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INTRODUÇÃO
José Herbert de Souza, o conhecido Betinho, foi um transformador social.
Sociólogo, sempre presente nas lutas sociais e políticas se propondo a ampliar a
democracia e a justiça social e levantando a bandeira do humanismo. Dedicou-se à CoordenaçãoGeral do IBASE - com firme resistência física e brilhante lucidez e consciência da realidade
brasileira. Publicou diversos livros, artigos e ensaios onde denunciou a exclusão social,
concentração de renda e controle político
Hemofílico, contraiu a AIDS em uma das inúmeras transfusões de sangue a que
era obrigado a se submeter.
A sua luta pelo direito à vida aos portadores do HIV/AIDS transcendeu apenas o
pessoal, chegando à esfera da sociedade, tornando-se uma verdadeira batalha em favor da defesa
da dignidade humana.
Em vida, foi uma figura humana notável, realizando magníficos projetos para a
valorização da solidariedade e dos direitos humanos em uma sociedade tão injusta., onde o que
mais se destacou foi a Campanha do “Natal sem Fome”, que perdura até hoje.
Depois de sua partida, deixou e deixa saudades e a certeza de que com boa
vontade, coragem, luta e perseverança todas as pessoas podem colaborar para a melhoria do
mundo. Basta querer!
"Gente foi feita para inventar o mundo de novo, para mudar e desmudar,
carregando alegria."
Betinho
BIOGRAFIA
José Herbert de Souza, o Betinho, nasceu em 3 de novembro de 1935, em Minas
Gerais, região montanhosa no interior do Brasil cujos habitantes são conhecidos por sua
mansidão, pelo jeito calmo e sutil. "É um mineiro", diz-se das pessoas equilibradas, que
dificilmente se exaltam ou assumem posições contundentes. Isso talvez ajude a explicar por que
Betinho, assumindo integralmente as mais radicais utopias de transformação social, fazendo da
sua própria vida uma bandeira costurada de bandeiras universais, sempre trabalhou no sentido de
congregação, da união.
Terceiro de uma série de oito irmãos, completou, em 1962, os cursos de Sociologia
e Política e de Administração Pública na Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade de
Minas Gerais. Nessa época, atuou como liderança nacional dos grupos de juventude católica que
representavam as aspirações de transformação social, depois reforçadas com o Concílio Vaticano
II e participou das conquistas pelas chamadas "reformas de base". Segundo testemunho do
escritor Otto Lara Rezende, da Academia Brasileira de Letras, Betinho, nas praças públicas, pedia
tudo que os comunistas pediam - e mais o céu. Nesse período de vida democrática do Brasil,
exerceu funções de coordenação e assessoria no Ministério da Educação e Cultura e na
Superintendência de Reforma Agrária, além de elaborar estudos sobre a estrutura social brasileira
para a Comissão Econômica para a América Latina (Cepal), da ONU. Data desse período
também a sua presença nos movimentos operários brasileiros.
Com o golpe de 64, passou a atuar na resistência contra a ditadura militar,
dirigindo organizações de cunho democrático no combate ao regime que se instalava. No começo
da década de 70, foi para o exílio e, como no poema de Brecht, trocava de país como quem
trocava de sandálias. Morou primeiro no Chile, em Santiago, onde deu aula na Faculdade
Latinoamericana de Ciencias Sociales e atuou como assessor do presidente Allende.
Conseguiu escapar do sangrento golpe militar do general Pinochet, indo para a
embaixada do Panamá, em 1974. Seguiu depois para o Canadá e México. Exerceu, nessa época,
diversos cargos: diretor do Conselho Latino-Americano de Pesquisa para a Paz (Ipra), consultor
para a FAO sobre projetos e migrações na América Latina e coordenador do Latin American
Research Unit (Laru), entre outros. Foi, ainda, professor efetivo no Doutorado de Economia da
Divisão de Estudos Superiores, na Faculdade de Economia da Universidade Nacional Autônoma
do México, e diretor de Brazilian Studies, no Canadá.
Com o crescimento dos movimentos pela democratização dos meios de
comunicação no Brasil, seu nome tornou-se um dos símbolos da campanha pela anistia. Em 1979,
retornou ao país e envolveu-se inteiramente nas lutas sociais e políticas, sempre se propondo a
ampliar a democracia e a justiça social. No início dos anos 80, ajudou a fundar o ISER - Instituto
de Estudos da Religião -, presidiu a Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS - ABIA,
fundada, em 1986 e uma das primeiras e mais influentes instituições do País, preocupada com a
organização da defesa dos direitos das pessoas portadoras do HIV ou doentes com AIDS. A sua
luta pelo direito à vida aos portadores do HIV/AIDS não foi apenas pessoal, mas contextualizouse em um nível mais amplo e elevado, o da defesa da dignidade humana. Além disso, dedicou-se
à Coordenação-Geral do IBASE - Instituto Brasileiro de Análises Sócio-Econômicas -, cargo
ocupado até os últimos dias, com firme resistência física e brilhante lucidez e consciência da
realidade brasileira, cuja perversidade - exclusão social, concentração de renda e controle político
- nunca deixou de denunciar. O Ibase é uma entidade governamental e tem como objetivo
principal democratizar a informação acerca das realidades econômicas, políticas e sociais no
Brasil.
A natureza não foi benevolente com o cidadão Betinho. Hemofílico, contraiu a
AIDS em uma das inúmeras transfusões de sangue a que era obrigado a se submeter. Por essa
mesma condição genética, em 1988, em um intervalo de três meses, Betinho perdeu dois irmãos:
o cartunista Henfil, aos 43 anos, famoso pelo uso hábil e criativo do humorismo na crítica à
ditadura militar, mesmos nos seus piores momentos de repressão à livre expressão política; e o
músico Chico Mário, com apenas 39 anos. Mesmo abalado por estes acontecimentos, Betinho
nunca abandonou a militância política, sempre presente em cada evento que levantasse a bandeira
do humanismo. No dia 05 de julho de 1997, Betinho foi internado no Hospital da Beneficência
Portuguesa, no Rio, vítima de uma infecção oral. Vinte e seis dias depois, pediu para voltar para
casa. Morreu aos 61 anos, em 9 de agosto do mesmo ano, em sua casa, no bairro do Botafogo, no
Rio de Janeiro, com 61 anos de idade, vítima da hepatite C. Em 11 de agosto, o corpo do
sociólogo foi cremado. A seu pedido, as cinzas foram espelhadas em seu sítio em Itatiaia.
Betinho é, sem dúvida, o símbolo da determinação e do trabalho incansável pela
cidadania, pela restauração da verdadeira democracia participativa, pela valorização da
solidariedade e dos direitos humanos em uma sociedade injusta. Por essa constante postura
desempenhou um importante papel em relevantes momentos da história recente do país e em
vários movimentos de mobilização social, entre eles: a articulação da Campanha Nacional pela
Reforma Agrária, em 1983, congregando entidades de trabalhadores rurais; a organização, em
1990, do movimento Terra e Democracia; a liderança, em 1992, do Movimento Pela Ética na
Política, que culminou com o impeachment do então presidente Fernando Collor de Mello, em
setembro do mesmo ano. Terminada a batalha do impeachment, Betinho dedicou-se à Ação da
Cidadania contra a Miséria e Pela Vida. A campanha contra a fome ganhou as ruas em 1993 e
chegou ao final daquele ano com total aprovação da sociedade - 96% de concordância, segundo o
Ibope. Sua figura humana adquiriu, então, notoriedade definitiva como o incansável Coordenador
da "Ação pela Cidadania contra a Fome e a Miséria", que pretendia ir além de um movimento
social de caráter assistencialista, para aglutinar outros movimentos e iniciativas individuais e
comunitárias em todo o País. A "Campanha do Betinho" foi tão polêmica quanto popular e o seu
sentido político maior, razão principal da polemização em torno de suas ações, tinha por objetivo
final a promoção da cidadania, do direito ao emprego e da luta pela terra, etapa final do programa
de ação planejado e o maior legado público da vida deste brasileiro humanista.
No ano de 1994, lançou a Campanha "Natal sem Fome", que arrecadou, no
primeiro ano, 600 toneladas de alimentos. Em agosto do mesmo ano, fez um pronunciamento na
ONU, na reunião preparatória para a Conferência Mundial sobre o Desenvolvimento Social.
Houve, ainda, dois momentos marcantes: a Caminhada pela Paz do Movimento Reage Rio, em
novembro de 1995; e o desfile no carnaval de 1996, quando Betinho foi enredo da Escola de
Samba Império Serrano, no Rio de Janeiro, cujo tema foi: "E verás que um filho teu não foge à
luta". Em suas últimas iniciativas, entre os anos de 1996/1997, apresentou uma proposta para a
Agenda Social Rio 2004 ao Comitê Olímpico Internacional, quando a cidade do Rio de Janeiro
empenhou-se em sua candidatura à sede olímpica, em 1996; lançou, via Ibase, a Agenda Social
Rio 2000, tentativa de lutar pela melhoria da qualidade de vida no Estado do Rio de Janeiro, por
meio da implantação das metas sociais por ele idealizadas; e, em julho de 1997, num encontro
com empresários de todo o país, lançou a campanha de adesões ao Balanço Social, uma espécie
de balanço financeiro onde os indicadores são os investimentos sociais feitos por empresas.
Ao longo de sua trajetória, publicou, ainda, diversos livros, artigos e ensaios,
sempre com a mesma preocupação de criticar as estruturas que tornam a vida difícil e injusta para
milhões de pessoas.
O Programa Nacional de Doenças Sexualmente Transmissíveis e Aids tem a honra
de lançar uma página na internet para reverenciar a sua memória, pois sua presença nos meios de
comunicação transformou-o em símbolo das vítimas da AIDS e da luta pela saúde da população.
Que a sua luta continue pelas mãos daqueles que nele acreditaram e pelas dos seus filhos, para
que a esperança por um mundo melhor e mais justo permaneça entre nós.
TRAJETÓRIA
13/11/1935: Nasce em Bocaiúva, interior de Minas Gerais, Herbert (sem um "r" por erro do
escrivão) de Souza, o primeiro filho de Henrique e Maria da Conceição Figueiredo de Souza.
