CONFLITOS E SENTIMENTOS FAMILIARES NO CONVIVER COM O PACIENTE PORTADOR DE HIV/AIDS* ROGÉRIA APARECIDA R. DOS S. ACADROLI, MARIA APARECIDA DA SILVA Resumo: revisão integrativa com abordagem qualitativa de oito estudos publicados no período de 2003 a 2013. Teve-se como objetivo descrever as percepções da família frente ao paciente portador de HIV/Aids, destacando os aspectos positivos da convivência familiar. Tanto o paciente, quanto a família passam por mudanças e dificuldades inesperadas, especialmente após o diagnóstico da soropositividade, necessitando de maior atenção profissional nesta etapa. estudos, Goiânia, v. 41, especial, p. 101-112, out. 2014. Palavras-chave: HIV. AIDS. Família. Preconceito. Percepção. N os dias atuais, em um mundo globalizado, falar sobre Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) ainda causa impactos negativos nas pessoas, por se tratar de um assunto rodeado de estigmas e preconceitos. Nesse sentido, observa-se que há diversos aspectos sobre os questionamentos e as curiosidades referentes ao assunto, como, por exemplo, saber como é o cotidiano de uma família cujo integrante é portador do Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV); conhecer suas dificuldades, seus medos e anseios e como faz para conviver dia a dia, no contexto familiar. Pensando em buscar respostas para nossas próprias dúvidas e questionamentos, e de muitas outras pessoas, surgiu o interesse em estudar essa temática, no que concerne ao cotidiano das famílias que convivem com o paciente portador de HIV/Aids no contexto familiar. Nesse sentido, é importante que se provoque a seguinte reflexão a respeito: Como é a rotina de uma família que convive com o paciente portador de HIV/Aids? Quais as dificuldades enfrentadas pela família ante a condição do seu ente querido com HIV/Aids? 101 OBJETIVOS 102 Descrever as percepções da família frente ao paciente portador de HIV/Aids, destacando os aspectos positivos da convivência familiar. estudos, Goiânia, v. 41, especial, p. 101-112, out. 2014. Assim, considera-se relevante aprofundar essas e outras questões, uma vez que se pretende ajudar aos profissionais de enfermagem a conhecer o cotidiano da família que convive com o paciente portador do HIV/Aids, já que esta categoria de trabalho está envolvida diretamente com o cuidado ao cliente, à família, especialmente no que se refere às orientações a serem cumpridas no âmbito domiciliar, envolvendo o autocuidado, o acolhimento, o aconselhamento, a prevenção e até mesmo as diferentes fases da evolução da doença. Sabe-se que a Aids é uma manifestação clínica avançada da infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV), e se caracteriza pela depleção das células com marcador fenotípico CD4+, principalmente os linfócitos T, o que leva à imunodepressão e ao consequente desenvolvimento de doenças oportunistas (LAZZAROTTO et al., 2010). Carvalho e Galvão (2008) ressaltam que o fato de saber o diagnóstico sobre uma doença letal gera vários sentimentos nos pacientes, dentre eles a vergonha, a ansiedade e a depressão, pois existe a dificuldade de enfrentamento da doença, o que prejudica o referido tratamento. Por isso, é necessário que se destaque a importância do envolvimento da família, no apoio ao paciente, durante seu tratamento. Alguns estudos mostram que a adesão ao tratamento é um dos problemas mais frequentes enfrentados pelos pacientes. Sendo assim, ressalta-se que é de competência do enfermeiro instruir o paciente sobre os possíveis sintomas e sobre as mudanças físicas que ocorrerão, esclarecendo as dúvidas e possibilitando a criação de um elo entre o profissional e o paciente (FERREIRA; NICHIATA, 2008). Outros autores afirmam que a família é considerada uma unidade de cuidado e uma fonte de ajuda para o indivíduo com Aids. Desta forma, ela contribui para o equilíbrio físico e mental do paciente (SOUSA; KANTORSKI; BIELEMANN, 2004). A família é um complexo sistema de organização, e apresenta crenças, valores e práticas ligadas às transformações da sociedade, em busca da melhor adaptação possível para a sobrevivência de seus membros e da