Novo Teste de Esforço

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O GLOBO - JORNAL DA FAMÍLIA- 6 DE JUNHO DE 2004
O novo teste do esforço
Marcia Cezimbra
Você sabia que o popular teste de esforço, também conhecido como teste ergométrico,
o exame mais pedido em medicina no Brasil, não mede com precisão a sua potência
aeróbica máxima? A margem de erro média na avaliação do volume máximo de
oxigênio (VO2) consumido por minuto é de 20% para mais e para menos, mas pode
ser ainda maior em atletas, idosos ou cardiopatas. Com esta margem de erro,
considerada inaceitável do ponto de vista clínico e científico por especialistas como o
professor Claudio Gil Araújo, uma pessoa de 70kg teria seu peso estimado entre 56kg
e 84kg. Isso é precisão? Não. Mas a potência aeróbica máxima deve e pode ser
precisa, desde que seja medida por uma nova análise do metabolismo, que mede a
movimentação de ar e a quantidade de oxigênio de repouso, para conhecer melhor o
comportamento dos pulmões durante o exercício, calculando exatamente o VO2
máximo de cada paciente. O melhor teste ergométrico agora é o teste
ergoespirométrico — ou teste cardiopulmonar de exercício — associado a um aparelho
pouco maior que um rádio de pilha que joga os dados do VO2 numa tela de
computador.
Teste faz prognóstico de vida longa
O problema é que, dos dois mil laboratórios de teste de esforço do país, apenas 20 ou
30 fazem o teste ergoespirométrico, embora haja mais de cem desses analisadores em
clubes, escolas de educação física e em algumas sedes do Sesc que não prestam
serviço ao público. No Rio, o Hospital Pró-Cardíaco, a Clínica de Medicina do Exercício
(Clinimex), o Hospital Universitário do Fundão e o Pedro Ernesto, da Uerj, são alguns
dos poucos que fazem o novo teste. Claudio Gil Araújo diz que o aparelho de VO2
custa “um milésimo” de um de ressonância magnética e deveria ser adotado por
laboratórios porque os benefícios dos resultados precisos são imensos:
— No teste ergométrico convencional, o paciente vai para uma esteira e quem
consegue ficar mais tempo ali é o mais condicionado. Nem sempre é assim. O teste
ergoespirométrico mostra precisamente que o mais condicionado é o que consegue
captar mais oxigênio. Normalmente se usa cargas individualizadas para alcançar o
esforço máximo entre 8 e 12 minutos de exercício na esteira ou na chamada bicicleta
ergométrica. O resultado é muito mais rico.
O novo teste pode tornar desnecessários exames invasivos como o cateterismo, já que
indica exatamente o que aconteceu com o paciente durante o exercício. Um bom
exemplo foi o do professor de educação física Arnaldo Waksman, de 45 anos, que, na
semana passada, submeteu-se a um teste de ergoespirometria na Clinimex, que já
acumula mais de três mil testes, sob supervisão de Claudio Gil Araújo. Arnaldo tem
um bom condicionamento físico, corre dez quilômetros quase todos os dias, mas é
hipertenso e este foi o motivo do teste mais preciso. Na avaliação do VO2 em repouso,
antes do exercício, Claudio Gil constatou que Arnaldo tem apenas 81% de sua
capacidade pulmonar. Os restantes 19% talvez tenham sido perdidos em seu período
de fumante, dos 13 aos 21 anos. Durante os 12 minutos de exercício, a pressão de
Arnaldo foi subindo, como é natural, mas depois se estabilizou. O que aconteceu? O
teste ergométrico convencional não poderia explicar e o médico talvez tivesse que
optar por outros exames, entre eles um cateterismo:
— Se a pressão se estabiliza ou cai durante o exercício, uma das razões poderia ser o
fato de o coração não estar bombeando sangue suficiente para os músculos. É uma
dúvida que o teste convencional não esclarece e o médico precisa investigar — explica
Claudio Gil.
Mas o teste cardiopulmonar de Arnaldo esclareceu detalhadamente o que aconteceu. A
pressão arterial do professor de educação física se estabilizou porque os vasos
sanguíneos se dilataram. O coração estava ótimo, bombeando sangue normalmente
para o corpo inteiro.
— Na hipertensão, o coração perde a distensibilidade. Ele não relaxa adequadamente,
logo pode não contrair tão bem e bombeia mal o sangue. Mas a curva do pulso de
oxigênio de Arnaldo na tela do computador mostra que seu coração relaxa e contrai
bem. Está conseguindo bombear e relaxou tanto os vasos dos músculos que a pressão
não subiu. Não foi por falta de bombeamento que a pressão não subiu. Foi por
vasodilatação. Ele não precisa fazer novos exames para obter essa resposta, muito
menos um cateterismo — diz Claudio Gil.
