Dados publicados originalmente em: SANTOS, L. C.. Verbos de

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Dados publicados originalmente em: SANTOS, L. C.. Verbos de Forma Larga y de Forma Corta en Suyá.
In: VI Simposio Internacional de Comunicación Social, 1999, Santiago de Cuba. Atas do VI Simposio
Internacional de Comunicación Social. Santiago de Cuba: Editorial Oriente, 1999. v. II. p. 512-518
Dados publicados originalmente em: SANTOS, L. C. Eliminação de segmentos fonológicos na língua
suyá. In: Ludoviko dos Santos; Ismael Pontes. (Org.). Línguas jê - estudos vários. Londrina: Editora da
Universidade Estadual de Londrina, 2002, v. 1, p. 131-146. Edição esgotada. Republicado em: SANTOS,
Ludoviko dos. Eliminação de Segmentos Fonológicos na Língua Suyá. Revista Eletrônica do Programa
de Pós-graduação em Letras da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Número 8 – março a junho
de 2009. Págs. 18-28.
VERBOS DE FORMA LONGA E NOMES EM SUYÁ1
Ludoviko dos Santos
UEL
Há, na língua Suyá (Família Jê), um processo morfofonológico que optei
por tratar como um caso de eliminação de segmentos fonológicos por
considerar que dessa forma é possível dar um tratamento descritivo unificado
para o processo que envolve, principalmente, as classes de nomes e verbos.
Há um primeiro momento deste processo que consiste na eliminação de vogal
de palavras paroxítonas, tanto para nomes quanto para verbos: I) a forma ʹtygy
"preto", perde a vogal final quando sufixada ou seguida por uma palavra
qualquer, ou seja, [ʹtygy] + [tʃi] + [ʹtyktʃi]; II) a forma tɛm
̃ ɛ ̃ "ir", perde a vogal final
quando seguida por outra palavra, ou seja, [ʹtɛm
ɛ
]
+
[mã]
"marca de fut." = [tɛm
̃ ̃
̃
mã]. No caso de verbos, há a possibilidade de eliminação de uma sílaba inteira:
a mesma forma [ʹtɛm
̃ ɛ]̃ acima, quando não seguida por nenhum elemento,
ocorre como [ʹtɛ]̃ .
Guedes (1993) trata o mesmo processo como reduplicação e o coloca
nos seguintes termos: “Na língua Suyá há um predomínio de palavras
monossilábicas sobre outros tipos. Quando a palavra monossilábica termina
em consoante, costuma ocorrer o acréscimo de uma vogal eco no final da
palavra. Essa vogal eco tem a mesma qualidade fonética da vogal anterior.
Quando a palavra aparece na sua forma monossilábica, dá-se o nome de
forma breve, curta ou reduzida e quando aparece na forma dissilábica, dá-se o
nome de forma longa.” (GUEDES, 1993, p. 78). Guedes aponta tal
reduplicação tanto para nomes quanto para verbos. Dá, entre outros, os
seguintes exemplos de nomes: “/ʹpəm/ [ʹpəmə] “pai”; “pássaro”; /ʹmur/ [ʹmburu]
“pescoço” (op. cit. p. 79). Quanto aos verbos, Guedes coloca que
“...apresentam uma forma curta ou reduzida e uma longa, .... As formas
reduzidas são sempre formas verbais transitivas. Nestas o objeto ocorre
redundantemente, sendo anteposto imediatamento ao verbo o pronome objeto
ku-.” (op. cit. p. 131). Para formas curtas de verbo dá alguns exemplos dentre
os quais escolhemos os que seguem:
I. ɤwĩsɨ oʹa
kuʹku
“eu como fruta”
fruta – eu – obj. (a) / comer
II. ʹrͻpra kãʹŋa ʹpĩ
“a onça matou a cobra”
onça – cobra – matar
1
Este texto completo corresponde à soma de dois artigos que foram publicados
separadamente, embora tratem do mesmo assunto: a possibilidade de verbos de forma longa
funcionarem como nomes. As referências de “Verbos de Forma Larga y de Forma Corta en
Suyá” e “Eliminação de segmentos fonológicos na língua suyá” constam na bibliografía.
Dados publicados originalmente em: SANTOS, L. C.. Verbos de Forma Larga y de Forma Corta en Suyá.
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suyá. In: Ludoviko dos Santos; Ismael Pontes. (Org.). Línguas jê - estudos vários. Londrina: Editora da
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Ludoviko dos. Eliminação de Segmentos Fonológicos na Língua Suyá. Revista Eletrônica do Programa
de Pós-graduação em Letras da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Número 8 – março a junho
de 2009. Págs. 18-28.
Segue expondo que as formas longas “...é que podem ocorrer como verbos
transitivos ou não. ... Além disso, as formas longas não ocorrem
necessariamente como o último elemento da oração.” (op. cit. p. 132).
Salientamos os seguintes exemplos dados pela autora:
III. ʹirɛ ɤwĩʹsɨ ʹkur
ʹker
“eu não como fruta”
eu – fruta – comer – não
IV. joko miʹči
ʹpĩr
mã
“Yoko vai matar o jacaré”
yóko – jacaré – matar – intenção
Assim, Guedes trata a eliminação de elementos vocálicos, tanto para
nomes quanto para verbos, como reduplicação. Deve-se notar que não há
indicações sobre a ausência de consoante final na forma curta do verbo no
dado II, assim como não há explicação da presença de consoante final nos
verbos de forma longa dos dados III e IV. Por outro lado, Guedes faz uma
relação entre as classes de verbos longos e curtos e sua transitividade. Não
nos parece que tal relação seja relevante porque tanto verbos de forma longa
quanto os de forma curta podem ser transitivos ou intransitivos. Vejam-se os
seguintes exemplos de verbos intransitivos de forma curta:
liana
ra
n. próp. ms
ʹtɛ ̃ “Liana foi”;
ir
ou, ainda, o exemplo:
wa
ʹŋgrɛ “Eu dancei”.