1950 a 1953: Vítima de tuberculose, vive confinado num quarto, nos fundos de sua casa.
Fim dos anos 50: Começa a militância na Juventude Estudantil Católica (JEC) e, depois, na
Juventude Universitária Católica (JUC).
1962: Aos 27 anos, é um dos fundadores da organização marxista Ação Popular (AP).
1964: Com o golpe militar, exila-se no Uruguai. Volta clandestinamente.
1965: Nasce, clandestino, num hospital em São Paulo, o filho Daniel, de seu casamento com Irles
Coutinho de Carvalho.
1967: Novo exílio, desta vez na Europa. Retorna, outra vez clandestino, em 1968.
1971: Trabalha com identidade falsa, como operário no ABC paulista. A repressão aumenta e ele
parte para o último exílio: primeiro no Chile, depois Panamá, Canadá e, enfim, México.
16/09/79: A anistia política traz de volta ao país, com identidade verdadeira e entrada legal, o
"irmão do Henfil".
1981: Cria o Ibase (Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas), cuja meta é
democratizar o acesso à informação.
1986: Exame confirma sua condição de portador do vírus HIV. Funda a Abia, entidade que vira
referência na luta por maior controle dos bancos de sangue e contra a discriminação.
04/01/88: Morre o irmão Henfil, aos 43 anos, vítima de Aids.
14/03/88: Morre o
irmão
Chico
Mário,
aos 39
anos, de Aids.
Betinho se confessa
desesperançado e afasta-se da Abia, que passa a ser presidida pelo escritor Herbert Daniel.
09/88: Assume o cargo, sem remuneração, de primeiro defensor do povo do município do Rio de
Janeiro. Foi indicado por 11 entidades e empossado pelo prefeito Saturnino Braga.
06/91: Recebe o Prêmio Global 500, da ONU, por sua contribuição em favor da ecologia (na
Campanha pela Reforma Agrária), pela criação do Ibase e pela luta para a despoluição da Baia da
Guanabara e a preservação da Amazônia.
91: Monta no Ibase uma equipe para pôr em funcionamento o primeiro servidor do país de acesso
à Internet.
06/92: Começa a campanha para que os restaurantes, em vez de jogar comida fora, doem para
comunidades carentes. Surge aí o embrião da Ação da Cidadania contra a Miséria e pela Vida.
07/92: Participa do Movimento pela Ética na Política, um dos alicerces para a campanha que
resultou no impeachment do presidente Fernando Collor.
1993: Surgem em todo o país comitês da Ação da Cidadania, popularizada como "Campanha
contra a fome", ou, como ficou mais conhecida, "Campanha do Betinho". A iniciativa chegou a
ser tachada de assistencialista por militantes de esquerda.
03/94: Lança a "Campanha do Emprego". Baseada no mapa de mercado do trabalho do IBGE,
não alcança o mesmo sucesso da luta contra a fome.
06/04/94: O GLOBO revela que a Abia recebera, quatro anos antes, doação de US$ 40 mil do
bicheiro Turcão. A negociação fora intermediada por Nilo Batista, que em 1994 foi empossado
governador do Rio.
27/05/94: Recebe o Prêmio Eco 94, como hors-concours, pela campanha contra a fome.
24/08/94: Pronunciamento na ONU, na reunião preparatória para a Conferência Mundial sobre o
Desenvolvimento Social.
11/94: Lança a campanha "Natal sem fome" , que arrecada, no primeiro ano, 600 toneladas de
alimentos.
28/11/95: Toca o sino da paz após a Caminhada pela Paz na Avenida Rio Branco, organizada
pelo Movimento Reage Rio.
02/96: Faz a Sapucaí chorar ao sair como destaque da Império Serrano, que levou para a
Passarela do Samba o enredo "E verás que um filho teu não foge à luta", sobre sua vida.
11/96: Defende, junto a integrantes do Comitê Olímpico Internacional, o cumprimento da
Agenda Social na campanha do Rio para sediar as Olimpíadas de 2004.
05/07/97: Vítima de uma hepatite crônica, diagnosticada em 1994, Betinho é internado na
Beneficência Portuguesa. Seu quadro clínico é grave: muito debilitado e sem conseguir se
alimentar, o sociólogo sofre de pneumonia bacteriana, infecção oral e insuficiência hepática.
30/07/97: O tratamento não corresponde às expectativas e Betinho pede para voltar para casa. No
apartamento, em Botafogo, os médicos montam uma Unidade de Tratamento Intensivo (UTI)
portátil.
08/08/97: Betinho fala com dificuldade e reclama das dores e do desconforto. Seu estado de
saúde é grave: falência hepática, constatam os médicos. Pesando apenas 39 kg, Betinho é sedado
e medicado com diuréticos. A aplicação do coquetel de medicamentos contra o vírus da Aids é
suspensa. Com complicações hepáticas, entra, à noite, em coma induzido.
09/08/97: O infectologista Walber Vieira diz pela manhã que o quadro clínico de Betinho é
irreversível. Além da falência hepática, o sociólogo enfrenta complicações renais e hemorragias
cutâneas. Seu organismo passa a reter líquido e sua alimentação é através de uma sonda
nasogástrica. O médico diz temer que o sociólogo sofra um derrame na pleura. À tarde, Daniel,
filho do sociólogo, diz que o quadro clínico do pai não sofreu qualquer alteração.
09/08/97: Às 21h10m, Betinho morre em casa ao lado da mulher e dos filhos.
TEXTOS DO BETINHO
DIREITOS HUMANOS E AIDS
Meu tema é direitos humanos e doenças epidêmicas, e eu vou tratar da questão da
AIDS. Estou convencido de que a AIDS é uma doença revolucionária. Ela recoloca de forma
radical para a nossa sociedade, tanto brasileira quanto internacional, uma série de problemas
vitais que durante muito tempo tentamos ignorar. Nossa cultura foi se afastando do real e tenta
ignorá-lo, ao invés de desafiá-lo. A medicina moderna foi criando uma idéia de onipotência e nos
dizia, de forma indireta, que todas as doenças eram curáveis e que finalmente a morte não podia
existir. A cultura ocidental moderna não só passou a ignorar a morte como tenta negá-la sob todas
as pessoas e com todos os artifícios. Poucas são as pessoas que enfrentam a morte como seu
cotidiano, como algo natural. Na nossa cultura, a morte não existe. E a medicina se imbuiu da
idéia, transmitida através da tecnologia e do avanço científico, de que nós estávamos a pique de
superar a morte. Dentro dessa visão, todas as doenças são tratáveis, todas as enfermidades são
curáveis. Num determinado momento, a ciência moderna começou até mesmo a pensar que a
eternidade estava ao alcance da humanidade. Estávamos já tratando o câncer como a última
doença mortal. De alguma maneira, havia no horizonte de cada um de nós a seguinte expectativa:
o dia em que descobrirem a cura do câncer marcará o fim das doenças mortais.
E eis que surge um vírus, o HIV, que se esconde no sistema imunitário, nas células
que definem, articulam, constroem o sistema imunitário. E ao se instalar nesse sistema o desarma,
fazendo com que a pessoa passe a ser absolutamente vulnerável a qualquer ataque externo. E está
produzindo o pânico do século XX. Um sistema imunitário desarmado é a doença mais
espetacular produzida ao longo da história da humanidade.
A AIDS se apresenta como absolutamente mortal e epidêmica. No Brasil, hoje, a
cada dez meses, dobram os casos de AIDS. Tomando como base três mil casos registrados no
Brasil - subnotificados, obviamente, porque devemos ter cinco ou seis mil casos -, façamos esse
exercício: dobremos a cada dez meses; em seis anos chegaremos à casa dos milhões, não de
pessoas contaminadas, mas de pessoas com manifestação de AIDS. Então, essa dimensão
epidêmica que existe em nível de Brasil e em nível mundial, como que produz uma consciência
de pânico. A humanidade, se não encontrar nos próximos seis ou sete anos a cura ou a vacina,
pode estar condenada a um processo de extermínio por este vírus. Segundo pesquisas, alguns
países da África já estão nesse quadro, pois 20% a 30% da população apresentam manifestação
de AIDS ou se encontram contaminadas pelo vírus.
Esse vírus, sob todos os aspectos, apareceu de forma espetacular, mortal, com
manifestação rápida, fulminante, sem cura. E, até o presente momento, sem nenhum meio de
ataque direto que possa destruí-lo. Ele se transmite através da relação sexual que, queiramos ou
não, é vital para a humanidade e é universal, e na nossa cultura está marcada por todo tipo de
preconceito, culpabilidade, pecado, danação, inferno. Ele veio relacionado também ao sangue,
que é outro elemento universal na cultura da humanidade; o sangue está na nossa cultura sob mil
formas, há pessoas que entram em pânico quando o vêem, embora seja parte constitutiva da nossa
realidade. E o vírus se transmite, fundamentalmente, pelo sangue. Mesmo quando segue através
do esperma, é porque o esperma contaminado entra na corrente sanguínea. Então, este é o vírus
que adora o sangue, mata-nos através do sangue.
Mas a AIDS vem também marcada por várias outras questões: o racismo, por
exemplo. Quando o vírus foi descoberto, logo se buscou o culpado, e o culpado era o negro
africano, a AIDS teria vindo do Haiti. Depois se descobriu que mais americanos iam ao Haiti que
haitianos aos EUA, logo se abandonou em parte essa idéia. Nela, o culpado era a África, os
africanos teriam sido contaminados, através de suas relações com o macaco, passando esse vírus
para o resto da humanidade. O racismo ensaiou seus passos na questão da AIDS, resistiu por uns
três anos, e só recentemente, com o fracasso de todas as teorias que tentaram explicar a AIDS
como resultado dos "seres inferiores africanos", essa tese caiu por terra. A AIDS vinha dizer
assim: "Convençam-se de que todos são mortais". E uma nova doença voltou a revelar para o
século XX que a morte é absolutamente inevitável.