instituição como um todo (MINUCHIN, 1990). É comum depararmo-nos com situações nas quais o paciente perde a vontade de viver, pois muitas vezes se sente abandonado e sem motivação, tanto para começar, quanto para continuar o tratamento. Pode-se afirmar, também, que o preconceito ainda é um dos maiores problemas enfrentados tanto pelo portador do vírus HIV como pela família, e este acaba se tornando responsável pela não adesão do paciente ao tratamento (AYRES et al., 2004). Pelo presente estudo pretende-se levar aos profissionais de saúde mais informações, para melhor entendimento sobre o cotidiano de uma família que convive com um membro portador do vírus HIV/Aids. Desta forma, a equipe de enfermagem poderá identificar como e quais são as alterações da rotina do paciente e da própria família, no contexto familiar, após a descoberta da soropositividade, as quais servirão como apoio na elaboração de medidas e estratégias de atenção, tanto para o paciente, quanto para a sua família. estudos, Goiânia, v. 41, especial, p. 101-112, out. 2014. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Adotou-se, no presente estudo, a revisão integrativa, considerada um método de revisão mais amplo, por permitir a inclusão de estudos de abordagem quantitativa e qualitativa. Esse método foi desenvolvido em seis fases/etapas: escolha do tema e questão da pesquisa; critérios de inclusão e exclusão; busca na literatura; categorização dos estudos; análise dos dados; interpretação dos resultados e apresentação da revisão. O objetivo é reunir e sintetizar os estudos realizados sobre o assunto, proporcionando maior entendimento a partir dos resultados evidenciados em cada referencial teórico (SOUZA; SILVA; CARVALHO, 2010). Com o suporte desse método, fez-se a delimitação do tema tendo como perspectiva conhecer o contexto familiar frente à convivência com o paciente portador do HIV/ Aids, para o qual se formulou a seguinte pergunta norteadora: Quais as percepções da família frente à convivência com o paciente portador do HIV/Aids? Em seguida, procedeu-se com a busca dos estudos publicados no período de 2003 a 2013, cujo levantamento foi realizado nas bases de dados virtuais, Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), Centro Latino Americano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde (BIREME), Scientifc Eletronic Library On Line (SciELO) e Base de Dados de Enfermagem (BDENF), com acesso por meio de palavras-chave, previamente estabelecidas para a busca, usadas individualmente e/ou associadas, dentre elas: família, HIV, Aids, percepção e convivência, no processo de busca. Na fase de coleta dos dados, utilizou-se um roteiro caracterizado em quadros I e II, cujo objetivo foi facilitar a extração das informações-chave dos artigos selecionados, as quais foram analisadas detalhadamente. Para compor o estudo, foram incluídos os artigos originais que fizeram referência ao tema e que apresentavam abordagem qualitativa do tipo descritiva, exploratória descritiva. Finalmente, a análise e discussão do referencial teórico consistiram na leitura dos resumos de cada artigo, o que possibilitou a identificação do conteúdo descrito para a inclusão e a composição da pesquisa. Feito isso, realizou-se a leitura, na íntegra, de cada texto, e o registro dos pontos principais para análise. Após esta tarefa, fez-se a organização, a codificação, a caracterização dos estudos e a categorização do conteúdo, por meio de fichamentos, resumos e apontamentos, a fim de facilitar o desenvolvimento da presente pesquisa e de sua respectiva síntese. RESULTADOS E DISCUSSÃO No decorrer das investigações, foram encontrados 3.861 artigos, cujo número, após o refinamento temático, foi reduzido para um total de 74. Desses, 29 foram pré-selecionados para a leitura criteriosa dos títulos, resumos, resultados e das conclusões, conforme os critérios estabelecidos no método. A partir dessa estratégia, incluíram-se oito artigos no estudo, por apresentarem coerência com os critérios de inclusão e com a temática proposta. Os oito (100%) artigos foram encontrados nas seguintes bases de dados: quatro (50%) no SciELO e quatro (50%) na LILLACS, sendo que dois desses estudos apareciam simultaneamente em ambas as bases. 