INTRODUÇÃO José Herbert de Souza, o conhecido Betinho, foi um transformador social. Sociólogo, sempre presente nas lutas sociais e políticas se propondo a ampliar a democracia e a justiça social e levantando a bandeira do humanismo. Dedicou-se à CoordenaçãoGeral do IBASE - com firme resistência física e brilhante lucidez e consciência da realidade brasileira. Publicou diversos livros, artigos e ensaios onde denunciou a exclusão social, concentração de renda e controle político Hemofílico, contraiu a AIDS em uma das inúmeras transfusões de sangue a que era obrigado a se submeter. A sua luta pelo direito à vida aos portadores do HIV/AIDS transcendeu apenas o pessoal, chegando à esfera da sociedade, tornando-se uma verdadeira batalha em favor da defesa da dignidade humana. Em vida, foi uma figura humana notável, realizando magníficos projetos para a valorização da solidariedade e dos direitos humanos em uma sociedade tão injusta., onde o que mais se destacou foi a Campanha do “Natal sem Fome”, que perdura até hoje. Depois de sua partida, deixou e deixa saudades e a certeza de que com boa vontade, coragem, luta e perseverança todas as pessoas podem colaborar para a melhoria do mundo. Basta querer! "Gente foi feita para inventar o mundo de novo, para mudar e desmudar, carregando alegria." Betinho BIOGRAFIA José Herbert de Souza, o Betinho, nasceu em 3 de novembro de 1935, em Minas Gerais, região montanhosa no interior do Brasil cujos habitantes são conhecidos por sua mansidão, pelo jeito calmo e sutil. "É um mineiro", diz-se das pessoas equilibradas, que dificilmente se exaltam ou assumem posições contundentes. Isso talvez ajude a explicar por que Betinho, assumindo integralmente as mais radicais utopias de transformação social, fazendo da sua própria vida uma bandeira costurada de bandeiras universais, sempre trabalhou no sentido de congregação, da união. Terceiro de uma série de oito irmãos, completou, em 1962, os cursos de Sociologia e Política e de Administração Pública na Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade de Minas Gerais. Nessa época, atuou como liderança nacional dos grupos de juventude católica que representavam as aspirações de transformação social, depois reforçadas com o Concílio Vaticano II e participou das conquistas pelas chamadas "reformas de base". Segundo testemunho do escritor Otto Lara Rezende, da Academia Brasileira de Letras, Betinho, nas praças públicas, pedia tudo que os comunistas pediam - e mais o céu. Nesse período de vida democrática do Brasil, exerceu funções de coordenação e assessoria no Ministério da Educação e Cultura e na Superintendência de Reforma Agrária, além de elaborar estudos sobre a estrutura social brasileira para a Comissão Econômica para a América Latina (Cepal), da ONU. Data desse período também a sua presença nos movimentos operários brasileiros. Com o golpe de 64, passou a atuar na resistência contra a ditadura militar, dirigindo organizações de cunho democrático no combate ao regime que se instalava. No começo da década de 70, foi para o exílio e, como no poema de Brecht, trocava de país como quem trocava de sandálias. Morou primeiro no Chile, em Santiago, onde deu aula na Faculdade Latinoamericana de Ciencias Sociales e atuou como assessor do presidente Allende. Conseguiu escapar do sangrento golpe militar do general Pinochet, indo para a embaixada do Panamá, em 1974. Seguiu depois para o Canadá e México. Exerceu, nessa época, diversos cargos: diretor do Conselho Latino-Americano de Pesquisa para a Paz (Ipra), consultor para a FAO sobre projetos e migrações na América Latina e coordenador do Latin American Research Unit (Laru), entre outros. Foi, ainda, professor efetivo no Doutorado de Economia da Divisão de Estudos Superiores, na Faculdade de Economia da Universidade Nacional Autônoma do México, e diretor de Brazilian Studies, no Canadá. Com o crescimento dos movimentos pela democratização dos meios de comunicação no Brasil, seu nome tornou-se um dos símbolos da campanha pela anistia. Em 1979, retornou ao país e envolveu-se inteiramente nas lutas sociais e políticas, sempre se propondo a ampliar a democracia e a justiça social. No início dos anos 80, ajudou a fundar o ISER - Instituto de Estudos da Religião -, presidiu a Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS - ABIA, fundada, em 1986 e uma das primeiras e mais influentes instituições do País, preocupada com a organização da defesa dos direitos das pessoas portadoras do HIV ou doentes com AIDS. A sua luta pelo direito à vida aos portadores do HIV/AIDS não foi apenas pessoal, mas contextualizouse em um nível mais amplo e elevado, o da defesa da dignidade humana. Além disso, dedicou-se à Coordenação-Geral do IBASE - Instituto Brasileiro de Análises Sócio-Econômicas -, cargo ocupado até os últimos dias, com firme resistência física e brilhante lucidez e consciência da realidade brasileira, cuja perversidade - exclusão social, concentração de renda e controle político - nunca deixou de denunciar. O Ibase é uma entidade governamental e tem como objetivo principal democratizar a informação acerca das realidades econômicas, políticas e sociais no Brasil. A natureza não foi benevolente com o cidadão Betinho. Hemofílico, contraiu a AIDS em uma das inúmeras transfusões de sangue a que era obrigado a se submeter. Por essa mesma condição genética, em 1988, em um intervalo de três meses, Betinho perdeu dois irmãos: o cartunista Henfil, aos 43 anos, famoso pelo uso hábil e criativo do humorismo na crítica à ditadura militar, mesmos nos seus piores momentos de repressão à livre expressão política; e o músico Chico Mário, com apenas 39 anos. Mesmo abalado por estes acontecimentos, Betinho nunca abandonou a militância política, sempre presente em cada evento que levantasse a bandeira do humanismo. No dia 05 de julho de 1997, Betinho foi internado no Hospital da Beneficência Portuguesa, no Rio, vítima de uma infecção oral. Vinte e seis dias depois, pediu para voltar para casa. Morreu aos 61 anos, em 9 de agosto do mesmo ano, em sua casa, no bairro do Botafogo, no Rio de Janeiro, com 61 anos de idade, vítima da hepatite C. Em 11 de agosto, o corpo do sociólogo foi cremado. A seu pedido, as cinzas foram espelhadas em seu sítio em Itatiaia. Betinho é, sem dúvida, o símbolo da determinação e do trabalho incansável pela cidadania, pela restauração da verdadeira democracia participativa, pela valorização da solidariedade e dos direitos humanos em uma sociedade injusta. Por essa constante postura desempenhou um importante papel em relevantes momentos da história recente do país e em vários movimentos de mobilização social, entre eles: a articulação da Campanha Nacional pela Reforma Agrária, em 1983, congregando entidades de trabalhadores rurais; a organização, em 1990, do movimento Terra e Democracia; a liderança, em 1992, do Movimento Pela Ética na Política, que culminou com o impeachment do então presidente Fernando Collor de Mello, em setembro do mesmo ano. Terminada a batalha do impeachment, Betinho dedicou-se à Ação da Cidadania contra a Miséria e Pela Vida. A campanha contra a fome ganhou as ruas em 1993 e chegou ao final daquele ano com total aprovação da sociedade - 96% de concordância, segundo o Ibope. Sua figura humana adquiriu, então, notoriedade definitiva como o incansável Coordenador da "Ação pela Cidadania contra a Fome e a Miséria", que pretendia ir além de um movimento social de caráter assistencialista, para aglutinar outros movimentos e iniciativas individuais e comunitárias em todo o País. A "Campanha do Betinho" foi tão polêmica quanto popular e o seu sentido político maior, razão principal da polemização em torno de suas ações, tinha por objetivo final a promoção da cidadania, do direito ao emprego e da luta pela terra, etapa final do programa de ação planejado e o maior legado público da vida deste brasileiro humanista. No ano de 1994, lançou a Campanha "Natal sem Fome", que arrecadou, no primeiro ano, 600 toneladas de alimentos. Em agosto do mesmo ano, fez um pronunciamento na ONU, na reunião preparatória para a Conferência Mundial sobre o Desenvolvimento Social. Houve, ainda, dois momentos marcantes: a Caminhada pela Paz do Movimento Reage Rio, em novembro de 1995; e o desfile no carnaval de 1996, quando Betinho foi enredo da Escola de Samba Império Serrano, no Rio de Janeiro, cujo tema foi: "E verás que um filho teu não foge à luta". Em suas últimas iniciativas, entre os anos de 1996/1997, apresentou uma proposta para a Agenda Social Rio 2004 ao Comitê Olímpico Internacional, quando a cidade do Rio de Janeiro empenhou-se em sua candidatura à sede olímpica, em 1996; lançou, via Ibase, a Agenda Social Rio 2000, tentativa de lutar pela melhoria da qualidade de vida no Estado do Rio de Janeiro, por meio da implantação das metas sociais por ele idealizadas; e, em julho de 1997, num encontro com empresários de todo o país, lançou a campanha de adesões ao Balanço Social, uma espécie de balanço financeiro onde os indicadores são os investimentos sociais feitos por empresas. Ao longo de sua trajetória, publicou, ainda, diversos livros, artigos e ensaios, sempre com a mesma preocupação de criticar as estruturas que tornam a vida difícil e injusta para milhões de pessoas. O Programa Nacional de Doenças Sexualmente Transmissíveis e Aids tem a honra de lançar uma página na internet para reverenciar a sua memória, pois sua presença nos meios de comunicação transformou-o em símbolo das vítimas da AIDS e da luta pela saúde da população. Que a sua luta continue pelas mãos daqueles que nele acreditaram e pelas dos seus filhos, para que a esperança por um mundo melhor e mais justo permaneça entre nós. TRAJETÓRIA 13/11/1935: Nasce em Bocaiúva, interior de Minas Gerais, Herbert (sem um "r" por erro do escrivão) de Souza, o primeiro filho de Henrique e Maria da Conceição Figueiredo de Souza. 