POTENCIAL DE CONTAMINAÇÃO MICROBIOLÓGICA EM OLEAGINOSAS E BIODIESEL Diego Luiz Nunes -UFMG, [email protected] Franciane Diniz Cabral, ICB-UIT, [email protected] Isabella Cristina da Silva Prado, ICB-UIT, [email protected] Isabel Cristina Rocha Pereira, ICB-UIT, [email protected] Alex Nogueira Brasil-ENERBIO-UIT,[email protected] RESUMO:.Muito se pesquisa e desenvolve acerca das potencialidades e cultivo de oleaginosas e além, da extração de óleos e produção do biodiesel de distintas fontes. Contudo não foi percebida ainda alguma preocupação com os potenciais problemas microbiológicos que esses podem vir a ter. Em se tratando de materiais biológicos, provenientes de fontes renováveis, estão sujeitos a interferências ainda pouco conhecidas. Este trabalho visa elucidar acerca de algumas potenciais interferências que bactérias, fungos ou vírus podem ocasionar, resultando em perda de produção devido à redução da capacidade de crescimento e desenvolvimento de plantas. Além de interferências passíveis de acontecer enquanto da estocagem das sementes ou mesmo de seu óleo já extraído. Tudo isso poderá ainda, eventualmente, causar danos, ou pelo menos dificultar, os processos de produção de biodiesel. Palavras-Chaves: Fungos; Bactérias; Óleo; Biocombustíveis INTRODUÇÃO A produção da cultura agrícola de oleaginosas é amplamente afetada por pragas e doenças, patologias que comprometem partes da planta, como: folhas, raízes, vagens e sementes. As doenças podem ser causadas por agentes infecciosos, bióticos, ou agentes nãoinfecciosos, abióticos. Os agentes bióticos fungos, bactérias, nematóides e vírus causam as principais doenças e perdas no desenvolvimento e produção (PORTER, SMITH, RODRIGUEZ – KÁBANA ,1997). Dentre os agentes patogênicos às plantas, os fungos merecem papel de destaque com uma atividade marcadamente conhecida por provocar alterações indesejáveis, na maioria dos casos. (DINIZ, 2002). Determinadas patogenias podem ser transmitidas pela semente, servindo de inóculo inicial para a propagação e desenvolvimento de epidemias e podem causar prejuízos aos vegetais como queda da cobertura foliar, redução da taxa de crescimento e baixa resistência quanto a outros patógenos.Provocam também danos indiretos nas plantações, devido à introdução rápida em novas áreas, onde anteriormente não existia a doença, comprometendo a qualidade dos grãos colhidos e armazenados. Alguns fungos podem produzir, durante seu ciclo de vida, substâncias tóxicas conhecidas como micotoxinas que segundo Santos, Lopes, Kosseki (2001) são substâncias metabólicas liberadas ou não em substratos, como grãos e / ou sementes. A presença de micotoxinas em produtos alimentícios depende diretamente do crescimento de espécies fúngicas específicas, principalmente, as dos gêneros: Aspergillus, Penicillium, Fusarium, Claviceps e Alternaria, que requerem para o seu desenvolvimento fatores ambientais favoráveis, como umidade relativa do ar entre 80 e 90% e temperatura ambiental superior a 20 °C. MATERIAL E MÉTODOS O presente trabalho busca abordar um tema ainda fora da atenção dos trabalhos de desenvolvimento no cultivo, estocagem de sementes oleaginosas e de produção do biodiesel, no que tange à interferência microbiológica. Muito se estuda acerca da pureza, capacidade térmica e estabilidade do biodiesel, contudo considerando tratar-se de um produto de origem vegetal, este está susceptível a ação da biota, podendo, logo, introduzir alterações que não são, necessariamente, observadas ou mesmo esclarecidas do ponto de vista físico-químicas. Busca-se apresentar um breve relato acerca do potencial de ação microbiológica na cadeia de produção de biodiesel, deste a colheita, estocagem de grãos e óleos e o processo produtivo em si, uma vez que existe alguma possibilidade de microorganismos comprometerem a integridade física e estrutural das