BOLETIM DO CONSÓRCIO ISPOR PARA A AMÉRICA LATINA Conferência ISPOR Santiago Fórum Educacional da 5ª Conferência ISPOR para a América Latina examina governança, metodologias de avaliação e tomada de decisão informada pela evidência na política de saúde na América Latina VOL 3 N 4, DEZEMBRO 2015 Autor: Aproximadamente 50 participantes tomaram parte num Fórum Educativo sobre governança, metodologias de avaliação e tomada de decisão informada por evidência em política de saúde, que teve lugar conjuntamente com a recente 5ª Conferência ISPOR para a América Latina. Conduzido logo após a conferência no Santiago Marriott Hotel, no dia 9 de setembro de 2015, e patrocinado por um fundo educacional da Roche, o fórum procurou identificar metodologias para incorporação das preferências societárias e critérios baseados em valor nas avaliações de reembolso. O fórum visou, também, explorar modelos de governança para ganhar contribuições dos pacientes, especialistas da área terapêutica e outros interessados na tomada de decisões e, finalmente, procurou melhorar a compreensão de como os governos e outros interessados podem usar a evidência proveniente do mundo real, para fortalecer os sistemas de cuidados de saúde. Após observações introdutórias do Prof. Dr. Manuel Antonio Espinoza, Presidente do Capítulo chileno da ISPOR, o fórum abriu com uma apresentação marcante do Dr. Eduardo Cazap, Fundador e Presidente da Sociedade Latino-americana e Caribenha de Oncologia Médica (SLACOM) e ex-presidente da União Internacional contra o Câncer (UICC). O Dr. Cazap enfatizou a necessidade dos sistemas de saúde dirijirem o seu foco não apenas sobre o tratamento da doença, mas também sobre a promoção da saúde levando em conta as preferências societárias. Os cuidados de saúde não são mais vistos como preocupação exclusiva dos profissionais médicos; os demais cidadãos estão assumindo um papel crescentemente ativo nas decisões que afetam a sua própria saúde. Todavia, o acesso aos cuidados de saúde de alta qualidade permanece desigual na América Latina, o que retarda o alcance das metas nacionais de Cobertura Universal à Saúde (Universal Health Coverage – UHC)i. Estas disparidades são agravadas por diferenças na renda nacional e nos orçamentos de cuidados de saúde que ocorrem na região e algumas vezes, dentro dos próprios países.ii A propósito disto, os responsáveis pela elaboração de políticas devem esforçar-se para usar os recursos de cuidados de saúde da maneira mais eficiente possível, enquanto asseguram que os orçamentos sejam suficientemente robustos para atender às necessidades da sociedade. Outras barreiras à UHC na América Latina incluem a fragmentação dos sistemas de saúde, exames e diagnósticos inadequados, além de dados insuficientes para estabelecer sistemas de Avaliação de Tecnologias em Saúde (Health Technology Assessment – HTA) informados pela evidência.iii O Dr. Cazap notou a necessidade dos governos da América Latina prestarem mais atenção e de aumentarem o patrocínio à prevenção, diagnóstico e tratamento do câncer, integrando suas ações para o controle do câncer dentro d planos nacionais estabelecidos de controle de câncer, sempre que possível. O câncer impõe tremendos custos econômicos, mas apesar disso não recebe a prioridade adequada,iv especialmente à luz das ameaças à saúde de maior visibilidade, tais como o Ébola, para o qual uma vacina já está sendo clinicamente testada. O Dr. Cazap chamou a sociedade civil para juntarse aos profissionais médicos na conscientização sobre o câncer, colocando-o na agenda política e encorajando assim as autoridades governamentais, a que estabeleçam orçamentos adequados para o controle do câncer. Ele destacou uma iniciativav conduzida pelo presidente do Uruguai, Tabaré Vázquez, que procura avançar na consecução das metas da Conferência Mundial contra o Câncer (World Summit Against Cancer): (1) definir um Plano Global contra o Câncer, que sirva como um documento “guarda-chuva” para