Parecer do Grupo Técnico de Auditoria em Saúde 0 1 1 /0 3 Tema: Revascularização transmiocárdica a laser I – Data:25/08/03 II – Grupo de Estudo: Adolfo Orsi Parenzi Clemilda de Alvarenga Coelho Elen Cristina Queiroz Rezende Pinto Lélia Maria de Almeida Carvalho Luciana Bernardino Neuma Lúcia Cordeiro Lins Costa Pávilo Bernardina de Miranda Roberto Almeida Cunha Silvana Márcia Bruschi Kelles III – Tema: TRM Transmiocardial Laser Revascularisation – Revascularização transmiocardica a laser IV – Especialidade: Cirurgia cardíaca V – Questão Clínica / Mérito: 1. Foi solicitada, pelo Hospital Biocor, a liberação do procedimento “cirurgia de revascularização a laser” para pacientes com coronariopatia terminal e angina pectoris classe III e IV, refratária a terapêutica clínica e com alto risco para cirurgia de revascularização devido ao reduzido calibre das artérias coronarianas e pacientes com o quadro descrito anteriormente que por ventura têm algum vaso coronariano viável em que há possibilidade de revascularização convencional além da revascularização à laser. 2. Comprovar a efetividade e segurança do método proposto. VI – Enfoque: ( ) Etiologia ( ) Diagnóstico (X) Tratamento ( ) Prognóstico VII – Introdução: A destruição celular ou de substância orgânica pelo laser se faz por fotocoagulação (necrose por coagulação), queima, liquefação ou vaporização. Além do ponto atingido pela coagulação, a energia do laser é absorvida apenas por uma fina camada de tecido adjacente. Já em 1981, Mirhoseini et al propuseram o uso de raios laser visando a criação de canais transmiocárdicos. As primeiras experiências com laser em artérias coronárias humanas foram realizadas por Choy et al em 1984. Desde 1990, o laser foi utilizado em mais de 4.000 procedimentos em mais de 80 serviços de cirurgia cardíaca. No Brasil, a revascularização a laser foi iniciada em 1995, por Galantier et al que submeteram 17 pacientes a esse procedimento entre abril de 1995 e junho de 1996, com 3 óbitos imediatos e 5 tardios. Três pacientes não apresentaram nenhuma melhora da angina e seis tiveram melhora de pelo menos 1 a 2 classes funcionais da angina. Em 1990, o FDA aprovou o laser para revascularização para estudos clínicos comparativos, obedecendo a 3 protocolos diferentes: Fase I - Avaliou-se a segurança do procedimento com o coração batendo. Fase II - procurou-se avaliar a eficiência da revascularização transmiocárdica em classes III e IV de angina pectoris, refratária ao tratamento medicamentoso e que não eram passíveis de revascularização através de cirurgia ou de angioplastia. Fase III - Objetivou comprovar, de maneira randomizada, a segurança e eficácia observadas na revascularização na Fase II. Foi realizado um estudo prospectivo com 192 pacientes, em 12 centros, comparando o emprego do raio laser e tratamento medicamentoso em pacientes com angina graus III e IV, que não apresentavam indicações para o tratamento cirúrgico clássico ou angioplastia. A mortalidade no grupo tratado com laser foi de 3,3%. Ao final de 12 meses, 72% dos pacientes do grupo laser contra apenas 13% do grupo tratado com medicamentos, apresentaram redução significativa nos sintomas de angina. Uma das complicações inerentes ao procedimento está relacionada às arritmias cardíacas. O acesso ao coração para a realização do procedimento a laser é uma mini-toracotomia no 4º ou 5º espaço intercostal esquerdo. A fisiologia dos canais revascularizando o miocárdio é motivo de controvérsias. A primeira fase seria a lesão térmica ao tecido adjacente ao canal com o laser. Há migração de fibroblastos em um segundo momento, provocando a remodelação do canal. A suposição de que os canais transmiocárdicos criados pelo laser permanecem pérvios, fornecendo sangue oxigenado diretamente da cavidade ventricular é motivo de controvérsia. O mecanismo de funcionamento desses canais pressupõe: 1. Que os canais estejam patentes 2. Que estabeleçam comunicações entre o endocárdio e o miocárdio. 