ENCONTRO DE BIOÉTICA DO PARANÁ – Vulnerabilidades: pelo cuidado e defesa da vida em situações de maior vulnerabilidade. 2, 2011, Curitiba. Anais eletrônicos... Curitiba: Champagnat, 2011, p. 295-305. Disponível em: http://www.bioeticapr.org.br/ e - ISSN: 2176-8269 UM BREVE PANORAMA SOBRE A UTILIZAÇÃO E EFEITOS DA COCAÍNA E SEU SUBPRODUTO CRACK Alexandre Szabô1 Arilene Terto dos Santos1 Edecarlos de Jesus Renato1 Luana Molina Sellucio1 Natália Rafaela Marzola Leite1 Maria Cecilia Da Lozzo Garbelini 2 RESUMO Este trabalho busca traçar um breve panorama da utilização da cocaína e, principalmente, do crack. Para isso, são descritos dados estatísticos, alterações fisiológicas, neurológicas, alguns desdobramentos psicossociais e a influência da genética para que o uso torne-se um vício. Também relata que o uso pela gestante acarreta em danos no desenvolvimento gestacional e posteriormente no desenvolvimento cognitivo da criança. Descreve ainda, sinteticamente, características químicas da droga e seus desdobramentos ao entrar no organismo humano. Observa-se que sua disseminação causa sérios problemas, tanto em nível individual quanto em nível social. A metodologia utilizada foi pesquisa de cunho exploratório, realizada por meio de revisão de literatura em livros e publicações científicas tanto em materiais impressos e fontes virtuais. Os critérios de inclusão definidos para a busca dos conteúdos foram: publicações abrangendo o período de Janeiro de 1999 a Novembro de 2010, e artigos escritos em português e inglês. Palavras-chave: Crack. Cérebro. Cocaína. Danos. Saúde. ABSTRACT This paper seeks to provide a brief overview of the use of cocaine and, particularly, of crack. For this, we describe statistical data, physiological, neurological, psycho social and some consequences of the genetic influence that the use becomes an addiction. It also reports that the use by pregnant women leads to damage in gestational development and later cognitive development of children. It also describes, briefly, the chemical characteristics of the drug and its consequences to enter the human body. It is observed that its spread causes serious problems both at the individual and social level. The methodology was exploratory research, conducted by reviewing literature in books and scientific publications both in print and virtual sources. The inclusion criteria defined for the search of the contents were published covering the period January1999 to November 2010, and articles written in Portuguese and English. Keywords: Crack. Brain. Cocaine. Damage. Health. 1 Acadêmicos do 3º período de Biomedicina das Faculdades Pequeno Príncipe. Doutora em Biologia Celular e Tecidual pela Universidade de São Paulo. Professora de Histologia, Embriologia e Psicobiologia dos Cursos de Biomedicina, Enfermagem e Psicologia das Faculdades Pequeno Príncipe. 2 296 INTRODUÇÃO O crack é derivado da planta de coca, sendo resultante da mistura de cocaína, bicarbonato de sódio ou amônia e água destilada, resultando em grãos que são fumados em cachimbos. O surgimento do crack se deu no início da década de 1980 nos Estados Unidos, de custo menor que o da cocaína e por sua fabricação ser relativamente mais fácil possibilitou sua maior difusão. Houve uma migração da utilização de cocaína injetável, para a utilização do crack por dois principais motivos, o risco do HIV pela reutilização de seringas contaminadas, e o fato do efeito ser tão forte quanto o da cocaína injetável (EMCDDA, 2011). No Brasil a droga foi inserida na década de 1990 através da cidade de São Paulo e obteve um avanço extremamente rápido, pois os traficantes utilizavam uma quantidade menor de produtos químicos tornando a fabricação mais rápida e barata resultando em uma lucratividade maior. Esse avanço deve-se a medidas estratégicas