V Domingo da Quaresma (Ano A) O texto – Jo 11,1-45 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 Ora, havia um doente, LÁZARO de Betânia, a aldeia de MARIA e de MARTA, sua irmã. MARIA era aquela que tinha ungido o Senhor com perfume e tinha enxugado os seus pés com os seus cabelos; o seu irmão LÁZARO estava doente. Então, AS IRMÃS mandaram dizer-lhe: «Senhor, AQUELE de quem és amigo está doente». Mas Jesus, ouvindo isto, disse: «Esta doença não é para a morte, mas para a glória de DEUS, para que seja glorificado o FILHO DE DEUS por meio dela». Ora, JESUS amava MARTA, sua irmã e LÁZARO. Quando ouviu que ele estava doente, permaneceu ainda dois dias no lugar onde estava. Só depois disse aos discípulos: «Vamos de novo para a Judeia». Dizem-lhe os discípulos: «Rabi, há pouco os judeus procuravam apedrejar-te, e vais para lá?». Respondeu Jesus: «Não são doze as horas do dia? Se alguém caminha de dia, não tropeça, porque vê a luz deste mundo. Mas, se alguém caminha de noite, tropeça, porque a luz não está nele». Disse isto e depois disse-lhes: «Lázaro, nosso amigo, dorme, mas vou DESPERTÁ-LO». Disseram-lhe, então, os discípulos: «Se ele dorme, será curado!». Mas Jesus tinha falado da sua morte; eles, porém, pensaram que fosse do repouso do sono. Então, Jesus falou-lhes claramente: «Lázaro morreu; e Eu alegro-me por vós por não ter estado lá, para que CREIAIS. Mas vamos ter com ele». Então, Tomé, chamado Gémeo, disse aos companheiros: «Vamos também nós e morramos com Ele». 17 18 19 20 21 22 23 24 Ao chegar, Jesus encontrou-o já há quatro dias no sepulcro. Betânia ficava perto de Jerusalém, a cerca de quinze estádios. Muitos judeus tinham vindo junto de MARTA e MARIA para consolá-las pelo irmão. Logo que MARTA ouviu dizer que Jesus chegara, foi ao seu encontro, enquanto MARIA ficou sentada em casa. Marta disse, então, a Jesus: «Senhor, se Tu estivesses aqui, o meu irmão NÃO TERIA MORRIDO. Mas, ainda agora, eu sei que tudo o que pedires a Deus, Ele to concederá». Disse-lhe Jesus: Disse-lhe Marta: «Teu irmão «Eu sei que ele 25 RESSUSCITARÁ NA RESSURREIÇÃO no último dia». Disse-lhe Jesus: «EU SOU A RESSURREIÇÃO E A VIDA. Quem CRÊ EM MIM, ainda que morra, VIVERÁ. E quem VIVE e CRÊ EM MIM jamais morrerá para sempre. CRÊS nisto?». 26 27 RESSUSCITARÁ». Ela disse-lhe: «Sim, Senhor; EU CREIO que Tu és o CRISTO, O FILHO DE DEUS que deve vir ao mundo». 28 29 30 31 Dito isto, afastou-se e chamou sua irmã MARIA. Ela disse-lhe à parte: «O Mestre está aqui e chama por ti». Ela, logo que ouviu isto, levantou-se rapidamente e foi ter com Ele. JESUS ainda não tinha entrado na aldeia, mas estava ainda no lugar onde o encontrou MARTA. Então, os judeus que estavam com ela, em casa, para consolá-la, vendo que MARIA se levantou à pressa e saiu, seguiram-na, pensando que fosse ao túmulo para aí chorar. 32 Quando MARIA chegou ao lugar onde estava Jesus, vendo-o, caiu a seus pés, dizendo-lhe: «Senhor, se Tu estivesses aqui, o meu irmão NÃO TERIA MORRIDO». 33 Quando Jesus a viu chorar e os judeus que tinham vindo com ela a chorar também, comoveu-se e perturbou-se, e disse: «Onde o pusestes?». Dizem-lhe: «Senhor, vem e vê». Jesus chorou. Diziam, então, os judeus: «Vede como ele o amava!». Alguns deles disseram: «Esse que abriu os olhos do cego, não podia fazer com que ele NÃO MORRESSE?». 34 35 36 37 38 Jesus, suspirando de novo intimamente, foi até ao sepulcro; 39 40 41 42 43 44 45 era uma gruta e estava posta sobre ela uma pedra. Disse Jesus: «Tirai a pedra!». MARTA, a irmã do defunto, disse-lhe: «Senhor, já cheira mal, pois é o quarto dia». Disse-lhe JESUS: «Eu não te disse que, se creres, verás a glória de DEUS?» Tiraram, então, a pedra. Jesus, então, ergueu os olhos e disse: «Pai, dou-te graças porque me ouviste. Eu sabia que sempre me ouves, mas disse isto por causa da multidão que me rodeia, para que CREIAM que me enviaste». E dito isto, bradou com voz forte: «LÁZARO, vem para fora!». O morto saiu, com os pés e as mãos envoltas em ligaduras e o rosto coberto com um véu. Jesus disse-lhes: «Desligai-o e deixai-o ir». Então, muitos dos judeus que tinham vindo a casa de Maria, ao verem o que JESUS fez, CRERAM nele. Breve comentário O evangelho deste domingo é mais uma das catequeses que o evangelista João apresenta na primeira parte do seu evangelho, o «Livro dos Sinais». Apesar de ser um texto bastante longo, chamado vulgarmente «a ressurreição de Lázaro», dedica apenas dois versículos a este episódio. O resto do texto procura ajudar o leitor ou o ouvinte a entrar na profundidade da mensagem que o «sinal» quer transmitir. O termo «ressurreição» referido a Lázaro é equívoco. Será melhor falar de «reanimação», um regresso a este mundo para retomar a vida material, reservando a palavra «ressurreição» para significar a