103 104 estudos, Goiânia, v. 41, especial, p. 101-112, out. 2014. Os estudos foram codificados de A1 a A8, para melhor visualização dos dados, e em seguida ordenados de forma decrescente em relação ao ano de publicação, como mostra o quadro I. Ante a leitura dos títulos, identificou-se que os autores apontam o enfrentamento à HIV/Aids pelos pacientes soropositivos como um aspecto importante para a família, e este foi destacado em três (37,5%) artigos. Esses estudos enfatizam a convivência e as expectativas vividas pelos pacientes em três (37,5%) publicações, enquanto em dois (25%) estudos os autores salientam que muitos pacientes ainda vivem no anonimato. Observa-se, portanto, a preocupação dos autores em mostrar o cotidiano dos pacientes, assim como o cuidado e as expectativas despertadas nos soropositivos, juntamente com a família. Como a seleção do material correspondeu somente à abordagem qualitativa, como descrito no método, ressalta-se que os oito (100%) são pertinentes a esta modalidade, e desses, cinco (62,5%) correspondem ao estudo descritivo e três (37,5%) ao tipo exploratório descritivo, mostrando que os estudiosos pautaram suas pesquisas nesse tipo de estudo, que deve ter atendido às suas expectativas. Ao analisar a formação dos autores e área em que o estudo foi desenvolvido, observa-se que a área de enfermagem sobressaiu com sete (87,5%), das publicações, sendo os autores enfermeiros, mestres doutores e docentes, seguida da psicologia, com um (12,5%). Cinco (62,5%) artigos têm autores com formação de enfermeiro, mestre e doutor, dois (25%) têm enfermeiros graduados e um (12,5%) psicólogo doutor. Desta forma, pode-se afirmar que a enfermagem tem participado dos estudos referentes a essa temática, aumentando, consequentemente, o interesse em agregar conhecimentos e desenvolver pesquisas. Apesar dessa evidência, ainda há carência nessa área em publicações, o que exige maior empenho desses profissionais em ampliar as publicações nessa temática. Em relação às cidades de origem das publicações, Brasília/DF publicou três (37,5%) artigos, seguida de São Paulo/SP, com duas (25%); Rio de Janeiro/RJ, com duas (25%) e Porto Alegre/RS com uma (12,5%). Assim, observa-se a dedicação dos profissionais nessas regiões, ao publicarem artigos referentes ao HIV/Aids e sobre as percepções da família no cuidado ao paciente soropositivo. Logo, percebe-se a ausência de materiais publicados sobre o referido tema em outras cidades e/ou capitais, uma vez que não foi encontrado nenhum estudo em outras localidades. Quanto aos anos de divulgação do material, nos anos de 2012, 2011, 2009, 2008, 2007, 2006, 2005 e 2003 foi encontrado apenas um artigo publicado em cada ano. De 2005 a 2009, observou-se a continuidade de publicações, no entanto, verificou-se a necessidade de aumentar esse quantitativo, pois um assunto de tamanha magnitude requer um olhar mais atento, já que em 2004, 2010 e 2013 nenhum artigo referente à temática foi encontrado. Apesar de o pesquisador encontrar nas bases consultadas oito artigos associados ao tema, entende-se que este não é um número satisfatório para um assunto tão importante. Portanto, pode-se afirmar que, neste contexto deve-se levar em conta a necessidade de estudos nessa área, não só pela enfermagem, mas também pelas outras áreas, pois essa temática merece a atenção dos profissionais de saúde, e não deve se esgotar nunca. Embora tenham sido encontrados muitos estudos relacionados a esta temática, o problema ainda encontra-se muito presente, revelando que, além de pesquisar, é também necessário colocar em prática as respostas encontradas neste estudo. Quadro 1: Caracterização dos artigos estudos, Goiânia, v. 41, especial, p. 101-112, out. 2014. Cód. artigo Título Formação dos autores A1 Enfrentamentos experienciados por homens que vivem com HIV/Aids no ambiente de trabalho - Enfermeira. Mestre. Doutoranda em Enfermagem -Enfermeira. Doutora em Doenças Tropicais, docente -Enfermeira. Doutora em Enfermagem -Enfermeira. Mestranda em Enfermagem -Enfermeira. Mestranda em Enfermagem A2 Vivências para o enfrentamento do HIV entre mulheres infectadas pelo vírus Ano de publicação Fonte Publicação Abordagem / tipo de estudo 2012 Rev. Esc. Enferm. USP/SP LILLACS Qualitativa/ Exploratório descritivo -Enfermeira 2011 Rev Bras Enferm. (REBEn) Brasília/ DF LILLACS Qualitativa/ Descritivo A3 Convivência e percepção do cuidado familiar ao Portador de HIV/Aids -Enfermeira mestre e docente -Enfermeira mestre e docente -Enfermeira doutora em filosofia da enfermagem e docente -Enfermeira mestrando -Enfermeira, doutora em filosofia da enfermagem. 