Bastavam esses quatro elementos para definir a AIDS como extremamente
revolucionária e explosiva. Se compararmos o número de suas vítimas e o pânico existente em
torno dela, não há a menor proporção. Mas eu penso, estou convencido, de que existe uma razão
objetiva e subjetiva para esse pânico. É que de fato estamos diante de uma epidemia mundial, que
só será vencida pelo desenvolvimento científico, pela mudança de comportamento de alguns
setores da população e pela intervenção da sociedade e do Estado, de forma radical e enérgica, no
controle do sangue em nível mundial. Mas eu queria ainda fazer referência a algo que a AIDS
desvelou no mundo contemporâneo: a questão dos preconceitos que essa sociedade guarda em
relação às pessoas. Eu, quando decidi falar aberta e publicamente que estava contaminado pelo
vírus da AIDS, sabia que podia dizer isso como hemofílico, que fui contaminado através de
transfusões de sangue, mas eu já havia presenciado a morte e a tragédia de várias outras pessoas,
que morreram de AIDS, que tiveram que morrer clandestinamente porque eram homossexuais ou
drogados. E esses homossexuais e drogados haviam incorporado à culpabilidade, a discriminação
da sociedade em relação a eles, e assumido isso de tal maneira, que preferiam à morte anônima a
lutar pelos seus direitos.
Uma vez fui procurado por uma jovem que me disse o seguinte: "Meu irmão é
funcionário de uma empresa estatal, ele tem AIDS e não consegue se tratar em nenhum hospital:
meu pai e eu é que temos que cuidar dele. Os hospitais se recusam, e a empresa não dá a menor
assistência". Então, falei: "Se você quiser, nesse exato momento, vamos chamar a televisão, as
rádios, os jornalistas e fazer essa denúncia". Ela respondeu: "Mas isso pode prejudicar meu
irmão". E eu: "Minha amiga, você não disse que seu irmão está em estado terminal, morrendo?"
"É". "E o que mais ele pode perder? Ele não vai morrer?" Ela disse: "É, ele vai morrer, mas eu
tenho que pensar". Logo falei: "Bom, você pense e me diga: no momento que você quiser, vamos
denunciar essa empresa estatal que está discriminando uma pessoa doente, por abuso e
discriminação". Vinte dias depois, fui chamado pela mesma pessoa, que me disse: "Eu queria te
agradecer porque fui conversar com a direção da empresa, exigi tratamento, disse que denunciaria
essa discriminação e hoje meu irmão está morrendo com conforto, num hospital, com
apartamento, com ar refrigerado, com tudo que ele tem direito". Essa pessoa se sentia feliz
porque seu irmão estava morrendo em paz.
Conhecendo esse e vários outros casos, percebi que a AIDS estava revelando, de
forma trágica, o modo como a nossa sociedade discrimina as pessoas, discrimina o homossexual,
discrimina a relação sexual, discrimina a privacidade das pessoas, o direito de existir da forma
como a sua consciência julga ser necessário, ou de acordo com seus sentimentos ou com a sua
vontade. E que ainda descarrega sua discriminação sobre a cabeça e as consciências dessas
pessoas. E o mais trágico é que muitas delas internalizam essa discriminação e morrem na
clandestinidade, sem lutar pelos seus direitos mais elementares, como, por exemplo, o direito de
morrer em paz. Se não o de viver, mas o de morrer em paz.
Essa talvez tenha sido uma das experiências mais difíceis para mim. Eu
presenciava o fato em homossexuais, drogados, ou o que fosse, e estava diante das pessoas, não
diante de objetos da minha condenação moral. Ao mesmo tempo, meus dois irmãos
manifestavam a doença. E estávamos enfrentando esse problema ainda como clandestinos. Foi
então que decidi sair da clandestinidade. Já havia vivido assim durante cinco anos, clandestino na
ditadura militar; para mim era o suficiente. É inadmissível que alguém sofra por um vírus, uma
doença, uma enfermidade, e que, além disso, além de ter de enfrentar a morte, ainda precise se
esconder da sociedade e dos seus irmãos e irmãs. E a experiência que eu vivi ao dizer que era
hemofílico e estava contaminado por AIDS, e que meus irmãos também estavam, é uma
experiência extremamente positiva. Para mim e pelo menos para mais um, porque o outro irmão
provavelmente não tem condições de perceber o que está acontecendo com ele. Ao romper a
clandestinidade, ao denunciar a discriminação, recebi muita solidariedade.
Solidariedade de amigos recentes, amigos de muito tempo, mas também de
pessoas completamente desconhecidas, que nunca me viram, que nunca souberam nada a meu
respeito, que me encontram na rua e demonstram apoio e afeto. Então, descobri também isso, que
quando a gente aposta na dimensão negativa, à gente colhe a dimensão negativa. O pessimista
sempre colhe a desgraça. Agora, quando se aposta na dimensão positiva, na solidariedade,
também se colhe a dimensão positiva. Acho que é uma coisa perigosíssima admitirmos, em
princípio, que as pessoas são ruins, que são más, egoístas e covardes. Acho que devemos partir
do princípio oposto, e apostar nisso. E tomar o resto como exceção e não como regra. Há um caso
ilustrativo. Meu filho de 05 anos e meio brincava sempre com duas crianças e, quando eu saí na
televisão, no jornal ou no rádio, os dois amiguinhos desapareceram de nossa casa. Minha esposa
pressentiu algum problema. A primeira reação nossa foi de profunda tristeza. Discriminar a mim
que tenho 52 anos não me incomoda muito, mas discriminar uma criança de 05 anos e meio é
triste. Triste e inadmissível. Decidimos chamar a família, o pai e a mãe das duas crianças, e eles
vieram. Sentamos e dissemos: "Olha, nós sabemos que vocês devem estar preocupados com os
filhos de vocês: é justo; todo pai e toda mãe se preocupam com os filhos, com a saúde deles, mas
queremos dizer a vocês algumas coisas". Então demos, durante uma hora, mais ou menos, um
curso prático sobre hemofilia, transfusão de sangue, contaminação genética. Falamos que nosso
filho não é hemofílico, portanto não toma transfusão de sangue, portanto não está contaminado.
Depois, mais meia hora sobre AIDS, as formas de contaminação, as formas de transmissão, como
se transmite, como não transmite. E os dois escutavam muito atentamente e, depois dessa
conversa, já estavam querendo saber sobre outras coisas, sobre onde tínhamos estado no exílio,
curiosos sobre outras dimensões de nossa vida. Após duas horas de conversa, toda a questão
estava resolvida. No outro dia cedo, as duas crianças amigas já estavam lá em casa, brincando
com o nosso filho. E continuam brincando até hoje.
Esse exemplo só nos mostrou o seguinte: a passividade, o pessimismo, a entrega
ao que existe de pior, só reproduz o pior. Se não tivéssemos conversado com aquela família,
provavelmente as crianças não estariam brincando com nosso filho. Mas, depois da conversa, da
informação, da abertura, da confiança na capacidade deles de entender a questão e enfrentá-la, a
situação mudou. Não quero dizer que todos vão ter condições de viver e de proceder como nós. A
situação para os homossexuais é muito difícil, mas é possível fazer alguma coisa.
Partindo da experiência pessoal, quero dizer o seguinte: a AIDS está produzindo
um verdadeiro strip-tease da nossa sociedade, dos nossos valores, da nossa cultura, assim como
do sistema de saúde em nosso país. Aqui, o sistema de saúde não existe para a prevenção. É um
sistema da cura, da morte e do comércio. Desde há muito deficiente, foi destruído ao longo desses
vinte e tantos anos de ditadura. Na verdade, nunca tivemos uma política séria de saúde pública,
que estivesse voltada para interesses da população.
Eu já disse que a AIDS era a ponta de um iceberg , porque é a ponta mais
dramática, mais visível. Mas logo a seguir vem uma série de doenças endêmicas que poderiam ter
sido absolutamente eliminadas do país, com pouco investimento e pouco recurso, e que até hoje
não o foram, para vergonha nossa. O Brasil é um país tuberculoso, um país com doença de
Chagas, com lepra, com esquistossomose e uma série de outras enfermidades que atingem a
milhões de pessoas, sem contar aquelas que morrem sem estar doentes, porque morrem de fome.
É o caso da mortalidade infantil no Nordeste e também (por que não?) nas periferias das nossas
capitais. Há, porém, a consciência política de que não temos um sistema de saúde, mas de doença
e comércio - exatamente esse comércio que produziu a calamidade do sangue, transformando-o
em mercadoria e hoje transmitindo a morte, através da transfusão, pela AIDS, Hepatite B e várias
outras doenças. Essa situação tem muito mais a ver com política e cidadania e direitos humanos
do que com qualquer outra coisa. Nessa luta relacionada à AIDS tive uma revelação fantástica:
descobri que o principal problema de saúde do Brasil era o ministro da Saúde. Ele, um ministro
da Saúde de um país que ocupa o 2º lugar do mundo em casos absolutos de AIDS, nunca
entendeu o que é uma epidemia, tendo tido a coragem de dizer que não importava AZT porque o
Brasil tinha que fazer pesquisa científica para comprovar sua eficiência e proteger o consumidor.
Isso quando sabemos que esse mesmo ministro permite a importação e o uso, aqui no Brasil, de
drogas condenadas no mundo inteiro.
Outro exemplo de como a gente enfrenta obstáculos onde não deveria haver, foi
quando o diretor da Cacex, perguntado pelo jornalista se importaria ou não AZT, saiu-se com esta
jóia: “AZT é coisa de bicha rica”. Pois bem, depois dessa, ele continuou em seu cargo, porque
uma das coisas que se perdeu nesse país foi algo elementar, que se chama sentido de dignidade.
Mas gostaria de terminar, dizendo o seguinte: creio que podemos transformar a
tragédia da AIDS, da enfermidade e da doença num desafio, numa oportunidade, numa
possibilidade de recuperar na nossa sociedade, em nós mesmos, em cada um de nós e em todos
nós, o sentido da vida e da dignidade. E, com esse sentido da vida e da dignidade, seremos
capazes de lutar pela construção de uma sociedade democrática, de uma sociedade justa e
fraterna.