Ou seja, diferentemente do que afirma Guedes, verbos de forma curta podem
ser também intransitivos.
Trataremos do mesmo processo descrito por Guedes, fazendo-se um
contra-ponto, quando possível, com a exposição desta autora.
A eliminação vocálica em suyá é um processo simples e muito
abrangente, uma vez que se estende às principais classes de palavras.
Podemos reduzir o processo à seguinte regra que se aplica à composição de
palavras (sândi interno) e entre palavras (sândi externo): palavras paroxítonas
com sílaba final CV perdem a vogal final quando seguidas de qualquer
elemento. Vejamos alguns exemplos em diferentes classes de palavras:
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suyá. In: Ludoviko dos Santos; Ismael Pontes. (Org.). Línguas jê - estudos vários. Londrina: Editora da
Universidade Estadual de Londrina, 2002, v. 1, p. 131-146. Edição esgotada. Republicado em: SANTOS,
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ELEMENTOS
1. ʹmbɛri tʃi
bom
ASSIMILAÇÃO
RESULTADO
>ʹmbɛr tʃi
>mbɛt + tʃi
ʹmbɛtʃi
“muito bom”
quantificador
2. kiʹkrɛ ʹtũmũ + ra ʹsere
casa
E. VOCÁLICA
velho
>ʹtũm + ra
kiʹkrɛ ʹtũm ra ʹsere
“A casa velha queimou”
ms queimar
3. ʹsᴧgᴧ + ʹndͻ
>ʹsᴧg + ʹndͻ
>sᴧg + ndͻ
>ʹrͻw + ʹpĩ
>rͻp + pĩ
4. kujuʹsi ra ʹrͻwͻ + ʹpĩ
n. próp. ms onça
sᴧgʹndͻ
“ninho”
pássaro olho/ponta
5. ʹkĩ + ʹsere + je
kujuʹsi ra ʹrͻp ʹpĩ
“Kujusi matou a onça”
matar
>ʹser + je
>sed + je
aldeia queimar pluralizador
6. liʹana ra ʹtɛm
̃ ɛ ̃ ʹkere mã >´tɛm
̃ + ʹker >ʹked mã
n. próp. ms ir
negação fut. + mã
kĩʹsedje
“auto-denominação
grupo suyá”
do
liʹana ra ʹtɛm
ʹked
̃
ʹmã
“Liana não virá”
Nos dados 1 e 2 temos exemplos do processo envolvendo adjetivos na
formação de palavras e entre palavras. Como resultado temos uma
ressilabificação do morfema lexical ʹmbɛri, que passa de duas para uma sílaba
e, por assimilação regressiva, a variação do som final do morfema lexical, num
primeiro momento, e a assimilação total posteriormente. Em 2 ocorre apenas a
eliminação vocálica, uma vez que as nasais não são afetadas pelo ambiente
que as segue. Nos dados 3 e 4 o mesmo processo ocorre, em nomes, com as
seguintes alterações: em 3, eliminação da vogal e manutenção da som final do
morfema lexical, uma vez que o ambiente que o segue é sonoro; em 4,
mudança de [w] para [p], porque o ambiente seguinte é surdo, caso contrário
[w] torna-se [b]. Os dados 5 e 6 exemplificam o processo ocorrendo com
verbos e com palavra negativa. Resumidamente, os sons que sofrem alteração,
após a eliminação vocálica, são os seguintes:
[r]
[t] quando seguido por som surdo;
[d] quando seguido por som sonoro.
[g] [k] quando seguido por som surdo;
[g]quando seguido por som sonoro.
[w] [p] quando seguido por som surdo;
[b] quando seguido por som sonoro.
Portanto, o processo envolve várias classes de palavras. No entanto, a
classe de verbos comporta-se diferentemente das demais. Enquanto nomes,
adjetivos e outras classes sofrem apenas o processo de eliminação vocálica,
os verbos de forma longa, após a ressilabificação, perdem a consoante final da
palavra. Veja-se os exemplos abaixo:
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7. ʹhɛn
̃
ʹwa
asp
ʹrwə
1ps descer
“Eu desci”
8. ʹhɛn
̃
asp
ʹwa
i- rwək
ʹtɛ ̃
1ps 1ps descer
ir
“Eu estou descendo”
9. ʹhɛn
̃
asp
ʹwa
1ps
hwĩʹsɨ
fruta
ʹre
colher
“Eu colhi fruta”
10. i- rɛ
1ps erg
hwĩʹsɨ
ʹren
fruta
mã
colher
fut.
“Eu colherei fruta”
11.liʹana
n. próp.
ra
ʹtɛ ̃
ms
ir
“Liana foi”
Os dados 7 e 8 exemplificam, respectivamente, a ocorrência da forma
curta e longa do verbo “descer”, assim como o fazem os exemplos 9/10 e 6/11.
Note-se que a forma longa do verbo apenas sofre a eliminação vocálica (dados
8, 10 e 6), enquanto que a forma curta se submete, após a ressilabificação, à
eliminação da consoante final (dados 7, 9 e 11).
A observação dos dados acima pode sugerir uma distribuição
complementar entre verbos de forma curta que ocorreriam como último
elemento da oração e os de forma longa que ocorreriam em orações negativas,
no futuro e progressivas (Santos, 1999, p. 68). No entanto, as orações abaixo
demonstram que a tendência de as formas longas ocorrerem em ambiente
condicionado não se estende à totalidade dos dados de que disponho.