Arnaldo saiu com um resultado gratificante, apesar da hipertensão. Ele tem uma
capacidade física maior que a prevista, de um garoto de 15 anos, apesar dos 45 de
idade. Quanto aos 19% de capacidade pulmonar em repouso que ele perdeu durante
os sete anos de fumante, Claudio Gil diz que a deficiência só o atrapalharia em
altitudes altas e não o prejudica, por exemplo, como maratonista, já que as trocas
gasosas durante o exercício foram muito eficientes.
— No nível do mar, não precisamos usar a capacidade pulmonar total. Eu só não
recomendaria para Arnaldo exercícios nas montanhas, como escaladas ao Himalaia —
diz.
O teste de esforço convencional costuma ainda superestimar os efeitos dos programas
de exercícios em cardiopatas. Segundo pesquisa feita com 50 americanos cardiopatas,
coordenada pelo médico R.V. Milani e publicada na “American Journal of Cardiology”, o
índice de reabilitação cardíaca estimado pelas fórmulas matemáticas do teste
ergométrico comum foi de 54%, enquanto que o aparelho que mede o VO2 não deixou
dúvidas: o ganho real foi de 11%.
Claudio Gil Araújo explica que a finalidade do teste de esforço nunca é de fazer um
diagnóstico, mas, antes de tudo, um prognóstico.
— Ele já foi muito usado como diagnóstico, mas hoje sabemos que seu principal
aspecto é o prognóstico. Uma pessoa com baixo condicionamento físico tem uma
chance de sobrevivência bem menor que as de alta capacidade física. Nenhum outro
exame de medicina permite identificar risco alto de mortalidade em pessoas
aparentemente saudáveis — explica.
Condicionamento indica a mortalidade
A prova está numa pesquisa feita por médicos do Instituto de Saúde Pública da
Finlândia com uma população de homens de meia-idade, entre 40 e 50 anos,
acompanhados por 12 anos. O trabalho, coordenado pelos médicos Jari Laukkanen e
Timo A. Lakka, entre outros, publicado pela American Medical Association, mostrou
que os homens de boa capacidade física possuem baixa taxa de mortalidade para
qualquer tipo de doença. Eles classificaram os indivíduos em quatro grupos, de acordo
com sua capacidade física. Na seqüência, o grupo 1 era o de melhor capacidade física
e o 4, o de pior desempenho na medida direta de VO2. Os médicos verificaram ao
longo da pesquisa que 25% dos homens do grupo 4 morreram, contra apenas 6% do
grupo 1, uma proporção alta, de um para quatro nos dois grupos.
Vantagens do VO2
ESFORÇO: A avaliação do volume máximo de oxigênio consumido (VO2) pode ser
feita numa pedalada em ciclo ergométrico, numa esteira rolante, remando ou em
ciclo de braços (pedais para braços usados em testes com pessoas que têm
dificuldades de movimento com as pernas). Claudio Gil recomenda o teste na
bicicleta ergométrica, já que na esteira o paciente pode se apoiar nas barras laterais
e o gasto energético cai, favorecendo alterações no resultado.
AVALIAÇÃO COMPLETA: Para Claudio Gil Araújo, a avaliação completa da
capacidade física deve incluir o eletrocardiograma, um teste de flexibilidade, um
teste de potência muscular, a espirometria em repouso, um teste de freio e
aceleração cardíaca em 4 segundos e, enfim, o teste de potência máxima aeróbica ou
cardiopulmonar.
VANTAGEM: A maior vantagem do teste cardiopulmonar é medir precisamente, sem
o erro de 20% da estimativa, a condição aeróbica e assim indicar os prognósticos de
risco de vida em pessoas aparentemente saudáveis e em doentes. Assim, a pessoa
pode mudar o seu modo de vida para reverter estatísticas de morte prematura para
os que são aparentemente saudáveis, mas têm baixo desempenho na medida direta
de volume de oxigênio. O teste cardiopulmonar já é coberto por muitos planos de
saúde.
EXERCÍCIO FÍSICO: O teste cardiopulmonar é o mais indicado para prescrição de
exercícios em cardiopatas. Pesquisas mostram que as avaliações do teste de esforço
comum superestimam alguns resultados de programas de exercícios para cardiopatas
e, com o teste cardiopulmonar, essas prescrições podem ser revistas, tornando-se
mais intensas para resultados mais eficientes.
VIDA LONGA: Nos primeiros quatro anos da pesquisa finlandesa com homens de
meia-idade, ninguém do grupo 1 (mais bem condicionado) morreu, enquanto 5% do
grupo 4 (de pior desempenho da medida direta de oxigênio), morreram. Segundo os
cientistas, esse resultado mostra que o grupo 1 só precisa fazer exames preventivos
a cada dois anos. Já o grupo 4, anualmente.
COLESTEROL: Segundo os pesquisadores finlandeses, o mau condicionamento físico
foi considerado um risco de mortalidade duas vezes mais grave que o colesterol alto
e a hipertensão.
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