CARTA CONTRA O PRECONCEITO
Na sexta-feira dia 08/02/92, às 23 horas, decola do Aeroporto Internacional de
Guarulhos, em São Paulo, o Vôo da Solidariedade. A bordo do avião, cerca de 100 intelectuais
vão levar seu apoio ao povo cubano. Uma das poltronas poderia estar ocupada pelo sociólogo
Herbert de Souza, o Betinho, um dos que apóiam o vôo. Mas não está. No lugar do presidente da
Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (ABIA), vai uma carta assinada por ele. Um
protesto contra a política segregacionista do governo cubano em relação aos doentes da AIDS.
Presidente Fidel Castro,
Sou do tempo da Revolução Cubana. Defendi e defendo o direito do povo cubano
fazer sua revolução e decidir o seu próprio destino sem interferência de inimigos ou amigos.
Defendo para Cuba o que defendo para mim e para o meu próprio povo: liberdade,
igualdade, participação, respeito, diversidade e solidariedade. Feita essa introdução, desejo
apresentar uma questão e fazer um apelo. A questão é a AIDS. Sou hemofílico de nascimento e
soropositivo há quase 10 anos. Sou também presidente da Associação Brasileira Interdisciplinar
de AIDS desde 1986 e desenvolvo em meu país uma luta constante contra as políticas públicas do
governo federal em relação à AIDS.
A AIDS, desde o começo, foi apresentada como uma doença incurável e fatal, sem
esperança e sem destino a não ser a morte. Essa posição não é correta, não tem base científica e é
politicamente equivocada: a AIDS ainda não tem cura, mas poderá ter. A cura da AIDS está a
caminho. A França, por exemplo, já se propõe a rever a própria definição da AIDS (SIDA) para
doença degenerativa crônica.
Essa visão fatalista e anticientífica da AIDS foi responsável pela disseminação de
condutas discriminatórias, desumanas e terroristas em relação às vítimas da doença. Muita gente
tomou carona na tragédia para expressar todos os seus preconceitos e culpar as vítimas e suas
condutas, ao invés de atacar a causa real da doença: o vírus.
Conhecendo a tradição humanista e revolucionária de Cuba, sabendo dos avanços
de sua medicina, eu esperava que também Cuba se transformasse num exemplo mundial de como
enfrentar a AIDS. O que li no Gramma e soube por pessoas que visitaram Cuba, no entanto,
constitui para mim um choque: soube que os soropositivos são submetidos a um processo de
controle por agentes sanitários, que se caracteriza por uma espécie de vigilância à curta distância
para impedir que a pessoa contaminada contamine outras pessoas. Como sabemos que a
transmissão do vírus se dá basicamente por via sexual, estaríamos diante do controle da vida
sexual dos soropositivos por processos de vigilância que tenho dificuldades de imaginar como
seriam feitos, além de discordar frontalmente de tal tipo de controle. Soube, também, que os
doentes são levados aos hospitais e internados como doentes de AIDS, separados de suas
famílias, do trabalho, de suas atividades. Para ser franco e direto: os doentes são segregados da
sociedade pelo Estado e se transformam em presos políticos da epidemia. Digo políticos, porque
não existe nenhuma razão científica, médica, ou de simples bom senso, para se prender doentes
de AIDS a fim de prevenir a propagação da epidemia e proteger a saúde pública. Um doente de
AIDS é, na verdade, aquele que menos oferece risco de contaminação, porque ele já sabe que
pode transmitir, sabe como não transmitir, e, a não ser em casos patológicos, não quer transmitir
sua doença a ninguém, muito menos a seus familiares e amigos.
Os doentes de AIDS hoje podem passar a maior parte de seu tempo em suas
próprias casas ou desenvolvendo atividades úteis, ao invés de se verem presos, segregados,
discriminados como seres destinados a esperar a morte no leito da proteção pública.
Sou capaz de imaginar uma sociedade, a cubana, onde os soropositivos e os
doentes de AIDS recebam uma atenção e um carinho especiais de todos, onde não se sintam
discriminados, nem isolados, nem identificados com o perigo mortal para a saúde pública da
Nação. Onde os soropositivos trabalhem normalmente e onde os doentes possam também
trabalhar, viver, conviver e se confrontar com a morte em meio à solidariedade que se traduz em
convívio e não em segregação.
Não falo como leigo. Falo como soropositivo que trabalha agora mais do que
nunca e que jamais aceitaria ter um agente de saúde seguindo meus passos para verificar se sou
um perverso propagador da epidemia. Falo como um soropositivo que vive com a mulher e filho,
e que preferiria morrer a ser isolado no melhor hospital público quando os primeiros sinais da
doença se instalassem, para esperar a morte incerta e imprevista, o que hoje pode levar até anos
para se realizar. Quero também ter o direito de decidir sobre a forma, modo e o tempo de minha
morte. A doença não pode ser um pretexto para que se retire de mim o direito à cidadania.
Acredito firmemente que essas idéias deveriam ser muito mais desenvolvidas e possíveis em um
país como Cuba e não no meu próprio, onde os pacientes de AIDS, na maioria das vezes, morrem
sem as menores condições de assistência e ainda sofrem efeitos da propaganda oficial, que prima
pelo terrorismo.
Por tudo isso, quando surgiu a proposta dessa viagem a Cuba, que apoio, senti que
eu tinha em relação a ela um caráter político e pessoal: como seria tratado em Cuba? Como os
milhares de turistas que entram em Cuba sem apresentar os testes de HIV e que, sem saber, por
isso mesmo podem se constituir num risco para a saúde pública do país? Eu só poderia entrar em
Cuba como um soropositivo publicamente conhecido no Brasil e teria que apresentar meus
pontos de vista e principalmente meu apelo:
Se ainda existe vigilância organizada sobre os soropositivos, transformem essa
relação em programas de educação e confiem na responsabilidade cívica, humana dos cubanos.
Se ainda existe segregação dos doentes em hospitais - com a separação de suas
famílias - que tudo isso acabe porque é desumano, é inútil, é inaceitável.
Que essa viagem de solidariedade produza muitos frutos. Quero enviar junto a
essa carta um grande e fraterno abraço para todo o povo cubano, um povo que aprendi a amar e
admirar de longe e de perto, quando em 1968 estive representando o Brasil na OLAS
(Organização Latino-Americana de Saúde).
Agora que o presidente já tem quase o direito de se considerar eterno, gostaria de
terminar com uma frase que vai começar uma nova postura nossa diante da AIDS: a AIDS não é
mortal, mortais somos todos nós. A AIDS terá cura, e o seu remédio hoje é a solidariedade.
Abraços e saudades,
Herbert de Souza
Presidente da ABIA
(Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS)
AIDS E POBREZA
A AIDS, quando começou, parecia ser uma doença de Primeiro Mundo e de gente
rica. Talvez, graças a isso, tenha despertado tanto investimento em pesquisa (apesar de
insuficiente) e tanto interesse na mídia.
Com o tempo, verificou-se que a AIDS era uma epidemia mundial que se
deslocava do Primeiro para o Terceiro Mundo, constituindo-se numa verdadeira tragédia em
vários países da África e que cada região apresentava a cara social de seu país. Tornou-se
mundial e ligada, principalmente, à pobreza.
Mas o tratamento da AIDS em qualquer país exige muita atenção médica, e é caro.
É caro tomar AZT, são caros os remédios para prevenir ou combater as infecções, é caro internar
um doente com AIDS. Enfim, a AIDS é muito cara, e não prevenir a doença fica mais caro ainda.
No Brasil não é diferente. A maioria das pessoas infectadas com o vírus, ou
doentes, são pobres e não conseguem recursos públicos ou particulares para ter o atendimento de
que necessitam, nem para a prevenção nem para o tratamento. Diria, mesmo, que a maioria dos
pobres com AIDS morrem sem saber do que morrem.
Em algumas poucas clínicas particulares, estão os doentes ricos, pagando um custo
que desafia qualquer patrimônio familiar. Em alguns hospitais públicos, estão os pobres, onde,
além do atendimento médico solidário e humano, carecem de meios para comprar o que a ciência
moderna já colocou à disposição de todos em termos de diagnósticos sofisticados e remédios
eficientes.
Em relação à AIDS, como em relação a várias outras coisas, o apartheid social se
manifesta. Quem é rico se trata e tem uma qualidade de vida muito melhor. Quem é pobre sofre e
morre sem condições mínimas de atendimento.
Essa diferença se manifesta concretamente em qualidade e tempo de vida. Quando
a AIDS surgiu, nos anos 80, pouco se sabia sobre as diferenças entre contaminado e doente morriam em muito pouco tempo. Era questão de um ano entre a notícia e a morte. Com o
surgimento das primeiras drogas que controlavam o desenvolvimento do vírus e o acúmulo do
conhecimento clínico que acelerava o diagnóstico e tratamento das infecções oportunistas, o
tempo de vida foi aumentando de forma muito significativa.
Hoje se sabe que uma pessoa pode ficar contaminada sem manifestar a doença por
muito tempo, entre 10 e 15 anos, e que alguns podem viver sem que a doença se manifeste. Estar
com o vírus não é mais sinônimo de ficar doente. Hoje se sabe que uma pessoa doente que recebe
todos os tratamentos e cuidados necessários pode sobreviver com a doença por muitos ou vários
anos, três a quatro vezes mais do que se vivia antes.
Tudo isso significa que, em grande medida, viver ou morrer depende do
tratamento já existente. Quem se trata sobrevive. Quem não se trata morre. A vida cobra a conta.
A morte iguala. Quem tem recursos pode apostar na cura que virá. Pode ter a alegria de viver a
cura de uma epidemia que assustou e ainda assusta o mundo. Quem não tem recursos vai saber
que seu tempo é do tamanho de sua conta bancária e que, no Brasil, viver ou morrer é em grande
medida uma questão social, já que, no caso da AIDS, ser rico ou pobre significa viver mais, ou
menos, tempo.
Para uma pessoa doente e pobre, estar com AIDS é um drama duplo: o de ser
pobre e o de sofrer as conseqüências de uma epidemia que ainda está em processo de controle e a
caminho da cura, e, principalmente, o de saber que seu tempo de vida vai ser tão roubado quanto
seu salário, suas esperanças, sua qualidade de vida, sua cidadania.