2009 Rev. Enferm UERJ/ RJ LILLACS Qualitativa/ Exploratório Descritivo A4 O impacto da descoberta da sorologia positiva do portador de HIV/Aids e sua família -Mestre em enfermagem -Enfermeira, doutora em Filosofia da enfermagem. 2008 Rev. Enferm. UERJ/ RJ SciELO Qualitativa/ Exploratóriodescritivo Mulheres com HIV/ AIDS: fragmentos de sua face oculta -Mestre em enfermagem, docente e pesquisadora. -Doutora em Ciências da Saúde, Mestre em enfermagem, docente e pesquisadora. Transmissão vertical do HIV: expectativas e ações da gestante soropositiva -Enfermeira obstetra. Enfermeira obstetra. A7 Aspectos psicossociais da vivência da soropositividade ao HIV nos dias atuais -Psicóloga. -Psicóloga, doutora. -Psicóloga, doutora. -Psicóloga. A8 Mulheres e Aids: rompendo o silêncio da adesão Enfermeira. Mestre em Enfermagem, docente. Professora Adjunto, doutora em saúde publica e pesquisadora. A5 A6 Fonte: Dados coletados dos estudos divulgados no período de 2003 a 2013. 2007 Rev. Bras. Enferm. (REBEn) Brasília/DF SciELO Qualitativa/ Descritivo 2006 Rev Latinoam Enferm. USP/ SP SciELO Qualitativa/ Descritivo 2005 Psico, Porto Alegre. PUC RS LILLACS Qualitativa/ Descritivo 2003 Rev. Bras. Enferm. Brasília/DF SciELO Qualitativa/ Descritivo 105 106 estudos, Goiânia, v. 41, especial, p. 101-112, out. 2014. Ao realizar a síntese dos artigos, especialmente quanto aos objetivos dos estudos (quadro II), observa-se que em sete (87,5%) deles foi observada convergência no alcance dos objetivos. Porém, no artigo A3 não há clareza quanto às necessidades de cuidados que as famílias sentem na convivência com os pacientes soropositivos. No que diz respeito ao interesse em conhecer e compreender os impactos e os conflitos causados aos pacientes e à família, após receber o diagnóstico de HIV/Aids, notou-se que em quatro (50%) dos estudos os autores buscam respostas para esses aspectos, uma vez que os familiares são as pessoas mais próximas que convivem junto com o paciente. Logo, percebe-se que, em sua maioria, os objetivos são coerentes com os resultados, quando, nos artigos A3, A4, A5, A7, os autores descrevem os sentimentos e os conflitos vivenciados pelos pacientes e familiares, ao apontarem os sentimentos gerados após o diagnóstico, quais sejam: medo da morte, impotência, culpa e até isolamento, porém alguns pacientes, mesmo após o diagnóstico, não desistem de continuar lutando para melhorar a qualidade de vida (BOTTIL et al., 2009; CARDOSO et al., 2008; CECHIM; SELLI, 2007; CASTANHA et al., 2005). Nos oito (100%) artigos analisados, aparece o medo do preconceito e da morte como os sentimentos mais relatados pelos participantes das pesquisas. Então, observa-se que há uma concordância, entre todos os autores, em relatar esses sentimentos despertados. O artigo A1, por exemplo, mostra que o medo de perder o emprego e de ser soropositivo leva o paciente a omitir o seu diagnóstico, e esse medo, muitas vezes, o leva ao isolamento. O A2 afirma que a revelação do diagnóstico restringe-se apenas às pessoas íntimas, devido ao medo do preconceito e aos conflitos advindos dele. O artigo A3 mostra que a família é o porto seguro do soropositivo, e é nela que eles encontram forças para continuar a viver, pois quando o paciente recebe o diagnóstico a família, geralmente, assume o papel de cuidador durante o tratamento (FREITAS et al., 2012; GALVÃO; PAIVA, 2011; BOTTIL et al., 2009). Nesse caso, identifica-se convergência entre o artigo A3 e o A2, quando os autores apontam que, após o