Felizes os Misericordiosos! Nós e as Almas do Purgatório Padre José Roque ASM Cascais, 18 Outubro de 2016 1 Índice 1. Festa de Todos os Santos. Testamento do rei de França. Alexandre Magno. 2. Comemoração dos Fiéis Defuntos. Morte do Bem-aventurado Francisco Marto. Tenho pressa. S. Filipe Néri. 3. Origem da devoção às Almas do Purgatório S. Pedro Damião e a moeda. Beato Henrique de Suso. 4. Todos havemos de morrer. Serenidade na morte: Santo Hilarião. Morte da Bem-aventurada Jacinta Marto 5. A vida é breve Uma velha história S. Tomás Moro. História de um turista e de um sábio 6. S. Nuno de Santa Maria Santa Brígida e o soldado. O Imperador da Áustria 7. Os puros de coração verão a Deus Carta de S. Luís Gonzaga. Sem calmantes 8. O pecado do Rei David Purgatório na mensagem de Fátima. Santa Joana princesa. Beato Domingos Collins 9. Os três jovens na fornalha ardente. Martírio de S. Policarpo. Santa Clara 10. Felizes os misericordiosos! S. Domingos e a esmola. S. Luís Orione e as almas do Purgatório 11. S. Martinho. S. Martinho e a sua capa. Amor verdadeiro 12. Oração, jejum e esmola. Santa Teresa e o jovem fidalgo. Morte de Santa Teresa de Jesus 13. Reparte o teu pão com o faminto. Palavra de vida Santa Teresinha do Menino Jesus e a conversão de Pranzini. Santa Catarina de Sena Em vida, irmão, em vida... 14. Caminho da luz. Santa Margarida Maria Alacoque e o religioso beneditino. 2 Morte de S. João da Cruz 15. O Purgatório é doutrina de fé na Igreja Católica. Pai-Nosso e Frei Conrado. Pai da beata Arcangela 16. Socorramos os defuntos. Pai de S. Luís Beltrão Morte de Santa Mónica. S. Inácio de Antioquia 17. Cristo presente nos pobres e peregrinos. Santa Isabel da Hungria São João Crisóstomo 18. O dogma do Purgatório. Visão de Judas Macabeu. Judas Macabeu e o sacrifício pelos mortos 19. Podemos ajudar os irmãos que se purificam no Purgatório. Exigências do amor cristão. O Santo Cura d’Ars. 20. A nossa pátria está no Céu. O Papa S. João XXIII: vou para o Céu. A criança e o balão. 21. Nossa Senhora socorre seus filhos no Purgatório. A protecção da Santíssima Virgem. O escapulário do Carmo 22. O amor é mais forte do que a morte O que há do outro lado? Morte de S. Francisco de Assis. 23. A Virgem Maria aos pés da Cruz. S. João de Deus. S. João Bosco 24. Duração do Purgatório. Maria Simma. Anjo sedutor. 25. As almas do Purgatório não se podem aliviar a si mesmas. O paralítico da piscina de Jerusalém. S. Pio de Pietrelcina São Vicente Ferrer 26. A caridade não deve ter limites. Três amigos: dinheiro, familiares e obras de misericórdia. Casa na eternidade Santa Teresa de Calcutá. 27. Catarina Emmerich e as almas do Purgatório. Pintura imodesta História de um homem sem tempo para Deus. 28. Santa Teresinha e o Purgatório. Morte de Santa Teresinha: não morro, entro na Vida. Despedida emocionante 29. Santa Faustina Kowalska: Novena da Misericórdia. Santa Margarida Maria e uma religiosa no Purgatório. S. Pio de Pietrelcina e um noviço 3 30. A razão confirma a existência do Purgatório. O Purgatório em vida. O pai de Santa Catarina de Sena Protecção das almas 31. Concílio Vaticano II: Oração pelos defuntos. 32. Encomendação 33. Coroa pelas almas do Purgatório 34. Via-sacra pelas almas do Purgatório Introdução Felizes os misericordiosos porque alcançarão misericórdia!1 O Santo Padre, o Papa Francisco, convidou-nos a viver o Ano Jubilar da Misericórdia (8 Dezembro 2015 a 20 Novembro 2016, Domingo de Cristo Rei) à luz da palavra de Jesus, que nos pede: «Sede misericordiosos, como o vosso Pai é misericordioso.» (Luc 6, 36). “Jesus Cristo é o rosto da misericórdia do Pai. O mistério da fé cristã parece encontrar nestas palavras a sua síntese. Tal misericórdia tornou-se viva, visível e atingiu o seu clímax em Jesus de Nazaré. O Pai, « rico em misericórdia » (Ef 2, 4), depois de ter revelado o seu nome a Moisés como «Deus misericordioso e clemente, vagaroso na ira, cheio de bondade e fidelidade» (Ex 34, 6), não cessou de dar a conhecer, de vários modos e em muitos momentos da história, a sua natureza divina. Na «plenitude do tempo» (Gl 4, 4), quando tudo estava pronto segundo o seu plano de salvação, mandou o seu Filho, nascido da Virgem Maria, para nos revelar, de modo definitivo, o seu amor. Quem vê Jesus, vê o Pai (cf. Jo 14, 9). Com a sua palavra e os seus gestos, Jesus de Nazaré revela a misericórdia de Deus. (MV nº 1) Nas parábolas dedicadas à misericórdia, Jesus declara que a misericórdia não é apenas o agir do Pai, mas torna-se o critério para individuar quem são os seus verdadeiros filhos. Em suma, somos chamados a viver de misericórdia, porque, primeiro, foi usada misericórdia para connosco. O perdão das ofensas torna-se a expressão mais evidente do amor misericordioso. O perdão é o instrumento colocado nas nossas frágeis mãos para alcançar a serenidade do coração. Deixar de lado o ressentimento, a raiva, a violência e a vingança são condições necessárias para vivermos felizes. Acolhamos, pois, a exortação do Apóstolo: «Que o sol não se ponha sobre o vosso ressentimento.» (Ef 4, 26) Escutemos a palavra de Jesus que colocou a misericórdia como um ideal de vida e como critério de credibilidade para a nossa fé: «Felizes os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia.» (Mt 5, 7) Esta é a bemaventurança que deve inspirar-nos, neste Ano Santo. Na Sagrada Escritura, a misericórdia é a palavra-chave para indicar o agir de Deus para connosco. Ele não Se limita a afirmar o seu amor, mas torna-o visível e palpável. (MV nº 9) 1 Mat 5,7 . 4 A arquitrave que suporta a vida da Igreja é a misericórdia (nº10). «A Igreja vive uma vida autêntica quando professa e proclama a misericórdia, o mais admirável atributo do Criador e do Redentor, e quando aproxima os homens das fontes da misericórdia do Salvador, das quais ela é depositária e dispensadora.» (MV nº 11) Para sermos capazes de praticar a misericórdia, devemos primeiro pôr-nos à escuta da Palavra de Deus. Isso significa recuperar o valor do silêncio, para meditar a Palavra que nos é dirigida. Deste modo, é possível contemplar a misericórdia de Deus e assumi-la como próprio estilo de vida. (MV nº 13) Misericordiosos como o Pai é o lema do Ano Santo. Na misericórdia, temos a prova de como Deus ama. (MV nº 14) (Papa Francisco, Misericordiae Vultus, O rosto da misericórdia, bula de proclamação do Jubileu extraordinário da Misericórdia.) Diz o autor sagrado na Epístola aos Hebreus: Está estabelecido que todos morram. Após a morte segue-se o julgamento2. No momento da morte, ouviremos aquelas palavras do Evangelho: Dá-me contas da tua administração!3 Jesus Cristo afirmou que Ele mesmo será o Juiz: O Pai não julga ninguém. Concedeu ao Filho o poder de julgar. 4 Seremos julgados sobre a misericódia que praticámos ou deixámos de praticar. O Evangelho de S. Mateus (25, 31-46) fala-nos das obras de misericórdia como tema principal do nosso juízo, quando comparecermos “diante do tribunal de Jesus Cristo, a fim de que cada um receba conforme aquilo que fez de bem ou de mal, enquanto esteve no corpo.”(2 Cor 5,10) Eis a Palavra de Jesus sobre o Juízo final escrita por S. Mateus no capítulo 25 do seu Evangelho: 31* «Quando o Filho do Homem vier na sua glória, acompanhado por todos os seus anjos, há-de sentar-se no seu trono de glória. 32*Perante Ele, vão reunir-se todos os povos e Ele separará as pessoas umas das outras, como o pastor separa as ovelhas dos cabritos. 33À sua direita porá as ovelhas e à sua esquerda, os cabritos. 34 O Rei dirá, então, aos da sua direita: 'Vinde, benditos de meu Pai! Recebei em herança o Reino que vos está preparado desde a criação do mundo. 35Porque tive fome e destes-me de comer, tive sede e destes-me de beber, era peregrino e recolhestes-me, 36estava nu e destes-me que vestir, adoeci e visitastes-me, estive na prisão e fostes ter comigo.' 37Então, os justos vão responder-lhe: 'Senhor, quando foi que te vimos com fome e te demos de comer, ou com sede e te demos de beber? 38 Quando te vimos peregrino e te recolhemos, ou nu e te vestimos? 39E quando te vimos doente ou na prisão, e fomos visitar-te?' 40*E o Rei vai dizer-lhes, em resposta: 'Em verdade vos digo: Sempre que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim mesmo o fizestes.' 41Em seguida dirá aos da esquerda: 'Afastai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, que está preparado para o diabo e para os seus anjos! 42Porque tive fome e não me destes de comer, tive sede e não me destes de beber, 43era peregrino e não me recolhestes, estava nu e não me vestistes, doente e na prisão e não fostes visitar-me.' 44Por sua vez, eles perguntarão: 'Quando foi que te vimos com fome, ou com sede, ou peregrino, ou nu, ou doente, ou na prisão, e não te 2 Heb 9,27. Lc 16,22. 4 Jo 5,22. 3 5 socorremos?' 45Ele responderá, então: 'Em verdade vos digo: Sempre que deixastes de fazer isto a um destes pequeninos, foi a mim que o deixastes de fazer.' 46*Estes irão para o suplício eterno, e os justos, para a vida eterna.» (Mateus 25,31-46) Irmãos, falai e procedei como pessoas que vão ser julgadas segundo a lei da liberdade. Porque o juízo será sem misericórdia para quem não usou de misericórdia. Mas a misericórdia triunfa do juízo.5 S. João da Cruz afirma que «no entardecer da vida seremos julgados sobre o amor!» Garante-nos também “que Deus leva consigo, antes do tempo, as almas que Ele muito ama, por isso, é um grande negócio para a alma exercitarse, nesta vida, em actos de puro amor, para que purificando-se em breve tempo, não se detenha muito cá, nem lá, sem ver a Deus. Estes, que são poucos, porque já estão purificados pelo amor, não entram no Purgatório!” 