O teatro português no Renascimento

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LABORATÓRIO – PORTAL TEATRO SEM CORTINAS
HISTÓRIA DO TEATRO MUNDIAL – RENASCIMENTO
Título: O teatro português no Renascimento
Autor: Alexandre Mate
Revisão: Diego Cardoso
Arquivo: 03.HTM.0008
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O teatro português no Renascimento
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O teatro português no Renascimento
Muitas de suas peças são moralidades em que
por exemplo o mundo é apresentado como grande
feira, cujas mercadorias são as virtudes e os
vícios que se vendem a bom dinheiro. Ou então o
mundo vira floresta em que os personagens se
caçam mutuamente.
Anatol ROSENFELD. O teatro épico.
Alma humana formada,
de nenhuma cousa feita,
mui preciosa,
de corrupção separada,
e esmaltada
naquela frágua perfeita,
gloriosa; (...)
Vossa pátria verdadeira
é ser herdeira/ da glória que conseguis:
andai prestes.
Alma bem-aventurada,
dos anjos tanto querida,
não durmais;
um ponto não esteis parada,
que a jornada
muito em breve é fenecida,
se atentais.
Gil VICENTE. Auto da alma.
Durante a Idade Média peninsular ‘parece’ (pela ausência de material documental)
não ter havido produção teatral. Se houve tal produção (e é natural que tenha havido,
bastando para isso que se lembre das condenações às práticas teatrais pelos concílios
religiosos), pouquíssimos documentos restaram, apresentando fragmentos dessas
manifestações. Parece certo, entretanto, que, ligado ao teatro popular, as únicas
representações foram levadas a cabo pelos momos ou mimos. À exceção dessas
manifestações populares, segundo documentação de Garcia de Resende, na Crônica de
D. João II, foram apresentados por ocasião de efemérides religiosas (como o natal e a
páscoa), sucessão de quadros: provavelmente em forma de tableaux em igrejas e
catedrais.
Portugal, durante o período da renascença, apresenta um quadro semelhante
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àquele vivido pela Espanha, do ponto de vista econômico e, também, infelizmente, do
religioso. Em apresentação de algumas das obras de Gil Vicente (1465?-1536?),
Benjamin ABDALA Junior, assim se refere a essa questão:
Numa sociedade em ebulição pela chegada de riquezas nunca
vistas que colocava Lisboa como a Corte mais rica da Europa,
poucos continuavam a se preocupar com a produção.
Importava-se de tudo. Era mais fácil adquirir bens como ouro e
as especiarias provenientes da Navegações, ficando o trabalho
mais pesado para os escravos capturados na África e na Ásia.
Nessa situação, a população rural deixava o campo e corria
para Lisboa, os artífices afastavam-se das manufaturas, os
fidalgos acotovelavam-se em torno do palácio real.
Desorganizava-se assim a produção. Todos, inclusive o clero
procuravam usufruir desse vertiginoso afluxo de riquezas.
Nessas condições, era difícil viver do próprio trabalho.
Procurava-se o lucro fácil na empresa comercial-militar das
Índias, um monopólio do rei. Cresceu exageradamente o
número de servidores da Corte e os que conseguiam seguir
viagem só tinham um objetivo, de acordo com uma das
personagens do Auto da Índia: pelejar e roubar. (VICENTE,
1996: 9-10)
Assim, a hegemonia da Europa – de certa forma, disputada por estes dois países
– acabou sendo exercida durante um período significativo por Portugal, no século XVI, e
pela Espanha, na medida em que D. Sebastião ao ser morto (na Batalha de AlcácerQuibi1) deixa vago o trono de Portugal, que será ocupado por Felipe II, no chamado
período conhecido por ‘Domínio Espanhol’ (1580-1640).