facilidades de processamento. CONCEITUAÇÃO As toxinas fúngicas mais estudadas são as produzidas por: Aspergillus sp., Penicillium sp. e Rhizopus sp. que são reunidas num grupo denominado de aflatoxinas (AFTs) pelo fato de haverem sido inicialmente descobertas a partir de estudos com o fungo Aspergillus flavus A exposição do ser humano às AFTs pode ocorrer por via respiratória, durante a colheita, trilha, ensacamento, limpeza, armazenamento e processamento de grãos contaminados. Estudos epidemiológicos fornecem evidências de que as AFTs, em partículas respiráveis, como pó de grãos, apresentam um risco ocupacional (DHINGRA e NETTO, 1998). De acordo com Buyman e Cotty (1993) tais metabólitos são carcinogênicos e ocorrem em alimentos “in natura” como também em produtos industrializados derivados dos grãos contaminados. Por serem estáveis e termo-resistentes, são difíceis de serem eliminadas (BARCELOS, 1998). A preservação da qualidade das sementes durante o armazenamento, ou seja, da colheita até o momento da sua utilização, é um aspecto fundamental a ser considerado no processo produtivo, pois os esforços despendidos na fase de produção podem não ser efetivos se a qualidade das sementes não for mantida, no mínimo até a época de semeadura (OLIVEIRA, 1999). A sanidade de sementes está atrelada à presença ou ausência de patógenos, de beneficiamento em processos rotineiros de grãos e óleos considerando também anomalias fisiológicas, decorrentes de alterações nutricionais e condições climáticas adversas, seja no campo, no processamento ou durante o armazenamento. A presença desses agentes fitopatogênicos provoca a redução de germinação e vigor e originam focos primários de doenças. Segundo Toledo & Marcos Filho (1977), a queda do poder germinativo e do vigor das sementes é a manifestação mais acentuada da deterioração das sementes. A contaminação fúngica resulta, não somente a diminuição do peso da massa de produto estocado, pelo consumo direto os fungos, como também em alterações indesejáveis na composição nutricional e nas propriedades químicas, que dificultam a industrialização. Maneiras de precaução de sanidade de semente são além do manejo adequado nas diversas etapas de produção e colheita, o controle da umidade dos grãos pela secagem apropriada deles (menos de 14%), de modo a minimizar perdas físicas e prejuízos econômicos (MORAES & MELCHIADOS, s/d). A ação de vírus em plantas ocorre semelhantemente aos vírus em animais, quanto à presença de ácidos nucléicos e alguns deles se desenvolvem e multiplicam dentro de células de insetos. Causam doenças em culturas de importância econômica como, por exemplo, na cana de açúcar e milho. Os vírus podem causar mudanças de coloração, crescimento deformado, fazendo também definhar e parar o crescimento das plantas hospedeiras. Alguns hospedeiros, contudo, permanecem asssíntomaticos e servem como reservatório de vírus, apesar de as células vegetais geralmente serem protegidas das doenças por sua parede celular impermeável. Os vírus podem penetrar ou ser introduzidos juntamente com outros parasitas de plantas, entre eles os nematódeos, os fungos, e, mais frequentemente, os insetos que sugam a seiva da planta. O pólen e/ou as sementes de uma planta infectada podem também espalhar a infecção para outras plantas. AS OLEAGINOSAS A produção agrícola tem se desenvolvido e demonstrado cada vez maior eficiência, tendo em vista a crescente demanda mundial por alimentos e energia (FAO, 2007). O Brasil, sendo referência internacional em agropecuária, é excelente exemplo da variedade e crescimento em suas safras. Conforme a Tabela 1, fica evidenciado tanto o aumento da produção como as principais e potenciais plantações com aplicação tanto alimentar quanto para a produção de energia. O girassol e a mamona demonstram franco aumento em suas safras e, claramente