6 Quem ama a Deus com todo o seu coração e ao próximo como a si mesmo, terá uma bem-aventurança eterna! O Purgatório será o grande aperfeiçoamento do edifício espiritual começado nesta vida. A crença no Purgatório harmoniza dois atributos de Deus: A justiça e a misericórdia. Onde, senão no Purgatório, se hão-de cumprir as palavras de Jesus, que nos pede: Reconcilia-te com o teu adversário enquanto caminhais juntos, para não acontecer que sejas entregue ao juiz, o juiz te entregue aos guardas e estes te mandem para a prisão. Eu te digo que dali não sairás sem pagares o último centavo.7 Deus é misericordioso, mas essa misericórdia não consiste em fechar os olhos, como se não visse as nossas faltas. O Salmista canta a bondade de Deus que “é bondoso e compassivo, paciente e cheio de misericórdia” (Salmo 85 (86), por isso, dá-nos a possibilidade de nos arrependermos: «Eu julgarei a cada um segundo a sua maneira de agir, casa de Israel. Convertei-vos e afastai-vos dos vossos pecados. Rejeitai todos os pecados que cometestes contra mim e criai um coração novo e um espírito novo. Porque havíeis de morrer, ó casa de Israel? Eu não desejo a morte de ninguém. Convertei-vos e vivereis.» (Ezequiel 18,30-32) Orações A Sagrada Escritura revela-nos que “é um santo e piedoso pensamento” rezar pelos irmãos que já partiram. Os santos afirmam que, rezando pelos fiéis defuntos, cumprimos todas as obras de misericórdia. Com a nossa oração humilde, confiante e perseverante, socorramos os fiéis defuntos. Deus, vinde em nosso auxílio. Senhor, socorrei-nos e salvai-nos. Glória ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo Como era no princípio, agora e sempre. Amen. Hino 5 Tgo 2,12-13. S. JOÃO DA CRUZ, Obras Completas, ed. Carmelo, Oeiras, p. 64;862;534. 7 Mt 5, 25-26. Luc 12, 58-59 6 6 Morada eterna do Altíssimo, Celeste Jerusalém Eu te saúdo, desde hoje, Sou peregrino do Bem. Deus dos vivos e dos mortos, Crer em Vós é ter a esperança De encontrar na luz de sempre A paz do Último Dia. Purificados no Sangue De Jesus Cristo, Teu Filho, Resplandeça para eles, De teu rosto o eterno brilho. Os nossos rogos aceite O teu coração paterno. No esplendor da luz perpétua, Dá-lhes o descanso eterno. Acolhe na tua casa Os que se foram de nós, Arrancados deste mundo, Respondendo à tua voz. Antífona: Eu sou a ressurreição e a vida. Quem acredita em Mim, tem a vida eterna! Salmo 129 Do profundo abismo chamo por Vós, Senhor; Senhor, escutai a minha voz. Estejam vossos ouvidos atentos à voz da minha súplica Se tiverdes em conta as nossas faltas, Senhor quem poderá salvar-se? Mas em Vós está o perdão para serdes temido com reverência. Eu confio no Senhor, a minha alma confia na sua palavra. A minha alma espera pelo Senhor, mais do que as sentinelas pela aurora. Mais do que as sentinelas pela aurora, Israel espera pelo Senhor, Porque no Senhor está a misericórdia e com Ele abundante Redenção. Ele há-de libertar Israel de todas as suas faltas. Glória ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo Como era no princípio, agora e sempre. Amen Antífona: Eu sou a ressurreição e a vida. Quem acredita em Mim, tem a vida (Indulgência parcial a quem piedosamente rezar o salmo 129. Manual das Indulgências) Oração dos fiéis Imploremos a misericórdia divina para todos os fiéis defuntos, rezando: Senhor da vida e da morte, salvai-nos! eterna! 1 1. Senhor, Vós que salvastes os três jovens do fogo ardente, libertai também as almas dos castigos que sofrem pelos seus pecados. 2. Deus dos vivos e dos mortos, ressuscitai os defuntos e dai-nos um lugar junto deles na Vossa glória. 3. Vós que permitis a destruição da nossa morada terrestre, concedei a eterna morada no reino dos Céus a todos os fiéis defuntos. 4. Concedei a Vossa Misericórdia aos nossos irmãos defuntos que na terra esperaram em Vós e dai-lhes o descanso eterno, na Pátria celeste. 5. Aos nossos familiares, amigos e benfeitores que já partiram deste mundo, por intercessão da Mãe de Misericórdia, recompensai-os com a felicidade eterna. Pai-nosso; Ave-maria. Oremos: Senhor nosso Deus, Pai de misericórdia e fonte de toda a salvação humana, por intercessão da Virgem Maria e de todos os Santos, dai aos nossos pais, irmãos, parentes, amigos, benfeitores e a todos os que já partiram deste mundo a alegria da bem-aventurança eterna. Por Nosso Senhor Jesus Cristo. Obras de misericórdia As obras de misericórdia, segundo Catecismo, são aquelas com que socorremos o nosso próximo nas suas necessidades corporais ou espirituais. As obras de misericórdia corporais são: 1ª Dar de comer a quem tem fome; 2ª Dar de beber a quem tem sede; 3ª Vestir os nus; 4ª Dar pousada aos peregrinos; 5ª Assistir aos enfermos; 6ª Visitar os presos; 7ª Enterrar os mortos. As obras de misericórdia espirituais são: 1ª Dar bom conselho; 2º Ensinar os ignorantes; 3ª Corrigir os que erram; 4ª Consolar os aflitos; 5ª Perdoar as injúrias; 6ª Sofrer com paciência as fraquezas do nosso próximo; 7ª Rogar a Deus por vivos e defuntos. “Neste Ano Jubilar, que a Igreja se faça eco da Palavra de Deus que ressoa, forte e convincente, como uma palavra e um gesto de perdão, apoio, ajuda, amor. Que ela nunca se canse de oferecer misericórdia e seja sempre paciente a confortar e perdoar. Que a Igreja se faça voz de cada homem e mulher e repita com confiança e 2 sem cessar: «Lembrai-Vos, Senhor, da vossa misericórdia e do vosso amor.» (Sl 25/24, 6). (cf Papa Francisco, o rosto da misericórdia, nº 25) 1. Festa de Todos os Santos «Eu vi a cidade santa, a nova Jerusalém, que descia do Céu, resplandecente da glória de Deus, como noiva adornada para o seu esposo» (Ap 21,2) A Igreja celebra a festa de Todos os Santos no primeiro dia de Novembro. Os Santos aceitaram o convite à santidade que Deus faz a toda a huimanidade: “Sede santos porque Eu sou santo.” S. Pedro repete este convite aos cristãos do seu tempo e a todos nós: “À semelhança do Deus santo que vos chamou, sede santos, vós também, em todas as vossas acções, com está escrito: sede santos, porque Eu sou Santo.” (Lev 19,21; Ped 1, 15-16) Os santos são nossos irmãos, porque, como eles também nós rezamos: “Pai-nosso que estais nos Céus.” Atingiram a perfeição, suportando as múltiplas tribulações, que todos temos de sofrer para entrarmos no Reino dos Céus.8 Alcançaram a plenitude da Bem-aventurança! Contemplam a Deus face a face, nesse reino eterno e glorioso, a pátria da felicidade eterna! Fizeram a vontade de Deusn na terra, agora “cantam eternamente as misericórdias do Senhor”, no Céu! Quem são os Santos? Donde vieram? Como alcançaram a vida eterna? É grande o número dos eleitos? S. Lucas narra no seu Evangelho, capítulo 13, 22-30, que Jesus percorria as cidades e aldeias, ensinando. Um dia, alguém perguntou: Senhor, são poucos os que se salvam? Jesus não respondeu directamente, mas convidou-nos a “entrar pela porta estreita”. Finalmente, para dilatar a nossa esperança, afirmou: “Virão muitos do Oriente e do Ocidente, do Norte e do Sul sentar-se à mesa do Reino de Deus com Abraão, Isaac e Jacob e todos os profetas.” E noutro contexto afirmou: É esta a vontade de Meu Pai: que eu não perca nenhum daqueles que me deu! Que todo aquele que vê o Filho e acredita n’Ele tenha a vida eterna!9 Também o Apóstolo S. Paulo nos ensina (1 Tim 2,4): Deus quer que todos os homens se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade. Há um só Mediador entre Deus e os homens: Jesus Cristo. Ele entregou-se à morte para nos resgatar a todos! Como são consoladoras estas frases da Sagrada Escritura! O Céu também é para nós! Somos cidadãos da Cidade Santa, a celeste Jerusalém, a nossa Pátria prometida: “A nossa pátria está nos céus, de onde certamente esperamos o Salvador, nosso Senhor Jesus Cristo. Ele há-de transformar o nosso corpo mortal, conformando-o ao seu corpo glorioso, com aquele poder que o torna capaz de sujeitar a si todas as coisas.” (Fil 3, 20-21) Deus prova assim o seu amor para connosco: Cristo morreu por nós quando éramos ainda pecadores! Quanto mais agora que fomos justificados pelo Seu Sangue, seremos salvos por Ele! (Rom 5,8-9) 8 9 Cf. Act 14, 22. Jo 6,39-40. 3 Os Santos foram pessoas como nós. Suportaram o peso da vida com as suas angústias, alegrias e tristezas, mas viveram a realidade da filiação divina: O próprio Espírito atesta que somos filhos adoptivos de Deus. Se somos filhos também somos herdeiros – herdeiros de Deus e co-herdeiros com Cristo. Se sofrermos com Ele também com Ele seremos glorificados! Se morremos com Cristo, acreditamos que também com Ele viveremos!10 Vede que admirável amor o Pai nos consagrou em nos chamarmos Filhos de Deus! E somo-lo de facto!11 Na ordem da natureza, os filhos parecem-se com os pais; o mesmo se pode afirmar na ordem da graça. Sendo assim, quem tem esta esperança purifica-se a si mesmo tal como Deus é puro!12 Numa visão misteriosa, S. João contemplou e descreveu no Apocalipse uma multidão imensa de bem-aventurados, tão grande, que ninguém podia contar! Era composta por pessoas provenientes de todos os povos da terra! Estavam vestidos de túnicas brancas. Tinham lavado as suas vestes no sangue purificador de Jesus Cristo, o Cordeiro imolado. Deixemo-nos inundar pela grande alegria que desperta em nós esta página da Bíblia: Ouvi o número dos que foram marcados: cento e quarenta e quatro mil, de todas as tribos dos filhos de Israel. Depois disto, vi uma multidão imensa, que ninguém podia contar, vinda de todas as nações, tribos, povos e línguas…(Ap 7, 4-9) Ficámos a saber quem são aqueles a quem a Igreja exalta, na Festa de Todos os Santos. Que grande consolação para nós, sabendo que o seu número é incontável! Nós também queremos fazer parte “da geração dos que procuram contemplar a face de Deus” (cf. Salmo 24,6). Mas qual o caminho a percorrer para alcançar a Santidade? Jesus, no Evangelho, ensina todos os discípulos de todos os tempos e lugares: se queremos alcançar a Felicidade celeste e pertencer a esse reino eterno e glorioso, sigamos o caminho das Bem-aventuranças! Ao ver a multidão, Jesus subiu a um monte. Depois de se ter sentado, os discípulos aproximaram-se dele. Então, tomou a palavra e começou a ensiná-los, dizendo: «Felizes os pobres em espírito, porque deles é o Reino do Céu. Felizes os que choram, porque serão consolados. Felizes os mansos, porque possuirão a terra. Felizes os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados. Felizes os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia. Felizes os puros de coração, porque verão a Deus. Felizes os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus. Felizes os que sofrem perseguição por causa da justiça, porque deles é o Reino do Céu. Felizes sereis, quando vos insultarem e perseguirem e, mentindo, disserem todo o género de calúnias contra vós, por minha causa. Exultai e alegrai-vos, porque grande será a vossa recompensa, no Céu.» (S. Mateus 5,1-12) Felizes os pobres que o são no seu íntimo, porque deles é o Reino dos Céus! Felizes os que confiam na misericórdia de Deus, nosso Pai! O início do Novo Testamento é alegre, prometendo-nos a felicidade do Reino dos Céus. Os que forem atraídos por estas palavras luminosas caminharão de virtude em virtude, “até ver a Deus, em Sião” (Sl 83,8), no seu Templo santo: «Aí se chega por uma escada de oito degraus” (Ezequiel 40, 37). 