diagnóstico de HIV/Aids, os pacientes procuram motivações para enfrentarem a doença, na religiosidade, presença dos filhos e no suporte social e familiar, evidenciando, assim, a importância da família, antes e durante a fase da doença (GALVÃO; PAIVA, 2011; BOTTIL et al., 2009). Os artigos A1, A7 e A8 apontam que os pacientes soropositivos se isolam, após o diagnóstico do HIV/Aids, correspondendo a um percentual de (37,5%) do material encontrado, e esse sentimento aparece como uma característica comum após a descoberta da soropositividade (FREITAS et al., 2012; CASTANHA et al, 2005; REIS; XAVIER, 2003). O artigo A4 aponta as dificuldades enfrentadas pelos pacientes no ambiente familiar, com um artigo (12,5%), tais como medo de revelar o diagnóstico da doença até mesmo dentro da própria família, e, por isso, eles sentem necessidade de usar as medicações escondidas. Desta forma, a família não consegue apoiar e sustentar o seu ente nos momentos em que ele mais necessita. Observa-se, aqui, uma semelhança entre os aspectos discutidos no artigo A7, no qual os autores mostram que, devido à falta de suporte familiar e de apoio o paciente se isola, prejudicando, então, o tratamento (CARDOSO et al., 2008; CASTANHA et al., 2005). estudos, Goiânia, v. 41, especial, p. 101-112, out. 2014. Quanto às percepções das famílias, destacadas no artigo A5 (12,5%), os autores mostram o ponto de vista dos pacientes, porque a experiência de receber o diagnóstico é única, por ser uma notícia inesperada e que mudará sua vida, pois a confiança é algo que eles depositam nos parceiros, e, ao receberem o diagnóstico se deparam com a traição e o desrespeito do parceiro (CECHIM; SELLI, 2007). Em relação às recomendações e conclusões, os artigos apontam tanto para as consequências do diagnóstico, como para as expectativas apresentadas pelos pacientes, pois os conflitos gerados após a descoberta da soropositividade causam dor, medo, angústia e impotência. Mesmo assim, com tantas dificuldades os pacientes ainda têm forças para continuar a viver, porque, apesar dos conflitos vivenciados e das mudanças no cotidiano, eles se adaptam ao novo estilo de vida, porém não excluem dela o medo (CASTANHA et al., 2005; MOURA; PRAÇA, 2006; CARDOSO et al., 2008). Diante dessas constatações, entende-se que é competência do enfermeiro buscar informações para melhorar o atendimento ao paciente e à família cujo membro é portador do HIV/Aids, pois esse profissional encontra-se diretamente ligado ao cuidado, sendo o elo para a melhoria e qualidade de vida do paciente e de sua família. Por isso, é de extrema importância que esses profissionais tomem consciência da necessidade da realização de pesquisas e publicação de artigos sobre esse tema, pois, dessa forma, eles contribuirão para a melhoria no cuidado prestado aos pacientes e aos familiares. Sabe-se que eles necessitam de ajuda para enfrentar os conflitos gerados após o diagnóstico da soropositividade e que isto os leva a mudanças inesperadas, tanto na vida do paciente, quanto na da família. Quanto ao conteúdo discutidos pelos autores, foram identificadas, especialmente, as dificuldades no cotidiano familiar do paciente portador do HIV/Aids, e essas aprecem como um dos pontos mais importantes, discutidos pelos autores. Notou-se que os sentimentos são as dificuldades mais destacadas pelos autores, entre eles o medo do preconceito e da morte. Entretanto, ao descobrir o diagnóstico de HIV/Aids, toda a família é afetada. Alguns familiares ajudam, dando apoio ao paciente, enquanto outros mostram indiferença. Ao receber o diagnóstico da soropositividade, o sentimento despertado é considerado único, porque para a Aids não existe cura. Logo, pode-se afirmar que as dificuldades são grandes devido ao preconceito da sociedade e, muitas vezes, da própria família (FREITAS et al., 2012; GALVÃO; PAIVA, 2011; CASTANHA et al., 2005; CECHIM; SELLI, 2007). No que diz respeito ao convívio com a família, tem-se que esta é a base para uma vida de qualidade, e para o paciente soropositivo ela se torna importante também para o tratamento, pois, ao se deparar com um diagnóstico