1950 a 1953: Vítima de tuberculose, vive confinado num quarto, nos fundos de sua casa. Fim dos anos 50: Começa a militância na Juventude Estudantil Católica (JEC) e, depois, na Juventude Universitária Católica (JUC). 1962: Aos 27 anos, é um dos fundadores da organização marxista Ação Popular (AP). 1964: Com o golpe militar, exila-se no Uruguai. Volta clandestinamente. 1965: Nasce, clandestino, num hospital em São Paulo, o filho Daniel, de seu casamento com Irles Coutinho de Carvalho. 1967: Novo exílio, desta vez na Europa. Retorna, outra vez clandestino, em 1968. 1971: Trabalha com identidade falsa, como operário no ABC paulista. A repressão aumenta e ele parte para o último exílio: primeiro no Chile, depois Panamá, Canadá e, enfim, México. 16/09/79: A anistia política traz de volta ao país, com identidade verdadeira e entrada legal, o "irmão do Henfil". 1981: Cria o Ibase (Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas), cuja meta é democratizar o acesso à informação. 1986: Exame confirma sua condição de portador do vírus HIV. Funda a Abia, entidade que vira referência na luta por maior controle dos bancos de sangue e contra a discriminação. 04/01/88: Morre o irmão Henfil, aos 43 anos, vítima de Aids. 14/03/88: Morre o irmão Chico Mário, aos 39 anos, de Aids. Betinho se confessa desesperançado e afasta-se da Abia, que passa a ser presidida pelo escritor Herbert Daniel. 09/88: Assume o cargo, sem remuneração, de primeiro defensor do povo do município do Rio de Janeiro. Foi indicado por 11 entidades e empossado pelo prefeito Saturnino Braga. 06/91: Recebe o Prêmio Global 500, da ONU, por sua contribuição em favor da ecologia (na Campanha pela Reforma Agrária), pela criação do Ibase e pela luta para a despoluição da Baia da Guanabara e a preservação da Amazônia. 91: Monta no Ibase uma equipe para pôr em funcionamento o primeiro servidor do país de acesso à Internet. 06/92: Começa a campanha para que os restaurantes, em vez de jogar comida fora, doem para comunidades carentes. Surge aí o embrião da Ação da Cidadania contra a Miséria e pela Vida. 07/92: Participa do Movimento pela Ética na Política, um dos alicerces para a campanha que resultou no impeachment do presidente Fernando Collor. 1993: Surgem em todo o país comitês da Ação da Cidadania, popularizada como "Campanha contra a fome", ou, como ficou mais conhecida, "Campanha do Betinho". A iniciativa chegou a ser tachada de assistencialista por militantes de esquerda. 03/94: Lança a "Campanha do Emprego". Baseada no mapa de mercado do trabalho do IBGE, não alcança o mesmo sucesso da luta contra a fome. 06/04/94: O GLOBO revela que a Abia recebera, quatro anos antes, doação de US$ 40 mil do bicheiro Turcão. A negociação fora intermediada por Nilo Batista, que em 1994 foi empossado governador do Rio. 27/05/94: Recebe o Prêmio Eco 94, como hors-concours, pela campanha contra a fome. 24/08/94: Pronunciamento na ONU, na reunião preparatória para a Conferência Mundial sobre o Desenvolvimento Social. 11/94: Lança a campanha "Natal sem fome" , que arrecada, no primeiro ano, 600 toneladas de alimentos. 28/11/95: Toca o sino da paz após a Caminhada pela Paz na Avenida Rio Branco, organizada pelo Movimento Reage Rio. 02/96: Faz a Sapucaí chorar ao sair como destaque da Império Serrano, que levou para a Passarela do Samba o enredo "E verás que um filho teu não foge à luta", sobre sua vida. 11/96: Defende, junto a integrantes do Comitê Olímpico Internacional, o cumprimento da Agenda Social na campanha do Rio para sediar as Olimpíadas de 2004. 05/07/97: Vítima de uma hepatite crônica, diagnosticada em 1994, Betinho é internado na Beneficência Portuguesa. Seu quadro clínico é grave: muito debilitado e sem conseguir se alimentar, o sociólogo sofre de pneumonia bacteriana, infecção oral e insuficiência hepática. 30/07/97: O tratamento não corresponde às expectativas e Betinho pede para voltar para casa. No apartamento, em Botafogo, os médicos montam uma Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) portátil. 08/08/97: Betinho fala com dificuldade e reclama das dores e do desconforto. Seu estado de saúde é grave: falência hepática, constatam os médicos. Pesando apenas 39 kg, Betinho é sedado e medicado com diuréticos. A aplicação do coquetel de medicamentos contra o vírus da Aids é suspensa. Com complicações hepáticas, entra, à noite, em coma induzido. 09/08/97: O infectologista Walber Vieira diz pela manhã que o quadro clínico de Betinho é irreversível. Além da falência hepática, o sociólogo enfrenta complicações renais e hemorragias cutâneas. Seu organismo passa a reter líquido e sua alimentação é através de uma sonda nasogástrica. O médico diz temer que o sociólogo sofra um derrame na pleura. À tarde, Daniel, filho do sociólogo, diz que o quadro clínico do pai não sofreu qualquer alteração. 09/08/97: Às 21h10m, Betinho morre em casa ao lado da mulher e dos filhos. TEXTOS DO BETINHO DIREITOS HUMANOS E AIDS Meu tema é direitos humanos e doenças epidêmicas, e eu vou tratar da questão da AIDS. Estou convencido de que a AIDS é uma doença revolucionária. Ela recoloca de forma radical para a nossa sociedade, tanto brasileira quanto internacional, uma série de problemas vitais que durante muito tempo tentamos ignorar. Nossa cultura foi se afastando do real e tenta ignorá-lo, ao invés de desafiá-lo. A medicina moderna foi criando uma idéia de onipotência e nos dizia, de forma indireta, que todas as doenças eram curáveis e que finalmente a morte não podia existir. A cultura ocidental moderna não só passou a ignorar a morte como tenta negá-la sob todas as pessoas e com todos os artifícios. Poucas são as pessoas que enfrentam a morte como seu cotidiano, como algo natural. Na nossa cultura, a morte não existe. E a medicina se imbuiu da idéia, transmitida através da tecnologia e do avanço científico, de que nós estávamos a pique de superar a morte. Dentro dessa visão, todas as doenças são tratáveis, todas as enfermidades são curáveis. Num determinado momento, a ciência moderna começou até mesmo a pensar que a eternidade estava ao alcance da humanidade. Estávamos já tratando o câncer como a última doença mortal. De alguma maneira, havia no horizonte de cada um de nós a seguinte expectativa: o dia em que descobrirem a cura do câncer marcará o fim das doenças mortais. E eis que surge um vírus, o HIV, que se esconde no sistema imunitário, nas células que definem, articulam, constroem o sistema imunitário. E ao se instalar nesse sistema o desarma, fazendo com que a pessoa passe a ser absolutamente vulnerável a qualquer ataque externo. E está produzindo o pânico do século XX. Um sistema imunitário desarmado é a doença mais espetacular produzida ao longo da história da humanidade. A AIDS se apresenta como absolutamente mortal e epidêmica. No Brasil, hoje, a cada dez meses, dobram os casos de AIDS. Tomando como base três mil casos registrados no Brasil - subnotificados, obviamente, porque devemos ter cinco ou seis mil casos -, façamos esse exercício: dobremos a cada dez meses; em seis anos chegaremos à casa dos milhões, não de pessoas contaminadas, mas de pessoas com manifestação de AIDS. Então, essa dimensão epidêmica que existe em nível de Brasil e em nível mundial, como que produz uma consciência de pânico. A humanidade, se não encontrar nos próximos seis ou sete anos a cura ou a vacina, pode estar condenada a um processo de extermínio por este vírus. Segundo pesquisas, alguns países da África já estão nesse quadro, pois 20% a 30% da população apresentam manifestação de AIDS ou se encontram contaminadas pelo vírus. Esse vírus, sob todos os aspectos, apareceu de forma espetacular, mortal, com manifestação rápida, fulminante, sem cura. E, até o presente momento, sem nenhum meio de ataque direto que possa destruí-lo. Ele se transmite através da relação sexual que, queiramos ou não, é vital para a humanidade e é universal, e na nossa cultura está marcada por todo tipo de preconceito, culpabilidade, pecado, danação, inferno. Ele veio relacionado também ao sangue, que é outro elemento universal na cultura da humanidade; o sangue está na nossa cultura sob mil formas, há pessoas que entram em pânico quando o vêem, embora seja parte constitutiva da nossa realidade. E o vírus se transmite, fundamentalmente, pelo sangue. Mesmo quando segue através do esperma, é porque o esperma contaminado entra na corrente sanguínea. Então, este é o vírus que adora o sangue, mata-nos através do sangue. Mas a AIDS vem também marcada por várias outras questões: o racismo, por exemplo. Quando o vírus foi descoberto, logo se buscou o culpado, e o culpado era o negro africano, a AIDS teria vindo do Haiti. Depois se descobriu que mais americanos iam ao Haiti que haitianos aos EUA, logo se abandonou em parte essa idéia. Nela, o culpado era a África, os africanos teriam sido contaminados, através de suas relações com o macaco, passando esse vírus para o resto da humanidade. O racismo ensaiou seus passos na questão da AIDS, resistiu por uns três anos, e só recentemente, com o fracasso de todas as teorias que tentaram explicar a AIDS como resultado dos "seres inferiores africanos", essa tese caiu por terra. A AIDS vinha dizer assim: "Convençam-se de que todos são mortais". E uma nova doença voltou a revelar para o século XX que a morte é absolutamente inevitável. Bastavam esses quatro elementos para definir a AIDS como extremamente revolucionária e explosiva. Se compararmos o número de suas vítimas e o pânico existente em torno dela, não