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ANAIS DO III CONGRESSO NACIONAL DE PESQUISADORES EM DANÇA
Comitê Dança (e)m Política – Setembro/2014
DANÇA, POLÍTICA E RESISTÊNCIAS
Sofia do Amaral Osório (PUC-SP)*
RESUMO: Partindo da experiência do Teatro de Dança Galpão, que teve espaço em São
Paulo durante a década de 1970, o artigo busca apontar para a emergência de práticas
de resistência, por meio da dança, durante a ditadura civil-militar no Brasil, refletindo
sobre as relações entre as políticas de governo de um regime ditatorial e o caráter
transgressor da produção artística. Desta forma, pretende-se mostrar de que maneira a
dança paulistana se reinventou em um momento político desfavorável, encontrando
brechas para garantir sua existência.
PALAVRAS-CHAVE: Teatro de Dança Galpão. Ditadura civil-militar; Política cultural.
DANCE, POLICY AND RESISTANCE
ABSTRACT: Starting from the experience of Teatro de Dança Galpão, which had space in
São Paulo during the 1970s, the article seeks to point to the emergence of resistance
practices, through dance, during the civil-military dictatorship in Brazil, reflecting on the
relationship between government policies of a dictatorial regime and the transgressor
character of artistic production. Thus, we intend to show how the São Paulo‟s dance has
reinvented itself in an unfavorable political situation, finding loopholes to ensure its
existence.
KEYWORDS: Teatro de Dança Galpão. Civil-military dictatorship. Cultural policy.
1
http://www.portalanda.org.br/anai
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Na década de 1970, um abismo parecia separar duas vertentes distintas da
produção de dança em São Paulo: de um lado, havia um circuito oficial, financiado pelo
Estado, composto pela Escola Municipal de Bailado – criada em 1940 com o intuito de
formar bailarinos clássicos que comporiam os corpos de bailes para os espetáculos de
ópera que eram importados de outros países e se apresentavam no Teatro Municipal – e
pelo Corpo de Baile Municipal (CBM) – a companhia oficial da cidade, atualmente
denominada
Balé
da
Cidade,
que
até
1974
tinha
um
repertório
baseado
fundamentalmente na remontagem de obras do balé romântico. Do outro lado, havia uma
série de artistas interessados em desenvolver trabalhos menos ligados ao universo do
balé clássico, buscando referências na dança moderna estadunidense e na dança
expressionista alemã, entre outras.
O hiato entre estas duas formas de dançar e pensar a dança é muitas vezes
descrito por artistas que vivenciaram este período como uma verdadeira rixa entre
clássicos e modernos, ou oficiais e independentes, como foi possível notar por meio de
entrevistas realizadas para a pesquisa de mestrado Pulsações: uma antropologia da
crueldade1. Os trabalhos produzidos por aqueles que se vinculavam a uma perspectiva de
dança moderna não eram compreendidos como dança pelos bailarinos clássicos,
enquanto que a produção ligada à tradição do balé clássico era lida como algo apartado
da realidade que se vivia.
Se a casa do CBM era o Teatro Municipal, os bailarinos e coreógrafos interessados
em linguagens mais afastadas do clássico encontravam pouco espaço para apresentar
seus trabalhos. Era comum a realização de espetáculos em dias e horários alternativos,
em locais que costumavam receber peças teatrais. Mas este espaço era também restrito,
e algumas pessoas só conseguiam se apresentar diante do público em palcos
improvisados na rua. Quem queria dançar fora do contexto “oficial” precisava se virar para
encontrar meios de fazê-lo, pedindo doações de figurinos para grandes confecções,
emprestando salas das academias de dança para ensaiar, e, com a sorte de encontrar um
teatro para apresentar-se, contar apenas com o retorno financeiro vindo do borderô,
descontando-se o valor do aluguel das salas de espetáculo. É bem verdade que o
financiamento estatal para o circuito “oficial” de dança também não era muito generoso,
1
Projeto de pesquisa em andamento, sob orientação de Dorothea Voegeli Passetti, no Programa de
Estudos Pós-Graduados em Ciências Sociais da PUC-SP.
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mas por vezes investia-se para trazer grandes companhias de balé estrangeiras para
apresentações no Teatro Municipal, como descreve a bailarina Marilena Ansaldi em
entrevista concedida ao pesquisador Linneu Dias, em 1976:
A gente ia pedir cinco mil cruzeiros de ajuda e não tinha... Quando veio o Royal
Ballet [em 1973] deu um galho incrível porque eles deram uma verba muito grande
e a gente ficou muito revoltada e resolvemos fazer um abaixo-assinado. Nessa
época, o Sábato Magaldi falou com o Pedro de Magalhães Padilha, que era o
secretário da Cultura do Estado e levou a ele esse abaixo-assinado. Padilha ficou
muito espantado que houvesse um movimento de dança aqui no Brasil. 2
Marilena Ansaldi era então casada com o jornalista e critico teatral Sábato Magaldi,
o que facilitava seu acesso ao Secretário. Foi a partir deste abaixo-assinado que Pedro
Magalhães Padilha convidou Ansaldi para participar de uma Comissão de Dança, que
deveria elaborar um plano de ação para o desenvolvimento da dança no estado. A
proposta de criação de um espaço voltado para a dança “independente”, o Teatro de
Dança - Galpão, veio suprir a falta de espaço para o desenvolvimento de trabalhos com
uma grande restrição para serem formulados e apresentados.