12. pɨʹrɛje
tͻ̃
ra
ʹhrͻ̃n
menina sing. ms
correr
ʹmbɛri
bem
“A menina correu bem”
13. ŋgajʹmͻ ra
n. própio ms
ʹhrͻ̃nͻ̃
correr
“Ngajmo correu”
14. liʹana
kaʹfɛ
n. própio café
“Liana fez café”
ɲrel
ĩʹhwere
fazer
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15. maʹku
kaʹren
exo
cigarro
ʹhwe
fazer
“Vamos fumar!”
16. i- ʹt- a
ʹkuru ʹsĩrɛ
1ps rel coisa comer pouco
“Eu como pouco”
17. miʹtʃi
-n
jacaré
top
ʹwa ku1ps
ku
obj. comer
“Foi jacaré que eu comi”
18. maʹku
exo
a- ku
mã
? comer fut.
“Vamos comer!”
Em 12, a forma longa do verbo está seguida por um advérbio, ou seja,
fora do ambiente característico para tais verbos. Em 13, o mesmo ocorre
porque o verbo de forma longa está em ambiente de verbo de forma curta. Os
dados 14 e 15 demonstram a ocorrência das formas verbais longa e curta no
mesmo ambiente; para atender a distribuição, em 14 o verbo deveria estar em
sua forma curta, como ocorre em 15. O dado 16 demonstra, novamente, um
verbo de forma longa fora de seu ambiente característico, uma vez que a
oração não é negativa, não está no futuro (orações não marcadas estão no
passado), e nem está na forma que indica o progressivo. Desse modo, esperarse-ia a forma curta do verbo (igual à encontrada no dado 17) no lugar da longa.
Em 18, temos um verbo de forma curta em oração marcada para o futuro,
numa clara violação da ocorrência de verbos de forma curta em tal ambiente. A
forma esperada em 18 seria aquela forma verbal exibida no dado 16.
A abordagem de Guedes para tratar a eliminação vocálica tem, ao que
me parece, dois problemas.
a) Na reduplicação, tomar a forma curta como básica/fonológica implica em
poder reconstituir, a partir dela, a forma final da palavra acrescentando a vogal
eco a partir dos traços da vogal da raiz. Entretanto, tal procedimento não é
possível em alguns casos porque a vogal a ser acrescentada não é a mesma
da raiz, como se pode constatar pelos exemplos abaixo:
19. ʹrͻwo
“onça”
20. ʹmbɛri
“bom/bem”
21. ʹsᴧgə
“pássaro”
22. ʹdʒuni
“beija-flor”
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23. ʹmdʒeni
“marido”
24. ʹmburu “pescoço”
Para cada um desses dados, há eliminação da vogal final da palavra,
confira:
19a. rͻpʹtʃi
20a. ʹmbɛtʃi
“onça;”
“muito bom/bem;”
21a. sᴧgʹndͻ
“ninho;”
22a. dʒunʹtʃi
“tipo de beija-flor;”
23a. i-
ʹmdʒeni
1p.p. marido
ra
ms
ʹmbɛtʃi
bonito
“Meu marido é bonito”
24a. ʹmbud
ra
ʹrɨtʃi
pescoço top comprido
“O pescoço é comprido”
Assim, temos em 19 uma vogal posterior semiaberta na primeira sílaba e uma
vogal posterior semifechada na segunda sílaba; em 20, vogal anterior
semiaberta e vogal anterior fechada; em 21, vogal central semiaberta e vogal
central semifechada; em 22, vogal posterior fechada e vogal anterior fechada;
em 23, vogal anterior semifechada e vogal anterior fechada e, finalmente, em
24, vogal posterior fechada e vogal posterior fechada. Desse modo, percebe-se
que os traços vocálicos das vogais ditas reduplicadas não são os mesmos da
vogal da sílaba acentuada (a variação das vogais pode ser apenas dos traços
semifechado/semiaberto até os traços anterior/posterior), o que torna a tarefa
de predizer a ocorrência da vogal eco bastante difícil. Ou seja, se tomarmos as
formas curtas das palavras (ʹrͻp, ʹmbɛt, ʹsᴧk e ʹdʒun), tratando-as
como básicas, não seria possível determinar qual a vogal a ser acrescentada
pelo processo de reduplicação.
b) Por outro lado, a dificuldade de previsão da vogal dita reduplicada dos
nomes não ocorre para a classe de verbos. Isto é, a vogal da sílaba átona final
da palavra tem, com raras exceções, os mesmos traços da vogal da sílaba
acentuada, o que pode ter sido o ponto de partida para que Guedes tratasse a
vogal final de palavras paroxítonas como reduplicação para ambas as classes.
Isso nos coloca um problema: devemos tratar a vogal final de verbos como
reduplicação e a de nomes por outro processo? Parece-me que não seria
adequado tratar a vogal final de verbos e nomes por processos diferentes
porque: b1) nomes e verbos têm em comum um processo morfofonológico que
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afeta a vogal final da palavra; b2) no entanto, verbos não estão submetidos
apenas ao processo que afeta a última vogal da palavra paroxítona, mas
também a um processo de eliminação consonântica; b3) assim, se insistir-se
em tratar a vogal final de verbos como reduplicação, seria necessário lançar
mão de outro processo que explicasse o acréscimo de uma consoante na
forma curta do verbo. Desse modo, teríamos:
25. ʹhwe (forma curta) — ʹhwere (forma longa) “fazer”
Ou seja, seria necessário explicar o acréscimo da vogal através de um
processo (a reduplicação) e o acréscimo da consoante (que com a vogal
acrescentada formará sílaba) através de outro processo, uma vez que não é
possível predizê-la.
Enfim, o tratamento da vogal de sílaba final tipo CV de palavras
paroxítonas como reduplicação levanta mais problemas do que os resolve.