10 Rom 8,16-17; 6,8 1 Jo 3,1 12 1 Jo 3,3. 11 4 A primeira atitude dos que iniciam esta caminhada rumo à santidade é a pobreza de espírito pela qual confiamos totalmente em Deus, e não nos bens deste mundo. A misericórdia para com o próximo obtém-nos a misericórdia divina. Purificando continuamente o nosso coração, aprendemos a ser misericordiosos e seremos dignos de contemplar a glória de Deus. Exemplos 1. Testamento do rei de França “Em nome da Santíssima Trindade, Pai, Filho e Espírito Santo. Hoje, dia 25 de Dezembro de 1792, eu, Luís XVI, rei de França, preso há 4 meses com a minha família na Torre do Templo, em Paris, não tendo senão a Deus por testemunha dos meus pensamentos, declaro aqui, em sua presença, as minhas últimas vontades e os meus sentimentos. Entrego a minha alma a Deus, meu Criador. Peço-Lhe que a receba na Sua Misericórdia, por nosso Senhor Jesus Cristo, que Se ofereceu em sacrifício a Deus Pai por nós homens, mesmo indignos, dos quais eu sou o primeiro. Morro em união com a Santa Igreja Católica, Apostólica e Romana que, por sucessão não interrompida, recebeu os seus poderes de S. Pedro, ao qual Jesus Cristo os tinha confiado. Creio firmemente e confesso tudo quanto está contido no Credo e nos Mandamentos de Deus e da Igreja, nos sacramentos e mistérios, tais quais a Igreja Católica sempre ensinou. Peço a Deus que me perdoe todos os pecados. Não havendo um sacerdote para me confessar, peço a Deus que receba o meu arrependimento profundo. Peço a todos aqueles a quem ofendi por inadvertência (pois não me lembro de ter feito conscientemente qualquer ofensa a ninguém) ou a quem talvez tenha dado maus exemplos ou escândalos, que me perdoem o mal que crêem eu ter-lhes causado. Perdoo de todo o meu coração àqueles que se tornaram meus inimigos sem que eu lhes tenha dado qualquer motivo para isso. Peço a Deus que lhes perdoe, como também àqueles, que, por um falso zelo ou por um zelo mal entendido, me fizeram muito mal. Recomendo ao meu filho que tenha em vista a dívida sagrada que contraí com os filhos ou parentes daqueles que morreram por mim e também daqueles que caíram na desgraça pela fidelidade que me dedicaram. Termino, declarando diante de Deus que não me acho culpado de nenhum dos crimes que me são atribuídos.” 13 Este exemplo lembra-nos que devemos preparar-nos para a morte, confessando-nos bem, recebendo a Santa Unção dos Doentes e a Comunhão. Deste momento supremo depende a nossa felicidade eterna. 2. Os três últimos desejos do imperador Alexandre Magno (356-323 a.c.) A Bíblia diz que o imperador Alexandre, depois de muitas conquistas, caiu doente e compreendeu que ia morrer. Convocou os seus oficiais mais ilustres e repartiu entre eles o seu reino (cf 1 Macabeus 1-7). Diz a lenda que o imperador também manifestou os seus três últimos desejos: que seu caixão fosse transportado pelos médicos da época. Que fossem espalhados no caminho, até ao túmulo, os seus 13 Claude Mouton, Ils regarderont vers Celui qu’ils ont transpercé, 383 5 tesouros conquistados: prata, ouro, pedras preciosas. Que as mãos fossem deixadas fora do caixão, à vista de todos. Um dos seus generais, admirado com esses desejos insólitos, perguntou quais as razões. Alexandre explicou: quero que os mais iminentes médicos carreguem meu caixão, para mostrar que eles não têm poder de curar, perante a morte. Quero que o chão seja coberto pelos meus tesouros, para que as pessoas possam ver que os bens materiais aqui conquistados, aqui permanecem. Quero que minhas mãos balancem ao vento, para que as pessoas possam ver que viemos a este mundo de mãos vazias e de mãos vazias partimos. Poesia cantada por Frei Hermano da Camara: Mãos abertas, mãos de dar As minhas mãos são assim, Viste-as abertas chegar, E abertas hão-de ficar, Quando chegar o meu fim. Ao partir não levarei Nada mais do que ao chegar, Minhas mãos, quando tas dei, Vinham abertas e sei Que abertas hão-de ficar. Quando as junto p’ra rezar Quando as ergo para os céus, Minhas mãos são mãos de dar, Não sabem querer, nem esperar, Nem sequer dizer adeus. Ao partir não levarei Nada meu partindo em mim. De mãos abertas irei, Passado nunca o terei, As minhas mãos são assim. (Youtube, Mãos abertas, Frei Hermano da Camara) 3. Uma comparação Quando observamos um cruzeiro a afastar-se da costa estamos diante de um espetáculo de rara beleza. O barco vai ganhando o mar azul e parece-nos cada vez mais pequeno. Passado algum tempo, só podemos contemplar um ponto branco na linha remota e indecisa do horizonte, onde o mar e o céu se encontram. Quem observa o cruzeiro, que já mal se vê, poderá exclamar: “já se foi”. Na verdade, não desapareceu, apenas o perdemos de vista. O barco continua do mesmo tamanho e com a mesma capacidade que tinha quando estava próximo de nós. E talvez, no mesmo instante em que dizemos: “já se foi”, outras vozes, mais além, poderão afirmar: “já lá vem”! Também é assim com a morte. Quando a morte leva os nossos entes queridos, apenas os perdemos de vista. Acreditamos que persistem dentro do mistério divino. Então, no mesmo instante em que nós dizemos que os nossos irmãos “já partiram”, no 6 além, outros dirão que “já estão a chegar.” (Youtube: rabino Henry Sobel, parábola sobre a morte) Num dos prefácios da Missa de defuntos, a Igreja ensina-nos que a fé em Jesus “faz brilhar para nós a esperança na feliz ressurreição. A certeza da morte entristecenos, mas conforta-nos a promessa da imortalidade; para os que crêem no Senhor, a vida não acaba apenas se transforma e desfeita a morada deste exílio terrestre, adquirimos uma habitação eterna no Céu.” Jesus afirmou aos saduceus: “Deus não é um Deus de mortos, mas de vivos! Para Ele todos vivem!”(Luc 20, 38) Ben-Sirá 7, 36 : Em todas as tuas obras, lembra-te do teu fim e jamais pecarás. Oração: Senhor Jesus Cristo, Mediador entre Deus e os homens, Vós sois a alegria de todos os que em Vós se refugiam. Aos que morreram no Vosso amor, tornai-os participantes da vossa felicidade celeste com a Virgem Maria e todos os Santos. 2. Comemoração de Todos os Fiéis defuntos «Felizes os mortos que morrem no Senhor! Sim, diz o Espírito, que descansem das suas fadigas, porque as suas obras os acompanham.» (Apoc 14,13) 1. “Somos convidados a sair, com a nossa recordação, do mundo dos vivos e fazer uma viagem ao mundo dos mortos. Esta recordação é triste e grave, mas sempre instrutiva; faz-nos reflectir na brevidade e na caducidade da vida presente. Esta é uma grande lição, aumentando em nós, que acreditamos num destino imortal, a sabedoria para fazer um bom uso de todos os valores, especialmente o tempo, durante a nossa efémera e actual etapa terrena. Lembrar os fiéis defuntos é cumprir um dever de memória e de reconhecimento em favor de quem nos deixou todas as heranças, especialmente a vida, e muitas outras como, por exemplo, a amizade, a experiência, a cultura e talvez o sacrifício. Mas a memória dos defuntos não é só lembrança. É também a celebração da sua sobrevivência, da sua imortalidade. É um contacto vivo e comovedor com aqueles que nos precederam. Em Cristo podemos chegar aos nossos mortos, que estão vivos n’Ele. E um dia, se, neste mundo estivermos unidos a Cristo, o nosso ser ressurgirá recomposto, perfeito, feliz. Não é vão pensar desta maneira: é justo, é piedoso, é consolador. Do passado, o olhar dirige-se para o futuro, para a aurora do regresso de Cristo. Rezemos pelos mortos e por nós, os vivos.” (Papa Beato Paulo VI) 2. Na festa de Todos os Santos cantámos a glória e a felicidade dos nossos irmãos que já contemplam a face do Senhor. Atingiram a plenitude da santidade. De peregrinos neste “vale de lágrimas”, passaram ao convívio com os eleitos, na pátria celeste: «Ali com todos os coros dos Anjos, com a criação inteira, liberta do pecado e da morte, cantam: «Santo, Santo, Santo, Senhor Deus do universo!»14 14 Cf. Oração Eucarística IV. 7 Desde o início do século XI, com Santo Odilão (+1048), a Igreja consagra o dia dois de Novembro à Comemoração de Todos os Fiéis Defuntos. «É uma continuação lógica da festa de Todos os Santos. Se nos limitássemos a lembrar os nossos irmãos santos, a comunhão de todos os crentes em Cristo não seria perfeita. Quer os fiéis que vivem na glória, quer os que vivem na purificação, preparando-se para a visão de Deus, são todos membros de Cristo, pelo Baptismo. Continuam unidos a nós. Por isso, a Igreja peregrina na terra, ao celebrar a Igreja da glória, não podia esquecer a Igreja que se purifica no Purgatório.»15 O dia de Todos os Fiéis Defuntos convida-nos a uma mais íntima e profunda comunhão com aqueles que «partiram antes de nós marcados pelo sinal da fé e agora dormem o sono da paz.» É dia de oração, de sacrifício e de saudosa recordação. Por este motivo, o dia de Fiéis Defuntos suscitou, desde sempre, um profundo eco no Povo de Deus.16 “A fé dá-nos a possibilidade de uma comunicação com nossos queridos irmãos defuntos e dá-nos a esperança de que já possuem a verdadeira vida.” (GS18,2) Exemplo: 1. Morte do Bem-aventurado Francisco Marto «A minha alma