A sala Galpão do teatro Ruth Escobar foi alugada pela Secretaria de Cultura,
Esportes e Turismo do Estado de São Paulo em 1974, oferecendo cursos durante o dia e
funcionando como sala de espetáculo durante a noite. Localizada na Rua dos Ingleses, no
tradicional bairro do Bixiga, a Sala Galpão foi inaugurada em 1967, como parte do projeto
de expansão do Teatro Ruth Escobar, planejada de maneira a fugir do padrão
arquitetônico dos teatros tradicionais de palco italiano. Era uma sala pequena, com uma
arquibancada em cujo patamar mais baixo ficava o palco.
Foi no Galpão que se realizou a temporada paulistana do espetáculo Roda Viva, de
autoria de Chico Buarque e direção de José Celso Martinez Corrêa, em 1968. A peça se
tornou um símbolo da resistência à ditadura civil-militar por meio das artes, não só por seu
conteúdo mas, sobretudo, pelo episódio ocorrido no Galpão em 18 de julho, quando um
grupo do Comando de Caça aos Comunistas (CCC) invadiu o teatro, destruiu o cenário e
os equipamentos do teatro, e espancou integrantes do elenco e da equipe técnica. Um
entre tantos episódios que expressam a violência – tanto oficial quanto extraoficial –
2
Entrevista com Marilena Ansaldi, Emilie Chamie e Iacov Hillel a Linneu Dias em 26/3/1976. Centro Cultural
São Paulo: Arquivo Multimeios, TR2065.
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perpetrada contra expressões artísticas durante os chamados anos de chumbo.3 Para
Marilena Ansaldi, era importante que o Teatro de Dança se concretizasse justamente
naquele espaço que, apesar e também devido a todos os seus problemas estruturais, e
por sua própria história, representava a realidade com a qual a dança precisava lidar
naquele momento4.
Naquela primeira metade da década de 1970, a cena teatral brasileira, e
especificamente a paulistana, encontrava-se em uma situação de desarticulação em
consequência
da intensificação
da
censura
e
de
outras práticas repressivas
empreendidas pelo Estado5. Se, desde as décadas de 1950 e 1960, o teatro brasileiro
passava por um período marcado pela intensa produção de textos e montagens com um
conteúdo político combativo, após a promulgação do AI-5, “Entre 1969 e 1971, os três
mais importantes grupos teatrais brasileiros – o Arena, o Opinião e o Oficina –,
desarticularam-se ou foram extintos” (NAPOLITANO, 2014, p. 186), devido à perseguição
política que levou algumas das figuras importantes desta cena ao exílio.
3
Uma descrição detalhada do episódio pode ser lida em matéria publicada pelo jornal Folha de S. Paulo no
dia 19/07/1968. Ali é possível constatar a conivência estatal diante do episódio, perpetrado por um grupo
“clandestino”, mas que se alinhava aos interesses do regime ditatorial; também nota-se a mobilização da
classe artística que o episódio causou. Cf. “Invadido e depredado o Teatro Galpão” in Folha de S. Paulo,
19/07/1968. Disponível em: http://almanaque.folha.uol.com.br/ilustrada_19jul1968.htm (consultado em
28/05/2014). Ainda em 1968, no mês de setembro, o espetáculo estava em cartaz em Porta Alegre (RS)
quando houve outro episódio de agressão; desta vez, no entanto, a peça acabou por ser vetada pela
censura: a “obscenidade” da qual reclamavam os membros do CCC no episódio do Galpão transformou-se
em agressão à moral e aos bons costumes, no vocabulário da censura oficial.
4
“Eu me lembro que lutei muito para que fosse naquele lugar o teatro... Queria não sei o quê, queriam dar o
São Pedro, queriam mandar a gente não sei para onde. Quero aquele teatro! Porque é muito importante o
ponto. É importante o teatro. O teatro era ruim, quer dizer, sem grandes condições etc. e tal, mas eu acho
que foi formidável, é isso mesmo, a nossa realidade é essa. Quer dizer: não tem água no teatro, camarins
não tem, não funciona, nada funciona. Mas é isso mesmo, a gente tem que trabalhar com esses elementos,
se essa é a nossa realidade...” (Depoimento de Marilena Ansaldi em 1978, apud NAVAS e DIAS, 1992, p.
123).
