XI SIMPEP - Bauru, SP, Brasil, 08 a 10 de novembro de 2004 Análise do Risco de Perda Auditiva em Protéticos João Candido Fernandes (UNESP) [email protected] Aline Gomes Rampani (USP) [email protected] Camila de Cássia Macedo (USP) [email protected] Damiane Stivanin (USP) [email protected] Débora Cristina Baraldi (USP) [email protected] Fúlvia Eduarda da Silva (USP) [email protected] Rafaela Marques Di Giulio (USP) [email protected] Viviane Mendes Fernandes (USC) [email protected] Resumo Esta pesquisa teve como objetivo avaliar o conforto e o risco de perda auditiva de profissionais que trabalham em laboratórios de prótese. O protético é o profissional da área da odontologia voltado para a confecção de próteses dentárias. Em razão dos equipamentos que utiliza (turbinas de alta e baixa rotação do tipo extratorque, compressor, motor de chicote) e do tempo de exposição, este profissional pode ter um risco de perda auditiva maior que os dentistas. A metodologia consistiu em medir os níveis de ruído em sete laboratórios de prótese e comparar os valores com dados padronizados pela NBR 10152 (conforto acústico) e Portaria 3.214/78 do Ministério do Trabalho (risco de perda auditiva). Os resultados mostram níveis de ruído de fundo de até 78 dB(A) ruído de equipamentos entre 84 e 95 dB(A). Esses valores indicam um grande desconforto acústico nos laboratórios e uma possibilidade de perda auditivanos profissionais. Palavras chave: Ruído, Protético, Conforto Acústico, Perda de Audição. 1. Introdução Desde a década de 50, os dentistas têm tido um grande interesse em assuntos referentes à Perda Auditiva Induzida por Ruído (PAIR). Com a invenção das turbinas de alta rotação, as brocas dentais e os equipamentos de sucção, foram imediatamente notados os altos níveis de ruídos, principalmente os sons desagradáveis de alta freqüência. Diversos estudos produziram várias opiniões relativas aos efeitos dos ruídos odontológicos na audição dos dentistas. Alguns pesquisadores encontraram significativas perdas de audição resultantes da prática da odontologia, enquanto outros não encontraram conseqüências significativas nos limiares da audição. O protético é o profissional da área da odontologia voltado para a confecção de próteses dentárias. Este profissional pode ter um risco de perda auditiva maior que os dentistas, em razão dos equipamentos que utiliza (turbinas de alta e baixa rotação do tipo extratorque, compressor, motor de chicote) e do tempo de exposição. Desde 1959, o Conselho de Pesquisas Dentais da Associação Americana Dental aconselha que todos os dentistas que usam turbinas deveriam fazer uma avaliação audiológica periódica. O conselho de materiais e serviços odontológicos da Associação Americana de Odontologia recomenda o uso de protetores auriculares auditivos (plugs) e audiograma periódicos para os usuários de instrumentos odontológicos de alta rotação. Em consultas realizadas a técnicos autorizados para conserto de canetas dos fabricantes citados, todos são unânimes em apontar o rotor das turbinas como o grande responsável pelo ruído das canetas de alta rotação. Fatores como a lubrificação incorreta ou precária, idade da caneta, qualidade do ar, tipo de broca, XI SIMPEP - Bauru, SP, Brasil, 08 a 10 de novembro de 2004 dureza do material que se está cortando, também foram citados como responsáveis pelo ruído das canetas odontológicas, fatores estes também citados por diversos outros pesquisadores. Os catálogos dos fabricantes de canetas de alta rotação indicam níveis abaixo dos valores perigosos para a perda auditiva: a Dabi Atlante (2003) indica um valor de 70 dB e a Kavo (2003) cita que seus equipamentos geram 76 dB. Gross et al. (2002), em pesquisa realizada com canetas de alta rotação das marcas Kavo e Dabi Atlante, concluíram que o nível de ruído em virtude do tempo de uso teve como resultado uma variação insignificante, não trazendo risco para o profissional, porque o nível estava abaixo de 85 dB (A). Porém o que foi percebido é que o ruído aumenta mais com os maus tratos em relação à caneta, do que com o tempo de uso. Saquy et al. (1994) apud Souza (2002), realizando medições em 3 marcas de peças de alta rotação