banana streak virus (BSV), família Caulimoviridae, gênero Badnavirus, é o agente causal das estrias-da-bananeira e possui partículas baciliformes medindo de 60 a 130nm de comprimento e de 24 a 35 nm de diâmetro, os sintomas de estrias descoloridas ao longo das nervuras das folhas, inicialmente podem ser confundidos com aqueles causados pelo CMV, porém com o desenvolvimento da doença as estrias tornam-se necróticas ao longo do limbo foliar. 34 No Brasil foram relatadas quatro estirpes de BSV e este infecta principalmente, a variedade Mysore (AAB) (CORDEIRO & MATOS, 2003). O vírus não se transmite mecanicamente, portanto não se transmite pelas ferramentas empregadas nos tratos culturais, é transmitido pela cochonilha dos citros Planococcus citri de forma semi-persistente, transmite-se por semente, por material propagativo infectado, sendo que o vírus não é eliminado pela cultura de ápices meristemáticos, uma vez que o DNA do vírus pode ser incorporado ao genoma da planta. Embora não seja conhecida a extenção dos danos causados por essa doença, cumpre ressaltar a importância das medidas de controle, que envolvem a utilização de mudas sadias, a fim de evitar a introdução da doença em regiões indenes, a eliminação de plantas com sintomas, o controle químico da cochonilha vetor do BSV e a eliminação de plantas colonizadoras do vetor, entre outras medidas. A indexação sorológica de mudas de banana ‘Williams’ obtidas por cultivo de meristemas, provenientes da Costa Rica, submetidas à quarentena pelo MAPA, realizada no Instituto Biológico, revelaram a presença do CMV e do BSV, isoladamente ou em associação, em todos os lotes avaliados, embora o número de plantas infectadas tenha sido da ordem de 1% e os vírus já ocorram no Brasil, cumpre ressaltar a importância da utilização de material propagativo sadio para prevenir a introdução e a disseminação nas regiões produtoras. O BBrMV conhecido como mosaico-das-brácteas foi relatado nas Filipinas causando perdas de até 40% na produção. O BBrMV é o agente causal do mosaico-das-brácteas e possui partículas flexuosas medindo cerca de 750nm de comprimento e 11nm de diamêtro, causa sintomas de mosaico e de estrias nas brácteas das inflorescências, nos pecíolos, nos frutos causa estrias, má formação e diminuição do cacho. O BBrMV é transmitido de forma não persistente por afídeos, Aphys gossypii, Pentalonia nigronervosa de modo não persistente, é transmitido eficientemente por material de propagação vegetativa. Infecta plantas da família Musacea e está presente em vários países da Ásia e África e causa severos danos à bananicultura (MARINHO & BATISTA, 2005). O controle passa pela adoção de medidas quarentenárias para evitar a introdução da doença. Apesar do BBrMV não ocorrer no Brasil, no Estado do Rio Grande do Norte, foi registrada sua presença em mudas de bananeira ‘Williams’, oriundas de cultura de meristemas, provenientes da Costa Rica. A identificação feita pelo quarentenário da EMBRAPA e possibilitou a interdição do lote, uma vez que, todas as mudas de bananeira do lote no qual o BBrMV foi identificado foram incineradas, evitando assim a introdução dessa nova praga no Brasil. As mudas de todos os lotes foram testadas para à presença dos dois vírus exóticos para o Brasil e também, para o CMV e o BSV, vírus já presentes no país, porém, o BBrMV só ocorreu em um deles, nos demais foi constatada somente a presença do BSV (MARINHO & BATISTA, 2005). O intercâmbio de germoplasma entre os países produtores, deve ser realizado acompanhado de algumas medidas profiláticas, a fim de minimizar a disseminação de doenças, principalmente àquelas causadas por vírus. Nos 35 últimos anos, a incidência e a importância do CMV em bananais, tanto no Brasil como em outras regiões produtoras no mundo, tem aumentado, com registro de perdas na produção de até 80% (TRINDADE et al., 1998). Este fato deve-se principalmente, ao transporte e a comercialização de mudas de propagação vegetativa provenientes de culturas de meristemas, práticas adotadas pelos programas de melhoramento, manutenção e distribuição de germoplasma de banana. Portanto para uma bananicultura livre dos problemas causados pelos vírus, torna-se importante investir em métodos de diagnóstico rápidos, para certificar as mudas procedentes de programas de melhoramento em nível nacional e internacional. Referências Bibliográficas BRIOSO, P.S.T., CORDEIRO, Z.J.M., REZENDE, J.A.M., KITAJIMA, E.W., PIMENTEL, J.P., FIGUEIREDO, A.R. Infecção mista em bananeiras pelo vírus do mosaico do pepino (“Cucumber mosaic virus” –CMV) e da risca da bananeira (“Banana streak virus”- BSV) no Brasil. Summa Phytopathologica. v. 26, n. 2, p. 255-257, 2000. BRIOSO, P.S.T. Importance and current status of Badnavirus genus.Virus Reviews & Research. v. 9, p. 49-50, 2004 COLARICCIO, A., EIRAS, M., VICENTE, M., CHAGAS, C.M., HARAKAVA, R. Caracterização parcial de um isolado do vírus do mosaico do pepino de Musa sp. ‘Nanicão’. Fitopatol. Bras. v. 21, p. 268-274, 1996. CORDEIRO, Z.J.M., MATOS, A. P. Doenças da Bananeira. In FREIRE, F.C.O., CARDOSO, J.E., VIANA, F.M.P (eds.) 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