Nesse quadro é triste ver como o poder público, em nível federal, estadual e
municipal, em geral e com apenas raras exceções, está totalmente indiferente a essa tragédia. De
costas para a epidemia, ignora o imenso sofrimento dos pobres e espera que a morte ocupe o
lugar da vida, negando as possibilidades de tratamento, que só existem para uns poucos.
É triste saber que, até em relação à AIDS, o apartheid social existe e que aqui,
entre nós, existe uma Beláfrica.
CONFESSO QUE ESTOU VIVO
Assim como todo brasileiro, eu vejo televisão. Depois de um dia de trabalho
intenso, cheguei em casa e liguei a TV para ver os noticiários, quando fui pego de surpresa.
Aparecia na tela um jovem que dizia ter sido tuberculoso, mas que estava curado. Respirei
aliviado. Uma jovem dizia que tinha câncer e que se curou. Fiquei mais animado ainda com o
progresso da medicina. Logo entra um jovem, olha para mim e diz: "Eu tenho AIDS e não tenho
cura!".
Depois li nos jornais que a segunda etapa dessa campanha veiculada pela TV
começaria. No carnaval ia aparecer a máscara negra - o negro da morte e do racismo - para
continuar o didático processo de assustar a população, uma espécie de terrorismo pedagógico
com seqüestro da esperança.
Fiquei parado por um tempo, pensando, com amarga sensação de que alguém me
estava puxando para baixo, para a idéia da morte, para o fundo do poço. Custava a crer que fosse
uma propaganda promovida pelo Ministério da Saúde, mas era.
Lembrei-me de que a AIDS havia aparecido em 1981, ligada à idéia da morte,
doença fatal, vírus invencível, morte com data marcada. Estar com AIDS era estar marcado para
morrer muito mais rápido do que qualquer mortal. Os primeiros doentes de AIDS percorreram em
pouco tempo esse caminho do sofrimento terrível, da discriminação e da morte. Acompanhei e
presenciei a morte de meus dois irmãos hemofílicos, Henfil e Francisco Mario. Na morte de
Henfil, Francisco, sabendo que iria morrer, não resistiu à tentação de prever a minha morte.
Generosamente me deu três anos!
Com o tempo muita coisa foi mudando. O vírus foi perdendo sua invencibilidade e
seu caráter de absoluta excepcionalidade. Veio o AZT, que não cura, mas controla em muitos
casos o desenvolvimento da doença. Vieram várias outras drogas que estão sendo testadas e
administradas, como o DDI e vários outros. Vieram os tratamentos preventivos nos soropositivos
e nos doentes, como o uso de pentamidine para combater a pneumonia mais comum entre os
doentes de AIDS (Pneumocistis carini). Os prazos de manifestação da doença foram se alargando
para 7, 10, 15 anos. Os prazos de sobrevivência dos doentes romperam a barreira do ano e meio.
A vacina deixou de ser uma pura hipótese e está sendo testada. Enfim, a AIDS foi e está sendo
enfrentada como uma doença que ainda não tem cura, mas que já pode ser em grande medida
controlada e que, num prazo ainda não determinado, poderá ser curada ou definitivamente
controlada, como já ocorreu com tantas outras doenças incuráveis da história. Lembro-me de que
sou um incurável hemofílico, fui um incurável tuberculoso aos 15 anos e um incurável maoísta
nos anos 70. Hoje me sinto curado de todas essas doenças.
Depois de me preparar para morrer em dois anos - fiz também meus cálculos - e
de verificar que já se passaram quase três anos de minha morte anunciada, cheguei à conclusão de
que o melhor que faço é me preparar mesmo para continuar vivendo. Tenho ainda e gozo de boa
saúde e grande disposição para o trabalho, principalmente político, como: lutar pela
democratização do país, contra os pacotes econômicos, participar de campanhas de saúde,
particularmente AIDS, recuperação do Rio de Janeiro, defesa dos direitos humanos, proteção ao
meio ambiente, reforma agrária, entre outras questões.
Nesse período de preparação para a morte, cheguei mesmo a propor a meu xará
Herbert Daniel a compra comum de uma sepultura no Cemitério São João Batista, dado o alto
preço desse bem essencial e a economia que faríamos, colocando na mesma tumba um nome e
dois sobrenomes. Herbert Daniel chegou a facilitar a minha proposta, dizendo que ele queria ser
cremado, o que obviamente me daria muito mais espaço pelo mesmo preço.
Hoje me vejo em situação embaraçosa para mim e para meus amigos. Minha
morte não ocorreu. Tive de assistir desolado à morte de vários amigos que se foram antes de
mim. Minha saúde continua boa, apesar de todas as campanhas do Ministério da Saúde e de todos
os remédios que tomo, incluindo a cerveja, que até hoje não apresentou nenhum efeito colateral
com o AZT. Trabalho intensamente como se estivesse realmente vivo. Vou ao cinema e a shows
musicais sem provocar nenhum espanto entre aqueles que me vêem vivo. Escrevo para jornais.
Dou entrevistas para rádios e televisões nacionais e estrangeiras, demonstrando sinais
inequívocos de inteligência, agilidade e bom humor (salvo quando falo da equipe econômica do
governo).
Meu analista, desesperado com a minha insistência em não morrer, já propôs o fim
do tratamento. Meu médico imunologista já recebe com visível inquietação os resultados normais
de meus hemogramas. Minha companheira muitas vezes se esquece de minha situação e me trata
com a absoluta e notável naturalidade.
Foi aí que a propaganda do Ministério da Saúde veio me recolocar no meu devido
lugar e apontar um caminho. Gravei em vídeo a mensagem e agora passei a ver a propaganda
toda vez que desperto e antes de dormir. "Tenho AIDS e não tem cura!". Decidi então
acrescentar, ou aperfeiçoar o vídeo do governo (pago por muitas empresas que querem fazer o
bem para as pessoas com AIDS), uma mensagem minha para mim mesmo, que diz: "Convença-se
disso, seu imbecil. O Ministério da Saúde sabe o que é bom para você. O governo só quer o seu
bem! Cancele todos os seus compromissos de hoje, principalmente os políticos. Vista-se de preto
para ficar mais apropriado à sua situação. Acabe com esse sorriso sem sentido que brota de sua
boca. Mande sua companheira e filhos para lugares bem distantes para que não vejam o seu fim
tão próximo. Feche a porta. Venha de lá um abraço. Dr. Alceni. Abra o gás!".
A AIDS NÃO É MORTAL
Mortais somos todos nós .
A AIDS surgiu nos anos 80 como uma doença mortal e sem cura. Um vírus,
transmitido pela relação sexual ou pelo sangue, entrava no sistema imunitário e protegido, por
estar dentro dele, o destruía de forma inexorável, deixando suas vítimas expostas a todo tipo de
doenças que, em última análise, determinavam numa morte rápida, trágica e sem remédio.
Associando sexo e morte, a AIDS transformou-se na bomba do século vinte, que
pretendia haver liberado o sexo e estar anulando gradualmente a morte. De repente, a ciência
estava impotente diante de um vírus e a morte era de novo inevitável. O conhecimento inicial
sobre a AIDS definiu uma teoria de que não havia possibilidade de cura, era uma doença
incurável. Toda pessoa afetada, tocada, atingida pelo vírus HIV estava duplamente condenada.
Primeiro, a morrer como todas as pessoas e segundo, a morrer muito mais rápida e tragicamente
do que todas as demais, como se pudesse haver uma dose dupla de morte para uma única pessoa.
Esse nascimento trágico determinou até agora as atitudes básicas diante da AIDS: o medo, a
impotência, a fuga, a clandestinidade, a omissão, o terror e o abandono. Na contramão, vieram os
que lutaram contra o preconceito e o pânico e pregavam a solidariedade como o único remédio
disponível para curar os terrores de tal epidemia. Mas vinham também com a idéia da morte nas
mãos.
As pessoas afetadas pelo vírus se viram diante do trágico e não de uma doença. Os
cientistas se viram diante da impotência da cura e não do desafio da descoberta que tem que
inventar caminhos. Os governos praticaram o terrorismo e incorporaram todos os preconceitos
que a sociedade inspirava, decretando, na maioria dos casos, a morte civil dos portadores do vírus
fatal. Diante de uma epidemia fatal, que atacava homossexuais, drogados e hemofílicos, os
governos optaram por tentar proteger - através de campanhas terroristas - aqueles que não tinham
sido contaminados e deixar no abandono as "minorias" que já haviam sido tocadas pela
fatalidade, cuja via era o sexo promíscuo ou o sangue contaminado e cujo destino era a morte. Os
hemofílicos eram as vítimas inocentes de uma tragédia onde os verdadeiros culpados, os
promíscuos sexuais e os drogados, pagariam com a morte em conseqüência de seus próprios atos.
O vírus da AIDS era uma espécie de guilhotina que caía sobre a cabeça dos
culpados. Muita gente tomou carona no vírus para propagar suas idéias, valores e preconceitos.
Dez anos se passaram. Muita coisa mudou e não passou ao conhecimento do
público, outras continuam iguais apesar de todas essas mudanças. O conhecimento científico
trabalha hoje com a idéia da possibilidade da cura ou controle da doença: foram criados remédios
que controlam o desenvolvimento do vírus (AZT), os virostáticos, e estão sendo pesquisados
remédios que poderão destruir o próprio vírus, os viricidas. Cerca de 11 tipos de vacinas estão
sendo testadas, o que poderia abrir a porta para a prevenção em massa das populações não
afetadas e para o controle da doença nas pessoas já atingidas. As pessoas infectadas pelo vírus, os
soropositivos, que, no princípio se pensava, podiam viver somente alguns poucos anos, têm hoje
uma expectativa média de vida, sem o desenvolvimento da doença, da ordem de 9 a 10 anos, e
admite-se até que uma porcentagem delas possa não desenvolver a doença. No campo da clínica
médica, o monitoramento dos soropositivos e o tratamento das pessoas com AIDS foram passos
importantes para prolongar e melhorar a qualidade de vida das pessoas. Em muitos países, não no
Brasil, a qualidade das campanhas educativas vai produzindo efeitos, contribuindo para a
modificação de hábitos que ajudam na prevenção. A idéia dos grupos de risco, que servia para
isolar e discriminar as vítimas, foi abandonada. Fala-se hoje em comportamentos de risco e sabese que, em tese, todas as pessoas podem vir a serem afetadas pela epidemia: heterossexuais,
bissexuais, homossexuais, homens, mulheres de todas as idades.