Assim, considero que tal processo deve ser tratado como eliminação vocálica e
o processo que afeta a consoante final de verbos deve ser tratado como
eliminação consonântica. Há conseqüências desse tratamento: I) a forma
básica considerada será a longa; II) o processo de eliminação afetará a palavra
em estágios: no caso de verbos, a eliminação se estende por dois estágios, ou
seja, primeiro a eliminação vocálica e depois a eliminação consonântica; nas
demais palavras, a eliminação ocorre apenas no seu primeiro estágio, isto é,
somente a eliminação da vogal. O quadro abaixo resume a atuação do
processo:
Forma
Básica
Verbos
Outras Palavras
Estágio – 1
Ressilabificação
Eliminação Vocálica
X
X
Estágio – 2
Eliminação Consonântica
X
X
X
Portanto, teremos:
Forma
Básica
ʹtɛm
̃ ɛ̃
ʹrͻwͻ
Estágio – 1
Estágio – 2
Eliminação Vocálica
Eliminação Consonântica
ʹtɛm
̃
ʹrͻw
ʹtɛ ̃
O tratamento de tal fenômeno por meio de apenas um processo, a
eliminação de segmentos vocálicos/consonânticos, não é o único móvel que
me levou a utilizá-lo em detrimento do mesmo processo tratado como
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reduplicação. Há, pelo menos, um motivo mais que parece corroborar o acerto
desse tratamento.
O segundo estágio da eliminação, que atinge somente verbos, parece
ocorrer pela necessidade de acomodação fonológica. Confira-se os dados
abaixo:
26. i-
tɛm
̃
mã
1p.s. ir
fut.
“Eu irei.”
27. ʹŋum
na mɛʹŋgɛrɛ
int.
top.
festa
mã
ʹtɛ ̃ -n
posp.
mã
ir top.? fut.
“Quem irá à festa?”
28. ʹhwaj
jirau
tͻ
kuʹkwəj
-n
posp. top. macaco
ʹtɨk
ta
ʹnͻ̃
morto ms deitar
“É no jirau que o macaco morto está deitado”
29. kuʹkwəj
ra
macaco
ʹtɨ
ʹnͻ̃
-n
ms morto top. deitar
“O macaco morto está deitado”
Ou seja, em 26, podemos observar a forma longa do verbo, que predomina em
orações com marca de futuro. No entanto, em 27, numa oração marcada para
o futuro, ocorre a forma curta do verbo, porém, com o acréscimo de morfema
que marca tópico. Novamente, em 28, temos a raiz verbal de verbo de forma
longa submetida apenas ao primeiro estágio de eliminação ʹtɨk. Entretanto, em
29, o mesmo verbo é afetado pelo ciclo completo da eliminação para que possa
receber o morfema de tópico constituindo-se, desse modo, uma palavra
fonológica. Isto é, há uma proibição fonológica para seqüência de duas
consoantes em final de sílaba na língua suyá, conseqüentemente, há
eliminação da consoante final da forma longa do verbo para que se possa
acomodar o morfema {-n}. O significado gramatical deste morfema não está
claro para mim. Provavelmente, trata-se de um morfema cumulativo, uma vez
que, aparentemente, acumula as funções de marcação de tópico e de aspecto,
conforme sugerem os dados abaixo:
30. tuʹre
pai
ra
ms
ʹhuru
roça
mã
posp.
ʹtɛ ̃
ir
“O pai foi para a roça”
31. ʹhuru
roça
mã -n ʹture
posp top
pai
ra
ms
“Para a roça é que o pai foi”
ʹtɛ ̃
ir
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32. ʹludo
ra
n. próp. ms
ʹŋgo rͻ
rio
ʹre
posp cruzar
“O Ludo cruzou o rio (há muito tempo)”
33. ʹludo
ʹŋgo
-n
n. próp. top?/asp?
rio
rͻ
ʹre
posp cruzar
“O Ludo cruzou o rio (imediatamente após o momento da fala)”
34. ʹludo
ra
n. próp. ms
ʹŋgo rͻ
ʹre
-n
ʹtɛ ̃
rio posp cruzar asp? Ir
“O Ludo está cruzando o rio (no mesmo momento em que se está
falando)”
Em 30 e 31 o morfema {-n} está claramente relacionado à marcação de
um elemento da oração deslocado de sua posição canônica. Há, portanto,
razoável certeza de que marca a topicalização do elemento deslocado. Por
outro lado, nos dados 32, 33 e 34, o morfema {-n} parece estar ligado à
marcação de tempo/aspecto. Em 32, a oração está no passado, que se
caracteriza por ser, na língua, o elemento não marcado. Em 33 e 34, a mesma
manifestação fonológica do morfema parece marcar o fato com relação ao
momento do diálogo. Enfim, qualquer que seja o estatuto desse morfema, ao
que se quer chamar a atenção é que a forma curta do verbo pode ter, como
uma de suas características, a acomodação da palavra fonológica.
É interessante notar-se que o mesmo não ocorre para nomes, que não
perdem a consoante final para acomodação de morfemas em palavras
fonológicas. O dado abaixo exemplifica:
35. ʹrͻp
onça
na mbrɨjaritkaʹnde
top
caçador
ra
ms
ku- pĩ
obj. matar
“Foi a onça que o caçador matou”
A variante {na} é utilizada quando a palavra precedente termina por
consoante. Ora, seria possível esperar que, assim como os verbos, os nomes
perdessem a consoante final para receber a variante {-n}, que ocorre depois de
palavras terminadas por vogais. No entanto, isso não ocorre para os nomes,
apenas para os verbos.
Assim, considerando-se que a eliminação se dá em dois estágios que
atingem diferentemente nomes e verbos, acrescido do fato que o segundo
estágio de eliminação consonântica, que atinge verbos, estar ligado a um
processo de acomodação fonológica que não parece ocorrer para nomes, é
possível sugerir que o processo de eliminação seja utilizado como critério
auxiliar para distinguir nomes de verbos na língua suyá. Isto é, nomes são
afetados pelo primeiro estágio da eliminação; verbos são afetados pelo
primeiro e segundo estágios da eliminação.