complementar os planos nacionais de controle do câncer em todo o mundo, e (2) estabelecer um Fundo Global contra o Câncer, similar ao fundo global destinado ao HIV/AIDS, para fornecer os recursos necessários a componentes específicos do Plano Global contra o Câncer. Seguindo-se às observações do Dr. Cazap, a Prof. Dra. Felicia Knaul, Titular da Escola de Medicina Miller da Universidade de Miami (Miller School of Medicine of the University of Miami) e Diretora do Instituto Miami para as Américas (Miami Institute for the Americas) falou sobre os desafios para assegurar a Eduardo Cazap, MD, PhD, Fundador e Presidente da Sociedade Latinoamericana e Caribenha de Oncologia Médica (SLACOM) e Ex-presidente da União Internacional contra o Câncer (UICC), Buenos Aires, Argentina “O fórum procurou identificar metodologias para incorporação das preferências societárias e critérios baseados em valor nas avaliações de reembolso. O fórum visou, também, explorar modelos de governança para ganhar contribuições dos pacientes, especialistas da área terapêutica e outros interessados na tomada de decisões e, finalmente, procurou melhorar a compreensão de como os governos e outros interessados podem usar a evidência proveniente do mundo real, para fortalecer os sistemas de cuidados de saúde.” 1 sustentabilidade financeira nos sistemas de saúde na América Latina, especialmente aqueles impostos pelo envelhecimento demográfico, transições epidemiológicas e pela maior prevalência das doenças não contagiosas (Non-Communicable Diseases – NCDs), tais como câncer. Notando que os avanços tecnológicos estão demonstrando aspectos transmissíveis das NCDs, que turvam a distinção entre elas e as doenças infecciosas, a Prof. Knaul instou seus ouvintes a considerar não apenas a transmissibilidade, mas também a distinção entre condições crônicas e agudas. Um financiamento adequado é necessário para assegurar o acesso equitativo a tratamento para todas as doenças – contagiosas e não contagiosas, crônicas e agudas. Para assegurar que os sistemas de saúde considerem apropriadamente as necessidades dos pacientes, a Prof. Knaul recomendou uma abordagem do tipo ‘ciclo de vida’ no controle de doenças, combinando prevenção primária e secundária, diagnóstico, tratamento, cuidados paliativos e suporte financeiro. Ao tomar decisões para cobertura, os pagadores devem esforçar-se para assegurar o acesso àquilo que os pacientes mais valorizam, tal como controle da dor (por exemplo, acesso a morfina) e proteção contra custos catastróficos. Ao desenvolver métricas que avaliem o desempenho dos sistemas de saúde, é essencial que as mesmas se foquem nas diferentes causas de sofrimento aos pacientes. O México em particular tem feito progressos em direção às metas gêmeas de ‘sustentabilidade financeira’ e ‘maior atenção às necessidades dos pacientes’.vi Apenas à doze anos atrás, cerca de 50 milhões de mexicanos não tinham cobertura de saúde; hoje em dia, todos os cidadãos do México têm acesso garantido a uma ampla variedade de intervenções, que inclui mesmo tratamentos caros de última geração para o câncer de mama. Adicionalmente, conforme mencionado pelo Prof. Lindemberg Assunção Costa da Universidade Federal da Bahia (UFBA), os programas sociais e de saúde brasileiros garantem acesso universal a tratamento para hipertensão, diabetes e outras condições, e programas de acesso especial têm sido estabelecidos para outras doenças não cobertas. Mas mesmo no Brasil o acesso universal aos cuidadosde saúde permanecem uma meta elusiva devido ao baixo gasto per capita em saúde e às limitações de infraestruturas.vii Para superar as barreiras que restam ao acesso universal à saúde, tanto o Brasil como os outros países latino-americanos devem melhorar a conscientização sobre as doenças, estabelecer mais parcerias público-privadas e fortalecer a comunicação, colaboração e compreensão mútua entre os envolvidos no sistema de cuidados de saúde. Após a apresentação