ruim, o paciente necessita de amparo, incentivo e de alguém que mostre que, mesmo a doença não tendo cura, ele pode ter uma vida de qualidade, aderindo, primeiramente, ao tratamento correto (BOTTIL et al., 2009). Os autores abordam as mudanças no cotidiano da vida do paciente e da sua família, após o diagnostico de HIV/Aids, quando se observam alterações significativas de hábitos, rotinas e de concepções sobre saúde e sobre a própria vida (GALVÃO; PAIVA, 2011; CARDOSO et al., 2008; MOURA; PRAÇA,2006). Após a descoberta da sorologia, as mudanças acontecem tanto positiva, quanto negativamente. O fato de o paciente ter um bom relacionamento familiar gera resulta- 107 dos significativos para ele, quanto à adesão ao tratamento, influenciando em seu modo de viver. Assim, faz-se necessária a convivência harmoniosa entre os familiares, para que se possa ter, como resultado, uma vida saudável nesse contexto, pois uma convivência sem harmonia traz sofrimento para o paciente, porque isso gera o abandono e o preconceito, dentro da família, afastando, assim, um dos outros (CARDOSO; SILVA; WAIDMANI, 2008). O paciente precisa, então, buscar motivos para enfrentar a doença, pois além de tudo pode surgir também o sentimento de impotência, de inutilidade diante do diagnóstico, especialmente quando ele é responsável pelo sustento do lar. Nesse caso, a sorologia o leva ao sentimento de incapacidade para exercer suas funções diárias, como cuidar dos filhos, por exemplo. Por causa desse sentimento de culpa, a depressão pode ser inevitável (GALVÃO; PAIVA, 2011). Assim, ao fazer a síntese do conteúdo apresentado pelos autores, destaca-se que ainda existem diversas dificuldades enfrentadas pelo paciente soropositivo ao HIV, sendo necessário, portanto, um olhar mais crítico em busca de soluções para a melhoria da qualidade de vida desse pacientes e de seus familiares, uma vez que o enfermeiro cuida do paciente e da sua família. Mesmo diante de tantos obstáculos, nota-se que a maioria das famílias, e os próprios pacientes, têm esperança de construírem uma vida melhor, deixando de lado, muitas vezes, o medo do preconceito, e passando a encarar a vida de forma natural, não deixando que a doença acabe com suas expectativas e com seus sonhos. Cód. Artigo Título Objetivos Resultados Recomendações / Conclusões A1 Enfrentamentos experienciados por homens que vivem com HIV/ Aids no ambiente de trabalho - Apreender situações de enfrentamento experienciadas por homens que vivem com HIV/Aids no ambiente de trabalho. O medo da descoberta sobre a soropositividade leva muitos trabalhadores a se demitirem, se isolarem ou até mesmo a omitirem sobre sua saúde, com receio do preconceito. As consequências, ao revelar o diagnóstico, vão desde o constrangimento no ambiente de trabalho à demissão. Por medo do preconceito, a revelação do diagnóstico restringe-se às pessoas intimas. Para que elas enfrentem o HIV/Aids, algumas motivações foram ressaltadas, como religiosidade, presença de filhos, suporte social e familiar e cumplicidade profissional. Presença da esperança em algo sobrenatural como a religiosidade revelou-se como alento para o enfrentamento positivo, aliada à perseverança no tratamento com vistas a sobreviver, para poder cuidar dos filhos, mesmo ante a impossibilidade de cura. As mulheres perseveram em busca de novas alternativas e possibilidades, para enfrentarem a doença e sobreviverem dignamente. A2 108 Vivências para o enfrentamento do HIV entre mulheres infectadas pelo vírus - Descrever relatos e situações vivenciadas por mulheres infectadas pelo HIV para o enfrentamento da infecção. continua... estudos, Goiânia, v. 41, especial, p. 101-112, out. 2014. Quadro 2: Categorização e síntese dos artigos: objetivos, resultados e conclusões A família, além de constituir o porto seguro, para onde seus membros sempre retornam, para revigorar suas forças, serve ainda de confiança e apoio para o enfrentamento dos momentos difíceis acarretados pela condição crônica. Ela, que assume o cuidado no cotidiano até a completa recuperação do doente ou a sua continuidade por toda a vida, nos casos de