Dados publicados originalmente em: SANTOS, L. C.. Verbos de Forma Larga y de Forma Corta en Suyá.
In: VI Simposio Internacional de Comunicación Social, 1999, Santiago de Cuba. Atas do VI Simposio
Internacional de Comunicación Social. Santiago de Cuba: Editorial Oriente, 1999. v. II. p. 512-518
Dados publicados originalmente em: SANTOS, L. C. Eliminação de segmentos fonológicos na língua
suyá. In: Ludoviko dos Santos; Ismael Pontes. (Org.). Línguas jê - estudos vários. Londrina: Editora da
Universidade Estadual de Londrina, 2002, v. 1, p. 131-146. Edição esgotada. Republicado em: SANTOS,
Ludoviko dos. Eliminação de Segmentos Fonológicos na Língua Suyá. Revista Eletrônica do Programa
de Pós-graduação em Letras da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Número 8 – março a junho
de 2009. Págs. 18-28.
Finalmente, a descrição acima aponta para a possibilidade de verbos de
forma longa comportarem-se como nomes, uma vez que nomes e verbos de
forma longa compartilham do mesmo processo morfofonológico.
Também do ponto de vista sintático há um comportamento semelhante
de verbos de forma longa e nomes. Para desenvolvermos tal interpretação é
necessário discorrer sobre as partículas e posposições do suyá. No entanto,
num artigo como este, seria impossível tratar de todos esses elementos. Assim,
restrinjo-me apenas à partícula mã que mais facilmente contribuirá para
esclarecermos o ponto de vista aqui abordado, embora sua distribuição seja
mais complexa do que outras partículas e posposições.
A partícula mã tem diferentes funções que lhe são atribuídas pela
posição sintática que ocupa. Segue a distribuição desse elemento.
I- Como posposição seguindo nomes:
6.
8.
karuʹpi ra ʹŋga mã ʹtɛ ̃
ʹnira –n i- mã ʹkrwa ʹŋͻ̃
7.
n. próp. ms c. h. posp ir
3ps top 1ps posp flecha dar
"Karupi foi para a casa dos
homens"
"Ele deu flecha para mim"
ʹpa -n ʹwa a- mã ʹtɛp ŋͻhoʹhogo
1ps top 1ps 2ps posp peixe
limpar
"Eu que limpei o peixe para você"
Os exemplos demonstram que, como posposição, a partícula manifesta
o direcional (dado 6), o dativo (dado 7) e o benefactivo (dado 8).
II- Imediatamente após o constituinte nominal sujeito para expressar o
aspecto habitual. Cabe esclarecer que quando o constituinte nominal sujeito
tem por núcleo um nominal, ele virá sempre marcado pela partícula ra “marca
de sujeito” independentemente de o constituinte ser sujeito de verbo transitivo
ou de verbo intransitivo, ou seja, as orações simples do suyá configuram um
sistema nominativo-acusativo2.
9.
ʹmbotʃi ʹkãm na mɛ
veado
ra mã po
rͻ
saʹrĩ
posp top pessoal ms hab veste posp pular/dançar
"Na festa do veado o pessoal dança com pô (tipo de vestimenta feita com
folhas de buriti)"
III) Como primeiro elemento da oração, associada à marca de tópico, a
partícula indica que o falante está junto ao fato ou à coisa referida.
2
O suyá é uma língua de nominativo marcado (que configura um sistema nominativo/acusativo) nas
orações simples quando o constituinte nominal tem como núcleo um nome. No caso de o núcleo ser um
pronome, o sistema é parcialmente ergativo/absolutivo e parcialmente nominativo/acusativo. Para maiores
detalhes consulte Santos (1997).
Dados publicados originalmente em: SANTOS, L. C.. Verbos de Forma Larga y de Forma Corta en Suyá.
In: VI Simposio Internacional de Comunicación Social, 1999, Santiago de Cuba. Atas do VI Simposio
Internacional de Comunicación Social. Santiago de Cuba: Editorial Oriente, 1999. v. II. p. 512-518
Dados publicados originalmente em: SANTOS, L. C. Eliminação de segmentos fonológicos na língua
suyá. In: Ludoviko dos Santos; Ismael Pontes. (Org.). Línguas jê - estudos vários. Londrina: Editora da
Universidade Estadual de Londrina, 2002, v. 1, p. 131-146. Edição esgotada. Republicado em: SANTOS,
Ludoviko dos. Eliminação de Segmentos Fonológicos na Língua Suyá. Revista Eletrônica do Programa
de Pós-graduação em Letras da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Número 8 – março a junho
de 2009. Págs. 18-28.
10.
ʹhɛn
̃ ʒaʹnu ra kuʹkwəj
pass n. próp. ms macaco
ʹpĩ
11. ʹmã -n ʒaʹnu ra kuʹkwəj ʹpĩ
matar
part. top n. próp. ms macaco matar
"O Janu matou macaco"
"O Janu matou macaco"
Em 10, independentemente de o falante ter testemunhado ou não o
fato, a oração deve ser utilizada quando se discorre sobre a situação depois de
ela ter acontecido (horas depois, no dia seguinte ou dias depois). A oração 11
somente pode ser utilizada se o falante estiver junto ao fato, presente como
testemunha.
IV) A partícula ocorre também como último elemento da oração para
manifestar o futuro próximo ou remoto.
12.
kujuʹsi ra
mã
faʹzẽda
mã -n ʹtɛm
̃ 13. i- ʹrɛ hwĩsoʹsok ʹpɨrɨ ʹked mã
1ps erg
n. próp ms fazenda
"Kujusi irá à fazenda (num futuro
remoto para tratar de problemas
de poluição do rio Sujá-Missu)
14.