da Prof. Knaul, o Dr. Cazap conduziu um painel de discussão sobre “Princípios de Governança: Transparência e Envolvimento dos Interessados na Tomada de Decisão sobre Reembolso” com Luciana Holtz de Camargo Barros, Presidente e Diretora Executiva da organização não governamental brasileira ‘Instituto Oncoguia’ e o Dr. Bruno Nervi, Professor Assistente e Chefe de Oncologia Médica na Universidade Católica do Chile. Ambos os palestrantes enfatizaram a importância do engajamento dos envolvidos, do envolvimento do paciente e da transparência em assegurar que a tomada de decisão em reembolso seja informada por evidência e focada no quê os pacientes mais necessitam. Como médico chileno na prática privada, o Dr. Nervi expressou desalento ante as disparidades no acesso dos pacientes ao tratamento em seu país, resultante de diferenças na habilidade para pagamento de medicamentos não cobertos por seguradoras públicas ou privadas. Apesar de reconhecer que as autoridades de saúde enfrentam difíceis impasses devido aos recursos limitados, o Dr. Nervi clamou por uma maior consideração na perspetiva dos pacientes, ao se decidir sobre quais os tratamentos que oferecem benefício adicional suficiente para justificar a cobertura. Similarmente,. Holtz de Camargo Barros encorajou os pagadores a colocarem as necessidades e interesses dos pacientes – tais como qualidade de vida e alívio da dor – no centro das decisões sobre cobertura de tratamento. A tomada de decisão sobre quais os tratamentos que oferecem suficiente benefício para justificar a cobertura deve ser conduzida de forma transparente e envolver os próprios pacientes. Ela destacou o exemplo da agência de ATS do Brasil, a CONITEC (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS),viii que requer que toda tomada de decisão sobre reembolso inclua um período de consulta pública. Embora esta consulta pública obrigatória dê aos pacientes e outros atores societários uma oportunidade para expressar suas preferências aos tomadores de decisão, sua participação efetiva no processo é limitada, da mesma maneira que seu direito e habilidade para solicitar a inclusão de novas tecnologias de saúde no sistema público de cuidados de saúde no Brasil (o Sistema Único de Saúde – SUS).ix Ambos os palestrantes clamaram para que as autoridades de saúde deem maior prioridade ao câncer e invistam mais no exame, detecção precoce e infraestrutura para tratamento de câncer. O diagnóstico tardio representa um grande problema no Brasil, já que mais de metade dos 580.000 brasileiros recémdiagnosticados com câncer a cada ano apresentam um estágio já avançado da doença.x Notando que a maioria destes casos envolve câncer avançado ou metastático, a Srta. Holtz de Camargo Barros declarou que estes pacientes merecem um acesso equitativo ao tratamento. Reconhecendo o progresso do Chile no tratamento de câncer desde a lei que instaurou o Plano de Garantias Explícitas em Saúde (GES), em 2006,xi o Dr. Nervi notou que o país ainda precisa de um sistema de detecção precoce, que o amplo uso de tabaco gera altas taxas de câncer de pulmão entre os chilenos e que somente uma pequena quantidade de novos oncologistas ingressa na prática clínica a cada ano, não chegando à metade do número requerido para atender às necessidades do país.xii No Brasil e Chile, mesmo aqueles pacientes que já estão manifestando sintomas devem, algumas vezes, esperar meses por uma endoscopia ou mamografia, uma situação que ambos os palestrantes julgaram inaceitável.xiii As apresentações da Prof. Knaul, Dr. Nervi e de Holtz de Camargo Barros forneceram a base para uma subsequente discussão plenária focada em como melhor incorporar a evidência, as preferências societárias e os critérios baseados em valor nas avaliações e decisões de reembolso do governo. Os 2 participantes do fórum viram mérito na abordagem de Análise de Decisão por Múltiplos Critérios (Multiple Criteria Decision Analysis – MCDA) para avaliação de tecnologias