que os traficantes utilizaram. Esgotou a distribuição de outros tipos de drogas, não dando opção para os usuários, tendo o crack como única opção (OLIVEIRA; NAPPO, 2008). Segundo os pesquisadores Oliveira e Nappo (2008), em 1993 foram relatadas 204 apreensões da droga e em 1995 ocorreram 1.906 casos. Enfatizam também que em duas décadas não ocorreram alterações significativas no preço da droga, e sim alterações na qualidade e pureza da mesma, o que traz sérios riscos para o individuo e a sociedade. Sabendo que o crack tem um efeito devastador no ser humano e que o seu uso, de um modo geral, está ocorrendo de forma muito intensa entre os jovens e adultos nas diversas camadas sociais, justifica-se o presente trabalho. Esta pesquisa tem por objetivo analisar a ação da droga no sistema nervoso central e seus efeitos euforizantes e lesivos os quais levam os usuários a desenvolver e a conviver com sérias conseqüências físicas, psicológicas e sociais. METODOLOGIA A metodologia deste estudo caracteriza-se por uma pesquisa exploratória realizada por meio de revisão de literatura em livros, periódicos especializados, produções acadêmicas, bases de dados como Scielo e publicações científicas referentes à temática apresentada. Os critérios de inclusão definidos para a busca dos conteúdos foram: publicações abrangendo o período de Janeiro de 1999 a Julho de 2010, artigos escritos em Português e Inglês e as palavras-chave crack, cérebro, cocaína, danos, saúde. 297 O SER HUMANO VULNERÁVEL A vida social do ser humano é governada por regras e normas de conduta, e segundo Kant o ser social é resultado de uma vagarosa evolução. A moral não é absoluta, porém, um código de conduta criado mais ou menos ao acaso para a sobrevivência de um grupo e varia de acordo com a natureza e as circunstâncias de uma sociedade. Essas convenções surgem para se evitar o caos social. Sem esses conceitos a vida em sociedade não subsistiria. (DURANT, 2000; GIDDENS, 1996). Quando se trata da grande problemática das drogas há consenso generalizado dos que se recusam a viver de acordo com as regras seguidas pela maioria de nós, tendo como entendimento que viciados em droga não se enquadram nos padrões de aceitabilidade social. E para explicar o comportamento “desviante” é necessário compreender as duas principais linhas de pensamento, as que visam explicar pelas condições sociais e econômicas, e outras buscam respostas na linha psicológica e biológica (GIDDENS, 1996). Segundo um grupo de pesquisadores a guerra contra o narcotráfico no Brasil está perdida, e esta linha de pensamento é chamada de “economia delinquencial”, que tem como fundamento os estudos realizados na década de 1980 e é baseada na seguinte afirmativa, “A droga é a única alternativa econômica do terceiro mundo” (KASSOUF; SANTOS, 2007). Para se conseguir lutar contra as drogas, primeiro é necessário compreender os fatores da vulnerabilidade e dependência que ela causa. A droga por sua atuação no sistema nervoso central gera uma alteração na conduta humana em conseqüência sucede um desequilíbrio completo do comportamento. Inversamente ao aumento do consumo há um déficit no SNC, afetando o senso de ética, moral, raciocínio, torna-se um ser anti-social, não tendo limites, agindo de forma indiscriminadamente para conseguir cada vez mais a droga que necessita (KASSOUF; SANTOS, 2007). As análises das causas estão correlacionas estreitamente às condições estruturais da sociedade, incluído a pobreza, as condições das áreas urbanas decadentes as circunstâncias de vida decrépitas e os altos índices de corrupção e narcotráfico (GIDDENS, 2006). Atenção especial deve ser dada aos adolescentes, pois este período é caracterizado pela necessidade de integração social, busca da auto-afirmação e da independência individual, além da consolidação da identidade sexual e emoções conflitantes (SILVA; MATTOS, 2004). Nesta etapa do desenvolvimento inúmeras adaptações e mudanças nas capacidades e habilidades pessoais são observadas proporcionando um período de grande vulnerabilidade quanto ao uso das drogas. 