há a menor proporção. Mas eu penso, estou convencido, de que existe uma razão objetiva e subjetiva para esse pânico. É que de fato estamos diante de uma epidemia mundial, que só será vencida pelo desenvolvimento científico, pela mudança de comportamento de alguns setores da população e pela intervenção da sociedade e do Estado, de forma radical e enérgica, no controle do sangue em nível mundial. Mas eu queria ainda fazer referência a algo que a AIDS desvelou no mundo contemporâneo: a questão dos preconceitos que essa sociedade guarda em relação às pessoas. Eu, quando decidi falar aberta e publicamente que estava contaminado pelo vírus da AIDS, sabia que podia dizer isso como hemofílico, que fui contaminado através de transfusões de sangue, mas eu já havia presenciado a morte e a tragédia de várias outras pessoas, que morreram de AIDS, que tiveram que morrer clandestinamente porque eram homossexuais ou drogados. E esses homossexuais e drogados haviam incorporado à culpabilidade, a discriminação da sociedade em relação a eles, e assumido isso de tal maneira, que preferiam à morte anônima a lutar pelos seus direitos. Uma vez fui procurado por uma jovem que me disse o seguinte: "Meu irmão é funcionário de uma empresa estatal, ele tem AIDS e não consegue se tratar em nenhum hospital: meu pai e eu é que temos que cuidar dele. Os hospitais se recusam, e a empresa não dá a menor assistência". Então, falei: "Se você quiser, nesse exato momento, vamos chamar a televisão, as rádios, os jornalistas e fazer essa denúncia". Ela respondeu: "Mas isso pode prejudicar meu irmão". E eu: "Minha amiga, você não disse que seu irmão está em estado terminal, morrendo?" "É". "E o que mais ele pode perder? Ele não vai morrer?" Ela disse: "É, ele vai morrer, mas eu tenho que pensar". Logo falei: "Bom, você pense e me diga: no momento que você quiser, vamos denunciar essa empresa estatal que está discriminando uma pessoa doente, por abuso e discriminação". Vinte dias depois, fui chamado pela mesma pessoa, que me disse: "Eu queria te agradecer porque fui conversar com a direção da empresa, exigi tratamento, disse que denunciaria essa discriminação e hoje meu irmão está morrendo com conforto, num hospital, com apartamento, com ar refrigerado, com tudo que ele tem direito". Essa pessoa se sentia feliz porque seu irmão estava morrendo em paz. Conhecendo esse e vários outros casos, percebi que a AIDS estava revelando, de forma trágica, o modo como a nossa sociedade discrimina as pessoas, discrimina o homossexual, discrimina a relação sexual, discrimina a privacidade das pessoas, o direito de existir da forma como a sua consciência julga ser necessário, ou de acordo com seus sentimentos ou com a sua vontade. E que ainda descarrega sua discriminação sobre a cabeça e as consciências dessas pessoas. E o mais trágico é que muitas delas internalizam essa discriminação e morrem na clandestinidade, sem lutar pelos seus direitos mais elementares, como, por exemplo, o direito de morrer em paz. Se não o de viver, mas o de morrer em paz. Essa talvez tenha sido uma das experiências mais difíceis para mim. Eu presenciava o fato em homossexuais, drogados, ou o que fosse, e estava diante das pessoas, não diante de objetos da minha condenação moral. Ao mesmo tempo, meus dois irmãos manifestavam a doença. E estávamos enfrentando esse problema ainda como clandestinos. Foi então que decidi sair da clandestinidade. Já havia vivido assim durante cinco anos, clandestino na ditadura militar; para mim era o suficiente. É inadmissível que alguém sofra por um vírus, uma doença, uma enfermidade, e que, além disso, além de ter de enfrentar a morte, ainda precise se esconder da sociedade e dos seus irmãos e irmãs. E a experiência que eu vivi ao dizer que era hemofílico e estava contaminado por AIDS, e que meus irmãos também estavam, é uma experiência extremamente positiva. Para mim e pelo menos para mais um, porque o outro irmão provavelmente não tem condições de perceber o que está acontecendo com ele. Ao romper a clandestinidade, ao denunciar a discriminação, recebi muita solidariedade. Solidariedade de amigos recentes, amigos de muito tempo, mas também de pessoas completamente desconhecidas, que nunca me viram, que nunca souberam nada a meu respeito, que me encontram na rua e demonstram apoio e afeto. Então, descobri também isso, que quando a gente aposta na dimensão negativa, à gente colhe a dimensão negativa. O pessimista sempre colhe a desgraça. Agora, quando se aposta na dimensão positiva, na solidariedade, também se colhe a dimensão positiva. Acho que é uma coisa perigosíssima admitirmos, em princípio, que as pessoas são ruins, que são más, egoístas e covardes. Acho que devemos partir do princípio oposto, e apostar nisso. E tomar o resto como exceção e não como regra. Há um caso ilustrativo. Meu filho de 05 anos e meio brincava sempre com duas crianças e, quando eu saí na televisão, no jornal ou no rádio, os dois amiguinhos desapareceram de nossa casa. Minha esposa pressentiu algum problema. A primeira reação nossa foi de profunda tristeza. Discriminar a mim que tenho 52 anos não me incomoda muito, mas discriminar uma criança de 05 anos e meio é triste. Triste e inadmissível. Decidimos chamar a família, o pai e a mãe das duas crianças, e eles vieram. Sentamos e dissemos: "Olha, nós sabemos que vocês devem estar preocupados com os filhos de vocês: é justo; todo pai e toda mãe se preocupam com os filhos, com a saúde deles, mas queremos dizer a vocês algumas coisas". Então demos, durante uma hora, mais ou menos, um curso prático sobre hemofilia, transfusão de sangue, contaminação genética. Falamos que nosso filho não é hemofílico, portanto não toma transfusão de sangue, portanto não está contaminado. Depois, mais meia hora sobre AIDS, as formas de contaminação, as formas de transmissão, como se transmite, como não transmite. E os dois escutavam muito atentamente e, depois dessa conversa, já estavam querendo saber sobre outras coisas, sobre onde tínhamos estado no exílio, curiosos sobre outras dimensões de nossa vida. Após duas horas de conversa, toda a questão estava resolvida. No outro dia cedo, as duas crianças amigas já estavam lá em casa, brincando com o nosso filho. E continuam brincando até hoje. Esse exemplo só nos mostrou o seguinte: a passividade, o pessimismo, a entrega ao que existe de pior, só reproduz o pior. Se não tivéssemos conversado com aquela família, provavelmente as crianças não estariam brincando com nosso filho. Mas, depois da conversa, da informação, da abertura, da confiança na capacidade deles de entender a questão e enfrentá-la, a situação mudou. Não quero dizer que todos vão ter condições de viver e de proceder como nós. A situação para os homossexuais é muito difícil, mas é possível fazer alguma coisa. Partindo da experiência pessoal, quero dizer o seguinte: a AIDS está produzindo um verdadeiro strip-tease da nossa sociedade, dos nossos valores, da nossa cultura, assim como do sistema de saúde em nosso país. Aqui, o sistema de saúde não existe para a prevenção. É um sistema da cura, da morte e do comércio. Desde há muito deficiente, foi destruído ao longo desses vinte e tantos anos de ditadura. Na verdade, nunca tivemos uma política séria de saúde pública, que estivesse voltada para interesses da população. Eu já disse que a AIDS era a ponta de um iceberg , porque é a ponta mais dramática, mais visível. Mas logo a seguir vem uma série de doenças endêmicas que poderiam ter sido absolutamente eliminadas do país, com pouco investimento e pouco recurso, e que até hoje não o foram, para vergonha nossa. O Brasil é um país tuberculoso, um país com doença de Chagas, com lepra, com esquistossomose e uma série de outras enfermidades que atingem a milhões de pessoas, sem contar aquelas que morrem sem estar doentes, porque morrem de fome. É o caso da mortalidade infantil no Nordeste e também (por que não?) nas periferias das nossas capitais. Há, porém, a consciência política de que não temos um sistema de saúde, mas de doença e comércio - exatamente esse comércio que produziu a calamidade do sangue, transformando-o em mercadoria e hoje transmitindo a morte, através da transfusão, pela AIDS, Hepatite B e várias outras doenças. Essa situação tem muito mais a ver com política e cidadania e direitos humanos do que com qualquer outra coisa. Nessa luta relacionada à AIDS tive uma revelação fantástica: descobri que o principal problema de saúde do Brasil era o ministro da Saúde. Ele, um ministro da Saúde de um país que ocupa o 2º lugar do mundo em casos absolutos de AIDS, nunca entendeu o que é uma epidemia, tendo tido a coragem de dizer que não importava AZT porque o Brasil tinha que fazer pesquisa científica para comprovar sua eficiência e proteger o consumidor. Isso quando sabemos que esse mesmo ministro permite a importação e o uso, aqui no Brasil, de drogas condenadas no mundo inteiro. Outro exemplo de como a gente enfrenta obstáculos onde não deveria haver, foi quando o diretor da Cacex, perguntado pelo jornalista se importaria ou não AZT, saiu-se com esta jóia: “AZT é coisa de bicha rica”. Pois bem, depois dessa, ele continuou em seu cargo, porque uma das coisas que se perdeu nesse país foi algo elementar, que se chama sentido de dignidade. Mas gostaria de terminar, dizendo o seguinte: creio que podemos transformar a tragédia da AIDS, da enfermidade e da doença num desafio, numa oportunidade, numa possibilidade de recuperar na nossa sociedade, em nós mesmos, em cada um de nós e em todos nós, o sentido da vida e da dignidade. E, com esse sentido da vida e da dignidade, seremos capazes de lutar pela construção de uma sociedade democrática, de uma sociedade justa