O surgimento dos primeiros elementos da cultura renascentista em Portugal
coincide com o otimismo representado
pelo processo das conquistas da expansão
atlântica, no século XV, que deixaram a nobreza e, fundamentalmente, a burguesia
portuária absolutamente entusiasmadas com o futuro, levando-as a incentivar a produção
artística que – uma vez mais, de modo semelhante ao ocorrido em Espanha, – criaram o
chamado estilo manuelino: espécie de ecletismo arquitetônico, misturando elementos
realistas com função simbólica (como as cordas, por exemplo, que evocavam os feitos
das descobertas) e góticos.
1
Batalha travada no dia 4 de agosto de 1578 entre portugueses e mouros, com duração de quatro horas.
Nela morreram de sete a oito mil portugueses e de cinco a seis mil mouros, dentre eles D. Sebastião e parte
da nobreza portuguesa que participou da batalha e o sultão do Marrocos Abd al-Malik. Ocorre que com a
morte de D. Sebastião, que não tinha descendentes diretos ao trono, sobe ao poder seu tio-avô, o cardeal
D. Henrique, e, dois anos depois, Felipe II.
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De qualquer forma, segundo a totalidade das fontes consultadas, a figura-chave do
humanismo português foi Francisco Sá de Miranda (1495-1558), que após um período de
permanência na Itália introduziu, em Portugal, o stil nuovo que vinha sendo
experimentado e desenvolvido pelos artistas e intelectuais italianos. Miranda exercita o
estilo em epígrafe, apresentando-o em várias obras literárias – fundindo as formas
lusitanas tradicionais: como o vilancete e a cantiga aos metros italianos, característico do
stil nuovo2 – sendo que o novo estilo foi utilizado em duas de suas obras mais famosas,
ou seja: as comédias Vilhalpandos e Estrangeiros. Entretanto, o maior e mais significativo
‘humanista’ de Portugal é Luiz Vaz de Camões (1524-1580), autor da epopéia Os
Lusíadas que narra as conquistas portuguesas do chamado período expansionista. Além
dessa obra, que é uma das mais importantes em língua portuguesa de todos os tempos,
Camões escreveu outras obras líricas e três autos, em estilo medieval: El-Rei Seleno, O
anfitrião e Filodemo. Assim, parece que a mesma lógica segundo a qual: ‘o Brazil não
conhece o Brasil’ pudesse, também, ser aplicada aos portugueses (se não é mesmo de lá
que tal tipo de pensamento começou a ser produzido...) Em outras palavras, o alardeado
mito de que Gil Vicente teria sido o primeiro e único dramaturgo português do período,
pela ‘evidência’ camoniana precisa ser relativizada.
É talvez a partir da obra dramatúrgica de Camões e da influência de Juan del
Encina que surgiu a dramaturgia portuguesa escrita por Gil Vicente. Gilberto MOURA
apresenta uma excelente reflexão acerca da produção vicentina, chamando a atenção,
inicialmente, para a indefinição com relação à data de nascimento do autor, historiando,
ainda, a importância do autor e da obra no contexto renascentista.
O surgimento da dramaturgia portuguesa (excetuando-se as três obras de
Camões), segundo a bibliografia existente, teria aparecido com Gil Vicente, precisamente
em 06/06/1502, quando o autor declamou, na ‘câmara da puérpera’, D. Maria de Castela:
o Auto da visitação ou Monólogo do vaqueiro, para homenageá-la pelo nascimento de seu
filho, o príncipe D. João, futuro D. João III. Depois dessa primeira peça, a segunda Auto
da Índia, teria surgido em 1509. A diferença de aproximadamente seis anos parece ter
sido uma constante na produção do autor. MOURA – estudioso da obra de Gil Vicente –
2
Stil nuovo ou dolce stil nuovo, refere-se ao novo estilo desenvolvido, no século XIII, pela escola poética
italiana fundada por Guido Guinizelli, que reuniu poetas florentinos e toscanos – sendo o mais famoso deles
Dante Aleghieri – com o principal objetivo de, através das obras, louvar as virtudes da mulher amada.