doenças crônicas. Observar-se o envolvimento da família com a situação vivida e o cuidado prestado ao portador de HIV/Aids, o qual é permeado por vários sentimentos, entre eles os de impotência, compaixão, tristeza e até mesmo de conformismo. Com o passar do tempo, as dificuldade enfrentadas pelos pacientes vão dando lugar a outros sentimentos, como valorização da vida e mudanças no cotidiano, com vistas à melhora na qualidade de vida. A3 Convivência e percepção do cuidado familiar para o portador de HIV/ Aids A4 O impacto da descoberta da sorologia positiva pelo portador de HIV/ Aids e pela sua família - Compreender o impacto da sorologia positiva na vida do portador de HIV/Aids e seu familiar. Com o diagnostico do HIV, muitos pacientes mudaram o cotidiano, seja de forma positiva ou negativa. Alguns enfrentam dificuldade na família, e outros não deixaram que o diagnóstico interferisse na sua rotina de vida. Mulheres com HIV/AIDS: fragmentos de sua face oculta - Conhecer fatores geradores do medo que assola as mulheres soropositivas e as consequências nas relações do cotidiano familiar, do trabalho e do convívio social. Receber o diagnóstico da soropositividade significa, muitas vezes, para a mulher, um indicativo de morte. A perspectiva de morte iminente é o maior dos medos sentido pelo homem. Este sentimento foi expresso pelos sujeitos da pesquisa, manifestando medo diante da perspectiva da morte, pois esta é uma experiência única, solitária e alienante. A confiança no parceiro constitui uma situação que ofusca o risco da contaminação. Ao tomar conhecimento do diagnóstico de soropositivo, a mulher se defronta com a traição e o desrespeito de seu parceiro, tido, até então, como companheiro fiel na vida a dois. - Identificar as expectativas e ações da gestante HIV positivo quanto à gravidez e ao concepto. Para muitas mulheres, a criança seria uma força motivadora para as suas vidas. Um filho as ajudaria a se sentirem mais fortes, dando-lhes razão para resistirem ao vírus. Vários sentimentos são despertados, assim como a expectativa pelo nascimento de um recém-nascido saudável e não infectado, que dava forças à gestante HIV positivo, entrevistada, para prosseguir com a gravidez e manter-se viva. - Compreender os aspectos psicossociais da vivência da soropositividade e suas consequências na vida diária. As pessoas com HIV/Aids são, muitas vezes, discriminadas, isoladas do convívio com outras pessoas. A discriminação ocorre, muitas vezes, no próprio núcleo familiar, o que é bastante alarmante, pois a família e os amigos são fundamentais para se configurar uma rede de apoio. O abandono gera sentimentos de culpa, isolamento e até mesmo descuido com a aparência, sendo estes necessários para se continuar a viver. Através das representações sociais da Aids, apreendidas neste estudo, pode-se ter acesso às crenças, às interpretações, ao conjunto de relações sociais. Essas representações ultrapassaram o aspecto biológico e atingiram os aspectos psicossociais, tais como o preconceito, a segregação, o estigma e a inserção social, aspectos próprios da Aids. A5 A6 estudos, Goiânia, v. 41, especial, p. 101-112, out. 2014. - Conhecer aspectos da convivência familiar do portador do Hiv/Aids. - Identificar as necessidades de cuidado que as famílias sentem diante desta convivência. A7 Tr a n s m i s s ã o vertical do HIV: expectativas e ações da gestante soropositiva Aspectos psicossociais da vivência da soropositividade ao HIV nos dias atuais continua... 109 conclusão A8 Mulheres e Aids: rompendo o silêncio da adesão - Discutir a relevância ao grupo de adesão em relação á qualidade de vida das mulheres soropositivas. Todas as mulheres entrevistadas relataram mudanças significativas após o diagnóstico da soropositividade. O sentimento mais forte é de terem sido traídas pelo homem em quem confiavam. Elas relatam que se sentem fracas e oprimidas pela presença do vírus HIV. O medo, a revolta e a insegurança passam a preencher o cotidiano dessas mulheres. No início, elas buscam isolamento e solidão no próprio lar. Com o grupo de adesão coletivo foi possível permitir a troca de experiências, contribuindo, assim, para a melhoria da qualidade de vida dessas mulheres. A incorporação da família das mulheres no grupo de adesão, sendo esta a peça essencial na resposta ao tratamento, como a melhoria na qualidade de vida das pacientes. O grupo de adesão ajuda as mulheres a enfrentarem o HIV/Aids por meio de debates, informações e orientações relacionada à doença e ao cotidiano feminino. Fonte: Dados coletados dos estudos divulgados no período de 2003 a 2013. 