5
É importante ressaltar que, apesar de todo o aparato repressivo, o teatro brasileiro continuou
desempenhando um importante papel de resistência à ditadura civil-militar, ainda que em uma intensidade
reduzida. “No anticlímax que sofreu a classe teatral a partir do AI-5, depois de quatro anos sendo um dos
eixos do debate estético e ideológico na sociedade brasileira, duas peças marcaram época: Cemitério de
Automóveis (Fernando Arrabal [de 1968]) e O Balcão (Jean Genet [de 1969]), ambas dirigidas por Victor
Garcia e produzidas por Ruth Escobar. Esta se firmava como produtora independente e personalidade
crítica, desafiando o cerceamento cultural imposto pelo regime militar e pela censura. (...) Mais pela
concepção cênica e pela atuação dos atores do que pelo texto em si, foram uma espécie de manifesto
contra a ditadura, estilizando a violência e a crueldade das instituições oficiais e conservadoras contra o
indivíduo (como o Exército, a Igreja, a Justiça) e fazendo o público experimentar, esteticamente, a mesma
violência que derrotara as revoluções populares e o direito de manifestar a crítica social e política”
(NAPOLITANO, 2014, p. 186-187).
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Em entrevista datada de 1978, a bailarina e coreógrafa Célia Gouvêa afirma que as
experiências empreendidas no Teatro de Dança Galpão vinham atender a um público
interessado em invenções e experimentações em obras artísticas, características que
vinham sendo restringidas pela repressão às obras e grupos teatrais 6.
Em 1975 os cursos começaram a funcionar no Galpão. Diariamente, durante as
manhãs e tardes, eram oferecidas aulas de balé clássico (com Iracity Cardoso), dança
moderna (com Antonio Carlos Cardoso), expressão corporal (com Célia Gouvêa) e
interpretação para dança (com Maurice Vaneau)7, seguindo a estrutura proposta pela
Comissão de Dança.
Para alguns jovens bailarinos, abria-se a possibilidade para uma intensa imersão
em práticas de dança sem que fosse preciso pagar fortunas para assistir a muitas aulas
em diferentes academias. Além de aglutinar pessoas com formação em distintas técnicas
e estilos de dança, os cursos do Galpão também atraíram atores, interessados em
explorar outros meios de expressão através do corpo.
Não era apenas a gratuidade que distinguia o Galpão das academias de dança
espalhadas por São Paulo: os bailarinos que passaram a frequentar os cursos estavam
interessados em um tipo de formação que ultrapassasse o aprimoramento técnico. Em
entrevista concedida à autora em 25/03/2014, Célia Gouvêa chama a atenção para o que
considera ter sido uma das importantes marcas do Galpão: a criação de um vínculo entre
dança e sociedade, que vai de encontro com a tradição da prática de dança em espaços
fechados, como estúdios e academias. Mais do que as aulas, o espaço possibilitava a
convivência entre as pessoas que o habitavam, propiciando uma reflexão informal e
coletiva a respeito da dança. Naquele momento, o campo de atuação para bailarinos
estava praticamente restrito a programas de auditório e shows de boate 8, onde a dança e
6
“Desde que o Oficina acabou, o teatro estava naquele vai-não-vai... Nessa época, particularmente 74-75,
não estava acontecendo muita coisa no campo do teatro, assim, de efervescência, não é? Então, eu me
lembro que a gente estava emergindo, com a dança, atendendo a essa necessidade de um público mais
curioso, mais interessado numa experimentação, numa coisa nova, enfim, numa coisa que estivesse, assim,
investigando...” (Célia Gouvêa apud NAVAS e DIAS, 1992, p. 131).
7
Nos anos de funcionamento do Teatro de Dança que se seguiram, outros professores assumiram algumas
aulas, como, por exemplo, Sônia Motta, que passou a dar aulas naquele espaço em 1976.
8
Por meio das entrevistas e conversas informais realizadas para este trabalho com bailarinos daquela
geração foi possível constatar que, para dançar profissionalmente nestes locais, era necessário solicitar um
registro no mesmo local em que eram expedidos os registros de dançarinas, como eram identificadas as
garotas de programa que também trabalhavam em casas noturnas. Daí distinção entre as denominações
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o corpo funcionam como meros adereços, interessando basicamente a habilidade técnica
do executor de movimentos. Com seus cursos, o Galpão não pretendia fornecer uma
formação técnica para a execução de movimentos virtuosos. O que estava em jogo era
fornecer elementos que possibilitassem uma apropriação do próprio corpo como espaço
de invenção.
Juçara Amaral, aluna dos cursos no ano de 1975, afirma que aquela experiência
possibilitou a formação de um novo entendimento a respeito do corpo que dança: “Você
tinha na sua mão um instrumento de expressão artística, não só um adereço” 9.
Além disso, em um momento em que a simples reunião de pessoas podia ser
considerada como ato de subversão, o Galpão possibilitava uma sociabilidade
interceptada pelo regime ditatorial, abrindo espaço para a reunião de pessoas que, por
meio das inquietações em relação à dança, criavam não só grupos experimentais, como
também vínculos interpessoais. Portanto, expressava um vigor resistente diante do
regime ditatorial, não só pelas inovações em termos de linguagem de dança ali
empreendidas, mas também por se destacar como um lugar que insistia em pulsar
vitalidade na cidade de São Paulo.