3. Que haja passagem de sangue oxigenado por essas comunicações do ventrículo esquerdo para o sistema arteriolar. A denervação do miocárdio tem sido sugerida como um potencial mecanismo par alívio da angina pelo procedimento a laser. Isso criaria o conceito de que os sintomas dos pacientes teriam alívio não pela melhora da perfusão, mas que os pacientes passariam a não sentir a angina, pela denervação. Uma outra possibilidade para explicar a melhoria dos sintomas é o efeito placebo. Embora não possa ser afastado, esse efeito é pouco provável, pois alguns pacientes permanecem assintomáticos durante um ano ou mais.(1) VIII – Revisão Bibliográfica: Estudo de casos - Trabalho apresentado pela equipe do Instituto do Coração entre fevereiro 1998 e fevereiro de 2000, 40 pacientes foram submetidos ao procedimento. O procedimento foi realizado isoladamente em 75% dos pacientes e combinada em 25% dos casos. O número de canais por área tem sido de 1 a cada cm². Resultados do estudo, 87,8% dos pacientes, ao final de 12 meses apresentaram melhora de classe de III e IV para 0,I e II. Em 66,6% dos pacientes a angina desapareceu completamente. Mortalidade perioperatória foi de 2 pacientes, e foram 7,5% óbitos no segundo ano de tratamento.(1) Artigo de revisão – com 3 ensaios clínicos (328 pacientes) incluindo um estudo multicêntrico não randomizado (200 pacientes), um estudo prospectivo (12 pacientes com revascularização a laser concomitantemente com revascularização convencional), estudos descritivos e relato de casos. Os critérios de inclusão foram: pacientes com angina grave, refratária à terapia medicamentosa; isquemia reversível; angina instável e pacientes com contraindicações para cirurgia convencional de revascularização ou angioplastia. A revisão leva à conclusão de que não existem dados suficientes para avaliação de custo-efetividade do procedimento de revascularização a laser. O risco perioperatório foi de 3 a 5%; não houve evidência de que a revascularização a laser diminui a incidência de infarto, a tolerância ao exercício físico ou que prolongue a sobrevida dos pacientes.(2) Estudo avaliando custo-utility comparando o tratamento medicamentoso com a revascularização a laser. Trata-se de estudo randomizado cujo evento avaliado foi o incremento da capacidade de exercício físico, em 188 pacientes avaliados durante 12 meses. Os resultados mostram sobrevida em 1 ano, de 89% no grupo com revascularização a laser e de 96% no grupo tratado com medicamento. A avaliação da qualidade de vida, “QALY score” não apresentou diferença estatisticamente significativa. O custo total por paciente tratado com a técnica de Heart Laser foi de 11.472 libras, enquanto o tratamento medicamentoso durante o mesmo período foi de 2.586 libras. A análise mostrou que a revascularização a laser não foi um procedimento eficiente para o manejo de pacientes com doença coronariana grave. Mesmo levando em consideração o incremento na capacidade de exercício do paciente, o custoutility foi desfavorável à terapêutica com a cirurgia a laser. (3) Estudo prospectivo, randomizado, multicêntrico, com 263 pacientes. O tratamento indicado foi a revascularização convencional do miocárdio. O critério de inclusão no estudo foi o fato de apresentarem um ou mais vasos ou ramos de coronária não abordáveis por cirurgia convencional. Os pacientes foram aleatoriamente selecionados para serem submetidos a cirurgia convencional apenas ou cirurgia convencional mais revascularização a laser. 132 pacientes foram submetidos a revascularização e 131 à revascularização + revascularização a laser. Os pacientes foram acompanhados durante 1 ano. Resultados do estudo: Aspecto avaliado Revascularização convencional + Revascularização convencional revascularização a laser 1,5% 7,6% 4% 8% 30% 55% Arritimia 18% 16% Fibrilação ventricular 4% 2% ICC 5% 6% IAM 3% 2% AVC 1% 2% Mortalidade Necessidade de balão intraaortico no PO Suporte inotrópico pós operatório Reoperação por 3% 1% 4,7% 11,2% sangramento Melhora da angina (1 ano de follow up) Conclusão do estudo: Os resultados após 1 ano de follow up mostram que a associação de duas técnicas de revascularização é segura, entretanto a melhora da angina e da capacidade para realização de exercício físico não foi diferente nos dois grupos.