CONSUMO X CONSUMISMO Segundo a abordagem neo-malthusiana os problemas ambientais são resultantes da pressão demográfica sobre os componentes naturais disponíveis (Hardin, 1968 apud Trevizan, 1999). Questiona-se, no entanto, essa abordagem no momento em que 20% da população mundial, que habita principalmente os países afluentes do hemisfério norte, consome 80% dos recursos naturais e energia do planeta e produz mais de 80% da poluição e da degradação dos ecossistemas. Enquanto isso, 80% da população mundial, que habita principalmente os países pobres do hemisfério sul, fica com apenas 20% dos recursos naturais (MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, 2005). Desta forma, acredita-se que uma problemática ainda mais complexa merece atenção, a saber, a problemática que envolve o consumo. Segundo o capítulo 4 da Agenda 21: “Enquanto a pobreza tem como resultado determinados tipos de pressão ambiental, as principais causas da deterioração ininterrupta do meio ambiente mundial são os padrões insustentáveis de consumo e produção, especialmente nos países industrializados. Motivo de séria preocupação, tais padrões de consumo e produção provocam o agravamento da pobreza e dos desequilíbrios.” A priori, o consumo pode ser entendido como “o conjunto de processos socioculturais nos quais se realizam a apropriação e os usos dos produtos” (CANCLINI, 1999, p. 77). Mas, quando se trata da apropriação de produtos supérfluos surge o conceito consumismo. Essa discussão entre necessidades básicas e o supérfluo também é compreendida em Barbosa (2004). Esta autora ainda ressalta a necessidade de se tornar clara a distinção entre teorias sobre a sociedade e a cultura de consumo, pois a teoria da sociedade pode definir e analisar o porquê do consumo se tornar tão importante na sociedade. De acordo com a análise semiológica, Baudrillard (1995) vai além, apontando que a alienação social se dá pela naturalização do consumo, mas o consumo não é de objetos e sim de signos que obedecem a uma lógica própria, de modo que os objetos consumidos deixam totalmente de estar em conexão com qualquer função ou necessidade definida. Entende-se também o consumismo como a expansão da cultura do “ter” em detrimento da cultura do “ser”. De acordo com Featherstone (1995) usar a expressão cultura do consumo significa evidenciar que o mundo das mercadorias e seus princípios de estruturação são centrais para o entendimento da sociedade contemporânea. Segundo este autor a cultura do consumo é norteada por três perspectivas fundamentais. A primeira tem como premissa a expansão da produção capitalista de mercadorias, que deu origem a vasta acumulação de cultura material na forma de bens e locais de compra e consumo. A segunda e mais sociológica afirma que a relação entre a satisfação proporcionada pelos bens e seu acesso socialmente estruturado é um jogo de soma zero, no qual a satisfação e o status dependem da exibição e da conservação das diferenças em condições de inflação. Sendo assim, as pessoas usam a mercadoria de forma a criar vínculos e estabelecer distinções sociais, compartilha desta visão Bourdieu, (1979 apud Pina et al., 2006) abordando o consumo como uma prática por meio da qual os agentes buscam se distinguir na hierarquia social. Para este autor, os mais ricos produzem bens distintos e constantemente renovados a preços elevados à medida que as classes mais baixas vão conseguindo reproduzir e utilizar tentando ascender socialmente. Logo, consumir é participar de um cenário de disputas pelo que a sociedade produz e pelos modos de usá-lo. A terceira perspectiva refere-se à questão dos prazeres emocionais do consumo, os sonhos e desejos celebrados no imaginário cultural consumista e em locais específicos de consumo que produzem diversos tipos de excitação física e prazeres estéticos (FEATHERSTONE, 1995). Para Santos et al. (2008), o processo de identificação na cultura de consumo, no qual “os sujeitos são levados a identificar-se com coisas e objetos, é cambiante, fluido, fragmentado e parcial – objetos e coisas são usados para demarcar relações sociais. Objetos e mercadorias determinam estilos de vida, a posição social dos sujeitos e a maneira de interagirem socialmente.” Na tentativa de compreender as