298 PANORAMA ESTATÍSTICO Estima-se que no mundo todo, cerca de 14 milhões de pessoas fazem uso abusivo de cocaína - somente no Brasil, 7,2% de pessoas do sexo masculino de idade entre 15 a 34 anos já fizeram uso da droga, iniciando seu consumo com a idade média de 13 anos, e tornando-se dependente com 06 meses de uso de cocaína e 01 mês para o crack, em uso contínuo (CEBRID, 2005). Dados recentes relatam que cerca de 380 mil pessoas, em todo o Brasil utilizam a pedra de crack, e o governo busca alterar a forma de tratamento, sendo a principal estratégia a abordagem nas ruas, através da conscientização. Em um estudo assistido com jovens de classe média em clínicas de reabilitação, documentaram que a passagem do uso da cocaína para o crack foi demasiadamente rápida, sendo que a maioria deles já apresentava sinais claros de dependência, com pensamentos e preocupação intensa com a droga, rápida perda de modular seu uso e rápido desenvolvimento de tolerância (CEBRID, 2005). Segundo dados oficiais do IBGE (2001), numa entrevista com 878 pessoas da Região Sul, incluindo Curitiba, São José dos Pinhais e Ponta Grossa, todas no Estado do Paraná, concluiu-se que 1,1% deles já haviam consumido a pedra de crack e 3,1% já haviam feito uso de cocaína. Segundo esses levantamentos comparados com dados de 2005, os entrevistados afirmam ser muito fácil obter qualquer tipo de droga nessas cidades, se assim o desejarem (GALDURÒZ). Numa breve comparação com as regiões brasileiras, contatou-se que o uso da cocaína é maior que o consumo do crack nas regiões sul e sudeste, e nas regiões norte e nordeste, o quadro se inverte. Avalia-se que a situação deve-se principalmente ao quadro socioeconômico dessas regiões, pois a cocaína é uma droga relativamente mais cara em relação crack, que é extremamente barato. Todos os levantamentos epidemiológicos de âmbito nacional foram realizados pelo Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (CEBRID). A COMPOSIÇÃO DO CRACK E DA COCAINA A cocaína é um produto natural extraído das folhas de Erythroxylon coca Lam (folhas de coca). É um arbusto tropical amplamente cultivado no cume dos Andes na América do Sul e suas folhas são usadas, até os dias atuais, como estimulante por alguns povos indígenas dessa região desde os tempos históricos (HOW STUFF WORKS, 2011). Normalmente produzida na forma de sal cloridrato, tem limitado uso médico como anestésico tópico. A cocaína purificada foi 299 utilizada como um estimulante do sistema nervoso central desde os primeiros anos do século XX, estando atualmente sob controle internacional (EMCDDA, 2011). As pedras de crack contêm de 75 a 90% de cocaína. A cocaína tem uma rápida dependência psicológica e um efeito ainda mais acentuado naqueles que fumam base de cocaína (crack). Após uma dose de 25mg, os níveis sanguíneos máximos ficam na faixa de 400-700mg / l, dependendo da via de administração. Os principais metabolitos são ecgonina, benzoilecgonina e ecgonina éster metílico, que são inativos. Quando consumido com álcool, a cocaína também produz o metabólito cocaetileno. Algumas partículas de cocaína inalterada são encontradas na urina. A meia-vida plasmática da cocaína é dependente da dose, mas varia normalmente de 0,71,5 horas. A dose letal estimada é de 1,2g, mas indivíduos suscetíveis podem morrer com 30mg aplicada às membranas mucosas, ao passo que os toxicodependentes podem tolerar até 5g por dia (EMCDDA, 2010). A PARTICIPAÇÃO DA GENÉTICA NA DEPENDÊNCIA DAS DROGAS Muitos são os fatores que levam um individuo a se