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não sabe, tendo em vista a falta de documentação, se a produção vicentina foi realmente
irregular ou se as diversas injunções político-religiosas censuraram obras que
eventualmente o autor tivesse escrito.
A obra de Gil Vicente compreende quarenta e quatro obras, divididas em três
fases, assim descritas:
-
primeira, desenvolvida entre 1502 a 1508, denominada como fase de aprendizado ou
de iniciação e fundamentalmente religiosa;
-
segunda, desenvolvida de 1508 a 1516, em que se fundem a crítica social e
preocupações de ordem religiosa; e,
-
terceira, desenvolvida de 1516 a 1536, considerada de plena e extensa realização em
que se fundiram as características: hierática, popular e aristocrática.
Das quarenta e quatro obras do autor, onze foram escritas em espanhol (que era a
língua da corte); dezesseis em português e dezessete bilíngues. Como característica mais
marcante de sua obra, tanto nas farsas, nos autos ou moralidades quanto em suas
comédias, Gil Vicente não atacava as instituições mas seus representantes, sendo que
suas personagens representam uma confluência de todas as tônicas fortes da alma
humana: das iluminadas às sombrias.
Dessa forma, são personagens da obra de Gil Vicente:
Os figurantes do guinhol vicentino representam as principais
profissões, os principais cargos, as categorias da época: nele
comparecem irmanados, num inteiro alheamento de espaço e
tempo, papas, santos e cardeais, arcebispos, bispos, freires e
freiras; clérigos e capelões; imperadores, reis e príncipes;
condes, duques, fidalgos de alto coturno ou de meia tijela, com
ou sem escudeiros; escudeiros com ou sem moço; pagens;
alcaides e beleguins; corregedores e procuradores; cavaleiros,
físicos (médicos) e boticários; judeus e avarentos; ourives e
lavradeiras; sapateiros e alfaiates; lavradores, pastores e
vaqueiros; mulheres de mau porte, alcaiotas e parteiras;
serranas e camponesas; almocreves e peregrinos; ferreiros,
porteiros e forneiros, mercadores e regateiras; fadas, bruxas e
feiticeiras; patrões de galera, marinheiros e grumetes;
bailadores, cortesãos e rixosos; correios e postilhões – um
catálogo de ofícios, ocupações e situações, verdadeira e
formigante humanidade a agir e a conflituar-se perante outras
tantas figuras alegorizadas, o Tempo, a Igreja, a Morte, a Fé, a
Fama, a Verdade, a Pureza, a Prudência, a Humildade, a
Lusitânia, Portugal, Roma, Lisboa, (...) ou solicitadas ao mundo
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bíblico ou à mitologia: Adão e Eva, Abel, Moisés, (...) anjos,
todos os maiorais do Inferno e diversos diabos menores,
Mercúrio, Apolo e Cupido, sereias, o Sol, o Mar, três ou quatros
graves e rotundos planetas. (MOURA, s/d: 28-9)
Ainda com relação às personagens vicentinas, Benjamin ABDALA Junior, afirma,
reiterando algumas observações já apresentadas:
A “população das mais diversas regiões e condições sociais
que se amontoava em Lisboa sugeriu a Gil Vicente a criação
de uma variedade muito grande de personagens para suas
peças teatrais. São os tipos sociais, isto é, personagens com
as qualidades e defeitos de uma profissão, de uma classe
social (o Sapateiro ou o Fidalgo do Auto da Barca do Inferno) e
tipos psicológicos como o Parvo (Pero Marques, personagem
da Farsa de Inês Pereira). A sátira de Gil Vicente é implacável:
pune, com humor, o sapateiro ladrão, a esposa adúltera, (...).
personagens alegóricas (...) Mesmo nessa forma de figuração
(com anjo, diabo e barcas misteriosas), a alegoria – que exige
uma interpretação segura que o sentido literal, imediato, não
fornece – contribui para a representação realista, realçando as
ações, os caracteres das personagens, suas ligações com o
meio social.