e fraterna. CARTA CONTRA O PRECONCEITO Na sexta-feira dia 08/02/92, às 23 horas, decola do Aeroporto Internacional de Guarulhos, em São Paulo, o Vôo da Solidariedade. A bordo do avião, cerca de 100 intelectuais vão levar seu apoio ao povo cubano. Uma das poltronas poderia estar ocupada pelo sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, um dos que apóiam o vôo. Mas não está. No lugar do presidente da Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (ABIA), vai uma carta assinada por ele. Um protesto contra a política segregacionista do governo cubano em relação aos doentes da AIDS. Presidente Fidel Castro, Sou do tempo da Revolução Cubana. Defendi e defendo o direito do povo cubano fazer sua revolução e decidir o seu próprio destino sem interferência de inimigos ou amigos. Defendo para Cuba o que defendo para mim e para o meu próprio povo: liberdade, igualdade, participação, respeito, diversidade e solidariedade. Feita essa introdução, desejo apresentar uma questão e fazer um apelo. A questão é a AIDS. Sou hemofílico de nascimento e soropositivo há quase 10 anos. Sou também presidente da Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS desde 1986 e desenvolvo em meu país uma luta constante contra as políticas públicas do governo federal em relação à AIDS. A AIDS, desde o começo, foi apresentada como uma doença incurável e fatal, sem esperança e sem destino a não ser a morte. Essa posição não é correta, não tem base científica e é politicamente equivocada: a AIDS ainda não tem cura, mas poderá ter. A cura da AIDS está a caminho. A França, por exemplo, já se propõe a rever a própria definição da AIDS (SIDA) para doença degenerativa crônica. Essa visão fatalista e anticientífica da AIDS foi responsável pela disseminação de condutas discriminatórias, desumanas e terroristas em relação às vítimas da doença. Muita gente tomou carona na tragédia para expressar todos os seus preconceitos e culpar as vítimas e suas condutas, ao invés de atacar a causa real da doença: o vírus. Conhecendo a tradição humanista e revolucionária de Cuba, sabendo dos avanços de sua medicina, eu esperava que também Cuba se transformasse num exemplo mundial de como enfrentar a AIDS. O que li no Gramma e soube por pessoas que visitaram Cuba, no entanto, constitui para mim um choque: soube que os soropositivos são submetidos a um processo de controle por agentes sanitários, que se caracteriza por uma espécie de vigilância à curta distância para impedir que a pessoa contaminada contamine outras pessoas. Como sabemos que a transmissão do vírus se dá basicamente por via sexual, estaríamos diante do controle da vida sexual dos soropositivos por processos de vigilância que tenho dificuldades de imaginar como seriam feitos, além de discordar frontalmente de tal tipo de controle. Soube, também, que os doentes são levados aos hospitais e internados como doentes de AIDS, separados de suas famílias, do trabalho, de suas atividades. Para ser franco e direto: os doentes são segregados da sociedade pelo Estado e se transformam em presos políticos da epidemia. Digo políticos, porque não existe nenhuma razão científica, médica, ou de simples bom senso, para se prender doentes de AIDS a fim de prevenir a propagação da epidemia e proteger a saúde pública. Um doente de AIDS é, na verdade, aquele que menos oferece risco de contaminação, porque ele já sabe que pode transmitir, sabe como não transmitir, e, a não ser em casos patológicos, não quer transmitir sua doença a ninguém, muito menos a seus familiares e amigos. Os doentes de AIDS hoje podem passar a maior parte de seu tempo em suas próprias casas ou desenvolvendo atividades úteis, ao invés de se verem presos, segregados, discriminados como seres destinados a esperar a morte no leito da proteção pública. Sou capaz de imaginar uma sociedade, a cubana, onde os soropositivos e os doentes de AIDS recebam uma atenção e um carinho especiais de todos, onde não se sintam discriminados, nem isolados, nem identificados com o perigo mortal para a saúde pública da Nação. Onde os soropositivos trabalhem normalmente e onde os doentes possam também trabalhar, viver, conviver e se confrontar com a morte em meio à solidariedade que se traduz em convívio e não em segregação. Não falo como leigo. Falo como soropositivo que trabalha agora mais do que nunca e que jamais aceitaria ter um agente de saúde seguindo meus passos para verificar se sou um perverso propagador da epidemia. Falo como um soropositivo que vive com a mulher e filho, e que preferiria morrer a ser isolado no melhor hospital público quando os primeiros sinais da doença se instalassem, para esperar a morte incerta e imprevista, o que hoje pode levar até anos para se realizar. Quero também ter o direito de decidir sobre a forma, modo e o tempo de minha morte. A doença não pode ser um pretexto para que se retire de mim o direito à cidadania. Acredito firmemente que essas idéias deveriam ser muito mais desenvolvidas e possíveis em um país como Cuba e não no meu próprio, onde os pacientes de AIDS, na maioria das vezes, morrem sem as menores condições de assistência e ainda sofrem efeitos da propaganda oficial, que prima pelo terrorismo. Por tudo isso, quando surgiu a proposta dessa viagem a Cuba, que apoio, senti que eu tinha em relação a ela um caráter político e pessoal: como seria tratado em Cuba? Como os milhares de turistas que entram em Cuba sem apresentar os testes de HIV e que, sem saber, por isso mesmo podem se constituir num risco para a saúde pública do país? Eu só poderia entrar em Cuba como um soropositivo publicamente conhecido no Brasil e teria que apresentar meus pontos de vista e principalmente meu apelo: Se ainda existe vigilância organizada sobre os soropositivos, transformem essa relação em programas de educação e confiem na responsabilidade cívica, humana dos cubanos. Se ainda existe segregação dos doentes em hospitais - com a separação de suas famílias - que tudo isso acabe porque é desumano, é inútil, é inaceitável. Que essa viagem de solidariedade produza muitos frutos. Quero enviar junto a essa carta um grande e fraterno abraço para todo o povo cubano, um povo que aprendi a amar e admirar de longe e de perto, quando em 1968 estive representando o Brasil na OLAS (Organização Latino-Americana de Saúde). Agora que o presidente já tem quase o direito de se considerar eterno, gostaria de terminar com uma frase que vai começar uma nova postura nossa diante da AIDS: a AIDS não é mortal, mortais somos todos nós. A AIDS terá cura, e o seu remédio hoje é a solidariedade. Abraços e saudades, Herbert de Souza Presidente da ABIA (Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS) AIDS E POBREZA A AIDS, quando começou, parecia ser uma doença de Primeiro Mundo e de gente rica. Talvez, graças a isso, tenha despertado tanto investimento em pesquisa (apesar de insuficiente) e tanto interesse na mídia. Com o tempo, verificou-se que a AIDS era uma epidemia mundial que se deslocava do Primeiro para o Terceiro Mundo, constituindo-se numa verdadeira tragédia em vários países da África e que cada região apresentava a cara social de seu país. Tornou-se mundial e ligada, principalmente, à pobreza. Mas o tratamento da AIDS em qualquer país exige muita atenção médica, e é caro. É caro tomar AZT, são caros os remédios para prevenir ou combater as infecções, é caro internar um doente com AIDS. Enfim, a AIDS é muito cara, e não prevenir a doença fica mais caro ainda. No Brasil não é diferente. A maioria das pessoas infectadas com o vírus, ou doentes, são pobres e não conseguem recursos públicos ou particulares para ter o atendimento de que necessitam, nem para a prevenção nem para o tratamento. Diria, mesmo, que a maioria dos pobres com AIDS morrem sem saber do que morrem. Em algumas poucas clínicas particulares, estão os doentes ricos, pagando um custo que desafia qualquer patrimônio familiar. Em alguns hospitais públicos, estão os pobres, onde, além do atendimento médico solidário e humano, carecem de meios para comprar o que a ciência moderna já colocou à disposição de todos em termos de diagnósticos sofisticados e remédios eficientes. Em relação à AIDS, como em relação a várias outras coisas, o apartheid social se manifesta. Quem é rico se trata e tem uma qualidade de vida muito melhor. Quem é pobre sofre e morre sem condições mínimas de atendimento. Essa diferença se manifesta concretamente em qualidade e tempo de vida. Quando a AIDS surgiu, nos anos 80, pouco se sabia sobre as diferenças entre contaminado e doente morriam em muito pouco tempo. Era questão de um ano entre a notícia e a morte. Com o surgimento das primeiras drogas que controlavam o desenvolvimento do vírus e o acúmulo do conhecimento clínico que acelerava o diagnóstico e tratamento das infecções oportunistas, o tempo de vida foi aumentando de forma muito significativa. Hoje se sabe que uma pessoa pode ficar contaminada sem manifestar a doença por muito tempo, entre 10 e 15 anos, e que alguns podem viver sem que a doença se manifeste. Estar com o vírus não é mais sinônimo de ficar doente. Hoje se sabe que uma pessoa doente que recebe todos os tratamentos e cuidados necessários pode sobreviver com a doença por muitos ou vários anos, três a quatro vezes mais do que se vivia antes. Tudo isso significa que, em grande medida, viver ou morrer depende do tratamento já existente. Quem se trata sobrevive. Quem não se trata morre. A vida cobra a conta. A morte iguala. Quem tem recursos pode apostar na cura que virá. Pode ter a alegria de viver a cura de uma epidemia que assustou e ainda assusta o mundo. Quem não tem recursos vai saber que seu tempo é do tamanho de sua conta bancária e que, no