tem sede de Vós, meu Deus; quando irei contemplar a Vossa Face, Senhor?» (Salmo 41,1-2) Esta sede de Deus sentida pelo salmista faz-nos lembrar o desejo ardente que os pastorinhos de Fátima tinham de ir para o Céu. No dia 13 de Junho de 1917, a Lúcia, a certa altura, falou assim a Nossa Senhora: - Queria pedir-lhe para nos levar para o Céu. Nossa Senhora respondeu: - A Jacinta e o Francisco levo-os em breve!17 O Francisco, no meio das suas dores, repetia que o seu maior desejo era ir, quanto antes, para junto de Nossa Senhora. Na véspera da sua morte, disse à Lúcia: - Vês, estou muito mal; falta-me pouco para me ir embora. - Quando chegares ao Céu não te esqueças de pedir muitas graças para os pecadores e para o Santo Padre. - Sim, pedirei, mas diz isso também à Jacinta, porque tenho medo de me esquecer quando vir Nosso Senhor. Antes de tudo, quero consolar a Deus. O Francisco fez a Primeira Comunhão no seu leito de morte, com um fervor angélico. Nessa manhã luminosa, depois de comungar, disse à irmãzinha: - Hoje sou mais feliz do que tu, pois tenho Jesus dentro do meu coração. Vou para o Céu. Quando lá chegar, pedirei muito a Nosso Senhor e a Nossa Senhora que te levem depressa para junto de mim. Não podendo já rezar, pedia aos outros que rezassem o Terço em voz alta por ele. Chegada a noite, Lúcia despediu-se dele já moribundo. - Adeus, Francisco. Se fores esta noite para o Céu, não te esqueças de mim, ouviste? - Está sossegada, não te esquecerei. - Então, adeus. Até ao Céu. - Até ao Céu… 15 Missal Dominical, 2 de Novembro, Introdução à Festa dos Fiéis Defuntos. B. CABALLERO, En las Fuentes de la Palabra, ed. Perpetuo Socorro, Madrid 1988, 418. 17 IRMÃ LÚCIA, Memórias da Irmã Lúcia, Fátima 1976, 16. 16 8 Algumas das suas últimas palavras foram dirigidas à sua madrinha, quando a viu assomar à porta; pediu que o abençoasse e lhe perdoasse os desgostos que lhe tinha causado. No dia 4 de Abril de 1919, à noite, Francisco disse à mãe: - Ó mãe, olhe que linda luz está ali ao pé da porta! O rosto iluminou-se-lhe com um sorriso angélico e sem agonia, sem contracções, sem gemidos, expirou suavemente. Ainda não tinha onze anos. Morrer assim é privilégio dos predilectos da Virgem Maria!18 2 Tenho pressa Frei Benvindo Destéfani, sacerdote brasileiro, da Ordem de S. Francisco, conta o seguinte: “Foi no primeiro de Novembro, festa de Todos os Santos. Encontrava-me na capela, nas margens do rio Maroim, no estado de Santa Catarina. O dia era de grande calor. O horizonte vinha-se cobrindo de nuvens escuras, ameaçando aguaceiros fortes. O vento soprava forte. A dado momento, veio a correr para mim um menino que me disse: - A tempestade aproxima-se. Moro a três quilómetros de distância. Tenho pressa de voltar para casa, antes de começar o temporal. Amanhã é dia de Finados e desejava comungar pelas almas do Purgatório. O senhor padre não poderá confessar-me? - Pois sim, meu filho! O rapaz confessou-se na capela e, em seguida, correu para casa, procurando escapar ao mau tempo. No dia seguinte, na comemoração dos Fiéis Defuntos, o esperto garoto encontrava-se na Missa. No fim, acompanhou a procissão ao cemitério e regressou satisfeito para sua casa. Passando à beira do rio, escorregou numa pedra e caiu para dentro da água, de onde foi retirado já morto. No dia 3 de Novembro, procedeu-se ao enterro. O cemitério estava ainda ornamentado com flores e coroas de flores do dia anterior... A terra acolheu os restos mortais do menino que teve pressa de se confessar pela última vez, em preparação para a morte repentina e inesperada.” A morte é certa, mas a hora é incerta. A morte pode chegar quando menos se espera. Jesus aconselha: Vigiai e estai preparados, porque na hora em que não pensais virá o Filho do Homem. (Mat 24,42.44) Se o dono da casa soubesse a que hora viria o ladrão, não deixaria roubar a sua casa. Estai vós também preparados, porque à hora em que menos pensais virá o Filho do Homem.” (Lucas 12, 39- 40) 3. S. Filipe Néri São Filipe Néri tinha um profundo amor amor à Santa Igreja, à Santa Missa e à Santíssima Virgem. Sofreu imenso, mas nunca perdeu o sorriso. Ficou conhecido como o santo da alegria. Podemos imaginar o contentamento com que exortava as pessoas, nas suas pregações: “Alegrai-vos, na medida em que participais nos sofrimentos de Cristo! Não pode acontecer coisa mais gloriosa a um cristão do que padecer por amor a Jesus Cristo.” São Filipe Néri, fragilizado pela idade, sofria uma grave doença. Nossa Senhora veio visitá-lo. Eis as palavras comovedoras dirigidas por S. Filipe à Mãe de Jesus e que foram escutadas pelo médico, que o assistia: “Ó dulcíssima e bendita Virgem! Não sou digno de vós! Não sou digno que venhais visitar-me!” 18 JOÃO DE MARCHI, Foi aos pastorinhos que a Virgem falou, 9ª. ed., ed. Missões Consolata, Fátima 1979, 76-79. Cf. EUGÉNIO FORNASARI, Grande Promessa, ed. Paulistas, 81. 9 O médico, ao ouvir a voz do santo, entrou no quarto e perguntou-lhe o que sentia. Este, voltando a si, falou deste modo: “Não vistes a Santíssima Virgem? Ela livrou-me das dores.” S. Filipe Néri teve conhecimento antecipado do dia da sua morte, que aconteceu no dia 26 de Maio de 1595, aos 80 anos. Quando comungou pela última vez Jesus, o Pão da vida eterna, pronunciou estas palavras, que resumem toda a sua existência: “Jesus, Vós sois a fonte de toda a minha alegria! (cf. Revista Arautos do Evangelho, Maio de 2010, n. 101, p. 34-37) S. Filipe Néri, teve uma devoção muito terna pelas almas do Purgatório; o seu mais doce encanto era rezar por aquelas pessoas cuja consciência tinha dirigido. Pensava que a sua caridade paternal devia acompanhá-las até à eternidade, porque a verdadeira caridade não morre, como diz S. Paulo (1 Cor 13,8). Afirmava que tinha recebido muitas graças por seu intermédio. Ele mesmo apareceu, depois da sua morte, cercado de glória, no meio de brilhante cortejo, a um santo religioso. Dominado pelo ar de bondade e familiaridade com que o Santo se lhe dirigia, o religioso sentiu-se impelido a perguntar quem eram aqueles bem-aventurados que o rodeavam. S. Filipe respondeu que eram as pessoas a quem tinha sido útil durante a vida e as que tinha libertado do Purgatório com as suas orações. Acrescentou que tinham vindo ao seu encontro, ao sair deste mundo, para o introduzirem na habitação da felicidade eterna. «Vivo sem viver em mim e tão alta vida espero, Que morro porque não morro! Vivo já fora de mim, Desde que morro de amor Porque vivo no Senhor Que me escolheu para Si; Quando o coração lhe dei Com terno amor lhe gravei: Que morro porque não morro. Ai que vida tão amarga Por não gozar o Senhor! Pois sendo doce o amor, Não o é a espera larga; Tirai-me, ó Deus este fardo Tão pesado e tão amargo, Que morro porque não morro. Vida, que posso eu dar A meu Deus, que vive em mim, Se não é perder-te, enfim, Para melhor O gozar? Morrendo O quero alcançar, Pois nele está meu viver, QUE MORRO POR NÃO MORRER!»19 19 TERESA DE JESUS, Poesias, in Obras completas, 3ª ed., ed. Carmelo, Oeiras, 1385. 10 Como ressuscitam os mortos? Com que espécie de corpo voltam eles? Insensato! O que tu semeias não volta à vida sem morrer e o que semeias não é o corpo que há-de vir. É um simples grão de trigo, por exemplo, ou de qualquer outra espécie. Deus dá-lhe um corpo conforme entende: a cada semente o corpo que lhe é próprio. Assim é também na ressurreição dos mortos: o que é semeado sujeito à corrupção, ressuscita incorruptível. O que é semeado como corpo natural, ressuscita glorioso, espiritual. (1 Cor 15, 35-44) “O ramo de videira, mergulhado na terra, frutifica no tempo devido; o grão de trigo, caindo na terra e dissolvendo-se, multiplica-se pelo Espírito de Deus que sustenta todas as coisas. Em seguida, pela arte da fabricação, é transformado para uso do homem. Recebendo a palavra de Deus, converte-se no Corpo de Cristo, na Eucaristia. Assim também os nossos corpos, nutridos pela Eucaristia, depositados na terra e nela desintegrados, ressuscitarão a seu tempo, quando Deus lhes conceder a ressurreição para a glória, revestindo de incorruptibilidade a carne corruptível!” 20 «Eu sou o pão vivo descido do Céu: se alguém comer deste pão viverá eternamente. E eu o ressuscitarei no último dia.» (Jo 6,51) Oração: Senhor Jesus, Vós sois a luz do mundo; tende piedade dos fiéis defuntos e dai-lhes o eterno repouso no esplendor da luz perpétua, no Céu. 3. Novembro é um mês dedicado aos Fiéis Defuntos. «Lembrai-vos de mim, vós que sois meus amigos.» (Job 29,21) Novembro é um mês dedicado pela piedade cristã à oração em favor dos Fiéis Defuntos. É um tempo de especial união com os nossos queridos irmãos que já deixaram este vale de lágrimas. Rezar pelos mortos é um costume cujas origens remontam ao Antigo Testamento. Porquê um mês inteiro de recordação e saudade? O Livro do Génesis conta-nos como o povo judeu chorou a morte de Jacob: «José lançou-se sobre o rosto de seu pai e chorou inclinado sobre ele, e o beijou. Os médicos embalsamaram-no. Os egípcios choraram por ele, durante setenta dias.»21 Nas terras de Moab, onde Moisés morreu, «os Israelitas choraram Moisés durante trinta dias e assim passaram os dias de pranto pelo luto de Moisés.»22 Também Aarão foi chorado durante um mês (Livro dos Números 20,29). Santo Odilão, abade de Cluny, (962-1049) fez com que nos mosteiros da sua ordem se celebrasse um dia pelas almas dos monges falecidos. Mais tarde, este 20 S. IRENEU, Contra as heresias, livro 5,2,2-3;in Liturgia das Horas,vol.2,667. Gen 50,1-3. 22 Dt 34,8. 