A intensidade das atividades promovidas no Galpão tornou o espaço quase que
uma “segunda casa” para seus frequentadores. Tratava-se de um espaço de formação –
não somente técnica, mas sobretudo, formação de um olhar para a dança, quando só
havia uma faculdade de dança na Bahia.10
O bailarino Ismael Ivo, que até então dançava na rua, encontrou ali um lugar para
estudar mostrar seu trabalho com mínimas condições de apresentação. Em entrevista, ele
ainda chama a atenção para o fato de a dança “independente”, naquele momento, estar
muito ligada a bailarinos de classe média alta, que podiam arcar com os custos das aulas
de técnicas modernas, até então ministradas apenas em estúdios particulares, e financiar
a realização de espetáculos mais experimentais, que não contavam com qualquer
subsídio estatal; nascido em uma família mais pobre, a possibilidade de fazer cursos
bailarina e dançarina, que, embora pouco relevante atualmente, era bastante valorizada pelos profissionais
da dança das décadas de 1960 e 1970.
9
Entrevista com Juçara Amaral realizada em 13/08/2011.
10
Cf. entrevistas com Zina Filler, realizada em 16/07/2013, e com Vivien Buckup, realizada em 19/07/2014.
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gratuitos lhe era muito importante naquele momento. 11 Segundo o próprio Ivo, a
experiência no Galpão – frequentando os cursos e desenvolvendo e apresentando
trabalhos tanto individuais quanto criados com pessoas com quem convivia ali – teve uma
importância que ultrapassava sua formação enquanto bailarino e coreógrafo. Esta
formação se relacionava com a questão de
Como dividir com outros corpos, se permitir a absorver novas ideias, sem perder a
sua identidade, e entrar num percurso de autoafirmação. Então, nesse momento,
através do vocabulário novo apresentado, de ideias novas de dança, de dança
contemporânea, de dança independente, você começava a se estruturar enquanto
pessoa, se reafirmar, como no meu caso, como bailarino, artista, negro. Então,
essa experiência do Galpão te dava a possibilidade de se autoafirmar (...), criar a
sua própria identidade. (...) Acontece que isso te muda dentro da sociedade. E eu
comecei a perceber que a minha relação com a dança, com o público – porque aí
começa a se estabelecer um público, a gente começou a criar um público novo
(...) tanto que os espetáculos que a gente apresentava no Galpão eram lotados
(...), as pessoas queriam ver uma coisa nova (...) então você começa a apresentar
ideias novas (...). Então, você começa a influenciar outras visões, outras zonas de
convivência. (...) A arte, para mim, a partir dali, se tornou como um documento da
vida, da vida em progresso, da vida em transformação, de metamorfose, de
maneiras de comunicação corpo a corpo – sociedade, de ver coisas novas e
começar, então, a criar outros tipos de linguagem corporais. (...) A arte, a dança,
como um espelho da sociedade12.
O vínculo entre dança e sociedade era favorecido também pelo fato de o Galpão
estar localizado no bairro do Bixiga, reduto da vida cultural e boêmia da cidade de São
Paulo que, até os dias de hoje, concentra inúmeros restaurantes, bares, “baladas” e
teatros; tratava-se, como ainda hoje, de uma zona de convivência entre artistas de
diferentes áreas – do teatro, da dança, da música. A localização do espaço favorecia,
portanto, a contaminação da dança por outras linguagens artísticas, o que se mostrou
como uma característica marcante do Teatro de Dança Galpão, desde a instalação de
Célia Gouvêa e Maurice Vaneau no espaço. O casal de artistas foi o primeiro grupo a
ocupar a sala já alugada pela prefeitura, desenvolvendo ali um trabalho que buscava
articular teatro e dança, em uma perspectiva bastante influenciada pelo Teatro da
Crueldade proposto por Antonin Artaud.
Além das aulas, que ocorriam durante o dia, o Galpão funcionava também como
espaço para ensaios e sala de espetáculos à noite, abrigando a apresentação de
11
Entrevista com Ismael Ivo realizada em 20/08/2013.
Entrevista com Ismael Ivo realizada em 20/08/2013.
12
Entrevista com Ismael Ivo realizada em 20/08/2013.
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Entrevista com Ismael Ivo realizada em 20/08/2013.
12
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trabalhos de artistas e grupos experimentais como Marilena Ansaldi, Clarisse Abujamra 13,
Ismael Ivo, o grupo Andança14, o Teatro de Dança de São Paulo15, Grupo PróPosição16,
Grupo Teatro do Movimento17, entre tantos outros.
Em plena ditadura civil-militar, as experiências empreendidas no Galpão também
funcionaram como recusa e agressão às normas culturais e sociais – tanto no que diz
respeito à própria dança como ao contexto social e cultural mais amplo.