Brasil, viver ou morrer é em grande medida uma questão social, já que, no caso da AIDS, ser rico ou pobre significa viver mais, ou menos, tempo. Para uma pessoa doente e pobre, estar com AIDS é um drama duplo: o de ser pobre e o de sofrer as conseqüências de uma epidemia que ainda está em processo de controle e a caminho da cura, e, principalmente, o de saber que seu tempo de vida vai ser tão roubado quanto seu salário, suas esperanças, sua qualidade de vida, sua cidadania. Nesse quadro é triste ver como o poder público, em nível federal, estadual e municipal, em geral e com apenas raras exceções, está totalmente indiferente a essa tragédia. De costas para a epidemia, ignora o imenso sofrimento dos pobres e espera que a morte ocupe o lugar da vida, negando as possibilidades de tratamento, que só existem para uns poucos. É triste saber que, até em relação à AIDS, o apartheid social existe e que aqui, entre nós, existe uma Beláfrica. CONFESSO QUE ESTOU VIVO Assim como todo brasileiro, eu vejo televisão. Depois de um dia de trabalho intenso, cheguei em casa e liguei a TV para ver os noticiários, quando fui pego de surpresa. Aparecia na tela um jovem que dizia ter sido tuberculoso, mas que estava curado. Respirei aliviado. Uma jovem dizia que tinha câncer e que se curou. Fiquei mais animado ainda com o progresso da medicina. Logo entra um jovem, olha para mim e diz: "Eu tenho AIDS e não tenho cura!". Depois li nos jornais que a segunda etapa dessa campanha veiculada pela TV começaria. No carnaval ia aparecer a máscara negra - o negro da morte e do racismo - para continuar o didático processo de assustar a população, uma espécie de terrorismo pedagógico com seqüestro da esperança. Fiquei parado por um tempo, pensando, com amarga sensação de que alguém me estava puxando para baixo, para a idéia da morte, para o fundo do poço. Custava a crer que fosse uma propaganda promovida pelo Ministério da Saúde, mas era. Lembrei-me de que a AIDS havia aparecido em 1981, ligada à idéia da morte, doença fatal, vírus invencível, morte com data marcada. Estar com AIDS era estar marcado para morrer muito mais rápido do que qualquer mortal. Os primeiros doentes de AIDS percorreram em pouco tempo esse caminho do sofrimento terrível, da discriminação e da morte. Acompanhei e presenciei a morte de meus dois irmãos hemofílicos, Henfil e Francisco Mario. Na morte de Henfil, Francisco, sabendo que iria morrer, não resistiu à tentação de prever a minha morte. Generosamente me deu três anos! Com o tempo muita coisa foi mudando. O vírus foi perdendo sua invencibilidade e seu caráter de absoluta excepcionalidade. Veio o AZT, que não cura, mas controla em muitos casos o desenvolvimento da doença. Vieram várias outras drogas que estão sendo testadas e administradas, como o DDI e vários outros. Vieram os tratamentos preventivos nos soropositivos e nos doentes, como o uso de pentamidine para combater a pneumonia mais comum entre os doentes de AIDS (Pneumocistis carini). Os prazos de manifestação da doença foram se alargando para 7, 10, 15 anos. Os prazos de sobrevivência dos doentes romperam a barreira do ano e meio. A vacina deixou de ser uma pura hipótese e está sendo testada. Enfim, a AIDS foi e está sendo enfrentada como uma doença que ainda não tem cura, mas que já pode ser em grande medida controlada e que, num prazo ainda não determinado, poderá ser curada ou definitivamente controlada, como já ocorreu com tantas outras doenças incuráveis da história. Lembro-me de que sou um incurável hemofílico, fui um incurável tuberculoso aos 15 anos e um incurável maoísta nos anos 70. Hoje me sinto curado de todas essas doenças. Depois de me preparar para morrer em dois anos - fiz também meus cálculos - e de verificar que já se passaram quase três anos de minha morte anunciada, cheguei à conclusão de que o melhor que faço é me preparar mesmo para continuar vivendo. Tenho ainda e gozo de boa saúde e grande disposição para o trabalho, principalmente político, como: lutar pela democratização do país, contra os pacotes econômicos, participar de campanhas de saúde, particularmente AIDS, recuperação do Rio de Janeiro, defesa dos direitos humanos, proteção ao meio ambiente, reforma agrária, entre outras questões. Nesse período de preparação para a morte, cheguei mesmo a propor a meu xará Herbert Daniel a compra comum de uma sepultura no Cemitério São João Batista, dado o alto preço desse bem essencial e a economia que faríamos, colocando na mesma tumba um nome e dois sobrenomes. Herbert Daniel chegou a facilitar a minha proposta, dizendo que ele queria ser cremado, o que obviamente me daria muito mais espaço pelo mesmo preço. Hoje me vejo em situação embaraçosa para mim e para meus amigos. Minha morte não ocorreu. Tive de assistir desolado à morte de vários amigos que se foram antes de mim. Minha saúde continua boa, apesar de todas as campanhas do Ministério da Saúde e de todos os remédios que tomo, incluindo a cerveja, que até hoje não apresentou nenhum efeito colateral com o AZT. Trabalho intensamente como se estivesse realmente vivo. Vou ao cinema e a shows musicais sem provocar nenhum espanto entre aqueles que me vêem vivo. Escrevo para jornais. Dou entrevistas para rádios e televisões nacionais e estrangeiras, demonstrando sinais inequívocos de inteligência, agilidade e bom humor (salvo quando falo da equipe econômica do governo). Meu analista, desesperado com a minha insistência em não morrer, já propôs o fim do tratamento. Meu médico imunologista já recebe com visível inquietação os resultados normais de meus hemogramas. Minha companheira muitas vezes se esquece de minha situação e me trata com a absoluta e notável naturalidade. Foi aí que a propaganda do Ministério da Saúde veio me recolocar no meu devido lugar e apontar um caminho. Gravei em vídeo a mensagem e agora passei a ver a propaganda toda vez que desperto e antes de dormir. "Tenho AIDS e não tem cura!". Decidi então acrescentar, ou aperfeiçoar o vídeo do governo (pago por muitas empresas que querem fazer o bem para as pessoas com AIDS), uma mensagem minha para mim mesmo, que diz: "Convença-se disso, seu imbecil. O Ministério da Saúde sabe o que é bom para você. O governo só quer o seu bem! Cancele todos os seus compromissos de hoje, principalmente os políticos. Vista-se de preto para ficar mais apropriado à sua situação. Acabe com esse sorriso sem sentido que brota de sua boca. Mande sua companheira e filhos para lugares bem distantes para que não vejam o seu fim tão próximo. Feche a porta. Venha de lá um abraço. Dr. Alceni. Abra o gás!". A AIDS NÃO É MORTAL Mortais somos todos nós . A AIDS surgiu nos anos 80 como uma doença mortal e sem cura. Um vírus, transmitido pela relação sexual ou pelo sangue, entrava no sistema imunitário e protegido, por estar dentro dele, o destruía de forma inexorável, deixando suas vítimas expostas a todo tipo de doenças que, em última análise, determinavam numa morte rápida, trágica e sem remédio. Associando sexo e morte, a AIDS transformou-se na bomba do século vinte, que pretendia haver liberado o sexo e estar anulando gradualmente a morte. De repente, a ciência estava impotente diante de um vírus e a morte era de novo inevitável. O conhecimento inicial sobre a AIDS definiu uma teoria de que não havia possibilidade de cura, era uma doença incurável. Toda pessoa afetada, tocada, atingida pelo vírus HIV estava duplamente condenada. Primeiro, a morrer como todas as pessoas e segundo, a morrer muito mais rápida e tragicamente do que todas as demais, como se pudesse haver uma dose dupla de morte para uma única pessoa. Esse nascimento trágico determinou até agora as atitudes básicas diante da AIDS: o medo, a impotência, a fuga, a clandestinidade, a omissão, o terror e o abandono. Na contramão, vieram os que lutaram contra o preconceito e o pânico e pregavam a solidariedade como o único remédio disponível para curar os terrores de tal epidemia. Mas vinham também com a idéia da morte nas mãos. As pessoas afetadas pelo vírus se viram diante do trágico e não de uma doença. Os cientistas se viram diante da impotência da cura e não do desafio da descoberta que tem que inventar caminhos. Os governos praticaram o terrorismo e incorporaram todos os preconceitos que a sociedade inspirava, decretando, na maioria dos casos, a morte civil dos portadores do vírus fatal. Diante de uma epidemia fatal, que atacava homossexuais, drogados e hemofílicos, os governos optaram por tentar proteger - através de campanhas terroristas - aqueles que não tinham sido contaminados e deixar no abandono as "minorias" que já haviam sido tocadas pela fatalidade, cuja via era o sexo promíscuo ou o sangue contaminado e cujo destino era a morte. Os hemofílicos eram as vítimas inocentes de uma tragédia onde os verdadeiros culpados, os promíscuos sexuais e os drogados, pagariam com a morte em conseqüência de seus próprios atos. O vírus da AIDS era uma espécie de guilhotina que caía sobre a cabeça dos culpados. Muita gente tomou carona no vírus para propagar suas idéias, valores e preconceitos. Dez anos se passaram. Muita coisa mudou e não passou ao conhecimento do público, outras continuam iguais apesar de todas essas mudanças. O conhecimento científico trabalha hoje com a idéia da possibilidade da cura ou controle da doença: foram criados remédios que controlam o desenvolvimento do vírus (AZT), os virostáticos, e estão sendo pesquisados remédios que poderão destruir o próprio vírus, os viricidas. Cerca de 11 tipos de vacinas estão sendo testadas, o que poderia abrir a porta para a prevenção em massa das populações não afetadas e para o controle da doença nas pessoas já atingidas. As pessoas infectadas pelo vírus, os