Durkheim e a Sociologia

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Leila Diniz quebrou tabus de uma época em que a repressão dominava o Brasil, escandalizou ao exibir a
sua gravidez de biquini na praia, e falava de sua vida pessoal sem nenhum tipo de vergonha ou
constrangimento. Concedeu diversas entrevistas marcantes à imprensa, mas a que causou um grande furor
no país foi a entrevista que deu ao jornal O Pasquim em 1969. Nessa entrevista, ela, a cada trecho, falava
palavrões que eram substituídos por asteriscos, e ainda disse: Você pode muito bem amar uma pessoa e ir
para cama com outra. Já aconteceu comigo. O exemplar mais vendido do jornal foi justamente esse onde
houve a publicação da entrevista da atriz fluminense. E foi também depois dessa publicação que foi
instaurada a censura prévia à imprensa, mais conhecida como Decreto Leila Diniz. Perseguida pela
polícia política, Leila se esconde no sítio do colega de trabalho e apresentador Flávio Cavalcanti, se
tornando jurada do programa deste, no momento em que é acusada de ter ajudado militantes de esquerda.
Alegando razões morais, a TV Globo, do Rio de Janeiro, não renova o contrato de atriz. De acordo com
Janete Clair, não haveria papel de prostituta nas próximas telenovelas da emissora. (wikipédia)
15 de abril de 1858 – 15 de novembro de 1917. (FRANÇA)
O AUTOR
Todo conhecimento se desenvolve socialmente. Para entendermos os conhecimentos
produzidos por um determinado autor precisamos, antes de tudo, entender o período em que
esse conhecimento foi produzido.
O pensamento de um período da história é criado por
indivíduos que reagem e respondem a situações históricas de seu tempo.
Podemos dizer que, na maior parte das sociedades, existem grupos que defendem a
continuidade da situação existente, pois isso atende a seus interesses, enquanto que outros
grupos procuram justamente o contrário, mudar a situação social existente por julgarem que ela
não é boa para eles e para os outros.
A Sociologia é uma dessas formas de conhecimento, resultado das condições sociais,
econômicas e políticas do tempo em que se desenvolveu.
Na França, vários autores desenvolvem trabalhos importantes, sendo o mais destacado deles
Émile Durkheim, que procurou sistematicamente definir o caráter científico da Sociologia, ou
seja, deu a ela o estatuto de ciência, com objeto e método.
Durkheim desenvolve sua obra num período de grande crise numa França pós guerra. A
miséria e o desemprego caminhavam juntos com uma grande expansão industrial,
ocasionando o fortalecimento das organizações dos trabalhadores, bem como greves e lutas
sociais.
Foi também uma época marcada por grandes inovações tecnológicas: desenvolvimento da
indústria do aço, utilização da eletricidade e do petróleo como fontes de energia; além de
inovações que mudaram o cenário social: telégrafo, avião, submarino. As inovações e os
problemas da sociedade capitalista passam a fazer parte do dia a dia dos franceses. Durkheim
procurou estudar essa diversidade de situações.
Formou-se em Filosofia e durante os anos em que ensinou esta disciplina acaba voltando seus
interesses para a sociologia, indo aprofundar seus estudos na Alemanha e posteriormente
sendo responsável pelo primeiro curso de sociologia que se ofereceu numa universidade
francesa.
Fundador da escola francesa de sociologia.
É considerado, junto com Max Weber, um dos fundadores da sociologia moderna.
“O tratamento científico dos fatos sociais é tão pouco habitual que algumas das proposições
contidas neste livro correm o risco de surpreender o leitor. Todavia, se existe uma ciência das
sociedades, é de esperar que ela não se limite a ser paráfrase de preconceitos tradicionais, e,
sim, que mostre as coisas de maneira diferente da encarada pelo vulgo; pois o objetivo de toda
ciência é descobrir, e toda descoberta desconcerta mais ou menos as opiniões formadas”.
DURKHEIM. As regras do método sociológico. Prefácio da primeira edição, 1895.
FATO SOCIAL
O termo fato social, segundo Durkheim, é utilizado sem muita precisão, sendo empregado
correntemente para designar quase todo fenômeno que se passa no interior da sociedade,
desde que apresente, além de uma certa generalidade, algum interesse social. Partindo desta
visão, não existiria qualquer evento humano que não pudesse ser classificado como social.