direcionados à produção de biodiesel. Não obstante ao aumento da colheita, mas com relação à magnitude, a soja evidencia a aplicação de seu óleo, um clássico subproduto, na cadeia de produção de biodiesel. A soja é um importante grão devido a sua considerável diversidade genética e adaptabilidade (YUYAMA; OLIVEIRA, 1997). Para a obtenção de sementes de soja de melhor qualidade, é fundamental que a colheita seja realizada o mais próximo possível do ponto de maturação fisiológica (Sediyama citado por BLACK, 2000). A maioria das doenças de importância econômica que ocorre na cultura da soja sendo causada por patógenos que são transmitidos pelas sementes, que assumem importante papel na disseminação e transmissão de inúmeros microorganismos, sendo os fungos os de maior ocorrência (Sincvain & Neergraad, citados por GOULART, 1991). A soja é apropriada para recuperação de solos fracos, sendo no Brasil muito usada para recuperação de cerrados, pela grande contribuição ao balanço de nitrogênio no solo se for inoculada com estirpes de Rhizobium previamente testadas. Apesar de a soja ser uma leguminosa constituída por mais proteína que óleo, dispõe de uma oferta muito grande desse óleo, chegando quase a 90% de produção desse subproduto no Brasil, constituindo-se e importante de produção de biodiesel, logo evidenciando a importância da abordagem e estudo microbiológico no óleo in natura de soja. Quanto ao girassol, suas sementes adicionadas em rações animais e alimentação humana. Delas se extraem o óleo vegetal comestível, com baixos teores de gordura saturada e altos teores de ácido linoleicos, sendo este óleo obtido através da prensagem do grão de girassol, sem refino. Este processo, pelo fato de não envolver altas temperaturas, mantém inalterada a composição química do óleo, principalmente no que diz respeito ao teor de tocoferóis, compostos que apresentam atividade conservante e, por conseguinte, pouco interferindo na possibilidade de existência e interferência de microorganismos neste óleo. Culturas como girassol proporciona melhoramento químico e físico do solo, elevando significativamente a produtividade e, além disso, já foi observado que restos culturais de diferentes cultivos dessa planta apresentaram efeito alelopático sobre algumas ervas daninhas na cultura da soja em sucessão a ela, o que ainda está sob investigação (ROSSI, 1998). O girassol apresenta características agronômicas importantes, como maior resistência à seca, ao frio e ao calor que a maioria das oleaginosas cultivadas no Brasil, o grão se destaca pela crescente demanda do setor agroindustrial e comercial e, pela excelente qualidade do óleo (REYES et al., 1999), tendo logo, largo potencial na produção de biodiesel. Tabela 1: Produção de cereais, leguminosas e oleaginosas – comparação entre as safras de 2007 e 2008 no Brasil Produtos Agrícolas Algodão herbáceo (caroço) Amendoim (em casca) 1ª safra Arroz (em casca) Feijão (em grão) 1ª safra Mamona (baga) Milho (em grão) 1ª safra Soja (em grão) Sub-total Safra 2007 2 497 588 185 322 11 047 937 1 776 217 88 574 36 123 249 57 952 011 109 670 898 Amendoim (em casca) 2ª safra Aveia (em grão) Centeio (em grão) Cevada (em grão) Feijão (em grão) 2ª safra Feijão (em grão) 3ª safra Girassol (em grão) Milho (em grão) 2ª safra Sorgo (em grão) Trigo (em grão) Triticale (em grão) Sub-total 41 927 212 961 4 620 235 578 1 074 034 394 985 101 178 15 707 421 1 385 240 4 088 908 182 970 23 429 822 Produção ( t ) Safra 2008 Variação % 2 434 117 -2,5 239 017 29,0 12 173 008 10,2 1 655 978 -6,8 149 596 68,9 39 872 906 10,4 59 841 925 3,3 116 366 547 6,1 48 196 245 620 5 134 241 105 1 418 932 425 252 136 301 18 406 596 1 691 506 5 161 946 192 700 27 973 288 15,0 15,3 11,1 2,3 32,1 7,7 34,7 17,2 22,1 26,2 5,3 19,4 Total 133 100 720 144 339 835 8,4 FONTE - Grupo de Coordenação de Estatísticas