tornar dependente químico de uma substância entorpecente. Entre eles podemos citar os fatores sociais, psicológicos e hereditários. Várias pesquisas e estudos realizados mostram a importância dos fatores genéticos na transmissão da vulnerabilidade às dependências. Essa transmissão pode ser compreendida através do desenvolvimento do transtorno onde condições biológicas hereditárias associam-se a situações ambientais ao longo da vida para a produção da dependência (MESSAS, 1999). Ainda não se tem um estudo sobre a investigação de vulnerabilidades especificas para a dependência do crack, porém, alguns estudos indicam a relação entre o uso abusivo do crack e a propensão ao alcoolismo (MESSAS, 1999). Segundo Messas (1999), entre as vulnerabilidades comuns a diversos fenótipos da psiquiatria encontram as suscetibilidades comuns para a síndrome de Gilles de la Tourette, déficit de atenção e hiperatividade infantis e abuso de diversas drogas, incluindo crack. Os estudos epidemiológicos comprovam a existência da participação genética nos transtornos de dependência. Os estudos moleculares realizados buscam a investigação de variações polimórficas nos genes de seus cinco tipos de receptores (DRD1; DRD2; DRD3; DRD4 e DRD5). Polimorfismos são variações na seqüência de bases de um determinado gene que podem acarretar diferenças em sua expressão e, por conseqüência, variações funcionais da proteína por ele gerada. Associações são encontradas entre determinados polimorfismos e dependência de drogas para todos os receptores. A variante menor do gene do receptor 300 dopaminérgico DRD2, conhecida por DRD2-A1 representa um importante papel na transmissão da vulnerabilidade à dependência de drogas, assim como a outros fenótipos. Esta hereditariedade se dá provavelmente através de mecanismos neurofisiológicos que produzem variações funcionais nos sistemas cerebrais, acarretando padrões afetivos e neuropsicológicos vulneráveis ao surgimento do transtorno (MESSAS, 1999). Os estudos moleculares apontam para a transmissão genética (mediada por características de personalidade e diferentes reações individuais aos efeitos das drogas) de variações no balanço de sistemas de neurotransmissão e de metabolização bioquímica de drogas. A ação do meio ambiente sobre estas condições biológicas produz a expressão do fenótipo (MESSAS, 1999). OS “BEBÊS DA COCAÍNA” As pesquisas demonstram que o abuso da droga pode afetar o desenvolvimento durante as primeiras vinte semanas de gestação atuando sobre a citogênese e a migração celular; ou durante a segunda metade, causando danos cerebrais decorrente de hipóxia fetal em virtude da vasoconstrição placentária, que torna reduzido o fluxo sanguíneo e o aporte de oxigênio às células da placenta e ao feto. Sob a influência direta da cocaína, o feto sofre alterações em seu desenvolvimento cerebral, com danos na arquitetura do córtex, principalmente com a imprecisão da laminação cortical, sugerindo desordens na diferenciação neural e na migração de neurônios e células da neuroglia. Tais problemas neurológicos podem afetar as funções autônomas normais do recém-nascido, que dependem de deglutição e sucção, além de causar danos na faculdade de aprendizado e amadurecimento da criança (BASTOS; BORNIA, 2009; CUNHA, 2007; NIGRI et al, 2009; WANG, 2010). A cocaína atravessa rapidamente a barreira placentária, agindo diretamente na vasculatura fetal, causando vasoconstrição, taquicardia, arritmias, enfartes, deslocamento de placenta, trabalho de parto prematuro, aborto, além de malformações urogenitais, cardiovasculares e do sistema nervoso central. A insuficiência útero placentária causa hipóxia e acidose fetal, acarretando crescimento intrauterino restrito, baixo peso ao nascimento, parto prematuro e aborto espontâneo (BASTOS; BORNIA, 2009; CUNHA, 