nacionais de marca Dabi Atlante [68,87 db(A)] e Kavo [71,57 dB(A)], apresentaram em média, ruídos abaixo de 85 dB (A), e a marca Rucca [89,72 dB(A)] apresentou em média ruídos acima de 85 db (A). Coelho et al. (2003), em pesquisa realizada com 20 indivíduos, encontraram níveis de ruído variando entre 75 e 80 decibels, concluindo que os mesmos não corriam risco de perda da acuidade auditiva, apesar de outros autores afirmarem que dependendo da sensibilidade de cada pessoa o nível máximo de ruído pode variar de 78 a 85 decibels. Taylor et al. (1965) apud Keenan (1999) concluíram em sua pesquisa que alguns dentistas expostos ao ruído da broca dentária durante 3 a 7 anos, já apresentavam alteração na audição. Predominaram as seguintes intensidades e freqüências das diferentes marcas de canetas: SSW: 80 dB(A) de 4.000 a 16.000 Hz; Kavo: 78 dB(A) em 16.000 Hz; Starling: 77 dB(A) em 4.000 Hz; Siemens: 74 dB(A) em 6.000 Hz; Faro: 74dB(A) entre 10.000 e 16.000 Hz. 2. Material e Métodos Esta pesquisa foi desenvolvida em campo, no próprio ambiente de trabalho de profissionais escolhidos aleatoriamente, em uma moldagem de prótese, para que fossem coletados os dados referentes ao ruído. Foi solicitado ao profissional que respondesse a um questionário préelaborado, a fim de avaliar seu conhecimento a respeito dos ruídos a que estava exposto. 2.1. Sujeitos Foram entrevistados um total de nove profissionais, nos laboratórios de prótese do Hospital de Reabilitação de Alterações Craniofaciais (Centrinho da USP, Bauru) e da Clínica de Prótese da Faculdade de Odontologia da USP. As medições foram realizadas em sete ambientes. 2.2. Materiais e equipamentos Foram utilizados os seguintes materiais e equipamentos: - um medidor de nível de pressão sonora da marca ENTELBRA, modelo 142-A, devidamente calibrado, usado na curva A, velocidade slow; - um calibrador para o medidor da marca ENTELBRA, modelo 130B; - um questionário (Figura 1); - motor de chicote - caneta de alta rotação - exaustor XI SIMPEP - Bauru, SP, Brasil, 08 a 10 de novembro de 2004 Ficha de coleta de dados Local em que foi executada a medição:__________________________ Clínica ( ) Sexo: M ( ) Laboratório ( ) Sala de Prótese ( ) F( ) Condições da pessoa medida: Estudante ( ) Idade: __________ Profissional ( )_ Tempo de trabalho:_________________ Marca do motor usado:_____________________________________ Medição (dB): Em alta rotação: Em baixa rotação: Tempo semanal normalmente exposto ao barulho:________________ Nota que possui algum problema auditivo ?______________________ __________________________________________________________ Se sim, adquiriu antes ou após a exposição excessiva ao barulho ?_____ __________________________________________________________ Figura 1 – Ficha de coleta de dados 2.3. Método Foram realizadas as seguintes avaliações: - medição do ruído de fundo do ambiente – com o uso do medidor de nível de pressão sonora avaliou-se o ruído das sete salas de prótese, com o ruído do rádio, ar-condicionado, ruídos externos, etc. - medição do ruído com os equipamentos - em seguida mediu-se com os equipamentos de confecção de prótese: o compressor, o motor de chicote, a caneta de alta e baixa rotação em procedimento de corte. Todas as medições foram tomadas próximo ao ouvido dos protéticos. 3. Resultados e Discussão 3.1 Resultados do Laboratório de Ortodontia Os níveis de ruído medidos nos três Laboratórios de Ortodontia estão na Tabela 1. 3.2 Resultados do Laboratório de Prótese Os níveis de ruído medidos no três Laboratórios de Prótese estão na Tabela 2. XI SIMPEP - Bauru, SP, Brasil, 08 a 10 de novembro de 2004 Situação da medição Nível de ruído [dB(A)] Ruído de fundo 78 Ruído de fundo + exaustor + 84 compressor Um motor de chicote 90 Dois motores de chicote 92 Três motores de chicote 94 Tabela 1 – Valores de ruído medidos nos três Laboratórios de Ortodontia Situação da medição Nível de ruído [dB(A)] Ruído de fundo 78 Ruído de fundo + exaustor + 80 compressor Um motor de chicote 84 Dois motores de chicote 88 Três motores de chicote 92 Tabela 2 – Valores de ruído medidos nos três Laboratórios de Prótese 3.3 Resultados do Laboratório de Prótese Fixa Os