Então o que não é um fato social? COMER, DORMIR, BEBER, RACIOCINAR. Estas ações
são naturalmente determinadas pelo biológico (organismo), não podemos escolher se iremos
realizá-las ou não, e diferem-se dos fatos sociais por estes serem determinados de forma
coercitiva pela sociedade. É de interesse da sociedade que essas ações ocorram de forma
regular, mas se elas fossem fatos sociais, então a Sociologia não teria objeto próprio. Esses
atos são biológicos, temos a necessidade de satisfazê-los independente do que a sociedade
pensa, mas como isso será feito já pertence à esfera do social.
“É um fato social toda maneira de fazer (pensar, sentir ou agir), fixada ou não, susceptível de
exercer sobre o indivíduo uma coação exterior; ou ainda, que é geral no conjunto de uma dada
sociedade tendo, ao mesmo tempo, uma existência própria, independente de suas
manifestações individuais”.
DURKHEIM. As regras do método sociológico.
Assim, o fato social está diretamente ligado à instituição cultural, estando o conceito de fato
social ligado ao processo de socialização.
Sendo os fatos sociais as regras e normas coletivas que orientam a vida dos indivíduos e tendo
sua origem na sociedade, Durkheim nos diz que eles devem tratados como COISAS:
→ objetos que existem independentes da nossa vontade.
→ algo objetivo com lógica própria, que se opõe à idéia de algo que pode ser compreendido
pela aparência ou por um simples processo de análise mental.
→ é uma categoria sociológica que permite dar objetividade ao comportamento humano em
grupo, ou seja, a sociologia só poderia estudar determinados comportamentos a partir do
momento que eles são fatos sociais.
Características do Fato Social
Generalidade - os fatos sociais existem não para um indivíduo específico, mas para a
coletividade, assim, devem ser isolados das suas manifestações individuais. O que é fato
social, e que interessa para a sociologia, não é qualquer fenômeno social, mas sim os que têm
uma dimensão significativa no grupo; imposto pela educação a partir de valores, regras e
normas definidas; preexistentes e subsistentes aos indivíduos isoladamente considerados;
repetência que leva a um comportamento geral. A unanimidade do fato social é que leva os
grupos ao entendimento daquilo que pode ser considerado como normal em relação aos
comportamentos individuais. Ou melhor, os comportamentos considerados como normais e
que são passados ao indivíduo pelo processo de socialização representam o “acordo” firmado
entre os indivíduos do grupo sobre determinadas questões.
Exterioridade - o fato social é exterior aos individuos, ou seja, existe independente das suas
consciências. Ele é exterior ao indivíduo, é anterior e sua existência se dá independente das
vontades individuais.
Coercitividade – todos nós seguimos um conjunto de regras que nos são inerentes, e é isso
que nos dá um sentido de humanização, os parâmetros que devemos seguir. Cada conjunto de
regras/normas irá comportar um sentido próprio para cada grupo, levando os seus indivíduos,
assim, a terem valores específicos. Dentre esses valores temos a MORAL, que é o que define
o certo/errado, bom/ruim, etc.
Mas esta coerção nem sempre se faz sentir, ou seja, estamos tão acostumados a ela, que não
a percebemos. Podemos usar como exemplo o hábito de usarmos roupas, que está ligado à
moda, que por sua vez é um fato social – impõe aos indivíduos a maneira considerada correta
de nos vestirmos. Mas isto é algo tão interiorizado em cada um de nós que não percebemos
que não existe aí nada de natural ou biológico, mas sim de social, só que este social foi
naturalizado.
QUAL O RAPAZ AQUI PRESENTE USA SAIA OU VESTIDO?
QUAL A MOÇA AQUI PRESENTE USA TERNO COM GRAVATA E TUDO?
“Dir-se-á que um fenômeno não pode ser coletivo se não for comum a todos os membros da
sociedade, ou, pelo menos, à maior parte deles, portanto, se não for geral. Sem dúvida; mas se
é geral, é porque é coletivo (quer dizer, de certo modo obrigatório) e nunca coletivo, por ser
geral”.
DURKHEIM. As regras do método sociológico.
MÉTODO
Durkheim queria que a sociologia fosse reconhecida como ciência autônoma que possuía
problemas e objetos específicos. As CH, em seu surgimento, sofrem fortes influências das CN
(biologia), e isso aparece no trabalho de Durkheim quando ele define a sociedade como um
todo orgânico onde existe uma ligação entre os órgãos que compõem esse todo.
Para ele, o cientista social deve seguir um caminho rigoroso na análise dos fatos sociais, para
evitar que ocorram erros e não se caia em noções e valores do senso comum.