A mais importante de todas as mudanças, no entanto, é que hoje se pode dizer que
a AIDS ainda não tem cura, mas poderá ter. Que a AIDS é curável e que a cura ou o controle da
doença é uma questão de tempo. Uma pessoa infectada hoje pelo vírus pode organizar sua vida na
expectativa de viver uma década em condições de normalidade, tempo talvez suficiente para que
se anuncie a cura definitiva da doença. Acabar com o mito da fatalidade da AIDS é
absolutamente necessário para que possamos mudar os comportamentos e as atitudes das pessoas
e dos governos. É necessário ver a AIDS como uma doença que poderá ser curada, tratada e
controlada e não como morte imediata e inelutável. No caldo de cultura do terror e do fatalismo,
não há mudança possível. As pessoas continuarão a contaminar seus parceiros ou parceiras. As
pessoas que ainda não foram contaminadas não estarão dispostas a se confrontar com algo que
não tem saída, nem salvação. Do terror das campanhas se foge. Da fatalidade se tenta escapar.
Qualquer racionalidade é vista como absurda ou como heroísmo sem futuro. É necessário
comunicar a toda a sociedade que a ciência avançou e avança e que os dias da AIDS estão
contados. A esperança não é um ato de irracionalidade, é uma esperança que anda de braços
dados com a vida e com a solidariedade.
Viver sob o signo da morte não é viver. Se a morte é inelutável, o importante é
saber viver, e para isso é importante reduzir o vírus da AIDS à sua real dimensão: um desafio a
ser vencido. É fundamental, portanto, reafirmar que esse vírus não é mortal. Mortais somos todos
nós. Isso sim é o inelutável e faz parte da vida.
(Dedico este artigo a Herbert Daniel, aquele que sempre esteve e está ao lado da
vida).
O DIA DA CURA
Numa manhã comum, como qualquer outra, abri o jornal e li a manchete:
Descoberta a Cura da AIDS! A princípio fiquei deslocado na cama, como se a terra tivesse saído
do lugar e meu quarto estivesse mais à esquerda do que de costume.
Fiquei por um tempo parado, sem saber qual deveria ser o primeiro ato de uma
pessoa de novo condenada a viver. Primeiro, certificar-se. Telefonei para o meu médico.
Realmente, a notícia era sólida, e o próprio presidente dava declarações na TV americana
assumindo a veracidade do fato: dez pacientes em estado avançado da doença haviam tomado o
CD2 e não apresentavam nenhum sinal ou sintoma da presença do vírus em seus organismos. Um
eficiente viricida fora descoberto. As outras notícias seguiam o mesmo curso. O laboratório do
CD2 tivera uma espetacular alta na bolsa de Nova Iorque. Na França, o Instituto Pasteur dizia que
outra coincidência acompanhava os caprichos da ciência. Ali também o SD2 estava no forno,
quase pronto para ser anunciado. Telefonei para o meu analista. Dei a notícia sobre a cura da
AIDS e decidi que só enfrentaria a felicidade nas próximas sessões. Afinal me havia preparado
tanto para a morte que a vida agora era um problema.
Do meu lado, Maria ainda dormia e não sabia que nossa vida havia mudado.
Casados há 21 anos, os últimos tinham sido um tempo de tensão a cada gripe, mancha na pele,
febre sem explicação. O amor feito durante tanto tempo e que havia sido interrompido pelo medo
do contágio, do descuido, do imponderável, estava agora ao alcance da vida como um milagre,
apesar de meus 56 anos, como costuma insistir um jornal paulista. Pensei comigo mesmo,
camisinhas nunca mais! Maria dormia, ainda não sabia da novidade. Ela agora poderia ser viúva
de outras coisas mais banais, mais correntes, mais normais. Ela não mais seria a viúva da AIDS.
Grandes avanços. Tinha os filhos para avisar. Não mais seriam órfãos da AIDS. O pai agora tinha
algo de imortal ou podia morrer como todo os mortais.
A TV continuava a mostrar cenas incríveis em Nova Iorque, e o meu telefone já
começava a tocar. Afinal, eu havia sido, durante quase dez anos o entrevistado perfeito para o
caso da AIDS: era hemofílico, contaminado e sociólogo. Podia desempenhar três papéis num só
tempo e numa só pessoa. Eu era uma espécie de trindade aidética! Iam querer saber o que sentia,
o que faria, meus primeiros atos, minhas emoções, minhas reações diante da vida e da
normalidade. Imaginava as perguntas: como você se sente agora que é de novo um ser normal? O
que vai fazer agora de sua vida? O que efetivamente mudou na sua vida? O que você aprendeu
com a AIDS? Você continua a ter raiva do governo? Cheguei a pensar, como Chico Buarque, que
daria minha primeira entrevista ao Jô Soares. Afinal, falaria da vida, tomando cerveja!
Ainda na cama, onde, de manhã, gosto de ficar, tive saudades do Henfil e do
Chico, e em meio à alegria que já me contagiava, chorei. Por que haviam sofrido tanto e morrido
tão fora de hora? Quanto sofrimento inútil, quanta dor que palavras não descrevem. O olhar
parado de quem expira. O abandono sem remédio. A fatalidade que nem a morte enterra? Por que
logo eles haviam morrido, se eram meus irmãos, a quem telefonava com a certeza de quem
acreditava poder fazer isso séculos e séculos seguidos? De repente, ninguém do outro lado da
linha. Números riscados numa agenda sem remédio. Ainda a lembrança do Chico no enterro do
Henfil, dizendo para mim, entre espanto e humor: hoje é o Henfil, amanhã serei eu, e você irá
daqui a 03 anos... Bem, digamos 05!
E hoje estou aqui passados 04 anos, quase 05, lendo essa notícia, e eles todos
mortos antes do tempo. Não há remédio para a morte de meus irmãos, que são tantos.
De repente me dou conta de que houve realmente remédio para a AIDS. É hora de
levantar, atender os telefonemas, reunir o pessoal da ABIA. Festejar com o pessoal do IBASE.
Abrir um champanhe, ou uma cerveja. Telefonar para saber onde estava o tal remédio, como
comprá-lo, o preço, o prazo da chegada. Estaria disponível quando, a que preço? Quem poderia
comprá-lo?
Algo inusitado acontecia em paralelo. Amigos e amigas, que não suspeitava, me
chamavam para dizer que eles também eram soropositivos, porque agora havia cura. Uns diziam
que suas vidas sexuais eram um caos, mas que agora havia cura. Alguns me chamavam para dizer
que iriam começar o tratamento, o controle e a pensar na vida, porque agora havia cura. E,
finalmente, outros me diziam que agora poderiam revelar a imprensa sua condição de
soropositivos, para servir de exemplo, porque agora havia cura.
De repente, dei-me conta de que tudo havia mudado porque havia cura. Que a
idéia da morte inevitável paralisa. Que a idéia da vida mobiliza... Mesmo que a morte seja
inevitável, como sabemos. Acordar, sabendo que se vai viver, faz tudo ter sentido de vida.
Acordar pensando que se vai morrer faz tudo perder o sentido. A idéia da morte é a própria morte
instalada.
De repente, dei-me conta de que a cura da AIDS existia antes mesmo de existir, e
de que seu nome era vida. Foi de repente, como tudo acontece.
Artigo publicado em: "Escritos indignados: Democracia x neoliberalismo no
Brasil", Rio de Janeiro : Rio Fundo Editora/IBASE, 1993.
A DEMOCRACIA NO BRASIL
A democracia é uma das mais antigas idéias da humanidade. Jamais
realizada plenamente. Em seu nome já se fez muito bem e se praticou muito mal. Tem servido ao
longo desse período tanto para inspirar movimentos libertadores como para justificar golpes
militares e regimes de opressão. Para alguns é apenas uma forma de governo, derivada de
eleições diretas que só existe nos países capitalistas. Para outros é algo mais profundo que afeta a
todas as relações da sociedade (econômicas, sociais, políticas, culturais) em busca da igualdade e
que, portanto não existe nas sociedades capitalistas.
É uma utopia, uma inspiração radical de transformação da sociedade. Uma idéiaforça que ilumina a história humana. Sempre presente e jamais plenamente realizada e, por isso
mesmo, motor permanente de transformação da própria humanidade.
A democracia é o igual e o diverso. O encontro de liberdades. A convergência da
pessoa e da comunidade. Da sociedade civil e do Estado (administração do bem público). A
democracia é o atendimento do básico e do transcendental. Do Pão e da Liberdade. Do finito e do
infinito. Do Eu e do Nós. É a afirmação da consciência, no mundo de sua falsificação em relações
coisificadas. Democracia é obra sem limite e portanto inacabável. Mas democracia é exatamente
aquilo que fizermos dela e por isso é fundamental inventá-la a todos os níveis e a cada momento.
A democracia se constrói em torno de alguns princípios fundamentais, simples em
seu enunciado, complexos e radicais em sua realização histórica: igualdade, liberdade,
diversidade, solidariedade, participação. Pensar a realidade brasileira à luz da democracia é rever
o passado, entender o presente e refletir sobre o futuro, tendo como referência esses princípios
básicos.
A PRODUÇÃO DA DESIGUALDADE
A nossa história é a produção da desigualdade. Há um passado do Brasil, no
entanto, que o Brasil desconhece. É aquele vivido pelos povos indígenas antes da chegada dos
colonizadores portugueses em 1500. (...)
Com a chegada pos portugueses se dá início à produção da desigualdade, imposta
através da guerra e extermínio dos povos indígenas, da escravidão de povos africanos e da
implantação de uma estrutura econômica e política fundada no domínio da coroa e dos grandes
proprietários locais.
Esse passado mostra o processo de concentração da propriedade da terra, da
riqueza e do poder nas mãos de uma minoria, ao lado da marginalização, exclusão e dominação
da maioria em relação a esses bens e a participação no poder. O desenvolvimento da produção no
Brasil não teve como contrapartida o desenvolvimento da cidadania. Ele se fez exatamente à
custa de sua negação. Senhor e escravo, dono de engenho e camponês submetido, latifundiário e
deserdados da terra constituem os pares desse Brasil. Se a cidadania não se dá na sociedade ela
também não se reflete no Estado, autoritário, centralizador. O Estado institucionaliza a exclusão,
organiza e mantém a desigualdade. (...)