2007; NIGRI et al, 2009; WANG, 2010). A grande dificuldade em avaliar pesquisas que relacionem a utilização de cocaína e seus derivados durante a gestação reside no fato de que normalmente a mãe usuária de drogas não faz o uso restrito de cocaína. Também é difícil avaliar o grau de confiabilidade nos dados fornecidos pela gestante para a realização da pesquisa, além de que, grande parte das usuárias não faz acompanhamento pré-natal, tornando ainda mais complicado o acesso aos dados quantitativos 301 reais, não somente à quantidade de substância como também a quantidade de gestantes que a utilizam (WANG, 2010). Outros fatores podem interferir na testemunha de efeitos gerados pelo uso da droga. Como fatores socioeconômicos, a falta de cuidado no pré-natal, o acompanhamento do pai, a capacidade da mãe se cuidar tanto durante a gestação quanto cuidar do bebê após o nascimento, bem como a alimentação da mãe durante a gestação já que a cocaína tem poder inibidor de apetite. A utilização de várias substâncias em conjunto pode ser decisiva para os efeitos observáveis (WANG, 2010). EFEITOS NO CERÉBRO Assim que fumado, o crack cai imediatamente na circulação chegando rapidamente ao cérebro. Em 10 a 15 segundos os primeiros efeitos já ocorrem, enquanto que os efeitos após cheirar o "pó" acontecem após 10 a 15 minutos e após a injeção, em 3 a 5 minutos. Essa característica faz do crack uma droga "poderosa" do ponto de vista do usuário, já que o prazer acontece quase que instantaneamente após uma "pipada" (ALVES; WATSON, 2007). A duração rápida dos efeitos faz com que o usuário volte a utilizar a droga com maior frequência (praticamente de cinco em cinco minutos) quando comparado às outras formas de utilização levando-o assim à dependência muito mais rapidamente do que os usuários da droga em pó ou diluída, por outras vias (nasal e endovenosa). Logo após a "pipada" o usuário sente uma sensação de grande prazer, intensa euforia e poder. É tão agradável, que logo após o desaparecimento desse efeito, ele volta a usar a droga, fazendo isso inúmeras vezes até acabar todo o estoque da droga que possui ou então com o dinheiro para adquirir mais droga. Além desse "prazer" indescritível, que muitos comparam a um orgasmo, o crack também provoca um estado de excitação, hiperatividade, insônia, perda de sensação do cansaço, falta de apetite. Este último efeito é muito característico do usuário de crack. Em menos de um mês ele perde muito peso (8 a 10 Kg) e num tempo um pouco maior de uso ele perde todas as noções básicas de higiene ficando com um aspecto deplorável. Após o uso intenso e repetitivo o usuário experimenta sensações muito desagradáveis como cansaço e intensa depressão (ALVES, 2007). O conjunto destes efeitos leva à alienação do usuário, que busca o prazer pelo prazer. Há perda de sua identidade social e prejuízo do seu núcleo de convívio, ficando assim sem condições de interação com o meio, sem autopercepção e assim o usuário troca a sua estabilidade psicológica, social e física, assim como seus bens e sua estrutura familiar, pela utilização da substância. 302 A ENTRADA DA SUBSTÂNCIA NO CÉREBRO Quando a cocaína entra no sistema de recompensa do cérebro, ela bloqueia os sítios transportadores dos neurotransmissores (dopamina, noradrenalina, serotonina), os quais têm a função de levar de volta estas substâncias que estavam agindo na sinapse (CARDOZO; SABBATINI, 2007). Desta maneira, ela possibilita a oferta de um excesso de neurotransmissores no espaço inter-sináptico à disposição dos receptores pós-sinápticos, fato biológico cuja correlação psicológica é uma sensação de magnificência, euforia, prazer, excitação sexual. Por este motivo, denomina-se o consumo da cocaína "Síndrome de Popeye", numa analogia desta droga com o espinafre do conhecido marinheiro