O início das atividades do Galpão como Teatro de Dança coincide com o primeiro
ano de Ernesto Geisel na presidência da república. Do ponto de vista liberal, o governo
Geisel é descrito como o momento de retomada da rota original da “Revolução de 64”,
que teria tido seus objetivos de reestabelecimento da democracia desviados por volta de
1968; frequentemente, este período é apontado como o início do processo de “abertura”
que levaria à “redemocratização” do país, já na década de 1970. No entanto, é preciso
atentar para o fato de que a chamada “distensão” ou “abertura”, no governo Geisel,
significava estritamente a institucionalização do regime militar, levando-se em conta que
“o aparato policialesco de repressão era insuficiente e arriscado para tutelar o sistema
político, sob risco do governo isolar-se dele” (NAPOLITANO, 2014, p. 234).
Em outras palavras, era preciso iniciar uma normalização da vida política, que no
jargão político da época significava consolidar o espírito de tutela do AI-5 em
princípios constitucionais, abrandar o controle da sociedade civil, sem
13
Clarisse Abujamra (1948-) é uma bailarina, coreógrafa e atriz brasileira. Estudou a técnica Martha
Graham em Nova York e trabalhou como professora no Ballet Stagium, no Balé da Cidade e no Balé do
Teatro Castro Alves. No início da década de 1980, foi responsável pela implantação do Dança Espaço no
TBC, onde ocorriam aulas, discussões e espetáculos. Criou e dirigiu, junto com Val Folly, o grupo Teatro
Brasileiro de Dança. Cf. http://www.clarisseabujamra.ato.br/biografia.asp (consultado em 04/06/2014).
14
“O Andança surgiu em novembro de 1977, de um objetivo comum de suas seis integrantes de fazerem
dança dentro de um esquema coletivizado em que a direção, produção, a escolha do programa, cenários,
figurinos, o ensaio e a divulgação, enfim, tudo devia ser deliberado e realizado pelo grupo, que se dividia
entre as funções (...). Do ponto de vista financeiro, a manutenção dos trabalhos se dava por meio de uma
caixinha de contribuição suprida mensalmente pelas próprias bailarinas; porém, a sobrevivência individual
provinha das aulas que cada uma delas tinha que dar a fim de poder manter o grupo e a si mesmas na
profissão. A criação do repertório da companhia funcionava em sistema rotativo: além de trabalhos
realizados pelas próprias integrantes, eram convidados diferentes profissionais, sempre buscando dar
espaço aos novos criadores” (GERALDI, 2009, p. 126). Sônia Motta foi uma das coreógrafas que muito
colaborou com o grupo, criando para ele diversas coreografias.
15
Nome que assumiu o grupo de Célia Gouvêa e Maurice Vaneau depois de Caminhada; os integrantes
não eram fixos, mas o trabalho sempre estava centrado no “núcleo fundamental” formado pelo casal.
16
O grupo PróPosição foi fundado em 1973 pelos bailarinos Denilton Gomes e Janice Vieira. O grupo
interrompeu suas atividades em 1983; em 2008, Janicce Vieira retomou o nome do grupo e voltou a
produzir
alguns
trabalhos,
agora
já
sem
Denilton,
que
faleceu
em
1994.
Cf.
http://www.proposicaodanca.com.br/grupo-pro-posicao/ (consultado em 04/06/2014).
17
Grupo dirigido por Angel e Klauss Vianna, sedeado no Rio de Janeiro entre 1975 e 1980.
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necessariamente dar a ela espaço político efetivo no processo decisório, e, em um
futuro incerto, devolver o poder a civis identificados com as doutrinas que
inspiraram 1964 ou que, ao menos, não lhes fossem hostis (IDEM, IBIDEM, pp.
237-238).
Em paralelo ao grande número de opositores mortos e desaparecidos
especialmente no governo Geisel, foi justamente neste período que se instituiu uma das
mais importantes ações na área cultura do país: o Plano Nacional de Cultura, criado em
1975. Antes que se esbarre em uma leitura pela via da contradição, vale à pena ressaltar
que a criação de políticas culturais, historicamente, remete-se a experiências de Estados
autoritários:
Na qualidade de uma intervenção sistemática e institucionalizada por parte do
Estado ou de poderes públicos, que por seu intermédio reconhece a importância
sociocultural das artes, das produções intelectuais e dos acervos históricos, a
política cultural surgiu em inícios do século XX, integrando-se à lógica das
planificações econômicas, sociais e educacionais da União Soviética, assim como
à tarefa de propaganda ideológica (CUNHA, p. 511).
No Brasil, as procedências remontam à criação do Departamento de Cultura na
Prefeitura de São Paulo, em 1935, dirigido pelo modernista Mário de Andrade; à ditadura
do Estado Novo, com a criação do Departamento de Informação e Propaganda (DIP) e,
mais especificamente, à gestão de Gustavo Campanela no então Ministério de Educação
e Saúde Pública (ao qual estava vinculada a área da cultura).