O desenvolvimento dessas desigualdades chegou a tal ponto que o Estado se
desgarrou totalmente da sociedade e uma crise geral de legitimidade e governabilidade obrigou a
ditadura a abrir o caminho para a democratização. É verdade que cerca de 10 a 15% da população
ganharam com a industrialização internacionalizada. Ás custas do resto que ficou na margem. Foi
então que um certo ministro da economia de nome Delfim Netto aplicou a teoria do bolo que
deveria primeiro crescer para depois ser dividido. Essa teoria não explicava porque os donos do
bolo deveriam dividir o seu bolo, nem quando esse fato inusitado de caridade capitalista ou social
democrata deveria se dar. Nesse caso a culinária fracassou.
O controle dos meios de comunicação de massa constitui privilégios de alguns
grupos que editam a realidade do país segundo interesses e visões onde o que menos importa é o
que efetivamente acontece, mas em benefício de quem acontece. A mídia se apropriou do
imaginário e com ela tenta dirigir a realidade em benefício da ordem dominante, excludente. A
questão hoje é de se saber se a mídia é o quarto ou o primeiro poder da república e como sua
gestão pode ser democratizada. Os bens do poder são escassos para quem tem de lutar
diariamente para sobreviver.
A CIDADANIA
O direito de votar para presidente da República é um passo fundamental, mas é só
o primeiro na luta por restaurar os direitos da cidadania e o poder da sociedade civil sobre o
Estado. É que na política os bens estão também distribuídos de forma desigual. (...)
O capitalismo é menor que a sociedade. Sobra sociedade e se tenta substituir o
capitalismo e conter o excesso da sociedade através do Estado. Introduzir milhões na vida, nas
relações, na sociedade brasileira é a questão central da democracia. Não há como fazer
Democracia só para alguns, como uma ação entre amigos.
As condições institucionais básicas estão dadas para que a luta pela Democracia
sobreviva à crise econômica e social e se transforme no instrumento fundamental para a solução
de todos os problemas da sociedade. Resta seguir os seus caminhos através da participação, da
garantia das liberdades, da aceitação da diversidade e fundamentalmente do esforço permanente
de superação de todas as desigualdades. Para isso serve a democracia, e somente ela. Da
democracia estamos ainda muito longe, mas estamos a caminho. está ainda no horizonte de uma
conquista a ser feita pela maioria.
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SELEÇÃO DE FRASES E PENSAMENTOS
HERBERT DE SOUZA-BETINHO
Ética
"Em resposta a uma ética da exclusão, estamos todos desafiados a praticar uma
ética da solidariedade." (1993)
Transformações
"O que nos falta é a capacidade de traduzir em proposta aquilo que ilumina a
nossa inteligência e mobiliza nossos corações: a construção de um novo mundo."(1993)
Sociedades
"Quando uma sociedade deixa matar crianças é porque começou seu
suicídio como sociedade." (1991)
"Um país não muda pela sua economia, sua política e nem mesmo sua
ciência; muda sim pela sua cultura." (1993)
Inclusão
"A democratização das nossas sociedades se constrói a partir da democratização
das informações, do conhecimento, das mídias, da formulação e debate dos caminhos e dos
processos de mudança." (1991)
"A terra e a democracia aqui não se encontram. Negam-se, renegam-se. Por isso,
para se chegar a democracia é fundamental abrir a terra, romper essas cercas que excluem e
matam, universalizar esse bem, acabar com o absurdo, restabelecer os caminhos fechados, as
trilhas cercadas, os rios e lagos apropriados por quem, julgando-se dono do mundo, na verdade o
rouba
de
todos
os
demais."
(1994)
Essência
"A luta pela democracia é que desenvolve o mundo e ela se constrói com e através
da comunicação."(1993)
"Toda informação é, de certa forma, uma proposta ou elemento de formulação de
propostas. É matéria-prima fundamental da ação política e, portanto, do trabalho cotidiano dos
movimentos
populares."
(1990)
Olhares
"É preciso olhar a propriedade da terra com o olhar da democracia, com o olhar da
vida,
e
não
com
o
olhar
da
cobiça,
da
cerca,
da
violência..."
(1994)
"É importante ver, com os dois olhos, os dois lados - para mudar uma única
realidade, a que temos." (1997)
"Essas crianças estão nas ruas porque, no Brasil, ser pobre é estar condenado à
marginalidade. Estão nas ruas porque suas famílias foram destruídas. Estão nas ruas porque nos
omitimos.
Estão
nas
ruas,
e
estão
sendo
assassinadas."
(1992)
"No Brasil não existia o controle do sangue: a Aids era desconhecida. Ele não
existia também para outras doenças. Assistimos ao comércio de sangue, uma irresponsabilidade
total.
Neste
sentido,
a
Aids
salvou
o
sangue."
Passos
"Não podemos aceitar a teoria de que se o pé é grande e o sapato, pequeno,
devemos
cortar
"Para
fundamental que
que
um novo
o
pé.
nascer
um
Temos
novo
de
Brasil,
trocar
humano,
de
sapato."
solidário,
(1995)
democrático , é
uma nova cultura se estabeleça, que uma nova economia se implante e
poder
expresse a sociedade democrática e a democracia no Estado."
Humanidade
"O desenvolvimento humano só existirá se a sociedade civil afirmar cinco pontos
fundamentais: igualdade, diversidade, participação, solidariedade e liberdade." (1994)
"Democracia serve para todos ou não serve para nada." (1995)
SUAS OBRAS
SOUZA, Herbert de. A Centopéia que Pensava. 1. ed. : Salamandra, 1999
SOUZA, Herbert de. A Centopéia que Sonhava. 2. ed. : Salamandra,1999
SOUZA, Herbert de. A Lista de Ailce 1.ed. : Cia das Letras, 1996
SOUZA, Herbert de. A Cura da Aids . 1. ed. : Relume Dumará, 1994
SOUZA, Herbert de. A Zeropéia, : ed. Salamandra,1994
SOUZA,Herbert de. Como Se Faz Análise de Conjuntura : Vozes, 2001
SOUZA, Herbert de. et al. Estreitos Nós - Lembranças de um Semeador de Utopias : Garamond,
2001
SOUZA, Herbert de. Ética e Cidadania - Col. Polêmica : Moderna, 1996
SOUZA, Herbert de. Miltopéia - A Centopéia Solidária : Salamandra, 1998
SOUZA, Herbert de. Revoluções da Minha Geração - Col. Polemica: Moderna, 1997
SOUZA.Herbert José de.No fio da navalha.1.ed. : Revan, 1996
SOUZA, Herbert de; AFONSO, Carlos A. O Estado e Desenvolvimento do Capital No Brasil 1.
ed. : Paz e Terra, 1977
SOUZA, Herbert de. et al. Em Defesa do Interesse Nacional. 3. ed.: Paz e Terra,1994
SOUZA, Herbert de. Escritos Indignados: Democracia x neoliberalismo, Rio de Janeiro: ed.: Rio
Fundo/IBASE, 1993
ANEXO I
OBRAS – SINOPSES
1. A Centopéia que Pensava
Um belo dia, Dona Centopéia descobriu que,
além de suas cem patinhas, ela tinha uma
cabeça e que podia pensar. Ela podia ter idéias,
inventar histórias, fazer as coisas acontecerem
dentro de sua cabeça antes que acontecessem
fora. Descobriu, também, que por meio do
pensamento é possível fazer muito bem ou
muito mal para os outros e até mudar o mundo.
Pronto, estava dado o primeiro passo para
várias outras descobertas. Junto com seus
amigos, Dona Centopéia procurará respostas
para grandes e pequenas questões que
envolvem esse grande mistério que é a vida.
2. A Centopéia que Sonhava
Quem nunca sonhou poder voar como um
pássaro? Ou nadar como um peixe? Que
maravilhoso seria cantar como um sabiá! Dona
Centopéia sonhava fazer tudo isso, mas tinha
as suas limitações, como todas as pessoas e
bichos. Neste livro, Betinho nos mostra que,
sozinhos, podemos muito pouco, mas quando
nos ajudamos uns aos outros, conseguimos
realizar nossos sonhos. Não é difícil imaginar
o porquê de tanta sensibilidade para falar de
sonhos compartilhados. Betinho nunca
sonhava sozinho.
3. A Lista de Ailce
Era uma vez Bocaiúva e seus habitantes... Esta
poderia ser a maneira de ler o livro de Herbert
de Souza, o Betinho, que retorna à cidade onde
nasceu através de uma lista de nomes
preparados a seu pedido pela prima Ailce. Só
que teríamos de aumentar a frase : Era uma vez
Bocaiúva e seus habitantes... que morreram.
Os nomes listados dão origem a pequenos
necrológios, só que diferentes das notícias de
morte publicadas nos jornais que tratam de
gente ilustre. Os necrológios de A lista de
Ailce contam breves e saborosas histórias de
vidas de homens e mulheres que habitaram a
infância de Betinho na pequena cidade
mineira. Uma galeria de figuras ímpares, que
inclui o tio colecionador de tudo e chefe do
correio local, os casais perfeitos e os
imperfeitos, o médico que errava diagnósticos,
o primo suicida, os mendigos e os padres, as
mulheres avançadas para o seu tempo. E outra
galeria: a dos tipos mineiramente chamados de
sistemáticos, os loucos internados na casa da
própria família, além da mulher opiniática, que
toma decisões à revelia do marido, e do
apaixonado, o homem desiludido que adoece
de frustração. Até o político famoso - José
Maria Alkimin - ganha seu necrológio, em que
se destaca a capacidade de fazer promessas e
nunca cumpri-las. A genealogia familiar
comparece em peso: José Maria, o primeiro
irmão hemofílico a morrer, a avó Dona
Mariquinha - a mãe-grande e controladora de
todos os movimentos da família -, as tias, a
irmã, os irmãos mortos pela AIDS, o pai
Henrique e a mãe, Dona Maria, destinatária
das famosas cartas para a mãe escritas por
Henfil para a imprensa e para a TV nos anos
70. De cada personagem se narra um
pedacinho da vida, aquele que melhor define
uma fragilidade ou uma grandeza. Afinal,
quase todos, antes de morrerem, viveram
muito. Fazendo a crônica dos mortos de
Bocaiúva, Betinho vai reunindo lembranças: as
namoradas encantadas da infância, o quarto de
menino tuberculoso nos fundos da casa, a
iniciação na militância política ainda na
juventude e, ao final, desenha um esboço de
auto-retrato. Narrando histórias de cidades do
interior, que se repetem em qualquer parte do
mundo, Betinho cria uma família literária para
4. A Cura da Aids
Seis Ensaios Sobre Aids e Política de Saúde.