das histórias em quadrinhos (CARDOZO; SABBATINI, 2007). Uma vez bloqueados estes sítios, a dopamina e outros neurotransmissores específicos não são receptados, ficando, portanto, "soltos" no cérebro até que a cocaína saia. Quando um novo impulso nervoso chega, mais neurotransmissor é liberado na sinapse, mas ele se acumula no cérebro por seus sítios receptadores estarem bloqueados pela cocaína (CARDOZO; SABBATINI, 2007). O uso prolongado da cocaína pode fazer com que o cérebro se adapte a ela, de forma que ele começa a depender desta substância para funcionar normalmente diminuindo os níveis de dopamina no neurônio (CARDOZO: SABBATINI, 2007). Se o indivíduo parar de usar cocaína, já não existe dopamina suficiente nas sinapses e então ele experimenta o oposto do prazer manifestando fadiga, depressão e humor alterado (CARDOZO; SABBATINI, 2007). OS EFEITOS EUFORIZANTES Tanto a dopamina como outras substâncias aumentadas no cérebro podem produzir vasoconstrição e causar lesões. Estas lesões podem incluir hemorragias agudas e infarto no cérebro (zona de morte celular, causada por falta de oxigênio), bem como necrose do miocárdio, podendo levar à morte súbita (CARDOZO; SABBATINI, 2007). Um estudo de PET (Positron Emission Tomography) feito por cientistas da John Hopkins University e o National Institute on Drug Abuse (NIDA) nos EUA, descobriu que o vício pelo crack está diretamente correlacionado a um aumento no cérebro dos receptores para substâncias opióides, como as endorfinas, que são naturais, e drogas de abuso, como a heroína e o ópio. 303 Quanto maior a intensidade do vício, maior esse número de receptores (CARDOZO; SABBATINI, 2007). Quando os viciados em cocaína que foram testados na pesquisa ficavam um mês longe da droga, em alguns deles o número de receptores voltava ao normal, mas em outros continuava alto. Pode haver uma correlação entre esse fato e a suscetibilidade do drogadito voltar ao vício ou não (CARDOZO; SABBATINI, 2007). CONSIDERAÇÕES FINAIS A cocaína e, de certa forma em maior grau, o crack têm efeito devastador na vida do usuário, em todos os seus aspectos. O crack, por ser uma droga mais barata, acaba atingindo também uma parcela social que, por falta de condições físicas urbanas, econômicas e educação, torna-se mais vulnerável, sendo então encontrado alto índice de corrupção e narcotráfico, causando um grande impacto físico e psicológico tanto na vida pessoal quanto na vida familiar. Conforme os dados estatísticos apontam, nota-se que o consumo do crack no País é grande por todas as classes, e que está atingindo cada vez mais a população jovem que, por fatores sociais e psicológicos, começa a consumir a droga mais cedo gerando transtornos aos familiares que também sofrem com o desvio comportamental. Como meio de reter o progresso do consumo do crack, é necessário que a política pública do Estado intervenha dando mais atenção à camada social mais vulnerável proporcionando condições de cidadania e especialmente atenção à educação. Deve ainda fornecer condições para uma vida digna e, com isso, agir preventivamente ao problema. Além do amparo aos usuários e familiares, há a necessidade da criação de programas de reabilitação e promoção da recuperação e reintegração destes à sociedade. Também se mostra necessária uma assistência voltada para os “filhos do crack”, crianças que tiveram seu desenvolvimento intra-uterino acompanhado da utilização da substância pela mãe e, por isso, poderão apresentar dificuldades no desenvolvimento cognitivo. Portanto, as ações de prevenções devem estar relacionadas com a dignidade do ser humano. REFERÊNCIAS ALVES. Um crack no cérebro. Disponível em: http://revistavivasaude.uol.com.br/Edicoes/50/artigo54701-1.asp. Acesso em: 15 set. 2010. 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