110 Para o desenvolvimento deste estudo, teve-se como eixo central o ato de conviver da família com o paciente portador de HIV/Aids, destacando-se suas dificuldades, sentimentos e conflitos. Nesse sentido, o material analisado mostrou que, historicamente, o preconceito ainda é um problema que acompanha a família e o paciente desde a sua descoberta na sociedade até os dias atuais. Ligados ao preconceito também emergem vários outros sentimentos, tanto na família, quanto no doente e nas pessoas próximas ao paciente. Observa-se que, devido ao medo da doença, do preconceito e da exclusão social o paciente se isola, muitas vezes, em sua própria casa, prejudicando ainda mais seu tratamento. Diante desse contexto, e como forma de amenizar as dificuldades vivenciadas pela família, tem-se no enfermeiro, em especial, e na equipe de enfermagem um ponto de apoio importante, por ser, reconhecidamente, a equipe mais presente no cotidiano da assistência à saúde e com maior possibilidade de aceso à família do paciente, quando o objetivo é a obtenção de determinadas informações, sobre a convivência com o paciente, que possam ser trabalhadas junto à família e ao paciente. Assim, a enfermagem pode agir de forma mais adequada e eficiente, indicando/adotado as melhores estratégias para o paciente e a família lidarem com as dificuldades provenientes de tal condição. Logo, faz-se necessária a intervenção da enfermagem, com domínio de conhecimento técnico e científico e com capacidade para estabelecer elo com a família e o paciente, uma vez que o tratamento mais eficaz só poderá ser alcançado se o paciente estiver inserido no ambiente familiar com menos conflitos e mais apoio. Apesar das limitações na realização deste estudo, principalmente na localização do referencial teórico, nota-se que o tema é, ainda, pouco divulgado entre os profissionais de saúde, sinalizando a necessidade de um olhar mais crítico dos pesquisadores, em especial os da enfermagem, quanto ao interesse de contribuir com a área da saúde e da categoria, para que possam registrar, por meio de estudos, suas experiências nesse contexto temático. estudos, Goiânia, v. 41, especial, p. 101-112, out. 2014. CONSIDERAÇÕES Portanto, espera-se que as impressões contidas neste estudo possam chegar até os profissionais de saúde e gerar reflexão crítica e humanística sobre como eles podem agir no seu trabalho, para melhorar a assistência aos pacientes e aos seus familiares, uma vez que esses necessitam de apoio para enfrentar os conflitos gerados após a descoberta da soropositividade ao HIV, porque isto pode levar a mudanças inesperadas no cotidiano da família. CONFLICTS AND EMOTIONAL TOLL IN FAMILIES LIVING WITH HIV PATIENTS Abstract: integrative review containing a qualitative approach on eight studies published in the period 2003-2013 with the objective to describe the perceptions held by family members toward patients with HIV/AIDS, mainly highlighting positive aspects of family living. Both patient and family undergo through changes and unexpected difficulties after HIV seropositivity diagnosis which requires even more professional attention at this stage. Keywords: HIV. Aids. Family. 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E-mail: rogé[email protected]. 112 MARIA APARECIDA DA SILVA Enfermeira. Mestre pela Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Docente do Curso de Graduação em Enfermagem da PUC Goiás. Orientadora do estudo. estudos, Goiânia, v. 41, especial, p. 101-112, out. 2014. SOUZA, T. M.; SILVA, D. M.; CARVALHO, R. Revisão integrativa: o que é e como fazer. Einstein, v. 8, n. 1, supl. 1, p. 102-6, 2010.