(4) Ensaio clínico, com 21 pacientes, tratados com terapia a laser. Quatro apresentavam angina instável, 7 apresentavam fração de ejeção de 35% ± 5%. Os pacientes foram acompanhados durante 20 meses. A conclusão foi de que não houve comprovação de melhora significativa na função contratil ventricular. (5) Estudo de casos – foram avaliados retrospectivamente 78 pacientes submetidos a revascularização a laser por angina, nos 5 anos anteriores ( pacientes até 7 anos de revascularização). Foram selecionados, inicialmente, 195 pacientes submetidos ao procedimento. Destes apenas 78, após os 5 anos, não necessitaram de nova revascularização ou evoluiram para óbito. Resultados: A maioria dos pacientes apresentavam, no momento do procedimento classe IV de angina (74%) ou classe III (26 %). Após 1 ano de follow up, a classe de angina observada era menor do que aquela no momento da revascularização – 81% dos pacientes ou não apresentavam angina ou a apresentavam em classes menores I e II ( média 1,5 ± 1,1). A distribuição dos mesmos pacientes, 5 anos após a intervenção não mudou significativamente, com 80% dos pacientes não apresentando angina ou apresentando-a em classe I ou II (média 1,6 ± 1,1). Pacientes que continuaram com o tratamento clínico, apresentaram a mesma mortalidade submetidos à revascularização a laser. dos pacientes Da mesma forma, pacientes com tratamento clínico obtiveram níveis similares de melhora da angina. A conclusão é que o procedimento proposto pode melhorar a qualidade de vida mas não altera a expectativa de vida do paciente. IX – Parecer do G.T.A.S.: Tendo como fundamento a bibliografia consultada, o Grupo Técnico conclui não existirem indicações para a liberação do procedimento Revascularização do Miocárdio a Laser até o momento. Essa decisão se pauta, sobretudo, nas seguintes observações: - Não existe aumento da sobrevida dos pacientes submetidos à Revascularização a Laser, em relação a pacientes tratados com medicamentos. - Os pacientes com angina sintomática se beneficiam com o procedimento, apresentando diminuição da classe de angina apresentada, porém, como mostram os estudos de custoefetividade, os mesmos resultados são obtidos com tratamento medicamentoso a um custo cinco vezes menor (3) - O mecanismo pelo qual se atinge a diminuição da dor anginosa é controverso, não existindo consenso sobre a fisiologia do tratamento. - Não existe relato de melhora significativa da função ventricular em pacientes submetidos a tratamento por revascularização a laser.(5) - O trabalho apresentado com avaliação do estado clínico dos pacientes submetidos a revascularização a laser há, pelo menos, 5 anos, mostra melhora da classe de angina, porém cabe analisar que somente 40% dos pacientes submetidos ao procedimento estudado foram avaliados, sabendo-se que os restantes 60% tiveram necessariamente uma evolução pior (óbito ou necessidade de nova revascularização). XII – Referências Bibliográficas: 1. Dallan LAO et al, Cirurgia de Revascularização Transmiocárdica a laser de CO2, Ver.Bras.Cir Cardiovasc 2000: 15(2): 89-104. 2. MSAC, Medicare Services Advisory Committee, Transmyocardial Laser Revascularisation (TMR), oct 1999, aplication 1004. 3. Campbell HE et al, A UK trial-based cost-utility analysis of transmyocardial laser revascularization compared to continued medical therapy for treatment of refractory angina pectoris, Jour of Cardio-Thoracic Surgery, 2001; 20(2):312-318. 4. Keith BA et al, Transmyocardial laser revascularization combined with coronary artery bypass grafting: A multicenter, blinded, prospective, randomized, controlled trial. Jour.Thoracic and Cardiov Surg; mar 2000, vol 119- number 3. 5. Denton AC, Transmyocardial laser revascularization: Clinical experience with twelve-month follow-up; Journ. of Thoracic and Cardiovascular Surgery, apr 1996, vol 111, number 4. 6. Keith AH, Sustained Angina Relief 5 Years After Transmyocardial Laser Revascularization With CO2 Laser, Circulation, 2001; 104: I-81 XIII – Anexos Bibliografia Processo original de solicitação de inclusão da técnica