21 11 costume estendeu-se a toda a Igreja e deste modo nasceu a celebração do dia dois de Novembro, como um dia de oração e sacrifício pelos irmãos defuntos23. Conta uma história antiga, que da Terra Santa, regressava a França uma embarcação com numerosos peregrinos. Houve uma enorme tempestade e a barca afundou-se. Muitos passageiros morreram afogados, outros salvaram-se em cima de tábuas e conseguiram aportar às muitas ilhas que constelam o Mar Mediterrâneo. Um dos náufragos, monge de Cluny, foi dar a uma ilha deserta. No meio dos rochedos medonhos, encontrou um eremita que vivia numa caverna, entregue à oração e à mais austera penitência. - Donde vens irmão? – Perguntou o eremita. - Venho de visitar os Lugares Santos, onde o Divino Salvador viveu e morreu por nosso amor. Volto para França, minha pátria. - França, França, terra de santos! - Suspirou o frade. Conheces o mosteiro de Cluny, onde tantos monges levam vida de piedade aos olhos de Deus? - Se conheço! Eu mesmo pertenço a esse mosteiro. - Graças sejam dadas ao Senhor que me deu ocasião de falar com um religioso de tal convento e de lhe abrir o meu coração. Irmão caríssimo, sabes o que me prende a esta ilha deserta e me leva a fazer tanta oração e penitência? Uma visão espantosa com que Deus repetidas vezes me favoreceu. Mostrou-me o Senhor o intenso sofrimento de milhares e milhares de almas. Percebi que estavam no Purgatório. Aquelas almas suplicavam que rezássemos e fizéssemos sacrifícios para lhes abrirmos as portas do Céu. Foi por isso que me desterrei para esta ilha. Sinto-me feliz porque tenho visto muitas almas que voam radiantes para o Céu. Muitas mereceram tão boa sorte, devido às orações e vida santa dos monges de Cluny. Por isso, peço-te que voltes para o teu mosteiro e contes aos teus colegas tudo quanto ouvistes. Que esses santos monges continuem a sufragar as almas do Purgatório. Tendo regressado a França, o peregrino contou todo este episódio ao abade do mosteiro, que nessa altura, era Santo Odilão. Este ficou tão impressionado com a narração, que pediu para que redobrassem as orações pelas benditas almas do Purgatório, em todos os mosteiros da sua ordem. Duma maneira especial, cada ano, depois de terem celebrado a festa de Todos os Santos, deviam dedicar o dia seguinte, dois de Novembro, à comemoração dos fiéis defuntos. Nesse dia, haviam de rezar, oferecer o santo sacrifício da Missa e dar esmolas em sufrágio das pobres almas do Purgatório. Este costume dos monges de Cluny estendeu-se depois a toda a Igreja.24 Nós te rogamos, Senhor, pelos irmãos que partiram e à procura do teu rosto à tua porta bateram! Recebe-os junto de Ti Por tua grande bondade Teu amor os transfigure Em divina claridade. 23 DAVID HUGH FARMER, Dictionnary of Saints, 3ª. ed., ed. Oxford Univeristy Press, Oxford 1992, 361362. 24 Cruzada Eucarística, (Nov 1963). 12 Os nossos rogos aceite O teu coração paterno. No esplendor da luz perpétua, Dá-lhes o descanso eterno. (Hino de Vésperas, Ofício de Defuntos, in Liturgia das Horas.) Os fiéis que visitarem o cemitério com devoção e nele orarem pelos defuntos, podem ganhar uma indulgência plenária em cada um dos oito primeiros dias de Novembro, aplicável às almas do Purgatório. Nos restantes dias do ano, a indulgência será parcial. No dia 2 de Novembro, pode ganhar-se uma indulgência plenária, somente aplicável às almas do purgatório, em todas as Igrejas e Oratórios públicos.25 Na visita piedosa ao cemitério, ou à Igreja, devemos cumprir as condições para ganhar esta indulgência: rezar pelo Santo Padre um Pai-nosso e recitar o Credo. Regra geral, para ganhar uma indulgência plenária são necessárias três condições: confissão sacramental (estado de graça), comunhão eucarística e oração pelas intenções do Santo Padre. Viver em estado de graça, implica não ter qualquer afecto ao pecado, nem mesmo ao pecado venial. Santa Teresinha do Menino Jesus respondeu a uma Irmã que lhe perguntou como ganhar uma indulgência plenária, que a melhor maneira consistia em praticar a caridade, porque a caridade cobre a multidão dos pecados. (1 Ped 4,8) (Doutrina de S. Teresinha do Menino Jesus sobre o Purgatório, p. 30) D. Bosco nunca deixava de assinalar uma festa em que se pudesse lucrar indulgência plenária aplicável às Almas do Purgatório. Animava os doentes e os aflitos a socorrerem essas pobres almas, oferecendo por elas as dores e tribulações. Quando alguém lhe pedia um conselho, de um modo geral, costumava dizer: «Faça uma comunhão, reze o Terço ou oiça uma Missa em sufrágio daquela alma do Purgatório a que só falte isso para voar para o Paraíso. Quereis evitar o Purgatório? Ganhai todas as indulgências que puderdes!»26 Exemplo: 1. S. Pedro Damião e a moeda S. Pedro Damião nasceu em Ravena no ano 1007. Numa época muito difícil, colaborou com os Papas na promoção da reforma da Igreja, ajudando-os com a sua actividade e os seus escritos. Foi nomeado bispo e cardeal; faleceu, em 1072. S. Pedro Damião ficou sem mãe quando era criança. Seu pai casou novamente. Sua madrasta tratava-o muito mal, apesar do carinho que ele lhe dedicava. Para se ver livre dele mandou-o embora para casa de um irmão mais velho. Entretanto, seu pai acabou por falecer e a situação tornou-se ainda mais difícil. Confiava na misericórdia divina, cujos desígnios são de paz e de bondade. Confiava na divina providência. A ajuda que não encontrava na terra, viria do Céu. De facto, certo dia, o infeliz rapaz encontrou no caminho uma moeda de elevado valor. Podia ficar satisfeito: agora já tinha dinheiro para melhorar a sua vida. 25 Manual das Indulgências concessão 13 e 67 26 GABRIEL BOSCO, À espera da felicidade, 18;6. 2ª ed. Cavaleiro da Imaculada, Porto. 13 Entretanto, procurou por toda a parte o dono daquela moeda. Como não apareceu, podia ficar com o seu pequeno tesouro. De repente, recordou-se de seus pais. Correu à Igreja, entregou a moeda a um sacerdote e disse-lhe: - Peço que, com este dinheiro, celebre as missas que puder pelos meus falecidos pais. Como Deus recompensou esta atitude tão generosa! Uma bondosa senhora tomou conta dele, pagou-lhe o sustento e os estudos. Terminada a sua formação, foi nomeado sacerdote, mais tarde foi bispo e hoje é S. Pedro Damião, Doutor da Igreja.27 2. O pacto de Henrique de Suso Quando o beato Henrique de Suso, da Ordem Dominicana, estudava em Colónia, fez um pacto com um colega: logo que um deles morresse, o outro diria na Segunda e na Sexta de cada semana uma missa pelo amigo defunto. Morreu primeiro o companheiro; o Beato Henrique de Suso começou a cumprir a promessa, observando-a fielmente, durante muito tempo, mas por fim, deixou de celebrar a Eucaristia pela intenção do seu amigo. Este apareceu-lhe e censurou-o por haver faltado à palavra. - Eu nunca te esqueci nas minhas orações, respondeu Frei Henrique. - Isso não basta. São as missas que me fazem falta. É o Sangue de Jesus que pode apagar as chamas que me devoram. O Beato Henrique recomeçou a celebrar por essa intenção. Ao fim de algum tempo o seu amigo voltou a parecer-lhe para manifestar a sua gratidão.28 Oremos: Sangue de Jesus Cristo, que libertais as almas do Purgatório, salvainos, e salvai todos os fiéis defuntos. Senhor Jesus Cristo, Bom Pastor, concedei o descanso eterno a todos os defuntos que esperaram em Vós. Irmãos não queremos que ignoreis o que se refere aos defuntos, para não ficardes tristes como os que não têm esperança. Se acreditamos que Jesus morreu e ressuscitou, assim também os que morrerem em Jesus, Deus levá-los-á em sua companhia. Consolai-vos uns aos outros com estas palavras! (1 Tes 13-14.18) 4. Todos havemos de morrer! «Os meus dias passaram mais velozes que uma lançadeira de tear e desvaneceram-se sem deixar esperança.» (Job 7,5) 1. Palavras do Concílio Vaticano II «O máximo enigma da vida humana é a morte. Não é só a dor e a progressiva dissolução do corpo que atormentam o homem, mas também, e ainda mais, o temor de que tudo acabe para sempre. Mas a intuição do próprio coração fá-lo acertar, quando o leva a recusar a ruína total e o desaparecimento definitivo da mesma pessoa! O germe de eternidade que nele existe insurge-se contra a morte! A fé cristã dá uma resposta à 27 OLIVEIROS DE JESUS REIS, A Esmola, ed. Cavaleiro da Imaculada, Porto, 42-45; CROISET, Ano Cristão, Vol 2, ed. Seminário do Porto, Porto, 22 de Fevereiro. 28 O’ SULLIVAN (E.D.M.), Como evitar o Purgatório, 10: «As almas do purgatório não sofrem enquanto por elas é oferecido o Santo Sacrifício» S. Jerónimo. 14 nossa ansiedade acerca do nosso destino futuro: Cristo Ressuscitado libertou o homem da morte com a Sua própria morte.»29 2. A morte é o problema mais atormentador e angustiante ao longo da história da humanidade. Quanto progresso na luta contra as doenças! Quantos trabalhos para prolongar a vida! Apesar disso, todos morremos. Conta-se a história de um imperador que mandou construir uma torre muito alta para recolher num vaso de ouro o orvalho matutino. Pensava que esse rocio matinal, tomado todos os dias, lhe prolongaria a vida. Também morreu. Há muitos séculos, reinaram os faraós, junto às margens do rio Nilo, no Egipto. Diante deles grandes multidões de homens se inclinavam até ao pó da terra. Multidões de escravos os serviam, satisfazendo todos os seus caprichos… Todos morreram.30 Está determinado que todos os homens morram e morram uma só vez.31 Há um quadro intitulado a marcha triunfal da morte. O autor pinta-nos a morte, tocando uma campainha com a mão descarnada, passando pelo meio das pessoas. Seguem-na uma imensa multidão composta por crianças, velhos, pobres, ricos…32 “Pinta-se a morte em figura de um esqueleto, com uma foice na mão. Sem olhos, como a dizer que não repara em classes, em idades, nem em riquezas. Sem ouvidos, porque não se deixa vencer pelos rogos de ninguém. Sem nariz, porque não se deixa subjugar pelos perfumes mundanos. A morte não tem entranhas, nem coração, mas tem pés para correr e mãos para nos apanhar.” (Frei Mateus Maria do Souto, "Verdades e Luz", Coimbra, 1946, pág. 229 ) 3. A Sagrada Escritura recorda-nos: É lei deste mundo que todos hão-de morrer!33 Aceitemos a morte não como uma verdade terrível da qual “vivente algum pode escapar”, mas habituemo-nos a pensar nela como um membro da nossa família. S. Francisco de Assis chamava-lhe a irmã morte. Jesus, o Filho de Deus, quis morrer por nós. «Deixou-nos o exemplo para que sigamos os seus passos.»34 Através da morte chegaremos à vida: «Se morrermos com Cristo também com Ele viveremos!»35 Oferecer a Deus a nossa morte com perfeita resignação, pode reparar plenamente os nossos pecados. A morte é a máxima penitência que podemos fazer pelos nossos pecados: aceitemos morrer no dia, na hora, no lugar e da maneira que Deus quiser. Podemos rezar: «Meu Deus, eu hei-de morrer, mas não sei como, nem onde, nem quando: aceito desde já, de boa vontade e recebo com alegria e resignação o género de morte que Vos aprouver mandar-me, com todas as suas dores e sofrimentos!» 