[...] o governo Getúlio Vargas / Gustavo Capanema inaugurou uma atuação
sistemática do estado na cultura. Dentre outros procedimentos, tem-se a criação
de legislações para o cinema, a radiodifusão, as artes, as profissões culturais etc e
a constituição de inúmeros organismos culturais, tais como: Superintendência de
Educação Musical e Artística; Instituto Nacional de Cinema Educativo (1936);
Serviço de Radiodifusão Educativa (1936); Serviço do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional (1937); Serviço Nacional de Teatro (1937); Instituto Nacional do
Livro (1937) e Conselho Nacional de Cultura (1938) (RUBIM, s/d).
O Plano Nacional de Cultura, de 1975, é tido como o “primeiro plano oficial
abrangente em condições de nortear a presença governamental na área cultural”
(MICELI, 1984, p. 57). De acordo com Sérgio Miceli,
[...] inserir o domínio da cultura entre as metas da política de desenvolvimento
social do governo Geisel. Foi a única vez na história republicana que o governo
formalizou um conjunto de diretrizes para orientar suas atividades na área cultural,
prevendo ainda modalidades de colaboração entre os órgãos federais e outros
ministérios; [...] com secretarias estatais e municipais de cultura, universidades,
fundações culturais e instituições privadas (IDEM, IBIDEM, p. 57).
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O Plano combinava a repressão, por meio da continuidade da censura, ao
mecenato. Objetivava financiar produções e criar um mercado para as artes, em um
interesse articulado ao plano de desenvolvimento capitalista que se pretendia impulsionar
no país. Desde 1964, a cultura se constituía como um ponto estratégico para a ditadura
civil-militar no Brasil, articulado à segurança nacional e ao desenvolvimentismo que
alicerçavam os interesses do regime. Se, por um lado, o campo das artes abarcava boa
parte dos opositores do regime ditatorial, tratava-se também de uma área capaz de
auxiliar na construção de uma identidade nacional e uma integração das diversas regiões
do país. Deste modo, a censura foi um instrumento amplamente utilizado ao longo de toda
a ditadura civil-militar, baseando-se na lei de censura herdada do governo Vargas (Lei nº
20.493, de 1946) e nas legislações criadas no interior do regime (Lei nº 5.526, de 1968, e
Decreto nº 1.077, de 1970) (Cf. NAPOLITANO, 2014, p. 129). No que se refere à dança,
os espetáculos deviam ser submetidos à autorização dos censores, mas dois aspectos
nos permitem apontar os motivos pelos quais mesmo aquelas obras com conteúdo
político não serem vetadas: primeiro, pela ausência da palavra enquanto discurso; em
segundo lugar, pelo público aparentemente mais restrito em relação ao teatro, uma vez
que o governo estava mais preocupado em evitar a articulação das “artes engajadas” com
o grande público, e menos com as expressões que atingiam um grupo mais restrito.
É ainda importante ressaltar a falta de homogeneidade ou mesmo contradição que
havia entre os diferentes órgãos governamentais ligados à área da cultura.
Enquanto os órgãos militares e de segurança mantinham uma lógica de
controle, repressão e vigilância, muitos órgãos da cultura eram dirigidos
por pessoas ligadas às artes e ao meio intelectual, sobretudo após 1975
[...]. Esses nomes eram elos entre o Estado e a classe artística,
desempenhando um papel de mediadores das tensões entre um e outro”
(IDEM, IBIDEM, pp. 198-199).
No interior da Embrafilme e do Serviço Nacional do Teatro, por exemplo, há casos
de financiamento ou premiação de obras que foram vetadas pelos órgãos de censura.
Nota-se, portanto, a dificuldade de se traçar um perfil claro e uniforme da maneira como o
Estado lidava com a produção artístico-cultural durante a ditadura civil-militar.
De acordo com Napolitano, a elaboração de uma política cultural durante a ditadura
atendia à necessidade de maior aproximação do governo com a sociedade civil, a partir
da segunda metade da década de 1970, depois que a guerrilha armada já não se
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constituía como uma preocupação para o regime (que, como se sabe, já havia
exterminado seus integrantes, muitos dos quais têm os corpos desaparecidos até hoje).
Neste sentido, interessava criar maneiras de aproximar do governo uma classe de
intelectuais e artistas que haviam se colocado como opositores desde 1964, ainda que
isso significasse permitir um certo grau de liberdade de expressão em suas obras (Cf.
NAPOLITANO, 2014, pp. 195-196).