5. A Zeropéia
Dona Centopéia caminhava com suas cem
patinhas pela floresta, quando encontrou uma
barata. Ágil e esperta, a barata ficou muito
assustada com a grande quantidade de patas da
Centopéia. Ela tinha apenas seis patas e podia
correr, subir em paredes, fugir das chineladas...
Por que a Centopéia precisava de cem patas?
Outros bichos e outros problemas surgirão no
caminho da Centopéia. Mas a solução, a
Centopéia descobrirá dentro de si mesma. Este
foi o caminho que Betinho encontrou para
mostrar à criança que precisamos, antes de
tudo, gostar de nós mesmos. Respeitar as
opiniões diferentes não significa abdicar de
nossas próprias idéias.
6. Como se faz análise de Conjuntura
Conforme o pensar do autor, todos, em tudo
que fazem, analisam conjunturalmente. Este
livrinho, no entanto, quer mostrar que a análise
de conjuntura consiste numa técnica e, por isto,
é uma mistura de conhecimento e descoberta,
uma leitura especial da realidade, que se faz
sempre em função de alguma necessidade ou
interesse.
7. Estreitos Nós - Lembranças de um
Semeador de Utopias
Este pequeno-grande livro comunica que
Betinho continua, transvivenciando aquele
novembro de 1935, ao sair do útero quentinho
da Dona Maria, e muito além de agosto de
1997, quando seu corpo deu o último suspiro.
Quem são os "evangelistas" dessa notícia
solar? Não são anjos, nem santos, nem
profetas. Somos nós, seus amigos e amigas "de
copo e de cruz". Ateus, judeus, cristãos,
orientalistas, agnósticos. Românticos e ultrarealistas. Artistas e cientistas. Inconformados e
falíveis, todos. Mas o primeiro arauto dessa
ressurreição é o próprio Betinho, com a carta
que escreveu à sua sempre amada Maria, já
com a extra-lucidez e a suprema liberdade dos
que se sabem perto do fim. Com esta
consciência de ser finito e ultrapassável,
Betinho assinalou o que fica para sempre: um
sentido para a vida, o ideal de deixar o mundo
um pouquinho melhor do que quando nele
entramos. Atenção, leitor(a): você não tem em
mãos a biografia de um admirável homem
público, escrita por duas dezenas de autores
famosos. O que você vai ler é uma sacudidela
na tentação da vidinha frouxa, ensimesmada.
Pois Betinho soube ser um louco-manso,
heroicamente mortal, semeador de utopias. Ele
continua em todos nós, estreitos e amplos nós.
8. Ética e Cidadania
Numa entrevista em que fala do golpe de 64,
da clandestinidade, do exílio e da anistia que o
trouxe de volta, Betinho demonstra que há no
Brasil uma enorme fome de ética, que apenas
começou a se manifestar, e que democracia e
miséria são incompatíveis. Este livro é um
testemunho vivo do processo de mudança da
sociedade brasileira, no qual o jovem tem
participação decisiva. Um volume totalmente
dedicado às questões da ética na política e da
cidadania.
9. Miltopéia - A Centopéia Solidária
Antes de partir, Betinho nos deixou esta que é
a última aventura de sua simpática Centopéia.
Chico Alencar, atendendo pedido do próprio
Betinho, acrescentou ao texto o seu talento, a
sua sensibilidade. Juntos, Betinho, Chico e a
ilustradora Bia Salgueiro deram vida à
Miltopéia.
A Centopéia que já foi Zeropéia, que pensou e
sonhou, acaba de descobrir um sentimento
mágico. Trata-se da solidariedade. O mesmo
sentimento que Betinho transformou em
linguagem corrente, em ação, em sonho
realizado. Solidariedade que tem o poder de
nos transformar em dez, em cem, em mil...
Movida por este sentimento tão revolucionário,
a Centopéia desta deliciosa história descobre o
que o seu criador já havia descoberto: "É
possível mudar o mundo a partir da cidadania".
Nossa amiga, por sua vez, mudou a floresta!
10. Revoluções da Minha Geração
Este livro é resultado de uma das poucas
concessões que Betinho fez na vida, e de
muito trabalho. O jornalista francês François
Bougon esteve no Brasil, a convite da
Fondation pour le Progrès de I´Homme,
agência parceira do Ibase, para uma série de
entrevistas. Bougon teve o mérito de fazer
Betinho desdobrar-se em tempo e em
memória, revelando fatos marcantes de sua
vida.
11. No Fio da Navalha
Herbert Jose de Souza, o Betinho, Relata Neste
Livro a sua Historia Pessoal e Política, que se
Confunde com a Historia Recente do Brasil. no
fio da Navalha e o Relato Deste Homem Que,
Desde a Infância, Transformou sua Vida em
Luta em Favor da Sociedade.
12. O Estado E Desenvolvimento Capitalista
No Brasil
Neste livro o Estado, em sua dimensão
nacional, é analisado como instância
reguladora e organizadora de um modo
particular de desenvolvimento capitalista,
correspondente aos interesses de determinadas
classes sociais que traduzem sua hegemonia
através de formas particulares de legitimação.
Já em sua dimensão internacional, o Estado é
analisado como instância de articulação
econômica e política da formação social
nacional com o sistema capitalista mundial.
13. Em Defesa do Interesse Nacional
No livro, um elenco excepcional de analistas
busca combater a desinformação provocada
pela ofensiva ideológica patrocinada pelos
representantes dos interesses neoliberais e seus
aliados que, ao defender a venda do patrimônio
público, pretendem na verdade transformar a
economia brasileira numa espécie de
subsidiária
dos
países
capitalistas
desenvolvidos, sem autonomia e sem qualquer
capacidade de vôo próprio. O leitor
compreenderá o que significa o chamado
Consenso de Washington e terá uma visão
clara do que está por trás da campanha para
liquidar com os monopólios estatais do
petróleo e das telecomunicações mantidos pela
Constituição de 1988.
14. . Escritos Indignados: Democracia x
neoliberalismo
O livro que o autor tem agora em mãos fala de
um Estado insensível e excludente, que nos
ameaça de morte. No entanto, é a vida que nos
aproxima, não a morte. Sobretudo, as lutas que
movem
as
nossas
vidas.
"O que nos falta é a capacidade de traduzir em
proposta aquilo que ilumina nossa inteligência
e mobiliza nossos corações: a construção de
um novo mundo..."
CONCLUSÃO
Brasil, país das diferenças sociais... Positivista, que tem como lema “A Ordem e o
Progresso”.
Brasil, terra onde a Democracia apenas existe no papel...
Tantos os excluídos, os que sofrem preconceitos, e poucos os que detém a
concentração de renda e o controle político.
Fome, miséria, doença... a muitos.
CPIS e muito dinheiro a poucos.
Pouco conhecia do Betinho, mas com a Pesquisa realizada me tornei sua fã, me
identificando com suas aspirações , lutas e conquistas.
José Herbert de Souza, sociólogo, aidético, hemofílico... HERÓI!
Em seu legado de atitudes nada fez por desmerecer a sua missão na Terra: ser um
transformador social.
Poderia ter cruzado os braços, se atirado a uma cama e esperado a morte chegar,
como muitos fizeram, mas com sua coragem, determinação e amor ao próximo “arregaçou” as
mangas e pôs mãos à obra.
E que obras realizou...
Sabe, Betinho, por aqui nada mudou muito, continuamos na mesma, lutando,
caindo, sonhando, sobrevivendo, mas com a certeza que a luta que você iniciou e as obras que
realizou têm continuado pelas mãos daqueles que acreditaram e acreditam em tudo o que você
fez.
Continuaremos lutando por um mundo melhor, mais justo, onde as pessoas sejam
realmente vistas como seres humanos, e para isso devemos “Ver com os olhos do coração” e
“fazer ao próximo o que faríamos a nós mesmos”.
Mesmo que tudo pareça perdido, acreditar é preciso, pois só a esperança por um
mundo melhor, mais igual e
justo aliada à solidariedade ativa provocará com certeza as
mudanças necessárias para que todos os homens sejam iguais!
“Viver sob o signo da morte não é viver. Se a morte é inelutável, o
importante é saber viver !” Betinho
Herbert de Souza - Betinho
Mortais somos todos nós. Isso
sim é o inelutável e faz parte
da vida.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
<http://www.livrariasaraiva.com.br/produto>. Acesso em: 17 dez. 2005.
<http://www.aids.gov.br/betinho/perfil.htm> Acesso em: 17 dez. 2005.
<http://www.bibvirt.futuro.usp.br/textos/resenhas/livros/livros.html> Acesso em : 18 dez 2005.
<http://www.mercadobr.com.br/pesquisa> Acesso em: 17 dez. 2005.
<http://members.fortunecity.com/zipnet> Acesso em : 18 dez. 2005.
<http://www.geocities.com/florestabook/plvpromocoes.htm> Acesso em: 17 dez. 2005
<http://www.siciliano.com.br/livro> Acesso em: 17 dez. 2005.
<http://tudo.americanas.com.br> Acesso em: 17 dez. 2005.
<http://www.submarino.com.br> Acesso em: 17 dez. 2005.
<http://www.sodiler.com.br> Acesso em: 17 dez. 2005.
<http://pesquisa.bondfaro.com/livros.html> Acesso em: 17 dez. 2005.
<http://www.brazil-brasil.com/index.php?option=content&task=view&id=257> Acesso em: 18
de dezembro de 2005
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