inúmeras mudanças que vêm ocorrendo nas sociedades contemporâneas tem-se utilizado ainda o termo sociedade de consumo. Este termo refere-se à relevância que o consumo tem alcançado na construção e consolidação das nossas identidades, bem como na construção das relações sociais. Em outras palavras, um grupo social pode ser distinguido de outro pelo nível e estilo do seu consumo (SILVA, et al. 2008). Considerando os dados do IBGE de seis de fevereiro de 2006, a população mundial somava 6.496.124.433 habitantes, e pensar nesses números consumindo energia (das mais diversas formas), água, alimentos, roupas, celulares, computadores, eletrônicos em geral, automóveis, e toda a sorte de produtos lançados, é preocupante. E preocupa ainda mais pensar no processo final do consumo, a produção de resíduos sólidos, líquidos e gasosos. Por ano, 30 bilhões de toneladas de lixo são jogadas no nosso planeta, 88% do lixo doméstico é descarregado em aterros sanitários. Em países mais desenvolvidos, a produção de lixo diária, por habitante, é de cerca de 3,2 Kg (MACHADO et al., 2007). Uma vez consciente desses dados não há como não refletir os impactos do consumismo sobre o meio ambiente. A contaminação dos rios, lagos, mares e águas subterrâneas, resultando na diminuição de água para o consumo humano além da perda de espécies que dependem desses habitats; o desmatamento causando a perda de biodiversidade e mudanças nos micro climas podendo se estender para a escala macro; a contaminação, erosão, salinização e desertificação dos solos, diminuindo as áreas agricultáveis, e a poluição do ar com a emissão de gases de “efeito estufa” que prevêem catástrofes globais resultantes das alterações climáticas. Desta forma, é importante propor uma revolução no ato de consumir, para que deixe de ser corriqueiro tornando-se um ato pensado, consciente, com mais informações sobre os produtos – os seus custos sociais e os seus impactos ambientais – e buscar, por fim, consumir menos e consumir melhor, com qualidade. Conforme Pina et al. (2006) o modelo “compro, logo existo” imposto pelo mundo globalizado, escraviza tornando a pessoa intoxicada. As autoras ainda traçam o conceito de cidadão consumidor como a encarnação de um sujeito livre, no qual a liberdade evidencia a capacidade de escolher, detectar e aplicar alternativas justas e racionais, tratando-se, portanto, de uma pessoa crítica e solidária. Crítico frente à presença abusiva da publicidade e dos incentivos ao consumismo, e solidária no que tange a possibilidade de atender as necessidades básicas dos países pobres com consumidores desfavorecidos, combatendo a desigualdade do consumo no planeta. Outra questão preocupante é a associação da felicidade e da qualidade de vida reduzidas às conquistas materiais. Esse estilo de vida voltado para o intenso consumo se transformou em uma compulsão geralmente estimulada pelas forças do mercado, da moda e da propaganda. Assim, não se pode esquecer a atuação da mídia frente às necessidades humanas. Hodiernamente é comum perceber a publicidade explorando as necessidades ou até mesmo criando essas necessidades para, por meio do consumo, se obter a sensação de satisfação destas. De acordo com a pirâmide de Abrham Maslow (Figura 1), os indivíduos tendem a satisfazer, em primeira instância, as necessidades da base da pirâmide. Logo, em uma sociedade que tem as necessidades básicas garantidas é notório o apelo publicitário a necessidades de nível superior em produtos que podem apenas satisfazer as necessidades de níveis mais baixos. Figura 1: Pirâmide das necessidades de Maslow. Fonte: www.pt.wikipedia.org http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Hierarquia_das_necessidades_de_Maslow.svg Diante do exposto, admite-se o consumismo como um indicador ambiental que precisar ser considerado, discutido, e estudado com afinco, sobretudo pelas ciências sociais, no intuito de encontrar possíveis caminhos para atenuar e/ou solucionar as causas e, principalmente, as suas conseqüências. Disponível em: www.google.com.br – Sociedade Consumista e o Meio Ambiente – Uma Necessidade de (Re) Educar o consumo – Fabiana Faxina, Inatiane Lima Campos Martins, Jacques Manz e Rodrigo Nascimento da Costa. Site acessado em: fevereiro de 2010.