entrada para a vida inaugurada por Jesus na Páscoa, deixando esta vida material para entrar no mundo de Deus. Logo no início da narração é apresentada uma família composta apenas por três elementos, não havendo referência a outros membros, com a nota de que são «irmãos». Pelo facto de as duas irmãs, Marta e Maria, terem o controlo da casa, podemos pensar que Lázaro (forma grega do nome Eleazar, que significa «Deus ajudou») seria menor ou solteiro. Por outro lado, é com a palavra «irmão» que Jesus ressuscitado se refere à comunidade dos discípulos (Jo 20,17) e é assim que os membros da primeira comunidade cristã se tratam. A relação entre Jesus e esta família é apresentada em termos de amizade e de amor recíproco. As irmãs de Lázaro enviam-lhe um recado: «Senhor, aquele de quem és amigo está doente», em que está implícito um pedido de ajuda. Porém, Jesus não vai imediatamente ter com o amigo doente, mas deixa que ele morra. Não tem a intenção de impedir a morte física, prolongando-a indefinidamente, mas quer dar uma lição acerca da sua missão e do plano do Pai: dar a vida eterna, apresentando um sentido diferente, novo, para a morte física. Jesus manifesta aos discípulos a sua intenção de ir para a Judeia porque o impele o amor para com o seu amigo e por todos os homens. Este é o motivo do seu peregrinar: o amor generoso e fiel por todos. Mas os discípulos que estão com ele só pensam no perigo que poderá representar tal atitude. Com a frase «Não são doze as horas do dia?», provavelmente citando um provérbio, Jesus compara a sua vida a um dia de caminhada. Enquanto não tiver terminado o que Deus lhe confiou, a sua vida não chegou ainda ao seu termo e a sua missão continua. Só quando tudo estiver realizado terá chegado a sua hora, virá a noite, o «poder das trevas», em que os seus inimigos poderão matá-lo. Com o atraso deliberado de Jesus, para quem a morte é um «sono», o amigo Lázaro acaba por morrer e é sepultado logo no mesmo dia, conforme o costume judaico. Há quatro dias que tal aconteceu. Já não há nada a fazer pois, para a mentalidade judaica, tudo está consumado a partir do terceiro dia, tornando a morte irreversível. As irmãs de Lázaro, uma após outra, chamam a atenção de Jesus para o seu atraso: «Senhor, se Tu estivesses aqui, o meu irmão não teria morrido». Mas Marta continua a confiar, acredita que Jesus é o Messias e pode fazer tudo, podendo fazer ressuscitar o irmão. Ela crê na ressurreição final, mas espera que Jesus actue agora. No Antigo Testamento Elias tinha ressuscitado o filho da viúva de Sarepta (1Rs 17,21) e Eliseu o filho da mulher sunamita (2Rs 4,14). O próprio Jesus tinha ressuscitado a filha de Jairo e o filho da viúva de Naim. Mas em todos estes casos nem sequer estavam sepultados, quanto mais tendo morrido há quatro dias e a cheirar mal! A afirmação fundamental do texto é descrita em poucas palavras: «Eu sou a Ressurreição e a Vida. Quem crê em mim, ainda que morra, viverá. E quem vive e crê em mim jamais morrerá para sempre». A catequese é evidente: aqueles que aderem a Jesus já possuem a vida definitiva. A morte física é inevitável, mas não é definitiva, é apenas um sono, uma passagem para a vida definitiva. Jesus não é indiferente ao sofrimento e à dor dos seus amigos. Chora perante a separação, embora apenas por algum tempo. Mas o evangelista faz notar que o choro de Jesus é diferente. Enquanto usa o verbo grego klaiein para Maria, Marta e os outros judeus, que tem o sentido dum choro acompanhado com gestos de desespero, para Jesus usa o verbo edákrusen que significa: «as lágrimas começaram a correr-lhe dos olhos». Trata-se dum choro sereno. A pedra que encerra o sepulcro representa uma barreira entre a vida e a morte, tornando-se símbolo de separação definitiva. É esta «pedra» que Jesus manda retirar, tal como removeu a pedra do seu sepulcro para vencer a barreira da morte, pois a morte não é um fim. Jesus reza ao Pai, não para pedir um milagre mas para que os que o rodeiam entendam o significado profundo do «sinal» que está para realizar. E bradou com voz forte: «Lázaro, vem para fora». Concretiza-se assim o que ele já tinha dito: «Chega a hora – e é já – em que os mortos hão-se ouvir a voz do Filho de Deus, e os que a ouvirem viverão. Todos os que estão dos túmulos hão-se ouvir a sua voz e sairão» (Jo 5,25-29). A ordem final de Jesus – «Desligai-o e deixai-o ir» – parece não ter sentido naquele momento. Mas o evangelista está a pensar na futura comunidade dos «irmãos» que choram a perda dum «irmão». É importante deixar que o irmão viva a sua condição duma vida nova e plena. Esta vida é um novo nascimento, como o entenderam os cristãos logo no início, assinalando o dia da morte como o dia festivo da comemoração de cada santo. P. Franclim Pacheco Diocese de Aveiro