ʹludo ra hwĩsoʹsok ʹpɨ
n. próp ms caderno
caderno
pegar neg
fut
"Eu não pegarei o caderno (Ele já
está na iminência de pegá-lo, sua
mão já se dirige ao caderno)"
posp top ir fut
15. i-
pegar
rɛ
1ps erg
"Ludo pegou o caderno"
hwĩsoʹsok ʹpɨrɨ
caderno
ʹkere
pegar neg
"Eu não peguei o caderno "
Os dados 12 e 13 demonstram que mã (fut) é usada, indiscriminadamente,
para referência a um futuro remoto ou próximo. Os dados 14 e 15 exemplificam
o uso da negação neutra3 que se liga à oração. Comparando-se os dados 13 e
15 percebe-se que a partícula de futuro ocorre após a negação neutra,
apontando, desse modo, para o fato de não estar ligada diretamente ao verbo
já que a seqüência – v. de forma longa + futuro – pode ser interrompida.
16.
pɨʹrɛje
tͻ̃
ra mɛʹmbɨje tͻ̃
menina sing ms homem
pot
sing chegar
sͻ̃ʹmũn ʹked mã
ver
neg
fut
“A menina não verá o homem que chegou”
Como pode ser observado pelo dado 16 a partícula de futuro atinge
apenas a oração principal e não a oração subordinada, assim como a negação
neutra atinge apenas a oração principal (a proposição) e não a subordinada (a
pressuposição). Caso seja necessário colocar ambas as orações no futuro,
uma outra partícula ocorre no início da oração e afeta, quanto ao tempo, tanto
a oração principal quanto a subordinada:
3
O termo negação neutra está sendo usado conforme Givón (1984).
Dados publicados originalmente em: SANTOS, L. C.. Verbos de Forma Larga y de Forma Corta en Suyá.
In: VI Simposio Internacional de Comunicación Social, 1999, Santiago de Cuba. Atas do VI Simposio
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de 2009. Págs. 18-28.
17.
ʹke mɛʹndije ʹtͻ̃ ra mɛʹmbɨje tͻ̃
fut
mulher
sing ms homem
ʹpot
sing chegar
ʹkãm sͻ̃ʹmũn
part
ver
“A mulher verá o homem que chegará”
Ou seja, assim como a partícula mã liga-se à oração e não ao verbo, a
partícula ke liga-se à oração complexa. Desse modo, as partículas de tempo
ocupam posições sintáticas contíguas à oração, seja ela simples ou complexa.
V) Por último, a partícula pode ocorrer imediatamente após verbos de
forma longa.
18.
kaoʹmi ra
aʹŋgro ʹpĩrĩ mã ʹtͻ
n. próp ms
porco matar
?
ʹta
part v. pos.
“Kaomi está matando o porco”
É justamente nesta posição sintática que o estatuto da partícula requer
maior reflexão. A definição de seu caráter deve ajudar-nos a esclarecer o papel
dos verbos de forma longa.
Vejamos, primeiramente, a posição sintática ocupada pela partícula que pode
estar ligada ao verbo de forma longa ʹpĩrĩ ou estar ligada à construção que
manifesta o progressivo ʹtͻ ʹta. Esta dúvida se esclarece quando
acrescentamos à oração a marca de tópico na (-n, quando segue vogal) que se
liga a constituintes, e não a palavras específicas, como demonstrado nos
exemplos que seguem.
19.
mbaʹt ra iʹta ʹpĩ
febre
20. mbaʹtᴧ -n iʹta
ms 3ps matar
febre
“A febre matou ele”
21.
tuʹre
pai
ra ʹhuru
ms
“Foi a febre que matou ele”
ʹmã ʹtɛ ̃
22. ʹhuru mã -n tuʹre ra ʹtɛ ̃
roça posp ir
roça
“O pai foi para a roça”
23.
pɨʹrɛje
ʹpĩ
top 3ps matar
posp top pai
ms
ir
“Foi para a roça que o pai foi”
ra hwĩsosokʹtᴧ kãm na ʹta
crianças ms
escola
posp top v. pos.
“Na escola é que as crianças estão”
Em 19 temos uma oração neutra, sem topicalização. Em 20 o
constituinte nominal sujeito está topicalizado pela partícula que, neste caso,
acumula a função de marcador de sujeito. A comparação de 21 e 22 demonstra
que o constituinte pode ser deslocado quando recebe a marca de tópico ou,
ainda, não ser deslocado como exemplificado no dado 23. Portanto, a marca
de tópico não se liga a uma palavra específica, mas ao constituinte que pode
ser deslocado de sua posição canônica ou não. Visto isso, compare o dado 18
com o que segue:
Dados publicados originalmente em: SANTOS, L. C.. Verbos de Forma Larga y de Forma Corta en Suyá.
In: VI Simposio Internacional de Comunicación Social, 1999, Santiago de Cuba. Atas do VI Simposio
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de 2009. Págs. 18-28.
24.
kaoʹmi ra aʹŋgro ʹpĩrĩ mã -n ʹtͻ ʹta
n. próp ms porco matar ? top part v. pos.
“Matando o porco é o que Kaomi está fazendo”
Ou seja, a partícula mã está ligada ao verbo de forma longa e não à
construção que manifesta o progressivo ʹtͻ ʹta.