soropositivos, que, no princípio se pensava, podiam viver somente alguns poucos anos, têm hoje uma expectativa média de vida, sem o desenvolvimento da doença, da ordem de 9 a 10 anos, e admite-se até que uma porcentagem delas possa não desenvolver a doença. No campo da clínica médica, o monitoramento dos soropositivos e o tratamento das pessoas com AIDS foram passos importantes para prolongar e melhorar a qualidade de vida das pessoas. Em muitos países, não no Brasil, a qualidade das campanhas educativas vai produzindo efeitos, contribuindo para a modificação de hábitos que ajudam na prevenção. A idéia dos grupos de risco, que servia para isolar e discriminar as vítimas, foi abandonada. Fala-se hoje em comportamentos de risco e sabese que, em tese, todas as pessoas podem vir a serem afetadas pela epidemia: heterossexuais, bissexuais, homossexuais, homens, mulheres de todas as idades. A mais importante de todas as mudanças, no entanto, é que hoje se pode dizer que a AIDS ainda não tem cura, mas poderá ter. Que a AIDS é curável e que a cura ou o controle da doença é uma questão de tempo. Uma pessoa infectada hoje pelo vírus pode organizar sua vida na expectativa de viver uma década em condições de normalidade, tempo talvez suficiente para que se anuncie a cura definitiva da doença. Acabar com o mito da fatalidade da AIDS é absolutamente necessário para que possamos mudar os comportamentos e as atitudes das pessoas e dos governos. É necessário ver a AIDS como uma doença que poderá ser curada, tratada e controlada e não como morte imediata e inelutável. No caldo de cultura do terror e do fatalismo, não há mudança possível. As pessoas continuarão a contaminar seus parceiros ou parceiras. As pessoas que ainda não foram contaminadas não estarão dispostas a se confrontar com algo que não tem saída, nem salvação. Do terror das campanhas se foge. Da fatalidade se tenta escapar. Qualquer racionalidade é vista como absurda ou como heroísmo sem futuro. É necessário comunicar a toda a sociedade que a ciência avançou e avança e que os dias da AIDS estão contados. A esperança não é um ato de irracionalidade, é uma esperança que anda de braços dados com a vida e com a solidariedade. Viver sob o signo da morte não é viver. Se a morte é inelutável, o importante é saber viver, e para isso é importante reduzir o vírus da AIDS à sua real dimensão: um desafio a ser vencido. É fundamental, portanto, reafirmar que esse vírus não é mortal. Mortais somos todos nós. Isso sim é o inelutável e faz parte da vida. (Dedico este artigo a Herbert Daniel, aquele que sempre esteve e está ao lado da vida). O DIA DA CURA Numa manhã comum, como qualquer outra, abri o jornal e li a manchete: Descoberta a Cura da AIDS! A princípio fiquei deslocado na cama, como se a terra tivesse saído do lugar e meu quarto estivesse mais à esquerda do que de costume. Fiquei por um tempo parado, sem saber qual deveria ser o primeiro ato de uma pessoa de novo condenada a viver. Primeiro, certificar-se. Telefonei para o meu médico. Realmente, a notícia era sólida, e o próprio presidente dava declarações na TV americana assumindo a veracidade do fato: dez pacientes em estado avançado da doença haviam tomado o CD2 e não apresentavam nenhum sinal ou sintoma da presença do vírus em seus organismos. Um eficiente viricida fora descoberto. As outras notícias seguiam o mesmo curso. O laboratório do CD2 tivera uma espetacular alta na bolsa de Nova Iorque. Na França, o Instituto Pasteur dizia que outra coincidência acompanhava os caprichos da ciência. Ali também o SD2 estava no forno, quase pronto para ser anunciado. Telefonei para o meu analista. Dei a notícia sobre a cura da AIDS e decidi que só enfrentaria a felicidade nas próximas sessões. Afinal me havia preparado tanto para a morte que a vida agora era um problema. Do meu lado, Maria ainda dormia e não sabia que nossa vida havia mudado. Casados há 21 anos, os últimos tinham sido um tempo de tensão a cada gripe, mancha na pele, febre sem explicação. O amor feito durante tanto tempo e que havia sido interrompido pelo medo do contágio, do descuido, do imponderável, estava agora ao alcance da vida como um milagre, apesar de meus 56 anos, como costuma insistir um jornal paulista. Pensei comigo mesmo, camisinhas nunca mais! Maria dormia, ainda não sabia da novidade. Ela agora poderia ser viúva de outras coisas mais banais, mais correntes, mais normais. Ela não mais seria a viúva da AIDS. Grandes avanços. Tinha os filhos para avisar. Não mais seriam órfãos da AIDS. O pai agora tinha algo de imortal ou podia morrer como todo os mortais. A TV continuava a mostrar cenas incríveis em Nova Iorque, e o meu telefone já começava a tocar. Afinal, eu havia sido, durante quase dez anos o entrevistado perfeito para o caso da AIDS: era hemofílico, contaminado e sociólogo. Podia desempenhar três papéis num só tempo e numa só pessoa. Eu era uma espécie de trindade aidética! Iam querer saber o que sentia, o que faria, meus primeiros atos, minhas emoções, minhas reações diante da vida e da normalidade. Imaginava as perguntas: como você se sente agora que é de novo um ser normal? O que vai fazer agora de sua vida? O que efetivamente mudou na sua vida? O que você aprendeu com a AIDS? Você continua a ter raiva do governo? Cheguei a pensar, como Chico Buarque, que daria minha primeira entrevista ao Jô Soares. Afinal, falaria da vida, tomando cerveja! Ainda na cama, onde, de manhã, gosto de ficar, tive saudades do Henfil e do Chico, e em meio à alegria que já me contagiava, chorei. Por que haviam sofrido tanto e morrido tão fora de hora? Quanto sofrimento inútil, quanta dor que palavras não descrevem. O olhar parado de quem expira. O abandono sem remédio. A fatalidade que nem a morte enterra? Por que logo eles haviam morrido, se eram meus irmãos, a quem telefonava com a certeza de quem acreditava poder fazer isso séculos e séculos seguidos? De repente, ninguém do outro lado da linha. Números riscados numa agenda sem remédio. Ainda a lembrança do Chico no enterro do Henfil, dizendo para mim, entre espanto e humor: hoje é o Henfil, amanhã serei eu, e você irá daqui a 03 anos... Bem, digamos 05! E hoje estou aqui passados 04 anos, quase 05, lendo essa notícia, e eles todos mortos antes do tempo. Não há remédio para a morte de meus irmãos, que são tantos. De repente me dou conta de que houve realmente remédio para a AIDS. É hora de levantar, atender os telefonemas, reunir o pessoal da ABIA. Festejar com o pessoal do IBASE. Abrir um champanhe, ou uma cerveja. Telefonar para saber onde estava o tal remédio, como comprá-lo, o preço, o prazo da chegada. Estaria disponível quando, a que preço? Quem poderia comprá-lo? Algo inusitado acontecia em paralelo. Amigos e amigas, que não suspeitava, me chamavam para dizer que eles também eram soropositivos, porque agora havia cura. Uns diziam que suas vidas sexuais eram um caos, mas que agora havia cura. Alguns me chamavam para dizer que iriam começar o tratamento, o controle e a pensar na vida, porque agora havia cura. E, finalmente, outros me diziam que agora poderiam revelar a imprensa sua condição de soropositivos, para servir de exemplo, porque agora havia cura. De repente, dei-me conta de que tudo havia mudado porque havia cura. Que a idéia da morte inevitável paralisa. Que a idéia da vida mobiliza... Mesmo que a morte seja inevitável, como sabemos. Acordar, sabendo que se vai viver, faz tudo ter sentido de vida. Acordar pensando que se vai morrer faz tudo perder o sentido. A idéia da morte é a própria morte instalada. De repente, dei-me conta de que a cura da AIDS existia antes mesmo de existir, e de que seu nome era vida. Foi de repente, como tudo acontece. Artigo publicado em: "Escritos indignados: Democracia x neoliberalismo no Brasil", Rio de Janeiro : Rio Fundo Editora/IBASE, 1993. A DEMOCRACIA NO BRASIL A democracia é uma das mais antigas idéias da humanidade. Jamais realizada plenamente. Em seu nome já se fez muito bem e se praticou muito mal. Tem servido ao longo desse período tanto para inspirar movimentos libertadores como para justificar golpes militares e regimes de opressão. Para alguns é apenas uma forma de governo, derivada de eleições diretas que só existe nos países capitalistas. Para outros é algo mais profundo que afeta a todas as relações da sociedade (econômicas, sociais, políticas, culturais) em busca da igualdade e que, portanto não existe nas sociedades capitalistas. É uma utopia, uma inspiração radical de transformação da sociedade. Uma idéiaforça que ilumina a história humana. Sempre presente e jamais plenamente realizada e, por isso mesmo, motor permanente de transformação da própria humanidade. A democracia é o igual e o diverso. O encontro de liberdades. A convergência da pessoa e da comunidade. Da sociedade civil e do Estado (administração do bem público). A democracia é o atendimento do básico e do transcendental. Do Pão e da Liberdade. Do finito e do infinito. Do Eu e do Nós. É a afirmação da consciência, no mundo de sua falsificação em relações coisificadas. Democracia é obra sem limite e portanto inacabável. Mas democracia é exatamente aquilo que fizermos dela e por isso é fundamental inventá-la a todos os níveis e a cada momento. A democracia se constrói em torno de alguns princípios fundamentais, simples em seu enunciado, complexos e radicais em sua realização histórica: igualdade, liberdade, diversidade, solidariedade, participação. Pensar a realidade brasileira à luz da democracia é rever o passado, entender o presente e refletir sobre o futuro, tendo como referência esses princípios básicos. A PRODUÇÃO DA DESIGUALDADE A nossa história é a produção da desigualdade. Há um passado do