36 Tantas vezes recitamos o Pai-nosso: Pai, seja feita a vossa vontade! Fazendo o que Deus quer, estamos seguros. Transformamos as mágoas desta terra, em imensos 29 GS 8. TIHAMER TÓTH, A Vida Eterna, ed. Apostolado da Imprensa, Porto 1957, 93. 31 Heb 9,29. 32 TIHAMER TÓTH, A Vida Eterna, o.c., 91. 33 Ecl 14,12. 34 1 Ped 2,21. 35 Rom 6,8 36 O’ SULLIVAN (E.D.M.), Como se pode evitar Purgatório ,12. 30 15 méritos para o Céu. Quanto às nossas dores, ofereçamos tudo pela conversão dos pecadores e pelas benditas almas do Purgatório. A Sagrada Escritura recorda-nos que na feliz eternidade, “não haverá lágrimas, nem dor, nem pranto, nem luto. O Senhor destruirá a morte para sempre!” (Cf Apoc 21,4; Isaías 25,8) Em troca duns dias, meses ou talvez alguns anos de sofrimento, neste mundo, o Senhor dar-nos-á uma felicidade eterna, no outro. Tenhamos coragem! O muito sofrimento faz-nos pessoas mal dispostas e irritáveis, por isso é legítimo procurar o nosso bem-estar, que pode favorecer a nossa união com Deus. Diz a Bíblia: Por meio da medicina, o médico aplaca a dor e o farmacêutico faz misturas agradáveis. Meu filho, se estiveres doente não te descuides de ti, mas ora ao Senhor, que te curará. Em seguida, chama o médico, pois ele foi criado por Deus; que ele não te deixe, pois te é necessária a sua assistência. Roga ao Senhor que te mande por meio dele o alívio e a saúde, a fim de prolongar a tua vida. (Ben-Sirá 38, 7.9.12-14) Pelo sofrimento impregnado de amor contribuiremos para salvar almas. O Papa S. João Paulo II afirmou: “O sofrimento é um ingrediente indispensável para a santidade. O amor dá sentido e torna aceitável o sofrimento. Com amor, o sofrimento adquire um valor inestimável.” (C.E.P., O Rosário com João Paulo II. Ed Santuário de Fátima 2003) Os Apóstolos fortaleciam os discípulos, encorajando-os a manterem-se firmes na fé, porque, diziam eles: «Temos de sofrer muitas tribulações para entrarmos no Reino de Deus.» (Actos 14,22) Depois dos trabalhos desta vida, Deus limpará dos nossos olhos todas as lágrimas; e não haverá mais morte, nem pranto, nem dor. (Apoc. 21,4) Exemplo: 1. Serenidade na morte Quando Santo Hilarião chegou ao fim da sua longa vida, austera e penitente, atormentava-o o medo da morte. Contudo, animava a sua alma com estas palavras: «Parte! Porque temes? Vai-te, ó minha alma! Serviste a Jesus Cristo quase setenta anos e ainda temes a morte?» 37 Que grande consolação para quem, ao terminar os seus dias, puder repetir palavras semelhantes às deste santo: “Eu decidi seguir Jesus!” Seguir Jesus é estar onde Ele está. Determinemo-nos, a seguir Jesus, recordando a Sua promessa: Se alguém me serve, sigame. E onde eu estiver, ali estará também o meu servo. Se alguém me servir, meu Pai o honrará! (S. João 12, 26) Louvado seja Deus pelos que passaram os tormentos do mundo dolorosos e contentes sorrindo perdoaram! Pela alegria dos que trabalharam, pela morte serena dos bondosos Louvado seja Deus na mãe querida A natureza, que fez bela e forte Louvado seja pela irmã vida 37 TIHAMER TÓTH, A Vida Eterna, o.c., 167. 16 Louvado seja pela irmã morte. 38 2. Morte da Bem-aventurada Jacinta Marto A Jacinta ficou profundamente impressionada com a morte de seu irmão Francisco. Sua prima Lúcia perguntou-lhe, certo dia: - Em que pensas, Jacinta? - Penso no Francisco… Quem me dera vê-lo! A Jacinta sofria imenso devido a uma ferida que se lhe abrira no lado esquerdo e que não a deixava dormir. Numa dessas noites de insónia, apareceu-lhe Nossa Senhora que lhe disse: - Irás para dois hospitais, mas não terás cura; é para sofreres mais por amor de Deus, pela conversão dos pecadores e em desagravo das ofensas cometidas contra o meu Imaculado Coração. Tua mãe levar-te-á lá e depois ficarás sozinha. Um dia, a Lúcia encontrou-a abraçada a uma estampa de Nossa Senhora, dizendo: - Ó minha Mãe do Céu, então hei-de morrer sozinha? - Que te importa morrer sozinha, se Nossa Senhora te vem buscar? - Animavaa a prima. - É verdade, não me importa nada. Mas não sei como é: às vezes não me lembro de que ela me vem buscar. - Coragem, então, Jacinta. Já te falta pouco para ires para o Céu… E que vais fazer no Céu? - Vou amar muito a Jesus, ao Imaculado Coração de Maria, pedir por ti e pelos pecadores, pelo Santo Padre, pelos meus pais e irmãos e por todas as pessoas que me têm pedido…. Gosto tanto de sofrer por amor de Nosso Senhor e de Nossa Senhora! No dia dois de Fevereiro, a Jacinta deu entrada no Hospital de Dona Estefânia, sendo operada no dia dez, desse mesmo mês. - Ai Nossa Senhora! Ai Nossa Senhora! Paciência, todos devemos sofrer para ir para o Céu – era este o seu único queixume. Quatro dias antes de morrer, as dores passaram-lhe completamente. - Agora já não me queixo. Nossa Senhora tornou-me a aparecer e disse-me que, em breve, me viria buscar e que me tirava as dores. Chegou-se, assim, ao dia vinte. Pelas oito horas da tarde, sentiu-se mal. Pediu para receber o seu Jesus. O pároco da freguesia, Monsenhor Manuel Pereira dos Reis veio ouvi-la de confissão, mas não lhe deu a Comunhão. Prometeu-lha, para o dia seguinte. A pequena insistia, dizendo que morreria em breve, mas não foi atendida. Às dez horas e meia da noite, suavemente, sem agonia, a alma da Jacinta deixava este pobre mundo e entrava triunfante no Céu. O seu corpinho amortalhado de branco, com uma faixa azul, ficou três dias na sacristia da igreja. Deitada no caixão, parecia viva, com os lábios e faces cor-de-rosa e exalando um perfume que era como o de um ramalhete de flores raras.39 O senhor António de Almeida, a 11 de Junho de 1934, fez esta declaração: “ O cheiro agradável que o corpo exalava, não se pode explicar naturalmente, diga-se o que se quiser. O maior incrédulo não podia duvidar. A pequena estava morta há três dias e meio e o seu odor era como o de um ramalhete composto das mais variadas 38 39 Liturgia das Horas, Hino de 5ª feira, Ofício de Leituras, Tempo Comum. JOÃO DE MARCHI, o.c., 80-84. 17 flores. Também o número dos que desejavam ver a criança era grandíssimo. Quando as pessoas chegavam diante do caixão era um entusiasmo, uma admiração, uma loucura. Eu não deixava cortar relíquias. Neste ponto fui irremovível.” (Documentação crítica de Fátima II, p187; Fátima 75 anos, p. 83) Levanta os olhos para lá das nuvens Da tristeza, da saudade e da solidão… Verás que aquele que amas continua teu, Porque está vivo, adormeceu. Rasga o nevoeiro denso da amargura Com os faróis da Fé e da Esperança. Verás que aquele que amas continua teu, Porque está vivo, adormeceu. E quando transpuseres a curva da morte Na caminhada veloz para os Céus, Reencontrarás aquele que partiu E amas eternamente vivo, na vida de Deus. ( Padre Mário Salgueirinho) Oremos: Senhor Jesus, concedei aos defuntos a visão do vosso rosto e fazeinos participar, um dia, da sua felicidade eterna. O Apóstolo S. Paulo desejava morrer para estar com Jesus: Para mim viver é Cristo e morrer é lucro! (Fil 1,21) Sentindo-se próximo do seu fim, escreveu: Combati o bom combate, terminei a minha carreira, guardei a fé. Só me resta receber a coroa da glória que Jesus, justo juiz, me dará naquele dia, e não só a mim, mas também àqueles que desejam a sua vinda. (2Tim 4,7) 5. A vida é breve! «Digo-vos, irmãos que o tempo é breve! O que importa é que os que choram vivam como se não chorassem; os que se alegram como se não se alegrassem; os que compram, como se não possuíssem. Os que servem o mundo, como se dele se não servissem, porque o cenário deste mundo é passageiro.» (1 Cor 7, 29-31) Meditando sobre a caducidade da vida o salmista escreveu: Dai-me a conhecer, Senhor, o meu fim e qual é o número dos meus dias, para que veja como é efémera a minha vida. De poucos palmos é a duração dos meus dias, diante de Vós a minha vida é como nada. Todo o homem não é mais que um sopro. O homem é como sombra que passa.40 Os dias da nossa vida são como um suspiro; os dias da nossa vida andam pelos setenta anos; se robustos, por uns oitenta. A maior parte são trabalho e desilusão, passam depressa e nós partimos.41 40 41 Cf. Sal 38,4-6 Sal 89, 9-10. 18 A nossa vida sobre a terra é semelhante à de um soldado.42Tantos sonhos, projectos, trabalhos: pois bem, com a morte tudo acaba. Com a morte acaba a agitação dos maus; na morte repousam os homens extenuados; com a morte os prisioneiros são deixados em paz, já não ouvem a voz do carcereiro. Diante da morte são todos iguais pequenos e grandes e o escravo está livre do seu senhor.43 Esta passagem do Livro de Job, faz-me recordar a literatura mundial onde encontramos textos como o que se segue: “A morte liberta o escravo, A morte submete o rei e o Papa E paga a cada um o seu salário, E devolve ao pobre o que ele perdeu E toma ao rico o que ele amealhou.” (Hélinand de Froidmont,‘Os Versos da Morte’. Internet) Imaginemos que alguém vinha ter connosco e nos dizia: Dispõe da tua vida porque vais morrer. Não viverás mais. Estas palavras saíram como um relâmpago da boca do profeta Isaías e fez estremecer a alma do piedoso Ezequias, rei de Israel, que imediatamente começou a rezar: Ah! Senhor, lembrai-Vos de que vivi no vosso serviço com lealdade e rectidão de coração, fazendo o que vos agrada.44 Deus concedeu-lhe mais quinze anos de vida, diz o texto bíblico! Nós, com os anos que a bondade divina nos prolonga no tempo presente, queremos alcançar uma vida eterna! O rei de Israel aproveitou bem o benefício de uma vida acrescida, para se preparar para comparecer diante de Deus. Como nos preparamos para deixar este mundo? A vida sobre a terra é um exílio longe do Senhor!45 A vida neste vale de lágrimas é uma dura prova, mas é passageira; sabemos que todo o tempo que vivemos neste corpo é semelhante a um exílio, mas faz-nos pensar na pátria. O poeta João de Deus percebeu como é passageira a nossa existência. Deixou-nos este poema: A vida é o dia de hoje, A vida é ai que mal soa, A vida é sombra que foge, A vida é nuvem que voa; A vida é sonho tão leve Que se desfaz como a neve E como o fumo se esvai: A vida dura um momento, Mais leve que o pensamento, A vida leva-a o vento, A vida é folha que cai! A vida é flor na corrente, A vida é sopro suave, A vida é estrela cadente, Voa mais leve que a ave: 42 Cf. Job 7,1. Job 3,17-19. 