O primeiro passo é nos afastarmos das pré-noções, assim, o cientista social deve privilegiar
uma objetividade estrema ao explicar como as coisas realmente ocorrem no mundo, não
havendo espaço para que a realidade social seja interpretada de maneira distorcida.
Ele explica as ocorrências sociais a partir das funções realizadas pelos indivíduos e suas
conseqüências para a sociedade como um todo. Assim, caberia ao sociólogo estabelecer um
diagnóstico científico das possíveis patologias sociais que podem afetar aquela sociedade, ou
seja, entender e ajudar a sociedade a superá-las:
“As dificuldades práticas só podem ser definitivamente resolvidas através da prática e da
experiência cotidianas. Não será um conselho de sociólogo, mas as próprias sociedades que
encontrarão a solução”.
DURKHEIM. As regras do método sociológico.
Existem fenômenos sociais que devem ser analisados e demonstrados com técnicas
especificamente sociais
Porque seu método é funcionalista? Porque busca analisar a função dos fatos sociais
Paralelo da Biologia: Função é a contribuição do órgão para o organismo, da parte para o todo,
do fato social para a sociedade.
SOCIEDADE/INDIVÍDUO
O QUE VEM PRIMEIRO, INDIVÍDUO OU SOCIEDADE?
A SOCIEDADE FAZ O HOMEM OU O HOMEM É QUE FAZ A SOCIEDADE?
O Grito – Edvard Munch, 1893
A sociedade sempre prevalece sobre o indivíduo e se constitui em um conjunto de normas,
regras, leis, costumes, que não são individuais e garantem sua perpetuação. Essas regras e
leis independem dos indivíduos e pairam acima de todos, formando uma consciência coletiva
que dá o sentido de integração entre os membros da sociedade. Quando nascemos, já
encontramos uma sociedade formada por regras de conduta que devem ser seguidas, mas que
não criamos.
Recebemos uma herança de nossos antepassados composta por costumes, normas e valores,
e, ao sermos condicionados e controlados pelas instituições, cada um de nós sabe como deve
agir para não desestabilizar a vida em conjunto e também sabe que se não agir da forma
estabelecida, será repreendido ou punido, dependendo da falta cometida. Aí que está a força
da sociedade. Ex.: sistema penal.
Estar localizado na sociedade significa estar no ponto de interseção de forças sociais
específicas, quem as ignora, age com risco. A localização na sociedade constitui uma definição
de regras que devem ser obedecidas. Estamos localizados na sociedade não só no espaço
como também no tempo, a sociedade se constitui como uma entidade histórica.
A existência da sociedade e a coesão social que garante sua continuidade só são possíveis
quando os indivíduos passam pelo processo de socialização, ou seja, quando ele se torna
capaz de aprender valores, hábitos e costumes próprios de seu grupo social para poder
conviver no meio deste, definindo assim sua maneira de ser e de agir.
O homem seria apenas um animal selvagem que só se tornou Humano porque se tornou
sociável, porque foi capaz de aprender hábitos e costumes característicos de seu grupo social
para poder conviver no meio deste.
Mesmo com todo o caráter coercitivo dos fatos sociais somente a existência dos mesmos não
levaria os indivíduos a obedecê-los. O que então leva cada indivíduo à obediência? Durkheim
vai trabalhar com o conceito de consciência coletiva, ou seja, o que habita as mentes
individuais e serve para orientar a conduta de cada um de nós.
Consciência coletiva – "conjunto das crenças e dos sentimentos comuns à média dos membros
de uma mesma sociedade, formando um sistema determinado com vida própria". O
comportamento médio esperado; dá o sentido de integração entre os membros da sociedade e
é formada pelas regras e leis, são as crenças, os costumes, as idéias que todos que vivem em
um mesmo grupo e compartilham uns com os outros. É passada aos indivíduos pelas
instituições, que têm o papel de educar as pessoas dentro dos valores sociais vigentes. É
capaz de coagir ou constranger os indivíduos a se comportarem de acordo com as regras de
conduta prevalecentes, ou seja, cada um sabe até que ponto pode levar sua excentricidade,
passando dali se tornam patológicos e capazes de eliminar o próprio grupo. A consciência
coletiva seria então formada durante a nossa socialização e seria composta por tudo aquilo
(fatos sociais) que habita nossas mentes e que serve para nos orientar: como devemos ser,
sentir e nos comportar.
A consciência individual é aquilo que é próprio do indivíduo, que o faz deferente dos demais.