Brasil, no entanto, que o Brasil desconhece. É aquele vivido pelos povos indígenas antes da chegada dos colonizadores portugueses em 1500. (...) Com a chegada pos portugueses se dá início à produção da desigualdade, imposta através da guerra e extermínio dos povos indígenas, da escravidão de povos africanos e da implantação de uma estrutura econômica e política fundada no domínio da coroa e dos grandes proprietários locais. Esse passado mostra o processo de concentração da propriedade da terra, da riqueza e do poder nas mãos de uma minoria, ao lado da marginalização, exclusão e dominação da maioria em relação a esses bens e a participação no poder. O desenvolvimento da produção no Brasil não teve como contrapartida o desenvolvimento da cidadania. Ele se fez exatamente à custa de sua negação. Senhor e escravo, dono de engenho e camponês submetido, latifundiário e deserdados da terra constituem os pares desse Brasil. Se a cidadania não se dá na sociedade ela também não se reflete no Estado, autoritário, centralizador. O Estado institucionaliza a exclusão, organiza e mantém a desigualdade. (...) O desenvolvimento dessas desigualdades chegou a tal ponto que o Estado se desgarrou totalmente da sociedade e uma crise geral de legitimidade e governabilidade obrigou a ditadura a abrir o caminho para a democratização. É verdade que cerca de 10 a 15% da população ganharam com a industrialização internacionalizada. Ás custas do resto que ficou na margem. Foi então que um certo ministro da economia de nome Delfim Netto aplicou a teoria do bolo que deveria primeiro crescer para depois ser dividido. Essa teoria não explicava porque os donos do bolo deveriam dividir o seu bolo, nem quando esse fato inusitado de caridade capitalista ou social democrata deveria se dar. Nesse caso a culinária fracassou. O controle dos meios de comunicação de massa constitui privilégios de alguns grupos que editam a realidade do país segundo interesses e visões onde o que menos importa é o que efetivamente acontece, mas em benefício de quem acontece. A mídia se apropriou do imaginário e com ela tenta dirigir a realidade em benefício da ordem dominante, excludente. A questão hoje é de se saber se a mídia é o quarto ou o primeiro poder da república e como sua gestão pode ser democratizada. Os bens do poder são escassos para quem tem de lutar diariamente para sobreviver. A CIDADANIA O direito de votar para presidente da República é um passo fundamental, mas é só o primeiro na luta por restaurar os direitos da cidadania e o poder da sociedade civil sobre o Estado. É que na política os bens estão também distribuídos de forma desigual. (...) O capitalismo é menor que a sociedade. Sobra sociedade e se tenta substituir o capitalismo e conter o excesso da sociedade através do Estado. Introduzir milhões na vida, nas relações, na sociedade brasileira é a questão central da democracia. Não há como fazer Democracia só para alguns, como uma ação entre amigos. As condições institucionais básicas estão dadas para que a luta pela Democracia sobreviva à crise econômica e social e se transforme no instrumento fundamental para a solução de todos os problemas da sociedade. Resta seguir os seus caminhos através da participação, da garantia das liberdades, da aceitação da diversidade e fundamentalmente do esforço permanente de superação de todas as desigualdades. Para isso serve a democracia, e somente ela. Da democracia estamos ainda muito longe, mas estamos a caminho. está ainda no horizonte de uma conquista a ser feita pela maioria. ------------------------------------ SELEÇÃO DE FRASES E PENSAMENTOS HERBERT DE SOUZA-BETINHO Ética "Em resposta a uma ética da exclusão, estamos todos desafiados a praticar uma ética da solidariedade." (1993) Transformações "O que nos falta é a capacidade de traduzir em proposta aquilo que ilumina a nossa inteligência e mobiliza nossos corações: a construção de um novo mundo."(1993) Sociedades "Quando uma sociedade deixa matar crianças é porque começou seu suicídio como sociedade." (1991) "Um país não muda pela sua economia, sua política e nem mesmo sua ciência; muda sim pela sua cultura." (1993) Inclusão "A democratização das nossas sociedades se constrói a partir da democratização das informações, do conhecimento, das mídias, da formulação e debate dos caminhos e dos processos de mudança." (1991) "A terra e a democracia aqui não se encontram. Negam-se, renegam-se. Por isso, para se chegar a democracia é fundamental abrir a terra, romper essas cercas que excluem e matam, universalizar esse bem, acabar com o absurdo, restabelecer os caminhos fechados, as trilhas cercadas, os rios e lagos apropriados por quem, julgando-se dono do mundo, na verdade o rouba de todos os demais." (1994) Essência "A luta pela democracia é que desenvolve o mundo e ela se constrói com e através da comunicação."(1993) "Toda informação é, de certa forma, uma proposta ou elemento de formulação de propostas. É matéria-prima fundamental da ação política e, portanto, do trabalho cotidiano dos movimentos populares." (1990) Olhares "É preciso olhar a propriedade da terra com o olhar da democracia, com o olhar da vida, e não com o olhar da cobiça, da cerca, da violência..." (1994) "É importante ver, com os dois olhos, os dois lados - para mudar uma única realidade, a que temos." (1997) "Essas crianças estão nas ruas porque, no Brasil, ser pobre é estar condenado à marginalidade. Estão nas ruas porque suas famílias foram destruídas. Estão nas ruas porque nos omitimos. Estão nas ruas, e estão sendo assassinadas." (1992) "No Brasil não existia o controle do sangue: a Aids era desconhecida. Ele não existia também para outras doenças. Assistimos ao comércio de sangue, uma irresponsabilidade total. Neste sentido, a Aids salvou o sangue." Passos "Não podemos aceitar a teoria de que se o pé é grande e o sapato, pequeno, devemos cortar "Para fundamental que que um novo o pé. nascer um Temos novo de Brasil, trocar humano, de sapato." solidário, (1995) democrático , é uma nova cultura se estabeleça, que uma nova economia se implante e poder expresse a sociedade democrática e a democracia no Estado." Humanidade "O desenvolvimento humano só existirá se a sociedade civil afirmar cinco pontos fundamentais: igualdade, diversidade, participação, solidariedade e liberdade." (1994) "Democracia serve para todos ou não serve para nada." (1995) SUAS OBRAS SOUZA, Herbert de. A Centopéia que Pensava. 1. ed. : Salamandra, 1999 SOUZA, Herbert de. A Centopéia que Sonhava. 2. ed. : Salamandra,1999 SOUZA, Herbert de. A Lista de Ailce 1.ed. : Cia das Letras, 1996 SOUZA, Herbert de. A Cura da Aids . 1. ed. : Relume Dumará, 1994 SOUZA, Herbert de. A Zeropéia, : ed. Salamandra,1994 SOUZA,Herbert de. Como Se Faz Análise de Conjuntura : Vozes, 2001 SOUZA, Herbert de. et al. Estreitos Nós - Lembranças de um Semeador de Utopias : Garamond, 2001 SOUZA, Herbert de. Ética e Cidadania - Col. Polêmica : Moderna, 1996 SOUZA, Herbert de. Miltopéia - A Centopéia Solidária : Salamandra, 1998 SOUZA, Herbert de. Revoluções da Minha Geração - Col. Polemica: Moderna, 1997 SOUZA.Herbert José de.No fio da navalha.1.ed. : Revan, 1996 SOUZA, Herbert de; AFONSO, Carlos A. O Estado e Desenvolvimento do Capital No Brasil 1. ed. : Paz e Terra, 1977 SOUZA, Herbert de. et al. Em Defesa do Interesse Nacional. 3. ed.: Paz e Terra,1994 SOUZA, Herbert de. Escritos Indignados: Democracia x neoliberalismo, Rio de Janeiro: ed.: Rio Fundo/IBASE, 1993 ANEXO I OBRAS – SINOPSES 1. A Centopéia que Pensava Um belo dia, Dona Centopéia descobriu que, além de suas cem patinhas, ela tinha uma cabeça e que podia pensar. Ela podia ter idéias, inventar histórias, fazer as coisas acontecerem dentro de sua cabeça antes que acontecessem fora. Descobriu, também, que por meio do pensamento é possível fazer muito bem ou muito mal para os outros e até mudar o mundo. Pronto, estava dado o primeiro passo para várias outras descobertas. Junto com seus amigos, Dona Centopéia procurará respostas para grandes e pequenas questões que envolvem esse grande mistério que é a vida. 2. A Centopéia que Sonhava Quem nunca sonhou poder voar como um pássaro? Ou nadar como um peixe? Que maravilhoso seria cantar como um sabiá! Dona Centopéia sonhava fazer tudo isso, mas tinha as suas limitações, como todas as pessoas e bichos. Neste livro, Betinho nos mostra que, sozinhos, podemos muito pouco, mas quando nos ajudamos uns aos outros, conseguimos realizar nossos sonhos. Não é difícil imaginar o porquê de tanta sensibilidade para falar de sonhos compartilhados. Betinho nunca sonhava sozinho. 