São personagens que perdiam valores medievais (...) e se
desorganizavam socialmente. Perdiam antigos valores sem
adquirir novos, a não ser atitudes imediatistas de busca da
riqueza fácil (...) Gil Vicente questiona essa nova postura,
contrapondo-a a um passado que ele idealizava, num mundo
povoado por pessoas sempre sinceras e honestas. Esses
valores vinculam-se aos padrões éticos medievais e a uma
visão mais humanista da Igreja. Tais perspectivas levavam-no
a observar com desconfiança as novas formações sociais
abertas pelos Descobrimentos. (...)
Na descrição realista da vida de seu tempo, acaba assim por
contrariar o entusiasmo oficial. Não aparece em seu teatro, por
isso, a costumeira exaltação heróica dos cavaleiros
conquistadores, tão comum nessa época. Ele parece não se
sentir atraído pelas formas épicas de representação que
dariam origem, por exemplo, a Os Lusíadas, de Camões.
Motivava-o, na verdade, uma perspectiva popular e a crítica
feita do ângulo de quem trabalha. Não o humor pelo humor ou
o cômico pelo cômico, mas a sátira dos desequilíbrios
estruturais de todo o conjunto social com a finalidade de corrigilos. Sua arte teve esse sentido de intervenção social. (...)
O teatro de Gil Vicente, embora dirigido a um público
palaciano, foi popular na forma e no conteúdo. Suas raízes são
medievais, de onde incorporou alegorias, símbolos e temas
bíblicos. (...) Voltou-se para a atualidade do Renascimento,
aliando o humanismo religioso (seguia uma perspectiva de
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reforma humanista da Igreja em oposição ao dogmatismo da
Inquisição) com atitude crítica diante dos problemas sociais de
sua época. Cada personagem falava de acordo com sua
condição social.
À luz do exposto, portanto, não é tão paradoxal entender que o teatro
português, ‘nascido’ com Gil Vicente, tenha fenecido também com o autor, posto
que seu teatro representou, de maneira bastante acentuada, a cultura medieval:
que como se sabe caracterizou toda a produção portuguesa, extremamente afeta
aos dogmas religiosos desde sempre. Apesar do caráter dogmático e extremado (e
é uma especulação) a dramaturgia talvez pudesse ter se desenvolvido não fossem
tantos os editos proibitórios exarados pela corte em consonância obediente à
Igreja.3
Além de determinados recintos (não específicos) dentro dos palácios, na
chamada produção clássica que se inicia com Gil
Vicente, não havia teatros;
assim, alguns espetáculos foram apresentados nos pátios, em frente à fachada de
muito dos palácios. Dessa forma, o nome característico dado ao espaço teatral
português foi, como decorrência da inexistência dos específicos, foi ‘pátio’ (ou
Pateos, pela influência espanhola).
Ainda aferrados aos valores medievais, em 1739, por exemplo, foi queimado
em Auto de Fé, o comediógrafo nascido no Rio de Janeiro, Antônio José da Silva –
o Judeu4, com trinta e quatro anos de idade, condenado que fora de práticas
judaicas (nunca comprovadas).
O teatro em Portugal vai apresentar um nome de destaque somente no século
XIX, com o poeta Almeida Garret, que além de literatura escreveu o Auto de Gil
Vicente.
3
À guisa de conhecimento, em 17/12/1531 foi publicada a primeira bula instituindo a Inquisição em
Portugal. Quem conhece um pouco da história do teatro, sabe que os atores sempre foram
barbaramente perseguidos pelos ‘representantes de deus na terra’. Gil Vicente, não escapando da
sanha ‘higienista’ da Igreja esteve preso de 1534 a 1535.