Outra questão que se coloca é se a partícula nessa posição poderia
estar manifestando um futuro próximo/remoto, já que pelo contexto da oração
(cf. 24) o animal ainda não morreu. Para elucidarmos esse ponto, considere o
exemplo abaixo:
25.
mɛʹndije tͻ̃ ra sͻ̃ʹhwed mã ʹtɛm
mã
̃
mulher
sing ms trabalhar
?
ir
fut
“A mulher trabalhará (num futuro próximo)”
Ou seja, a marca de futuro (cf. item IV, dados 12 a 15) coocorre com a partícula
(dado 25). Além disso, compare ainda os dados 24 e 25 com o dado 12 onde a
partícula ocorre como posposição. Ou seja, após verbo de forma longa a
partícula não indica futuro, seja ele próximo ou remoto.
Isso posto, como devemos considerar a partícula que segue verbos de
forma longa? Parece-nos que uma interpretação possível seja, como já
dissemos, considerar que os verbos de forma longa são nomes e, portanto, a
partícula que os segue são posposições. Expomos abaixo os argumentos para
tal interpretação.
a)
Como já demonstrado, para cada função da partícula há
uma posição sintática diferente. Caso consideremos o verbo de forma longa
como verbo, a partícula estaria em uma posição sintática nova sem uma função
associada, uma vez que, nesta posição, não manifesta tempo/aspecto ou
qualquer outra função. No entanto, se considerarmos o verbo de forma longa
como nome a partícula estaria em uma de suas posições sintáticas
características, qual seja, posposição.
b)
Há uma classe de verbos transitivos no suyá cujos objetos
quando apagados ou deslocados fazem surgir uma marca: o prefixo –ku.
26.
ʹhɛn
̃ kaoʹmi ra ʹhrͻ̃ mã ʹmbrɨ ʹɲɨ ɲͻ̃
pass n. próp ms esp. posp bicho carne
dar
“Kaomi deu carne de bicho para a
esposa”
28.
ʹpa –n ʹwa miʹtʃi
ʹku
27. wəʹtən kaoʹmi ra ʹhrͻ̃ mã ku- ʹɲͻ̃
int.
n. próp. ms esposa posp obj dar
“O que Kaomi deu para a esposa”
29. miʹtʃi -n
ʹwa ku- ku
1ps top 1ps jacaré comer
jacaré top 1ps obj comer
“Eu que comi jacaré”
“Foi jacaré que eu comi”
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In: VI Simposio Internacional de Comunicación Social, 1999, Santiago de Cuba. Atas do VI Simposio
Internacional de Comunicación Social. Santiago de Cuba: Editorial Oriente, 1999. v. II. p. 512-518
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suyá. In: Ludoviko dos Santos; Ismael Pontes. (Org.). Línguas jê - estudos vários. Londrina: Editora da
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de 2009. Págs. 18-28.
Em 26 e 28 o objeto está contíguo ao verbo e, por isso, o prefixo não
ocorre. Em 27 a ausência do objeto provoca o surgimento do prefixo assim
como em 29 o deslocamento do objeto acarreta a presença do prefixo. Entre os
verbos que recebem o prefixo inclui-se o verbo pĩ “matar (forma curta do
verbo)”. Confira:
30.
ʹpa –n ʹwa miʹtʃi
ʹpĩ
31. miʹtʃi -n
ʹwa ku- ʹpĩ
1ps top 1ps jácaré matar
jacaré top 1ps pref matar
“Eu que matei jacaré”
“Foi jacaré que eu matei”
Ora, quando este mesmo verbo assume sua forma longa ocorre sem o prefixo.
32.
ʹhɛn
̃ ku- ʹpĩ
asp
33. ʹkere, ʹpĩrĩ
pref matar
neg
“Ele matou?”
matar
ʹkere
neg
“Não, não matou”
Em sua forma curta (cf. 32) o verbo não pode prescindir do prefixo
enquanto que no dado 33 (a forma longa do mesmo verbo) o prefixo não
ocorre. Ou seja, o verbo perde seu caráter de transitividade verbal e,
conseqüentemente, teríamos, nos dados 24 e 25, complementos nominais e
não objetos.
a)
A estrutura de complemento, verbo de forma longa mais
partícula que ocorre nos dados 18, 24 e 25 é semelhante a estruturas
francamente nominais como a do dado seguinte:
34.
aʹŋgro ʹpĩrĩ ra
ʹmbɛri
porco
bem/bom
matar ms
“A matança do porco foi boa”
35. mɛʹndije ŋgɛre ra ʹmbɛtʃi
mulheres
dança ms bonito
“A dança das mulheres é bonita”
d)
Verbos de forma longa partilham com nomes o mesmo tipo
de estrutura com modificadores.
36.
mɛʹndije ʹmbɛri ra
ʹtãmã
mulher
cair
bonito
ms
“A mulher bonita caiu”
38.
37. ʹhɛn
̃
pass
ʹwa ʹpĩrĩ
ʹmbɛri
1ps matar bem
“Eu matei bem”
ŋgᴧtɨʹrɛje tͻ̃ ra ndͻʹrɨn ʹtwə
39. ŋgᴧtɨʹrɛje tͻ̃
ra
ʹswərə
kuʹmɛni
menino sing ms rápido banhar
menino
ms
banhar
muito
“O menino banhou rápido”
“O menino banhou muito”
sing
Em 36 temos um constituinte nominal cujo núcleo está modificado pelo
adjetivo e o mesmo tipo de estrutura encontra-se no dado 37 com verbo de
forma longa fora de seu contexto característico de condicionamento. No
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de 2009. Págs. 18-28.
entanto, o dado 38 demonstra que o verbo de forma curta não partilha desse
mesmo tipo de estrutura já que o modificador ndͻʹrɨn “rápido” - ocorre anteposto
a ele. Por outro lado, no dado 39, a correspondente forma longa do verbo
banhar tem a estrutura - núcleo+modificador - igual à dos dados 36 e 37.