São crenças, hábitos, pensamentos, vontades que não são compartilhados pela coletividade,
mas que são especificamente individuais.
A consciência coletiva tem a função de orientar a nossa conduta individual, mas ela encontrase acima dos indivíduos e fora deles. Assim, os fenômenos sociais devem ser explicados a
partir da coletividade, e não o contrário:
Através consciência coletiva que identificamos o que é considerado
certo/errado, bom/mal, feio/bonito.
“É preciso, portanto, considerar os fenômenos sociais em si mesmos, separados dos sujeitos
conscientes que os concebem; é preciso estudá-los de fora, como coisas exteriores, pois é
nessa qualidade que eles se apresentam a nós. Se essa exterioridade for apenas aparente, a
ilusão se dissipará à medida que a ciência avançar e veremos, por assim dizer, o de fora entrar
no de dentro. Mas a solução não pode ser preconcebida e, mesmo que eles não tivessem
afinal todos os caracteres intrínsecos da coisa, deve-se primeiro tratá-los como se os tivessem.
Essa regra aplica-se, portanto, à realidade social inteira, sem que haja motivos para qualquer
exceção. Mesmo os fenômenos que mais parecem consistir em arranjos artificiais devem ser
considerados desse ponto de vista. O caráter convencional de uma prática ou de uma
instituição jamais deve ser presumido. Aliás, se nos for permitido invocar nossa experiência
pessoal, acreditamos poder assegurar que, procedendo dessa maneira, com freqüência se terá
a satisfação de ver os fatos aparentemente mais arbitrários apresentarem, após uma
observação mais atenta dos caracteres de constância e de regularidade, sintomas de sua
objetividade”.
DURKHEIM. As regras do método sociológico.
Durkheim conclui que os fatos sociais atingem toda a sociedade, e a compreensão dessa
colocação só será possível se admitirmos que a sociedade é composta por um todo integrado.
Estando tudo na sociedade interligado, então qualquer alteração numa das partes
consequentemente irá afetar seu todo, se algo não vai bem em alguma parte, toda ela sentirá
seu efeito.
“Da perspectiva do autor, a sociedade não é o resultado de um somatório dos indivíduos vivos
que a compõem ou de uma mera justaposição de suas consciências. Ações e sentimentos
particulares, ao serem associados, combinados e fundidos, fazem nascer algo novo e exterior
àquelas consciências e às suas manifestações. E ainda que o todo só se forme pelo
agrupamento das partes, a associação “dá origem ao nascimento de fenômenos que não
provêm diretamente da natureza dos elementos associados”. A sociedade, então, mais do que
uma soma, é uma síntese e, por isso, não se encontra em cada um desses elementos, assim
como os diferentes aspectos da vida não se acham decompostos nos átomos contidos na
célula: a vida está no todo e não nas partes”.
Quintaneiro, T. Um toque de clássicos.
Você sabe que vive em sociedade, mas já se deu conta de como a sociedade também vive em
você?
EDUCAÇÃO – INSTITUIÇÕES – ANOMIA
“(...) cada sociedade, considerada num momento determinado do seu desenvolvimento, tem
um sistema de educação que se impõe aos indivíduos com uma força geralmente irresistível. É
inútil pensarmos que podemos criar os nossos filhos como queremos. Há costumes com os
quais temos de nos conformar; se os infringirmos, eles vingam-se nos nossos filhos. Estes,
uma vez adultos, não estarão em condições de viver no meio dos seus contemporâneos, com
os quais não se encontram em harmonia. Quer tenham sido criados com idéias muito arcaicas
ou muito prematuras, não importa; num caso como noutro, não são do seu tempo e, por
conseguinte, não estão em condições de vida normal. Há pois, em cada momento do tempo,
um tipo regulador de educação de que não podemos nos desligar sem chocar com as vivas
resistências que reprimem as veleidades1 dos dissidentes”.
DURKHEIM, Émile. Educação e sociologia.
As pessoas se educam influenciadas pelos valores da sociedade onde vivem. A sociedade
educa seus membros para que aprendam as regras de conduta social, assim o grupo social se
perpetua, apesar da morte de seus membros.
As regras e leis existentes na sociedade irão se solidificar nas instituições, que são a base da
sociedade e correspondem a “toda crença e todo comportamento instituído pela coletividade”.
A transformação dos costumes sociais nunca ocorre de modo individual, mas de forma
vagarosa através das gerações, para que não existam conflitos ou desestruturação das
instituições.