3. A Lista de Ailce Era uma vez Bocaiúva e seus habitantes... Esta poderia ser a maneira de ler o livro de Herbert de Souza, o Betinho, que retorna à cidade onde nasceu através de uma lista de nomes preparados a seu pedido pela prima Ailce. Só que teríamos de aumentar a frase : Era uma vez Bocaiúva e seus habitantes... que morreram. Os nomes listados dão origem a pequenos necrológios, só que diferentes das notícias de morte publicadas nos jornais que tratam de gente ilustre. Os necrológios de A lista de Ailce contam breves e saborosas histórias de vidas de homens e mulheres que habitaram a infância de Betinho na pequena cidade mineira. Uma galeria de figuras ímpares, que inclui o tio colecionador de tudo e chefe do correio local, os casais perfeitos e os imperfeitos, o médico que errava diagnósticos, o primo suicida, os mendigos e os padres, as mulheres avançadas para o seu tempo. E outra galeria: a dos tipos mineiramente chamados de sistemáticos, os loucos internados na casa da própria família, além da mulher opiniática, que toma decisões à revelia do marido, e do apaixonado, o homem desiludido que adoece de frustração. Até o político famoso - José Maria Alkimin - ganha seu necrológio, em que se destaca a capacidade de fazer promessas e nunca cumpri-las. A genealogia familiar comparece em peso: José Maria, o primeiro irmão hemofílico a morrer, a avó Dona Mariquinha - a mãe-grande e controladora de todos os movimentos da família -, as tias, a irmã, os irmãos mortos pela AIDS, o pai Henrique e a mãe, Dona Maria, destinatária das famosas cartas para a mãe escritas por Henfil para a imprensa e para a TV nos anos 70. De cada personagem se narra um pedacinho da vida, aquele que melhor define uma fragilidade ou uma grandeza. Afinal, quase todos, antes de morrerem, viveram muito. Fazendo a crônica dos mortos de Bocaiúva, Betinho vai reunindo lembranças: as namoradas encantadas da infância, o quarto de menino tuberculoso nos fundos da casa, a iniciação na militância política ainda na juventude e, ao final, desenha um esboço de auto-retrato. Narrando histórias de cidades do interior, que se repetem em qualquer parte do mundo, Betinho cria uma família literária para 4. A Cura da Aids Seis Ensaios Sobre Aids e Política de Saúde. 5. A Zeropéia Dona Centopéia caminhava com suas cem patinhas pela floresta, quando encontrou uma barata. Ágil e esperta, a barata ficou muito assustada com a grande quantidade de patas da Centopéia. Ela tinha apenas seis patas e podia correr, subir em paredes, fugir das chineladas... Por que a Centopéia precisava de cem patas? Outros bichos e outros problemas surgirão no caminho da Centopéia. Mas a solução, a Centopéia descobrirá dentro de si mesma. Este foi o caminho que Betinho encontrou para mostrar à criança que precisamos, antes de tudo, gostar de nós mesmos. Respeitar as opiniões diferentes não significa abdicar de nossas próprias idéias. 6. Como se faz análise de Conjuntura Conforme o pensar do autor, todos, em tudo que fazem, analisam conjunturalmente. Este livrinho, no entanto, quer mostrar que a análise de conjuntura consiste numa técnica e, por isto, é uma mistura de conhecimento e descoberta, uma leitura especial da realidade, que se faz sempre em função de alguma necessidade ou interesse. 7. Estreitos Nós - Lembranças de um Semeador de Utopias Este pequeno-grande livro comunica que Betinho continua, transvivenciando aquele novembro de 1935, ao sair do útero quentinho da Dona Maria, e muito além de agosto de 1997, quando seu corpo deu o último suspiro. Quem são os "evangelistas" dessa notícia solar? Não são anjos, nem santos, nem profetas. Somos nós, seus amigos e amigas "de copo e de cruz". Ateus, judeus, cristãos, orientalistas, agnósticos. Românticos e ultrarealistas. Artistas e cientistas. Inconformados e falíveis, todos. Mas o primeiro arauto dessa ressurreição é o próprio Betinho, com a carta que escreveu à sua sempre amada Maria, já com a extra-lucidez e a suprema liberdade dos que se sabem perto do fim. Com esta consciência de ser finito e ultrapassável, Betinho assinalou o que fica para sempre: um sentido para a vida, o ideal de deixar o mundo um pouquinho melhor do que quando nele entramos. Atenção, leitor(a): você não tem em mãos a biografia de um admirável homem público, escrita por duas dezenas de autores famosos. O que você vai ler é uma sacudidela na tentação da vidinha frouxa, ensimesmada. Pois Betinho soube ser um louco-manso, heroicamente mortal, semeador de utopias. Ele continua em todos nós, estreitos e amplos nós. 8. Ética e Cidadania Numa entrevista em que fala do golpe de 64, da clandestinidade, do exílio e da anistia que o trouxe de volta, Betinho demonstra que há no Brasil uma enorme fome de ética, que apenas começou a se manifestar, e que democracia e miséria são incompatíveis. Este livro é um testemunho vivo do processo de mudança da sociedade brasileira, no qual o jovem tem participação decisiva. Um volume totalmente dedicado às questões da ética na política e da cidadania. 9. Miltopéia - A Centopéia Solidária Antes de partir, Betinho nos deixou esta que é a última aventura de sua simpática Centopéia. Chico Alencar, atendendo pedido do próprio Betinho, acrescentou ao texto o seu talento, a sua sensibilidade. Juntos, Betinho, Chico e a ilustradora Bia Salgueiro deram vida à Miltopéia. A Centopéia que já foi Zeropéia, que pensou e sonhou, acaba de descobrir um sentimento mágico. Trata-se da solidariedade. O mesmo sentimento que Betinho transformou em linguagem corrente, em ação, em sonho realizado. Solidariedade que tem o poder de nos transformar em dez, em cem, em mil... Movida por este sentimento tão revolucionário, a Centopéia desta deliciosa história descobre o que o seu criador já havia descoberto: "É possível mudar o mundo a partir da cidadania". Nossa amiga, por sua vez, mudou a floresta! 10. Revoluções da Minha Geração Este livro é resultado de uma das poucas concessões que Betinho fez na vida, e de muito trabalho. O jornalista francês François Bougon esteve no Brasil, a convite da Fondation pour le Progrès de I´Homme, agência parceira do Ibase, para uma série de entrevistas. Bougon teve o mérito de fazer Betinho desdobrar-se em tempo e em memória, revelando fatos marcantes de sua vida. 11. No Fio da Navalha Herbert Jose de Souza, o Betinho, Relata Neste Livro a sua Historia Pessoal e Política, que se Confunde com a Historia Recente do Brasil. no fio da Navalha e o Relato Deste Homem Que, Desde a Infância, Transformou sua Vida em Luta em Favor da Sociedade. 12. O Estado E Desenvolvimento Capitalista No Brasil Neste livro o Estado, em sua dimensão nacional, é analisado como instância reguladora e organizadora de um modo particular de desenvolvimento capitalista, correspondente aos interesses de determinadas classes sociais que traduzem sua hegemonia através de formas particulares de legitimação. Já em sua dimensão internacional, o Estado é analisado como instância de articulação econômica e política da formação social nacional com o sistema capitalista mundial. 13. Em Defesa do Interesse Nacional No livro, um elenco excepcional de analistas busca combater a desinformação provocada pela ofensiva ideológica patrocinada pelos representantes dos interesses neoliberais e seus aliados que, ao defender a venda do patrimônio público, pretendem na verdade transformar a economia brasileira numa espécie de subsidiária dos países capitalistas desenvolvidos, sem autonomia e sem qualquer capacidade de vôo próprio. O leitor compreenderá o que significa o chamado Consenso de Washington e terá uma visão clara do que está por trás da campanha para liquidar com os monopólios estatais do petróleo e das telecomunicações mantidos pela Constituição de 1988. 14. . Escritos Indignados: Democracia x neoliberalismo O livro que o autor tem agora em mãos fala de um Estado insensível e excludente, que nos ameaça de morte. No entanto, é a vida que nos aproxima, não a morte. Sobretudo, as lutas que movem as nossas vidas. "O que nos falta é a capacidade de traduzir em proposta aquilo que ilumina nossa inteligência e mobiliza nossos corações: a construção de um novo mundo..." CONCLUSÃO Brasil, país das diferenças sociais... Positivista, que tem como lema “A Ordem e o Progresso”. Brasil, terra onde a Democracia apenas existe no papel... Tantos os excluídos, os que sofrem preconceitos, e poucos os que detém a concentração de renda e o controle político. Fome, miséria, doença... a muitos. CPIS e muito dinheiro a poucos. Pouco conhecia do Betinho, mas com a Pesquisa realizada me tornei sua fã, me identificando com suas aspirações , lutas e conquistas. José Herbert de Souza, sociólogo, aidético, hemofílico... HERÓI! Em seu legado de atitudes nada fez por desmerecer a sua missão na Terra: ser um transformador social. Poderia ter cruzado os braços, se atirado a uma cama e esperado a morte chegar, como muitos fizeram, mas com sua coragem, determinação e amor ao próximo “arregaçou” as mangas e pôs mãos à obra. E que obras realizou... Sabe, Betinho, por aqui nada mudou muito, continuamos na mesma, lutando, caindo, sonhando, sobrevivendo, mas com a certeza que a luta que você iniciou e as obras que realizou têm continuado pelas mãos daqueles que acreditaram e acreditam em tudo o que você fez. Continuaremos lutando por um mundo melhor, mais justo, onde as pessoas sejam realmente vistas como seres humanos, e para isso devemos “Ver com os olhos do coração” e “fazer ao próximo o que faríamos a nós mesmos”. Mesmo que tudo pareça perdido, acreditar é preciso, pois só a esperança por um mundo melhor, mais igual e justo aliada à solidariedade ativa provocará com certeza as mudanças necessárias para que todos os homens sejam iguais! “Viver sob o signo da morte não é viver. Se a morte é inelutável, o importante é saber viver !” Betinho Herbert de Souza - Betinho Mortais somos todos nós. Isso sim é o inelutável e faz parte da vida. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS <http://www.livrariasaraiva.com.br/produto>. Acesso em: 17 dez. 2005. <http://www.aids.gov.br/betinho/perfil.htm> Acesso em: 17 dez. 2005. <http://www.bibvirt.futuro.usp.br/textos/resenhas/livros/livros.html> Acesso em : 18 dez 2005. <http://www.mercadobr.com.br/pesquisa> Acesso em: 17 dez. 2005. <http://members.fortunecity.com/zipnet> Acesso em : 18 dez. 2005. <http://www.geocities.com/florestabook/plvpromocoes.htm> Acesso em: 17 dez. 2005 <http://www.siciliano.com.br/livro> Acesso em: 17 dez. 2005. <http://tudo.americanas.com.br> Acesso em: 17 dez. 2005. <http://www.submarino.com.br> Acesso em: 17 dez. 2005. <http://www.sodiler.com.br> Acesso em: 17 dez. 2005. <http://pesquisa.bondfaro.com/livros.html> Acesso em: 17 dez. 2005. <http://www.brazil-brasil.com/index.php?option=content&task=view&id=257> Acesso em: 18 de dezembro de 2005