em saúde, mas advertiram que os critérios devem ser definidos de forma transparente e com os interesses dos pacientes em mente antes de tudo, e que os processos de cobertura de reembolso devem ter em conta as perspectivas sociais e condições sanitárias em cada país. Os participantes também concordaram que todos os envolvidos devem trabalhar juntos para assegurar que o respetivo sistema nacional de saúde reflita as preferências societárias, seja inclusivo e holístico e considere as necessidades dos pacientes, especialmente os mais vulneráveis. Concluindo o fórum educacional, o Dr. Cazap notou as seguintes incumbências em relação à boa governança, metodologias adequadas de avaliação em saúde e tomada de decisão informada pela evidência: Assegurar bons cuidados de saúde é responsabilidade não apenas dos profissionais de cuidados de saúde, mas também de todos os atores societários, incluindo os próprios pacientes; Os países latino-americanos, provavelmente, não farão progresso no fortalecimento de seus sistemas de saúde, sem o engajamento e suporte ativo por parte de todos os responsáveis relevantes do governo; Os critérios para avaliação de novas tecnologias devem ser talhados para a situação e necessidades de cada em país em particular; Os sistemas de saúde devem levar em conta os fatores não clínicos que são muito importantes para os pacientes e seus cuidadores, incluindo a facilidade de acesso às unidades de cuidado à saúde, o cuidado de idosos e crianças durante a doença e a disponibilidade de tratamentos paliativos e para controle da dor; e Dados de melhor qualidade são necessários na América Latina, para assegurar que a tomada de decisão de reembolso tem como base uma evidência adequada. Próxima oportunidade para realizar um FORO EDUCATIVO Gostaria organizar um fórum ou simpósio educativo na Conferência ISPOR na América Latina em São Paulo, Brasil em 2017? Escreva a [email protected]. i F. Knaul; R. Wong; H. Arreola-Ornelas: Financing Health in Latin America. 2012. http://www.idrc.ca/EN/Documents/Financing-Health-in-Latin-America-Volume-1.pdf. Acessado pela última vez em setembro de 2015. ii PAHO Health Economics and Financing (HEF): Health Care Expenditure and Financing in Latin America and the Caribbean [Folha informativa] iii T. Dmytraczenko; G. Almeida: Towards Universal Health Covergae and Equity in Latin America. 2015 iv The Lancet Oncology Commission: Planning cancer control in Latin America and the Caribbean. 2013. v Comisión Honoraria de Lucha Contra el Cancer: http://www.comisioncancer.org.uy/subcategorias_2_1.html. Acessado pela última vez em setembro de 2015. vi The World Bank: Seguro Popular: Health Coverage For All in Mexico. 2015. vii The World Bank: Health expenditure per capita. 2015. viii Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias: http://conitec.gov.br/index.php/2014-08-07-13-22-56. Acessado pela última vez em setembro de 2015. ix World Health Organization: “Brazil's march towards universal coverage” [Boletim] http://www.who.int/bulletin/volumes/88/9/10-020910/en/. Acessado pela última vez em setembro de 2015. x Instituto Oncoguia: Estimativas no Brasil. 2015. http://www.oncoguia.org.br/conteudo/estimativas-nobrasil/1705/1/. Acessado pela última vez em setembro de 2015. xi WHO: Social determinants of health - Chile. http://www.who.int/social_determinants/thecommission/countrywork/within/chile/en/. Acessado pela última vez em setembro de 2015. xii J. Jimenez de la Jara et al.: A snapshot of cancer in Chile: analytical frameworks for developing a cancer policy. 2015. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4417314/ . Acessado pela última vez em setembro de 2015. xiii A. Cecilio; E. Takakura; J. Jumes; J. dos Santos; A. Herrera; V. Victorino; C. Panis: Breast cancer in Brazil: epidemiology and treatment challenges. 2015. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4317062/pdf/bctt-7-043.pdf Acessado pela última vez em setembro de 2015. 3