níveis de ruído medidos no Laboratório de Prótese Fixa estão na Tabela 3. Situação da medição Nível de ruído [dB(A)] Ruído de fundo 68 Um motor de chicote* 70 Caneta de alta rotação 95 * Motor dentro de uma cabine de metal. Tabela 3 – Valores de ruído medidos no Laboratório de Prótese Fixa 3.4 Resultados sobre o tempo de exposição diária As respostas dos 9 protéticos sobre o tempo de trabalho estão nas Tabelas 4 e 5. Intervalo de tempo (horas) Número de profissionais 0a2 00 2a4 01 4a6 03 6a8 05 8 a 10 00 Tabela 4 – Tempo de trabalho diário dos protéticos Quanto ao conforto acústico, as clínicas de prótese apresentam um ambiente acusticamente bastante desconfortável, devendo causar forte influência no desempenho dos profissionais. A norma NBR 10.152 (Níveis de Ruído para Conforto Ambiental) indica que para consultórios e clínicas um nível de ruído máximo de 35 dB(A), podendo atingir até 45 dB(A). Os níveis de ruído medidos (Tabelas 1, 2 e 3) são muito superiores a estes valores. XI SIMPEP - Bauru, SP, Brasil, 08 a 10 de novembro de 2004 Tempo de utilização da caneta Número de profissionais (min/hora) 0 a 10 00 10 a 20 00 20 a 30 02 30 a 40 04 40 a 50 01 50 a 60 00 Tabela 5 – Tempo de utilização da caneta odontológica Quanto ao risco de perda auditiva, a Portaria 3.214 do Ministério do Trabalho (NR 15, anexo 1) estipula uma exposição máxima diária de 85 dB(A) para 8 horas, 86 dB(A) para 7 horas, 87 dB(A) para 6 horas, 88 dB(A) para 5 horas e 90 dB(A) para 4 horas diárias. As medições indicam que, pelo menos 4 dos profissionais estão expostos a níveis de ruído acima do recomendado pela legislação brasileira. Os outros três estão pouco abaixo dos limites. Os laboratórios de prótese deveriam disponibilizar aos protéticos equipamentos de proteção auditiva para uso contínuo em suas atividades. 4. Conclusões As medições realizadas nos laboratórios de protéticos permitiram concluir que: - os níveis de ruído de fundo medidos estão muito acima dos valores recomendados para conforto acústico. Este ruído deve provocar um baixo rendimento no trabalho dos protéticos, além de problemas fisiológicos como irritação, estresse, desconcentração, hipertensão arterial, insônia etc. Também deve influenciar na comunicação entre funcionários e na conversa por telefone. - Os níveis de intensidade sonora média coletados com as canetas e motores chicote em funcionamento, em alguns casos, estão acima do limite de 85 dB(A) permitido pela NR15 para um período de trabalho de 8 horas por dia, sugerindo que os profissionais correm riscos de perdas de audição. - Quatro profissionais têm exposição diária acima do previsto pela NR 15, indicando risco iminente de perda auditiva. - Os laboratórios de prótese deveriam oferecer aos seus profissionais uma infraestrutura de prevenção contra a perda auditiva. Essas medidas seriam: disponibilidade de protetores auditivos, manutenção dos equipamentos, atenuação e isolamento de fontes, isolamento acústico do ambiente, audiometrias periódicas etc. Referências Bibliográficas ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS – ABNT – Níveis de ruído para conforto ambiental – NBR 10152. São Paulo: ABNT, 1987. BRASIL – Portaria 3.214 do Ministério do Trabalho e Emprego. Norma Regulamentadora nº 15. 1978 COELHO, A . C. C. et al. Análise de ruídos em laboratórios e clínicas de prótese dentária – FOB – USP – 2003. XI SIMPEP - Bauru, SP, Brasil, 08 a 10 de novembro de 2004 DABI–ATLANTE – folhetos de propaganda, 2003. GROSS, C. et al. Nível de Ruído de Canetas Odontológicas – Faculdade de Odontologia de Bauru - Curso de Fonoaudiologia, 2002. KEENAN, V.R. Ruído em Consultório Odontológico – dos riscos à prevenção. Centro de Especialização em Fonoaudiologia Clínica – Porto Alegre – 1.999. KAVO DO BRASIL S. A . Manual de Instrução para Consertos. 2003 MONDELLI, J. et al. Dentística Operatório. São Paulo: Servier. 1.976. SAQUY, P.C. et al. Intensidade de ruído produzido pelas canetas de alta rotação. Revista Riograndense de odontologia, v.24, n.3, p.131-133, 1994. TAYLOR, W. et al. Hearing threshold levels of dental practitioner exposed to air turbine drill noise. British Dental Journal , 118(15): 206-210, 1965.