Agropecuárias - GCEA/IBGE, DPE, COAGRO, Levantamento Sistemático da Produção Agrícola - Maio 2008. O BIODIESEL E MICROORGANISMOS Nos últimos anos tem surgido um crescente interesse na tecnologia de modificação dos óleos e gorduras. Esta tendência pode ser atribuída principalmente ao fato desses materiais serem obtidos de fontes naturais e empregados como importantes matérias - primas para as indústrias químicas, farmacêuticas e alimentícias. Particularmente para o Biodiesel que é um combustível biodegradável derivado de fontes renováveis, que pode ser obtido por diferentes processos tais como o craqueamento, a esterificação ou pela transesterificação, sendo a última a mais utilizada e que consiste em uma reação de óleos vegetais, com um álcool e com um catalisador (NUNES, 2007) e tem como objetivo diminuir a viscosidade do óleo vegetal a valores similares ao diesel convencional, como também se aproximar de outras características físico-químicas. Pode ser utilizado em motores ciclo-diesel (automotivos e ou estacionários) sem que seja necessário fazer adaptações, e para co-produção de energia (SAMPAIO 2003). Produzido a partir de fontes renováveis (girassol, soja, mamona, canola, amendoim, dendê, óleos e gorduras residuais), o biodiesel emite menos poluentes que o diesel e age como lubrificante, o que pode aumentar a vida útil do motor. Sua aplicação como combustível proporciona também ganho ambiental, pois colabora para diminuir a poluição e emissão de gases do efeito estufa. Estudos foram realizados com culturas de bactérias isoladas de ambientes preparados com biodiesel (palma e soja) e diesel, com o objetivo de determinar os inibidores de crescimento das mesmas, visando controlar seu crescimento em dornas de armazenamento, evitando a biodegradação do biocombustível e biocorroção dos recipientes. As bactérias demonstraram um potencial para degradação do biodiesel maior do que do diesel de petróleo (Follis, 1994). A provável rota para a degradação do biocombustivel consiste: 1) clivagem do ester por uma esterase, produzindo ácido graxo e o álcool associado (reação inversa a produção do biodiesel) e 2) quebra do ácido graxo pelo Ciclo de Krebs, metabolismo respiratório ou incorporação direta nos lipídeos celulares. Vale ressaltar que certos microorganismos como Pseudomonas oleovorans, Pseudonomas mendocina, Pseudonomas aeruginosa, Marinomonas vaga, Escherichia coli, Burkholderia gladioli, Burkolderia cepacia, Bacillus subtilis, etc. apresentam esse potencial degradação do Biodiesel (Follis, 1994). Como conseqüência da atividade microbiana, uma larga biomassa (“lama”) pode se desenvolver na interface hidrocarboneto ar e água, resultando em problemas operacionais devido ao bloqueio de filtros e dutos. Pode ainda ocorrer produção de emulsão – devido à atividade de biosurfactante, provocando rápida e inalteradamente a qualidade do combustível. (Beech & Gaylarde, 1999). CONCLUSÃO O presente trabalho buscou demonstrar aspectos e potencialidades de ação microbiana em sementes oleaginosas, quando estocadas, e durante o processo de proteção do biodiesel, principalmente quando aplicado a óleos in natura. Denota, logo, a novidade desta vertente biológica na cadeia de produção do biodiesel. Os principais fatores que embasam a importância deste tema são a manutenção de sanidade das sementes em etapas de estocagem, a preservação da qualidade do óleo, quando estocá-lo e a segurança na pouca, ou inexistente, situação potencialmente temosa à estabilidade corrosiva de tanques, bombas e reatores. Finalmente, deseja-se que a comunidade cientifica se atente mais fortemente à multidisciplinaridade de produção de bicombustíveis pela vertente biológica, evidenciando a necessidade ou não da inserção de tratamentos microbiológicos à cadeia de produção de biodiesel. 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