44 2 Reis 20, 1-3. 45 2 Cor 5,6; 1Ped 1,17. 43 19 Nuvem que o vento nos ares, Onda que o vento nos mares, Uma após outra lançou, A vida - pena caída Da asa da ave ferida De vale em vale impelida A vida o vento levou!46 Ontem, hoje, amanhã (E. Bersot, texto tirado da Interet) “Ontem chegámos, hoje vivemos, amanhã partiremos. Quão breve é a vida! Desta vida, quão pouco levamos: apenas as sementes que plantámos: as sementes da bondade, as sementes da generosidade, que nos fez partilhar bens e dons. As sementes da integridade, que cultivámos cada vez que mantivemos acesa a chama da rectidão no nosso coração. As sementes do carinho, as sementes do amor. As sementes da unidade, que plantámos sempre que tratámos bem os nossos semelhantes, como sendo nossos irmãos, independentemente da raça, situação social, credo ou nacionalidade. O respeito pela natureza, o amor pela vida. As sementes da paz. Ontem chegámos, hoje sonhamos, amanhã, onde estaremos? Quão breve é a vida! Saibamos usar os nossos dias para plantar as melhores sementes, para trilhar o melhor caminho. Que nos aguarda na última curva da vida? A resposta está nas sementes que hoje plantamos. A vida não passa de um instante, mas basta este instante para empreendermos as coisas eternas.” A minha vida é um só instante, uma hora passageira. A minha vida é um só dia que me escapa e foge. Tu sabes, ó meu Deus! Para amar-Te, na terra Só tenho o dia de hoje! ( Poesia 5 “O meu canto de hoje. S. Teresa do Menino Jesus, O.C. 674) Exemplos: 1. Uma velha história de Gibran Khalil Gibran (1883-1931) Um homem atravessava, uma tarde, a praça do mercado, quando alguém lhe puxou pela manga: - Eu sou a morte, disse a figura. Vim para te avisar que temos encontro marcado às seis da manhã. O homem ficou muito assustado, mas pensou que poderia fazer bom uso da informação adiantada. Vendeu rapidamente o que tinha, comprou os três melhores e mais rápidos cavalos que havia na cidade e lançou-se através do deserto em direcção a uma cidade distante, na esperança de que a morte não o conseguiria encontrar. Cavalgou toda a noite, como o vento, esgotando cavalo após cavalo, até que, aproximando-se as seis horas da manhã, chegou a um pequeno oásis onde parou para beber água, antes de continuar a viagem. Quando se encaminhava para o poço, a tal figura ali estava, olhou para o relógio, levantou-se e disse: - Curioso! Eu ia jurar que o senhor não conseguiria chegar a horas! 46 JOÃO DE DEUS, Campo de Flores. 20 Não vale a pena fugir da morte; também não vale a pena procurá-la. A morte tem a sua hora e é pontual. 2. S. Tomás Moro (1478-1535) Tomás Moro, o grande chanceler inglês, não quis consentir na dissolução do casamento de Henrique VIII. Por este motivo foi privado da sua alta dignidade e encarcerado numa cela escura da Torre de Londres. Nem promessas, nem ameaças o puderam fazer titubear. Finalmente, foi visitá-lo, desfeita em lágrimas a esposa, acompanhada da filha. Lançou-se-lhe aos pés e suplicou: - Considera quanto tempo poderíamos viver felizes! - Quanto tempo poderíamos ainda viver juntos? - Pelo menos vinte anos. - Vinte anos? E por vinte anos neste mundo, hei-de sacrificar uma vida eterna? Depois de dezasseis meses de prisão, ofereceu valorosamente a sua vida, no dia 6 de Julho de 1535. Antes de subir ao cadafalso, aproximou-se dele o filho, banhado em lágrimas, pedindo que o abençoasse. A atmosfera era densa, dificilmente suportável. Tomás Moro, cheio de bom humor, disse ao oficial que presidia à execução: - Senhor Tenente, ajude-me a subir, pois para descer cá me hei-de desenvencilhar. Depois, o condenado ajoelhou-se, rezou uma breve oração e dirigiu-se serenamente ao carrasco, mas sempre cheio de bom humor: - Coragem, bom homem! Não tenhas medo de cumprir o teu dever. Como tenho o pescoço curto, toma atenção para não errares o golpe e perderes, assim, a tua boa reputação.47 3. História de um turista e de um sábio Conta-se que um turista foi à cidade do Cairo, no Egito, com o objetivo de visitar um famoso sábio. O turista ficou surpreendido ao ver que o sábio morava num quartinho muito simples. As únicas peças de mobília eram: uma cama, uma mesa e um banco. - Onde estão os seus móveis? - Perguntou o turista. E o sábio, bem depressa, perguntou também: - E onde estão os seus ? - Os meus!? Mas eu estou aqui só de passagem! - Eu também! - respondeu o sábio. (Internet: autor desconhecido) O autor da Carta aos Hebreus diz que os antigos patriarcas Abraão, Isaac e Jacob, se consideravam hóspedes e peregrinos na terra de Canaã: Pela fé, Abraão morou como estrangeiro na terra prometida, habitando em tendas. Esperava a cidade assente em sólidos fundamentos, cujo arquitecto e construtor é Deus. Todos eles morreram na fé, sem terem obtido a realização das promessas. Mas vendo-as e saudando-as de longe, confessaram que eram estrangeiros e peregrinos sobre a terra. Aspiravam por uma pátria melhor, que era a pátria celeste. (cf Hebr 11,1-19) 47 TIHAMER TÓTH, Vida Eterna, o.c., 72. TADEUSZ DAJCZER, Meditações sobre a Fé, 111-112. 21 Tal como os patriarcas, nós também não temos aqui morada permanente! A vida na terra é somente uma passagem. Porque não desejamos ardentemente a pátria definitiva? Porque estamos tão presos à terra, se a nossa pátria está no Céu? Quem é da terra, da terra fala e à terra pertence! (Jo 3,31) Oremos: Senhor nosso Deus, concedei aos defuntos a glória da ressurreição e fazei que também nós, um dia, possamos participar da felicidade eterna. Troquemos o instante pelo eterno, Sigamos o caminho de Jesus. A Primavera vem depois do Inverno, A alegria virá depois da Cruz! Passa o tempo e com ele as nossas vidas; Tal como passa o bem, passa a desgraça. Passam todas as coisas conhecidas, Só o Nome de Deus é que não passa. Farei da fé viva cada dia A luz interior que me conduz À luz de Deus, da paz e da alegria, À luz da glória eterna, á Luz da Luz. (Liturgia das Horas, Hino II de 4ª Feira, Hora Intermédia, Tempo Comum.) 6. S. Nuno de Santa Maria «Não nos cansemos de fazer o bem; porque, a seu tempo colheremos, se não tivermos esmorecido. Portanto, enquanto temos tempo, pratiquemos o bem para com todos, mas principalmente para com os irmãos na fé!» (Gal. 6,9-10) S. Nuno nasceu a 24 de Junho de 1360 e morreu a 1 de Abril de 1431, Domingo da Ressurreição, nesse ano. Foi canonizado no dia 26 de Abril 2009. Aos 13 anos, fazia parte do séquito do rei D. Fernando e por, essa altura, foi armado Cavaleiro. Em Santarém, o Mestre de Avis, escolheu-o para ser o Regedor e Defensor do Reino de Portugal. Como Condestável do reino, foi militar invencível. Em 1422, vencendo-se a si mesmo, deixou a glória vã deste mundo. Depois de partilhar os seus bens, professou na Ordem Carmelita. Em 15 de Agosto de 1423, dia de Nossa Senhora da Assunção, abandona tudo para se tornar apenas, o humilde e feliz, Frei Nuno de Santa Maria. Ei-lo, agora, despojado de todas as ambições e frivolidades terrenas, mas entregue por completo ao único objectivo de adorar e servir a Deus; depois de se ter mostrado invencível nas guerras políticas do mundo, tornouse o herói da grande batalha espiritual, que é preciso ganhar, para obter a santidade. Sentia uma grande satisfação em pedir esmolas, em socorrer os pobres, em exercer os cargos mais humildes, dentro da Comunidade. A sua grande compaixão e liberalidade para com os necessitados aparecem bem marcadas no livro das Crónicas dos Carmelitas: “Depois de religioso, foi o servo de Deus mais admirável nos exercícios da caridade. Não se contentava com distribuir as esmolas pelo seu pagador, como fazia na vida secular, mas pelas suas próprias mãos, na portaria do convento, 22 remediava a cada um a sua necessidade. Não menos caritativo era para com o seu próximo nas ocasiões que se lhe ofereciam de lhes acudir nas enfermidades. Assistia aos pobres nas doenças, não só com os alimentos, mas com regalos administrados com suas próprias mãos.” O seu belo exemplo de vida cristã identifica-se com os homens ilustres da Sagrada Escritura: Celebremos os louvores dos homens ilustres, dos nossos antepassados através das gerações! Eram poderosos nos seus reinos, homens de fama pelos seus feitos gloriosos! Eram guias do povo pelos seus conselhos! Homens ricos e poderosos, viviam em paz em suas casas. Todos eles alcançaram fama entre os seus contemporâneos! Foram homens virtuosos e suas obras não foram esquecidas! A sua descendência permanece para sempre e jamais se apagará a sua memória. Os seus corpos repousam em paz e o seu nome vive através das gerações!48 “Uma vida tão santa e benemérita devia ter como coroa um remate correspondente: a sua morte foi a continuação do hino de amor a Deus e à Santíssima Virgem. Vividos cerca de dez anos de vida conventual, sentindo a proximidade da morte, preparou-se com mais frequentes actos de virtude, para a derradeira hora. Chegado o dia do falecimento, depois de feita a profissão de fé, comungou com grande devoção; a seguir, recebeu o Sacramento da Santa Unção dos doentes. Assim, confortado e fortalecido, tendo na mão esquerda uma vela e na direita o Crucifixo, que devotamente fixava e beijava, entrando na sua última agonia, rogou que, para sua consolação, lhe lessem a Paixão de Jesus Cristo, escrita por S. João. Logo que chegou àquela passagem do Evangelho onde Jesus, falando com sua Mãe Santíssima a respeito do discípulo amado, lhe diz: Mulher, eis aí o teu filho. Filho, eis aí a tua Mãe49, deu ele o último suspiro e entregou a sua alma nas mãos do Criador.”50 É preciosa aos olhos do Senhor a morte dos seus fiéis!51 Repartiu com largueza pelos pobres: a sua generosidade permanece para sempre!52 “S. Nuno de Santa Maria combateu o bom combate e tornou-se exímio vencedor de si mesmo! (Oração da Missa) S. Nuno, rogai por nós. Exemplos: O soldado A grande mística Santa Brígida da Suécia (1302-1373) foi proclamada Padroeira da Europa pelo Papa S. João Paulo II. No seu livro “ Revelações” (livro VI), conta o caso seguinte, que nos faz pensar no ensino de S. Paulo: Nenhum de nós vive para si mesmo e nenhum de nós morre para si mesmo. Se vivemos, vivemos para o Senhor, e se morremos, morremos para o Senhor. Portanto, quer vivamos, quer morramos, pertencemos ao Senhor. Na verdade, Cristo morreu e ressuscitou para ser o Senhor dos mortos e dos vivos. Todos havemos de comparecer diante do tribunal de Deus. Cada um de nós dará contas de si mesmo a Deus. (cf. Romanos 14,7-12) Um dia, apareceu um demónio diante do tribunal de Deus e trazia com ele a alma de um defunto. Disse o demónio: 48 Sir 44,1-3.4.6-7.10.13-14 Jo 19, 25-27. 