Sector RESÍDUOS Medida ME8 Energias Renováveis: Aproveitamento de recursos endógenos Co-geração a biogás em ETARs Municipais Reduzir as emissões de gases com efeito de estufa: aproveitar os recursos energéticos renováveis As alterações climáticas são hoje um desafio da sociedade moderna, enquanto co-responsável pelas acções causadoras de efeitos sobre o clima e, simultaneamente, promotora de acções e medidas ao nível dos diversos sectores de actividade, para mitigar esses efeitos. As emissões de gases com efeito de estufa (GEEs) originadas localmente, repercutem-se em efeitos globais, comprometendo toda a sociedade na procura de soluções integradas, numa lógica de solidariedade e de equidade. A Convenção Quadro das Nações Unidas para as Alterações Climáticas e o Protocolo que dela emana, o Protocolo de Quioto, acordado em Dezembro de 1997, é o expoente máximo desta estratégia. É expectável que os 144 países que ratificaram este acordo, entre os quais se inclui Portugal, adequem as suas estruturas económicas e sociais à satisfação dos objectivos do Protocolo, estabelecendo metas de redução e investindo na eficiência dos diversos sectores de actividade, por forma a obter menores consumos energéticos e a diminuir o quantitativo das emissões para a atmosfera. A eficiência energética e a utilização de energias renováveis têm aqui um papel fundamental. Foi com esse propósito e por reconhecer a importância da intervenção local na redução das emissões de GEEs, que a Câmara Municipal de Almada (CMA) decidiu desenvolver uma estratégia local, cujo primeiro passo consistiu na realização do “Inventário Municipal das Emissões de Gases com Efeito de Estufa em Almada”, datado de 2001. Este Inventário, pioneiro a nível nacional, permitiu identificar os consumos de energia e as emissões de GEEs por sector de actividade económica no Concelho de Almada, tendo-se seguido a metodologia de cálculo proposta pelo IPCC (Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas das Nações Unidas). Na sequência deste estudo, foi desenvolvida a Estratégia Local para as Alterações Climáticas (ELAC), que Edição: Departamento de Estratégia e Gestão Ambiental Sustentável Câmara Municipal de Almada Rua Bernardo Francisco da Costa nº42, 2800-029 Almada Tel. 21 272 25 10, [email protected] ELAC_2 Almada, Julho 2005 propõe um conjunto de medidas sectoriais para a redução da intensidade energética e a melhoria ambiental das actividades, nos vários domínios em que são exercidas. De acordo com este Inventário, o Sector dos Resíduos, à data composto pela fracção de resíduos sólidos urbanos do Concelho de Almada depositada no Aterro Almada-Seixal e pelas Estações de Tratamento de Águas Residuais (ETARs) da Quinta da Bomba e de Valdeão, foi responsável pela emissão de 1,2% do total de GEEs libertados no Concelho de Almada. Emissões de CO2 por Sector de Actividade em Almada Resíduos 1% Transportes 43% Outros 8% Residencial 17% Serviços 18% Indústria 15% Fonte: Inventário Municipal das Emissões de Gases com Efeito de Estufa do Município de Almada (2001). À operação de uma ETAR estão associadas emissões de GEEs com três origens distintas: o consumo de energia nas diferentes fases de tratamento (contabilizado no Sector dos Serviços), a deposição de lamas em aterro e a libertação de biogás para a atmosfera resultante do processo de digestão das lamas (contabilizadas no Sector dos Resíduos). A possibilidade de reduzir a quantidade de lamas depositadas em aterro, através de um processo de digestão, e de aproveitar a energia renovável daí resultante, o biogás, na produção de energia eléctrica, constitui uma excelente oportunidade para mitigar as emissões de GEEs no Sector dos Resíduos. 1 O sistema de drenagem e tratamento de águas O processo de tratamento de águas residuais da ETAR do Portinho da Costa residuais dos SMAS de Almada O Concelho de Almada dispõe actualmente de um nível de atendimento de tratamento de águas residuais muito próximo de 100%. A concretização deste objectivo resultou de uma estratégia municipal que visou a cobertura integral do Concelho de Almada por redes de drenagem e sistemas de tratamento, à qual foram afectos elevados investimentos financeiros e humanos. A entrada em funcionamento da ETAR do Portinho da Costa confirma o empenho e a determinação do Município de Almada em fechar o ciclo urbano da água no Concelho, dando assim o seu contributo para a preservação da biodiversidade do estuário do Tejo e das suas funções ecológicas, fundamentais para inúmeras espécies de peixes, bivalves