Desta maneira, nota-se que, partindo de uma demanda expressa pelos próprios
artistas da dança, o financiamento estatal para o funcionamento do Galpão enquanto
Teatro de Dança parece também alinhar-se a uma relação entre Estado e cultura que
vinha se esboçando desde os primeiros anos da década de 1970, no Brasil, e ganhou
forma institucionalizada em 1975, com a criação do Plano Nacional de Cultura. No interior
de um Estado autoritário, a insistência possibilitou a criação de um espaço para a dança
independente, onde emergiu uma produção inventiva. Ademais, a existência de um lugar
onde as pessoas interessadas em uma produção de dança que escapasse ao padrão
oficial que predominava em São Paulo até aquele momento podiam se encontrar
favoreceu a consolidação de um movimento que já vinha emergindo de forma dispersa
desde a década de 1960, como se mostrou anteriormente.
A segunda metade da década de 1970 foi um momento importante para a dança
não só em São Paulo, mas em todo o Brasil. Em 1977 ocorreu a primeira edição do
Concurso Nacional de Dança, na Universidade Federal da Bahia (onde teve lugar, desde
a década de 1950, o primeiro curso de graduação em dança do Brasil), que reuniu artistas
de todo o país. Alguns anos depois, o evento perderia seu caráter competitivo, tornandose Oficina Nacional de Dança Contemporânea. Em sua primeira edição, no entanto, o
primeiro prêmio do concurso foi dado a Ismael Ivo, que apresentou um solo que havia
criado no Galpão: “Rito do Corpo em Lua” 18. Em 1978, foi realizada a primeira edição do
Ciclo Nacional de Dança Contemporânea, na cidade do Rio de Janeiro.
A realização de festivais e encontros se constituiu como um dos principais focos do
apoio à dança promovido pela Funarte. De acordo com a pesquisadora Marila Vellozo, é
justamente a criação desta instituição, em 1975, no bojo do Plano Nacional de Cultura, o
18
A participação no Concurso fez com que Ivo fosse notado por Alvin Ailey, diretor da famosa companhia de
dança negra que leva seu nome, sediada em Nova York, que o convidou a estudar como bolsista na escola
da companhia; foi a ida a Nova York que impulsionou a carreira do bailarino em nível internacional.
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“marco inicial da dança na esfera do poder federal” (VELLOZO, 2011, p. 130). É possível
entender estes eventos como a criação, em caráter temporário, de um espaço de
convivência e trocas, o que era uma característica permanente na existência do Teatro de
Dança Galpão. No trânsito entre estes espaços, foi tomando forma um movimento de
pessoas que discutiam a necessidade de maior profissionalização da área da dança, e a
necessidade de um apoio governamental mais sistemático e efetivo.
O que começou a acontecer de forma incipiente na década de 1970 ganhou uma
forma mais institucionalizada sobretudo a partir dos anos 2000, com a criação da
Cooperativa Paulista de Dança, em 2005, ou a realização de assembleias do movimento
autointitulado A dança se move19, que se propõe a discutir e propor políticas públicas para
a área da dança em nível municipal, estadual e federal. Estas práticas estão alinhadas ao
pressuposto de corresponsabilidade entre Estado e sociedade civil que norteia as
políticas culturais no Brasil, pelo menos desde o primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da
Silva na presidência da república. Em 2007, o então ministro da cultura Gilberto Gil
apresentou um novo Plano Nacional de Cultura, que partia de um conceito de cultura
abrangente.
A abertura conceitual e de atuação significa não só o abandono de uma visão
elitista e discriminadora de cultura, mas representa um contraponto ao
autoritarismo e a busca da democratização das políticas culturais. A intensa opção
por construir políticas públicas, porque em debate com a sociedade, emerge como
outra marca da gestão Gil. Assim, proliferam os seminários; as câmaras setoriais;
as conferências, inclusive culminando na Conferência Nacional de Cultura
(RUBIM, s/d).
No que se refere especificamente à dança, nota-se que a importância da
proposição de políticas por parte da própria “classe”, uma característica tão democrática,
começava a delinear-se em plena ditadura civil-militar. Seria este mais uma evidência de
que a chamada “abertura” não foi somente resultado do clamor das ruas, mas um projeto
muito bem articulado com vistas a uma transição democrática lenta e gradual, que não
excluiu do jogo democrático figuras e práticas importantes para a manutenção da
ditadura?
Vale lembrar que a primeira lei de incentivo fiscal voltada à área cultural foi
instituída durante o governo de José Sarney na presidência da república, e ficou
19
http://dancasemove.blogspot.com.br/
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conhecida justamente pelo nome de Lei Sarney (Lei 7.505/86). Durante o governo Collor,
esta lei foi substituída pela Lei Federal de Incentivo à Cultura (Lei 8.313 de 23 de
dezembro de 1991), em vigor até hoje, e que é conhecida pelo nome do secretário de
cultura em exercício na época de sua instituição, Sérgio Paulo Rouanet.
Se, por meio da Lei Rouanet, o investimento por parte dos empresários se dá
preferencialmente sobre produções de grande abrangência e impacto comercial,
as políticas de fomento possibilitam também o financiamento de
ações locais voltadas a públicos mais reduzidos.