A instituição social pode ser entendida como uma forma de proteção social, pois sendo ela o
conjunto de regras e comportamentos padronizados socialmente, aceitos e certificados pela
1
Intenção pouco firme, ou dificilmente realizável, pretensão.
sociedade, procura manter a organização do grupo e satisfazer as necessidades dos indivíduos
que o compõem. Elas são conservadoras por essência, agindo sempre contra as mudanças.
A força da sociedade está justamente na herança passada por intermédio da educação às
gerações futuras, herança essa formada por costumes, normas e valores que nossos pais e
antepassados nos deixaram. Condicionado e controlado pelas instituições, cada um de nós
sabe como deve agir para não desestabilizar a vida comunitária, e sabe também que se não
agir desta forma sofrerá algum tipo de sanção.
Instituições – a base social; possuem o papel de socializar os indivíduos. Família, escola,
Estado, sistema judiciário, são exemplos de instituições que congregam os elementos
essenciais da sociedade, dando-lhes sustentação e permanência.
Família – Tarsila do Amaral
Para Durkheim, o valor das instituições está no fato de que uma sociedade sem regras claras,
sem valores e limites leva o homem ao desespero.
Elementos essenciais da sociedade: coesão, integração e manutenção. O conflito existe
quando há anomia, que é a ausência ou insuficiência da normatização das relações sociais, ou
a falta de instituições que regulem essas relações.
As sociedades atuais passam por processos de mudanças tão profundas que não conseguem
estabelecer um corpo de regulamentação (normas) adequado.
O que leva os homens a viverem em sociedade? Por que os agrupamentos humanos não
costumam se desfazer facilmente e, ao contrário disso, desenvolvem mecanismos para lutar
contra a ameaça de desintegração?
DIVISÃO SOCIAL DO TRABALHO
Para responder a questão acima, Durkheim elaborou o conceito de solidariedade social, para
mostrar como ela se constitui e se torna responsável pela coesão dos indivíduos no grupo.
Para Durkheim, a sociedade é um organismo vivo, numa analogia ao corpo humano, e como
nosso corpo ela precisa que todas as suas partes estejam funcionando de forma harmônica,
pois cada órgão (indivíduo) tem uma função e depende dos outros para sobreviver.
Em seu trabalho "Da divisão do trabalho social" pretende demonstrar que a crescente
especialização do trabalho conseqüente da produção industrial moderna promove na
sociedade uma diferente forma de solidariedade e não de conflito. Aborda a interação social
entre os indivíduos que integram uma sociedade e analisa como cada membro, ao exercer uma
função na divisão do trabalho, sentirá a necessidade de se manter coeso e solidário aos outros.
Dentro de sua perspectiva, a existência de uma sociedade só é possível a partir de um
determinado grau de consenso entre os indivíduos, consenso esse que se assenta em
diferentes tipos de solidariedade social.
SOLIDARIEDADE:
MECÂNICA
A forma mais comum nas sociedades menos complexas, em que todos os membros do grupo
praticamente sabe fazer todas as coisas de que precisa para sua sobrevivência. O indivíduo
não se pertence, ele é literalmente uma coisa de que a sociedade se dispõe. É o tipo que liga
diretamente o indivíduo à sociedade sem nenhuma intermediação. Assim, não é possível
encontrar nesses grupos aquelas características que diferenciam nitidamente os membros uns
dos outros para podermos chamá-los de indivíduos. Suas consciências se assemelham, eles
são pouco ou quase nada desiguais entre si e é justamente essas similitudes que os unem. Até
mesmo a posse de bens não é individual. Essa solidariedade prevalece nas sociedades ditas
primitivas, em que os membros que as integram compartilham das mesmas noções e valores
sociais em todas as esferas sociais: produção, religião, punição, etc.
ORGÂNICA
Esse tipo de solidariedade é fruto da diversidade entre os indivíduos, e não da identificação
entre eles. O que vai os unir é a interdependência das funções sociais, ou seja, a necessidade
que uma pessoa tem da outra em consequência da divisão do trabalho social existente dentro
do grupo. A condensação da sociedade, ao multiplicar as relações intersociais, leva ao
progresso da divisão do trabalho. Ocorre então um processo de individualização dos membros
dessa sociedade, que passam a ser solidários por terem uma esfera própria de ação. A função
da divisão do trabalho é a de integrar o corpo social, assegurar-lhe a unidade. Segundo
Durkheim, somente existem indivíduos (no sentido moderno do termo) quando se vive numa
sociedade altamente diferenciada, onde a divisão do trabalho está presente, em que a
consciência coletiva ocupa um espaço já muito reduzido em face da consciência individual.