e aves. A ETAR do Portinho da Costa integra um dos 3 sistemas de drenagem de águas residuais do concelho, o sub-sistema da Caparica-Trafaria ou do Portinho da Costa, que serve as freguesias da Costa de Caparica, da Trafaria e parte da Caparica. No quadro seguinte apresentam-se as principais infra-estruturas dos 3 sub-sistemas referidos, aos quais estão ainda associados 942 km de colectores de águas residuais domésticas e pluviais. Componentes do sistema de drenagem e tratamento de águas residuais dos SMAS de Almada Portinho da Costa Mutela Quinta da Bomba Túneis T. de Vale Cavala T. de Portinho da Costa Emissários E. de Caparica E. do Torrão E. da Trafaria E. Geral de Almada E. Geral do Laranjeiro E. Geral de Cacilhas E. de Vale Figueira E. de Sobreda-Corroios E. de Vale Milhaços Ramal da Quintinha Rejeição da ETAR Estações Elevatórias EE. da Caparica EE. do Torrão EE. da Trafaria EE. de Cacilhas EE. da Aroeira ETAR ETAR do Portinho da Costa ETAR da Mutela ETAR do Valdeão ETAR da Quinta da Bomba - resíduos sólidos, inertes, que são depositados em aterro; - lamas, que podem ser depositadas em aterro ou sofrer posterior tratamento (digestão) antes do seu envio para o destino final; - águas residuais tratadas, que são lançadas ao rio Tejo. Na ETAR do Portinho da Costa, o processo de tratamento é constituído por uma primeira etapa de tamisagem, seguida de tratamento físico-químico avançado (com adição de cloreto férrico e polielectrólito em órgãos compactos, que incluem também as funções de remoção de areias e gorduras, bem como a sedimentação e pré-espessamento de lamas). Seguemse o tratamento biológico (biofiltração de fluxo ascendente, com arejamento em co-corrente) e a afinação final do efluente através de um emissário submarino com difusores, localizado a 25m de profundidade e a 150 m da margem do rio Tejo. Na fase sólida, as lamas, depois de espessadas, sofrem uma digestão em regime mesófilo (temperatura 35ºC), com aproveitamento energético do biogás em motores de cogeração para produção de energia térmica e eléctrica. As lamas digeridas são desidratadas por centrifugação, armazenadas em silo e reutilizadas na agricultura. Subsistema COMPONENTES A depuração das águas residuais urbanas drenadas para as quatro ETARs dos SMAS de Almada, é garantida através de processos físico-químicos e biológicos, que permitem a separação das matérias sólidas inorgânicas e a decomposição da matéria orgânica. Daqui resultam: Trata-se de uma ETAR tecnologicamente avançada e ambientalmente eficiente: apresenta uma elevada eficiência de tratamento (percentagem de remoção de matéria orgânica superior a 96%), produz biogás (utilizado como combustível para a produção de energia eléctrica e calor), aproveita as lamas como fertilizantes para a agricultura e reutiliza a água residual tratada para lavagens e rega de espaços verdes. Resultados de Exploração da ETAR do Portinho da Costa em 2004 Caudal médio diário (m3/dia) População servida (hab.eq.) Volume total tratado (m3) Carga orgânica afluente média (kg CBO5 /dia) Rendimento (% de remoção) CBO5 – Carência Bioquímica de Oxigénio sem nitrificação CQO – Carência Química de Oxigénio SST – Sólidos Suspensos Totais 7 143 77 230 2 187 959 4 129 96 97 97 Diagrama esquemático do processo de tratamento da ETAR do Portinho da Costa Reagentes Descarga de Águas Residuais Desarenação/Desengorduramento Decantação Primária Emissário Submarino Rio Tejo FASE LÍQUIDA Fonte: SMAS de Almada (www.smasalmada.pt) Cisterna de água tratada Biofiltros Areias Gradagem E. Elevatória (3 mm) Desinfecção por U.V. Separador de gorduras Espessamento gravítico Silo de Cal E. Elevatória Energia Eléctrica E. Elevatória Ar tratado Torres de Desodorização Aquecimento de lamas Silo de lamas Gasómetros Cogeração Aspiração de ar viciado 2 Tocha de gás em excesso Biogás FASE SÓLIDA Entrada de Águas Residuais Classificador/Lavador Água para usos compatíveis (rega e lavagens) Digestão Anaeróbia E. Elevatória Desidratação mecânica de lamas (Centrifugas) E. Elevatória Lamas para valorização agrícola A estação, que entrou em regime de ensaios em Fevereiro de 2004, serve actualmente uma população de cerca de 80 mil habitantes equivalente, tratando mais de 2 milhões de m3/ano de águas residuais urbanas, embora tenha capacidade para tratar os efluentes de 140 mil habitantes equivalente. A energia na ETAR do Portinho da Costa Na sua operação, a ETAR do Portinho da Costa apresenta necessidades energéticas correspondentes ao calor utilizado no tratamento das lamas e à