4
O primeiro texto dramatúrgico romântico, Antônio José ou o poeta e a Inquisição, (1838) de
Gonçalves de Magalhães apresenta a trajetória do poeta, de modo bastante interessante e
significativo, motivo pelo qual sua leitura é aqui recomendada.
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ANEXO
Auto da Lusitânia
(Entra Todo-o-Mundo, homem como rico mercador, e faz que anda
buscando alguma cousa que se lhe perdeu: logo após sua entrada um
homem, vestido como pobre, chamado Ninguém).
Ninguém -
Que andas tu i buscando?
Todo-o-Mundo -
Mil cousas ando a buscar;
delas não posso achar,
porém ando perfiando,
por quão bom é perfiar.
Ninguém -
Como hás nome, cavaleiro?
Todo-o-Mundo -
Eu hei nome Todo-Mundo,
e meu tempo todo inteiro
sempre é buscar dinheiro,
e sempre nisto me fundo.
E eu hei nome Ninguém,
e busco a consciência.
Ninguém -
Berzabu -
Esta é boa experiência:
Dinato, escreve isto bem.
Dinato -
Que escreverei, companheiro?
Berzabu -
Que Ninguém busca consciência,
e, Todo-o-Mundo dinheiro.
Ninguém -
E agora que buscas lá?
Todo-o-Mundo -
Busco honra muito grande.
Ninguém -
Eu, virtude, que Deus mande
que tope co’ela já.
Berzabu -
Outra adição nos acude:
Escreve logo i a fundo,
que busca honra Todo-Mundo,
e Ninguém busca virtude.
Ninguém -
Buscas outros mor bem qu’esse?
Todo-o-Mundo -
Busco mais quem me louvasse
tudo quanto eu fizesse.
Ninguém -
E eu quem me repreendesse
em cada cousa que errasse.
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Berzabu -
Escreve mais.
Dinato -
Que tens sabido?
Berzabu -
Que quer em estremo grado
Todo-o-Mundo ser louvado
e Ninguém ser repreendido.
Ninguém -
Buscas mais, amigo meu?
Todo-o-Mundo -
Busco a vida e quem ma dê.
Ninguém -
A vida não sei que é,
a morte conheço eu.
Berzabu -
Escreva lá outra sorte.
Dinato -
Que sorte?
Berzabu -
Muito garrida:
Todo-o-Mundo busca a vida
e Ninguém conhece a morte.
Todo-o-Mundo -
e mais queria o Paraíso,
sem mo ninguém estrovar.
Ninguém -
E eu ponho-me a pagar
quanto deve pera isso.
Berzabu -
Escreve com muito aviso.
Dinato -
Que escreverei?
Berzabu -
Escreve
que Todo-o-Mundo que Paraíso,
e Ninguém paga o que deve.
Todo-o-Mundo -
Folgo muito d’enganar,
e mentir nasceu comigo.
Ninguém -
Eu sempre verdade digo,
Sem nunca me desviar.
Berzabu -
Ora escreve lá, compadre,
não sejas tu preguiçoso.
Dinato -
Quê?
Berzabu -
Que Todo-o-Mundo é mentiroso,
e Ninguém diz a verdade.
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Ninguém -
Que mais buscas?
Todo-o-Mundo -
Lisonjar.
Ninguém -
Eu sou todo desengano.
Berzabu -
Escreve, ande lá mano.
Dinato -
Que me mandas assentar?
Berzabu -
Põe aí mui declarado,
não te fique no tinteiro:
Todo-o-Mundo é lisonjeiro,
e Ninguém desenganado”.
Bibliografia:
MOURA, Gilberto. Teatro de Gil Vicente. Lisboa: Ed. Ulisseia, s/d.
VICENTE, Gil. Auto da Índia; Auto da Barca do Inferno; Farsa de Inês Pereira:
adaptação e notas por Benjamin Abdala Júnior. São Paulo: SENAC, 1996.
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