“Sendo esta sociedade “um sistema de funções diferentes e especiais”, onde cada órgão tem
um papel diferenciado, a função que o indivíduo desempenha é o que marca seu lugar na
sociedade, e os grupos formados por pessoas unidas por afinidades especiais tornam-se
órgãos, e “chegará o dia em que toda organização social e política terá uma base
exclusivamente ou quase exclusivamente profissional”. Daí deriva a idéia de que a individuação
é um processo intimamente ligado ao desenvolvimento da divisão do trabalho social e a uma
classe de consciência que gradativamente ocupa o lugar da consciência comum e que só
ocorre quando os membros das sociedades se diferenciam. E é esse mesmo processo que os
torna interdependentes”.
Quintaneiro, T. Um toque de clássicos.
As diferentes solidariedades não se excluem.
Sociedade de
Sociedade de
solidariedade mecânica
solidariedade orgânica
Consciência coletiva
Divisão do trabalho
Laço de
solidariedade
social
Organização social
Sociedade segmentada
Sociedade diferenciada
Tipo de direito
Direito repressivo
Direito restitutivo
Sendo a solidariedade um fenômeno moral, e assim não podendo ser diretamente observada,
Durkheim observa então a predominância de certas normas do Direito como indicador da
existência de uma ou outra solidariedade. Função do Direito nas sociedades complexas:
regulador, em analogia ao sistema nervoso, que regula as funções do corpo.
Direito repressivo – sanções que infligem ao culpado uma dor, uma diminuição, uma privação.
Uma regra social considerada importante foi transgredida e seu castigo deve ser equivalente
ao seu erro. O infrator, aqui, está cometendo uma agressão contra toda a sociedade e não
apenas contra uma parte dela.
Direito restitutivo – sanções que fazem com que as relações conturbadas sejam restabelecidas
à sua situação anterior, levando o culpado a reparar o dano causado. o dano causado não
afeta a sociedade como um todo, mas apenas uma função específica desempenhada nela.
SUICÍDIO
Segundo a definição durkheimiana, o suicídio é um ato intencional na qual a vítima age com o
objetivo de provocar sua própria morte: "todo caso de morte provocado direta ou indiretamente
por um ato positivo ou negativo realizado pela própria vítima e que ela sabia que devia
provocar esse resultado".
No final do século XIX, Durkheim demonstra com seu estudo que o suicídio é mais do que um
ato individual de desespero, e que as taxas de suicídio são fortemente influenciadas por forças
sociais.
Seu argumento está baseado na relação que ele faz entre as taxas de suicídio e as taxas de
desordem psicológica de diferentes grupos. Caso o suicídio fosse provocado por uma
desordem psíquica, como se pensava na época, então as taxas de suicídio deveriam ser altas
em locais onde as taxas de desordem psicológicas também eram e baixas onde as taxas de
desordem psicológicas eram baixas. Mas não foi isso que ele observou acontecer, pois as
taxas não aumentavam e diminuíam em conjunto.
O que, então, explicaria a variação dos números de suicídios?
Para ele as taxas de suicídio estão ligadas ao grau de solidariedade existente no grupo.
Quanto maior o grau de compartilhamento de crenças e valores entre os membros do grupo, e
quanto mais eles interagem, maior é o grau de solidariedade existente. Quanto maior o grau de
solidariedade social, mais firmemente ligados ao mundo social estão os indivíduos e menos
chances de cometerem suicídio eles terão em momentos de crise.
Principais obras:
- A divisão do trabalho social (1893)
- As regras do método sociológico (1895)
- O suicídio (1897)
- A educação moral (1902)
- As formas elementares da vida religiosa (1912)
- Lições de Sociologia (1912)
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
BERGER, P. Perspectiva Sociológica. Petrópolis: Vozes, 1972.
BRYM, R. Sociologia: sua bússola para um novo mundo. SP: Thomson Learning, 2006.
DURKHEIM, E. As regras do método sociológico. SP: Editora Nacional, 1987.
DURKHEIM, É. Educação e sociologia. Lisboa: Edições 70, 2007. p. 48-49.
QUINTANEIRO, T. Um toque de clássicos: Marx, Durkheim e Weber. BH: Editora UFMG,
2002.
RODRIGUES, J. A. (Org.). Grandes Cientistas Sociais: Durkheim. São Paulo: Ática, 1988.
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