electricidade consumida em múltiplos outros processos. O projecto desta estação previu, desde o início, suprir parte destas necessidades energéticas através da instalação de um sistema de co-geração alimentado com o biogás produzido na própria ETAR. O biogás provém da digestão das lamas originadas nos tratamentos primário e secundário dos efluentes líquidos. As lamas, constituídas essencialmente pela matéria orgânica do esgoto inicial, são o substrato ideal para a aplicação de um processo de tratamento designado por digestão anaeróbia (degradação biológica na ausência de oxigénio). Deste processo resulta a produção de biogás, uma forma de energia renovável, essencialmente composto por metano (CH4) e dióxido de carbono (CO2), que pode ser utilizado como combustível. Diagrama do sistema de co-geração da ETAR do Portinho da Costa Gases de Escape Energia Eléctrica Co-geração Biogás Digestão Anaeróbia Circuito de Recuperação de Energia Térmica Lamas Frescas Lamas Estabilizadas atingir uma potência de cerca de 100 MW a partir deste recurso renovável. O biogás apresenta geralmente boas perspectivas de utilização em equipamentos de conversão energética, como sejam os grupos electrogéneos (motor + gerador) para produção combinada de calor (energia térmica) e electricidade, ou em caldeiras para produção de água quente e/ou de vapor. A perspectiva de produzir e utilizar internamente o biogás, um combustível “gratuito”, e de reduzir as emissões de GEEs, constituíram por si só um forte incentivo para justificar o esforço técnico, humano e financeiro que os SMAS de Almada assumiram na concepção da ETAR do Portinho da Costa. O biogás da ETAR do Portinho da Costa: uma energia renovável nobre De entre todas as formas de energia renovável, as que permitem valorizar resíduos são as mais nobres, pois aliam à geração energética uma componente ambiental positiva directa. O biogás originado em ETARs ou em aterros, quando energeticamente utilizado, pertence a este grupo. O interesse do biogás como recurso energético deve-se ao seu principal constituinte, o metano. Este composto possui um elevado poder calorífico, que torna a sua queima para a produção combinada de energia térmica e energia eléctrica – co-geração – muito oportuna. Pelo contrário, a sua libertação directa para a atmosfera é nociva, já que o metano apresenta um potencial de aquecimento global 21 vezes superior ao do dióxido de carbono. A composição do biogás varia, de acordo com as características do resíduo e as condições de funcionamento do processo de digestão. Em média, o biogás é constituído por 60% de metano (CH4) e 40% de dióxido de carbono (CO2). Outros gases, como o azoto (N2) e o sulfureto de hidrogénio (H2S), estão também presentes na mistura, embora em quantidades reduzidas ou mesmo vestigiais. As análises laboratoriais efectuadas ao biogás produzido na ETAR do Portinho da Costa, revelam uma percentagem de metano que ronda os 70%. Composição média de um biogás típico e do biogás do Portinho da Costa Parâmetros Biogás típico (%) Biogás do Portinho da Costa (%) Metano Dióxido de Carbono (CO2) Oxigénio+Azoto (N2+O2) Azoto (N2) 50-80 20-40 0,5-3 1-5 a) 69,08 28,18 2,74 6 (ppm) Fonte: SMAS de Almada A valorização energética dos resíduos orgânicos A digestão anaeróbia tem vindo a ser progressivamente utilizada nos sistemas de tratamento de águas residuais. No entanto, o principal objectivo deste processo não reside na produção e aproveitamento do biogás, mas sim na estabilização das lamas primárias e secundárias resultantes do tratamento aplicado. De um modo geral, o biogás assim produzido é simplesmente queimado, ao invés de considerado um subproduto útil, susceptível de ser aproveitado energeticamente. Estima-se que, caso todos os resíduos orgânicos mundiais sofressem um processo de digestão, fossem convertidos em metano e aproveitados como combustível, com uma eficiência de 50%, seria possível uma economia de cerca de 5% da energia fóssil mundial. Em Portugal, o potencial de utilização desta técnica é considerável, visto existirem actualmente em funcionamento ETARs dotadas de digestores anaeróbios para tratamento de lamas, ainda sem aproveitamento do biogás produzido. Só para produção de energia eléctrica, estima-se que seja possível Outros Sulfureto de Hidrogénio (H2S) a) valores não disponíveis Fonte: Departamento Municipal de Tratamento de Águas Residuais, SMAS de Almada;Guia Técnico de Biogás e INETI - Departamento de Energias Renováveis Embora em termos absolutos o biogás seja menos energético do que