Não só o Estado, mas também empresas de capital privado promovem uma série
de editais de financiamento. Há também as ferramentas colaborativas de
financiamento online, o crowdfunding – o atual financiamento coletivo por
intermédio da junção de múltiplas fontes, ou o eufemismo in english para uma das
denominações de valor agregado capitalista para um produto.
Entre financiamentos estatais, empresariais, público-privados ou alternativos, há
espaço para todos. Desde que o projeto responda aos interesses do proponente
do edital ou consiga um número mínimo de seguidores dispostos a custeá-lo.
O que importa é que se produza cada vez mais, ocupando e entretendo tanto o
público quanto os propositores de projetos.
Essas vias de financiamento apresentam lógicas similares e funcionamento
complementar:
submete-se
uma
proposta,
contendo
as
devidas contrapartidas e inovações adequadas a cada caso. É possível se
candidatar a uma ou outra destas modalidades, a depender dos interesses do
propositor ou de suas necessidades financeiras.
Este trânsito permite que a produção seja m o d u l á v e l, contínua e inofensiva.
Se os artistas não dependem mais da indústria cultural, é preciso que se
tornem empreendedores de si, aptos a formular projetos que articulem suas
propostas aos interesses dos possíveis financiadores.
Se não está mais em jogo apenas a produção artística voltada para uma elite
cultural, interessa a universalização do acesso à cultura como a garantia e
condicionalidade regulamentar de cidadania.
A cultura funciona hoje como uma importante via de fortalecimento do Estado. É
uma prioridade, articulada com a segurança, na agenda de ações voltadas para os
denominados ambientes degradados e populações vulneráveis (NU-SOL, 2013).
Ao longo deste artigo, pretendeu-se descrever a existência do Teatro de Dança
Galpão, observando a maneira como um projeto financiado pelo Estado, em plena
ditadura civil-militar, pôde apresentar características surpreendentes, propiciando
convivências e invenções no interior da dança. Os artistas paulistanos engajados com
este projeto souberam se aproveitar da importância que a cultura assumia no interior de
um projeto de “distensão” do regime para criar um espaço favorável à inventividade e à
resistência.
Observando a institucionalização de um movimento até então disperso, e o
acirramento
dos
vínculos entre
artistas e
o
Estado,
sobretudo
a
partir
da
redemocratização, aponta-se para a necessidade de se pensar de que maneiras a
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produção contemporânea de dança no Brasil pode se manter potente politicamente,
quando há espaço para todos no interior das políticas culturais estatais. Na medida em
que o apoio e o financiamento a projetos artísticos é garantido pelo dinheiro sequestrado
de cada um por meio de impostos, é necessário que os artistas da dança saibam tirar
proveito destes recursos sem que isso signifique um alinhamento incondicional em
relação aos interesses do Estado. Afinal, a potência política da arte encontra-se
justamente em seu caráter contestador, inventivo e transgressor – seja em uma ditatura,
seja em uma democracia.
Referências
CUNHA, Newton (org.). Dicionário Sesc: a linguagem da cultura. São Paulo: Perspectiva /
Sesc São Paulo, 2003.
ALCAÍNO, Gladys e HURTADO, Lorena. Retrato de la danza independiente en Chile –
1970-2000. Santiago: Ocho Libros, 2010.
MICELI, Sergio. “O processo de „construção institucional‟ na área cultural federal (anos
70)”. In: Estado e cultura no Brasil. São Paulo: Difusão Editorial, 1984, pp. 53-83.
NAPOLITANO, Marcos. 1964: História do Regime Militar Brasileiro. São Paulo: Contexto,
2014.
NAVAS, Cássia e DIAS, Linneu. Dança moderna. São Paulo: Secretaria Municipal de
Cultura, 1992.
NU-SOL. Hypomnemeta 160: breves anotações sobre Estado, mercado e cultura.
Setembro
de
2013.
Disponível
em:
http://www.nu-
sol.org/hypomnemata/boletim.php?idhypom=191 (acesso em 27/07/2014).
RUBIM,
Antonio
Albino
contemporaneidade”.
Canelas.
“Políticas
culturais
S/d.
no
Brasil:
trajetória
Disponível
e
em:
http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/files.do?evento=download&urlArqPlc=3confcultpoliticas-culturais-no-br.doc (acesso em 27/07/2014).
VELLOZO, Marila Annibelli. Dança e política: participação das organizações civis na
construção de políticas públicas. Tese de Doutorado. Salvador: Programa de PósGraduação em Artes Cênicas da Universidade Federal da Bahia, 2011.
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Mestranda no Programa de Estudos Pós-Graduados em Ciências Sociais da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo com o projeto de pesquisa Pulsações: uma antropologia da crueldade, financiado
pela CAPES, sob orientação de Dorothea Voegeli Passetti. Pesquisadora no Núcleo de Sociabilidade
Libertária (Nu-Sol) e no Projeto Temático FAPESP Ecopolítica: governamentalidade planetária, novas
institucionalizações e resistências na sociedade de controle. Contato: [email protected]
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