Percebe-se, assim, que a diferença entre verbos de forma longa e curta não é
meramente morfofonológica, mas também sintática.
d)
Outras estruturas semelhantes apontam também para a
possibilidade de as partículas que ocorrem após verbos de forma longa serem
posposições, como o caso da partícula ʹkãm. Compare o dado 23 com os que
seguem:
39.
kaomi ra ʹpĩrĩ
n. próp. ms matar
ʹkãm na ʹmbra
?
top
40. liʹana ra
v. pos.
“Kaomi está na época
resguardo da matança”
ʹkĩn
ʹkãm na ʹmbra
n. próp ms alegre posp top v. pos.
do
“A Liana é alegre”
O contexto do dado 39 precisa ser explicado: suponhamos (em uma
situação absolutamente hipotética) que meu informante, Kaomi, tenha matado
uma pessoa. Neste caso, haverá um tempo, após a morte, no qual ele estará
impedido de comer determinados alimentos ou fazer determinadas coisas, ou
seja, ele deve guardar uma época de resguardo. Atente-se para a semelhança
semântica de estar dentro de um espaço físico (cf. 23) e estar “dentro” de um
período psico-cultural de tempo. Parece-nos que a partícula ocorre como
posposição e, conseqüentemente, o verbo de forma longa seria nome. Ao dado
40 pode ser dado o mesmo tipo de interpretação semântica principalmente
quando se atenta para o significado semântico-cultural do verbo posicional
ʹmbra que denota o fato de uma pessoa estar em movimento “dentro” de algum
lugar ou região (caso a pessoa estivesse parada o verbo posicional seria ʹta),
ou seja, literalmente, o significado de 40 seria “A Liana permanece em
movimento na alegria” o que, pode-se dizer, é muito semelhante ao conteúdo
semântico do aspecto habitual que pode ser expresso, em português, por “A
Liana é alegre”. Portanto, em ambos os exemplos consideramos que a
partícula que ocorre após o verbo de forma longa é uma posposição.
Parece-nos que, pela exposição feita, é possível considerar, em
determinados contextos, o verbo de forma longa como nome. Assim, os
elementos marcados como ? devem, na verdade, ser marcados como
posposição. É evidente que isso não quer dizer que a língua suyá não tem
verbos. O que desejamos é salientar a possibilidade de análise aqui iniciada
que nos parece ter ficado, até esse momento, encoberta pela facilidade com
que se estabelece a distribuição de ocorrência das formas longas do verbo 4 (cf.
4
Também a língua Caiapó (da mesma família lingüística que o suyá) tem verbos de forma longa e curta.
No entanto, os estudos dessa língua, até o momento, apontam apenas a distribuição característica dos
verbos de forma longa.
Dados publicados originalmente em: SANTOS, L. C.. Verbos de Forma Larga y de Forma Corta en Suyá.
In: VI Simposio Internacional de Comunicación Social, 1999, Santiago de Cuba. Atas do VI Simposio
Internacional de Comunicación Social. Santiago de Cuba: Editorial Oriente, 1999. v. II. p. 512-518
Dados publicados originalmente em: SANTOS, L. C. Eliminação de segmentos fonológicos na língua
suyá. In: Ludoviko dos Santos; Ismael Pontes. (Org.). Línguas jê - estudos vários. Londrina: Editora da
Universidade Estadual de Londrina, 2002, v. 1, p. 131-146. Edição esgotada. Republicado em: SANTOS,
Ludoviko dos. Eliminação de Segmentos Fonológicos na Língua Suyá. Revista Eletrônica do Programa
de Pós-graduação em Letras da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Número 8 – março a junho
de 2009. Págs. 18-28.
dados 12 a 18).
ABREVIATURAS
? elemento a ser definido
1PS primeira pessoa do singular
2PS segunda pessoa do singular
3PS terceira pessoa do singular
ASP aspecto
ERG formativo que acompanha pronomes na função de sujeito de verbo
transitivo
EXO exortativo
FUT futuro
HAB aspecto habitual
INT palavra interrogativa
MS marcador de sujeito de verbos transitivos ou intransitivos
N. PRÓP nome próprio
NEG negação
OBJ objeto
PART partícula
PASS passado
POSP posposição
PREF prefixo
REL relacional
SING singular
TOP tópico
V. POS. verbo posicional
BIBLIOGRAFIA
GIVÓN, T. 1984. Syntax: a Functional-Typological Introduction. Vol. 1.
Amsterdan: John Benjamins Publishing Company.
GUEDES, Marymarcia. Suyá: a língua da gente. “Um estudo fonológico e
gramatical”. Tese de Doutoramento. UNICAMP. São Paulo, 1993.
JEFFERSON, K. 1989. Gramática Pedagógica Kayapó. Parte I e II. Brasília:
Summer Institue of Linguistics (Arquivo 186).
SANTOS, Ludoviko dos. 1979. Descrição de Aspectos Morfossintáticos da
Língua Suyá, Família Jê. Tese de Doutoramento. Universidade Federal de
Florianópolis-SC.
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SANTOS, Ludoviko dos. Aspectos do Sistema de Marcação de Caso da Língua
Suyá. Revista Signum/Programa de Pós-Graduação em Letras.
Universidade Estadual de Londrina, 1999.
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Suyá, Família Jê. Tese de Doutoramento. Universidade Federal de
Florianópolis-SC, 1979
SANTOS, Ludoviko dos. Verbos de Forma Larga y de Forma Corta en Suyá.
Atas do VI Simposio Internacional de Comunicación Social. Vol. II,
páginas 512 a 518. Santiago de Cuba, 1999.
SANTOS, Ludoviko dos. Eliminação de segmentos fonológicos na língua suyá.
In: Ludoviko dos Santos; Ismael Pontes. (Org.). Línguas jê - estudos
vários. Londrina: Editora da Universidade Estadual de Londrina, 2002, v.
1, p. 131-146.
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