a maioria dos gases normalmente utilizados como combustíveis, o facto de ser um subproduto e de ser renovável tornam a sua utilização ambientalmente muito eficiente. Equivalência energética bruta do biogás com 70% de metano 6,5 kW/h Electricidade 0,6 litros Gasóleo 1,6 kg Lenha 0,62 m3 Gás natural 1 m 3 de Biogás 70% CH 4 6,5 kWh/m 3 0,26 m3 Propano 0,20m3 Butano 3 Em suma, seja qual for a opção adoptada para utilizar o biogás, haverá sempre lugar à produção de, pelo menos, uma forma de energia (eléctrica, térmica e/ou mecânica). Consumos energéticos e economias de energia antes e após o funcionamento do sistema de co-geração Principais opções para utilização/conversão de biogás BIOGÁS MOTOR REDE DE GÁS Introdução em rede privada Co-geração Transportes Energia mecânica Aquecimento ambiente Produção de vapor Produção de frio Águas quentes Secagem Turbinas a gás Células combustível O sistema de co-geração da ETAR do Portinho da Costa O sistema de co-geração da ETAR do Portinho da Costa é constituído por dois grupos electrogéneos (motores e alternadores) que se alimentam do biogás armazenado em dois gasómetros flutuantes de dupla membrana (2 x 200 m3). Características técnicas dos principais equipamentos que constituem o sistema de co-geração da ETAR do Portinho da Costa Sistema de co-geração Equipamento Forma de energia Consumo Sem co-geração Energia eléctrica Gás natural Biogás (não aproveitado) 1 778 1 282 3 007 Com co-geração Energia eléctrica Gás natural Biogás (aproveitado) 967 51 3 007 COMBUSTÃO DIRECTA Modelo Regime Potência contínua HC 434 D2 1 500 rpm 250 kW Fonte: Departamento Municipal de Tratamento de Águas Residuais, SMAS de Almada Os dois grupos electrogéneos (2 x 250 kW) permitem converter aproximadamente 33% da energia contida no biogás em energia eléctrica. Cerca de 60% da energia contida no biogás é recuperada sob a forma de calor (vapor e água quente), através de permutadores que aproveitam a energia térmica presente nos gases de escape e nos circuitos de arrefecimento do motor. As perdas associadas ao processo de co-geração são apenas de 7%. Emissões de CO2 Total [ton CO2eq/ano] Energia Biogás 100% 959 260 4,9 1223 Energia eléctrica Gás natural Biogás (aproveitado) 521 10,2 4,9 536 687 [%] 39 Acresce ainda o facto da ETAR do Portinho da Costa ser uma obra notável de arquitectura, pensada e desenhada para estar plenamente integrada na sua envolvente natural, sobranceira ao magnífico estuário do Tejo. Motores co-geração A ETAR do Portinho da Costa: uma ETAR ecológica que transforma resíduos em energia O sistema de co-geração da ETAR do Portinho da Costa, permite reduzir em 67% os consumo energéticos de gás natural e electricidade, equivalente a cerca de 2 000 MWh Colaboração: Câmara Municipal de Almada Departamento de Estratégia e Gestão Ambiental Sustentável SMAS de Almada Departamento Municipal de Tratamento de Águas Residuais Emissões de CO2 Emissões de CO2 evitadas evitadas Este desempenho, deve-se ao facto dos SMAS de Almada terem previsto na concepção deste equipamento, a instalação de um sistema de co-geração que converte o biogás produzido em energia térmica e eléctrica. 60% Energia térmica Agência Municipal de Energia de Almada 46% 96% Concluindo, a entrada em funcionamento da ETAR do Portinho da Costa, que assegura o tratamento adicional de 24% das águas residuais do Concelho de Almada, não aumentou as emissões do Sector dos Resíduos. Perdas 7% 4 812 1 232 [ton CO2eq/ano] Energia eléctrica Gás natural Biogás (não aprov.) Balanço energético da central de cogeração a biogás da ETAR do Portinho da Costa 33% Energia eléctrica [ton CO2eq/ano] Sem co-geração Alternador Stamford E 2842 E 12 em V 21 930 cc 1 500 rpm 165 kW [%] Constitui pois um importante contributo dos SMAS de Almada para o esforço de contenção e redução das emissões de GEEs do Concelho de Almada e convergência de Portugal para as metas do Protocolo de Quioto. Forma de energia Modelo N.º de cilindros Cilindrada Regime Potência contínua Energia [MWh/ano] Em termos ambientais, estas economias de energia traduzemse num decréscimo de 39% das emissões de GEEs, o que em termos absolutos representa uma redução de 687 toneladas de CO2, equivalente às emissões de um automóvel que dê 120 voltas à Terra! Características Motor a gás MAN Energia [MWh/ano] Com co-geração Introdução na rede pública por ano, como se poderá depreender da análise comparativa nos períodos anterior e posterior à entrada em funcionamento deste sistema. A G E N E A L Agência Municipal de Energia de Almada