50 Cf. Liturgia das Horas, vol. 4, 1422. P. SANTOS ABRANCHES, Novena ao Beato Nuno, 25. 51 Sal 115,15. 52 Sal 111,9. 49 23 - Esta alma caiu-me nas mãos, mas não estou certo de que me pertença. O Senhor respondeu: - Os seus pecados são mais numerosos do que as boas obras! O demónio enumerou cada um dos pecados cometidos. Quando terminou, eis que avança Maria Santíssima e perguntou ao demónio: - Conheces todos os pensamentos dos homens? - Conheço somente aqueles que se manifestam por obras exteriores. - Que coisa te parece que possa apagar os pecados que enumeraste? - Uma só, a caridade. - Pois bem, continuou Nossa Senhora, nos últimos momentos, esta alma voltou-se para mim e disse-me: - Vós sois a Mãe de misericórdia! Como sou indigno de me dirigir a Jesus, Vosso Filho, ouso pedir-vos que tenhais compaixão de mim. Prometo-vos que, de hoje em diante, vou dedicar-me ao serviço de Deus. - Abre o teu livro e vê se algum dos pecados se apagou! O demónio abriu o livro e viu que todos os pecados do defunto tinham desaparecido. Então, Deus pronunciou a seguinte sentença: - Pelos seus pecados, esta alma tem de expiar muito. Será atormentada pelos rigores de um grande frio, pois se mostrou de gelo para com o meu Amor. Se dela dependesse, teria vivido no corpo, até ao fim do mundo. Por isso, deveria permanecer no Purgatório até ao fim dos tempos. Contudo, poderá ser aliviada pelas orações e esmolas que outras pessoas fizerem por ela. Esta alma era um soldado que costumava dar esmolas aos pobres. Estes, ao saberem da morte do seu benfeitor, rezaram muito por ele. Passado algum tempo, Santa Brígida viu essa pessoa subir ao Céu, circundada de glória.53 2. O imperador da Áustria No ano de 1916, realizou-se uma cerimónia de profundo simbolismo, no enterro do imperador da Áustria. O seu cadáver foi sepultado na cripta da igreja dos Capuchinhos de Viena. O mestre-de-cerimónias bateu à porta da cripta. - Quem pede entrada? - Francisco José I, imperador e rei. - Não o conheço. O mestre-de-cerimónias bate de novo. - Quem pede entrada? - Francisco José Habsburgo. - Não o conheço, respondeu de novo uma voz vinda de dentro da cripta. Bate terceira vez. - Quem pede entrada? - Um pobre defunto. Então, a porta abriu-se. Para reflectir: Com a morte desaparecem todos os títulos, regalias ou posições sociais. (Tihamer Tòth, Vida Eterna, p.161) Oração: Abri, Senhor as portas da vossa misericórdia aos que já partiram deste mundo, marcados pelo sinal da fé e recebei-os na vossa morada de luz e de paz. 53 Purgatory, p 92. OLIVEIROS DE JESUS REIS, .o.c., 20-23. 24 Caridade fraterna em S. Paulo aos Gálatas, (6,1-10): Irmãos, se porventura um homem for apanhado nalguma falta, vós, que sois espirituais, corrigi essa pessoa com espírito de mansidão; e tu olha para ti próprio, não estejas também tu a ser tentado. Carregai os fardos uns dos outros e assim cumprireis plenamente a lei de Cristo. Não vos enganeis: de Deus não se zomba. Pois o que um homem semear, também o há-de colher: quem semear na própria carne, da carne colherá a corrupção; quem semear no Espírito, do Espírito colherá a vida eterna. E não nos cansemos de fazer o bem; porque, a seu tempo colheremos, se não tivermos esmorecido. Portanto, enquanto temos tempo, pratiquemos o bem para com todos, mas principalmente para com os irmãos na fé. 7. Os puros de coração verão a Deus «Felizes os puros de coração porque verão a Deus!» (Mt 5,8) A Bíblia ensina-nos clara e repetidamente que só uma absoluta pureza é digna de ser admitida à visão de Deus. O temor de ver a Deus nasce da viva consciência da indignidade e imperfeição do homem para viver junto do Deus Santo. Para entrar no Templo de Jerusalém os israelitas sabiam que era preciso estar completamente limpos: Quem habitará, Senhor no vosso santuário? Quem descansará na vossa montanha sagrada? O que vive sem mancha e pratica a justiça! O que tem as mãos inocentes e o coração puro!54 O Novo Testamento confirma esta exigência de total pureza para entrar na bem-aventurança eterna: Deus escolheu-nos, antes da criação do mundo, para sermos santos, puros e irrepreensíveis na caridade, para vivermos na sua presença.55 Infelizmente, devido à nossa fraqueza, quanta imperfeição, quantos pecados, quantas faltas por negligência! Deus é Santo! Deus é a suma perfeição! Que temeridade pensarmos que havemos de entrar na glória celeste sem passarmos pelo sofrimento, pela purificação! Que diz a Sagrada Escritura? Está escrito que “é através de muitas tribulações que se entra no Reino dos Céus!” 56 Falando aos seus alunos, S. João Bosco não tinha medo de afirmar: «Não vos atemorizeis, meus filhos, se dentre setecentos ou oitocentos jovens somente três ou quatro forem direitos ao Paraíso! Isto significa que a maior parte deverá fazer uma paragem no Purgatório. Quanto tempo? Uns, um minuto apenas; outros semanas, outros meses e até mesmo anos!»57 Depois da morte, passamos pelo Purgatório porque ao longo da vida cometemos muitas faltas e não fazemos penitência para as reparar. Ora nós sabemos que nem a mais leve sombra de mal pode aparecer diante de Deus, cujo nome é Santo! Santo, Santo, Santo, Senhor Deus Omnipotente! Aquele que é, era e há-de vir! Os serafins clamavam alternadamente: Santo, Santo, Santo é o Senhor, Deus do Universo! 58 Arrependei-vos e convertei-vos para que os vossos pecados sejam apagados.59 54 Sal 14,1-2; 23,3-4 Cf. Ef 1,3-4. 56 Act 14,22 57 GABRIEL BOSCO, À espera da felicidade, 6. 58 Ap 4, 8; Is 6, 3. 59 Act 3,19 55 25 Criai em mim, ó Deus um coração puro!60 Corrigindo-nos, Deus quer tornar-nos participantes da sua Santidade. Acreditemos e aceitemos a sua palavra: Eu repreendo e corrijo aqueles que amo!61 Santa Margarida escreveu: «A santidade de Deus não pode sofrer a menor mancha. A luz de Deus faz-me ver até a mínima imperfeição, não podendo suportar a mais ligeira falta em que haja vislumbres de vontade própria ou negligência. Confesso que é para mim tormento insuportável aparecer diante daquela Santidade. Não há género de suplícios a que eu me não submetesse, antes que suportar a presença de Deus santo, quando a minha alma está manchada com alguma falta. Antes mil vezes sepultar-me num forno ardente.»62 «Deus fez-me ver duas santidades: uma de amor, outra de justiça, ambas rigorosíssimas a seu modo. A primeira havia de fazer-me sofrer uma espécie de purgatório muito doloroso de suportar, para aliviar as almas santas que ali estão detidas, às quais Ele permite, segundo Lhe agrada, dirigirem-se a mim. Quanto à santidade de justiça, tão terrível e espantosa para os pecadores, far-me-ia sentir o peso do seu justo rigor, fazendo-me sofrer pelos pecadores e particularmente pelas almas consagradas.»63 Muitos cristãos descuidam levianamente os meios que Deus nos dá para não pecarmos: oração e prática dos sacramentos. Quanto desleixo, quanta indiferença. No sacramento da confissão ou reconciliação, Jesus perdoa-nos os nossos pecados, através dos seus ministros: Jesus voltou a dizer-lhes: A paz esteja convosco! Assim como o Pai me enviou, também Eu vos envio a vós. Em seguida, soprou sobre eles e disse-lhes: Recebei o Espírito Santo. Àqueles a quem perdoardes os pecados, ficarão perdoados; àqueles a quem os retiverdes, ficarão retidos. (João, 20,21-23) Exemplo: Carta de S. Luís de Gonzaga S. Luís de Gonzaga (1568-1591), príncipe da casa de Mântua, Itália, foi educado cristãmente por sua mãe. Aos 17 anos, depois de renunciar aos seus direitos de primogenitura, entrou no noviciado, na Companhia dos padres Jesuítas, em Roma. Em 1591, a peste assolava a cidade. S. Luís Gonzaga dedicou-se com heroísmo, assistindo os doentes, revelando uma caridade infatigável. Deus permitiu que ficasse contagiado. Seguiram-se três meses de sofrimento intenso com febre ardente e devoradora. Tinha sempre diante dos seus olhos Jesus crucificado e uma imagem da Virgem Maria. Os médicos, finalmente, deram-lhe apenas oito dias de vida. Ficou tão contente com esta notícia que pediu ajuda para rezar o Te Deum, hino de louvor e de acção de graças! Por essa altura, escreveu uma carta a sua mãe, despedindo-se: «Espero ir em breve louvar a Deus eternamente na região dos vivos. Deus chama-me à verdadeira alegria, dando-me a segurança de não O poder perder jamais. Deus chama-me a um descanso eterno por um trabalho tão breve e tão pequeno. A nossa separação será breve; lá no Céu nos tornaremos a ver; lá seremos felizes e 60 Sal 50,12. Cf. Heb 12,10;Ap 3,19 62 S. MARGARIDA MARIA ALACOQUE, Autobiografia, ed. Livraria A.O., Braga, 61. 63 Ibidem, 46. 61 26 viveremos para sempre juntos, porque estaremos unidos ao nosso Redentor, louvandoO com todas as forças da nossa alma e cantando eternamente as suas misericórdias. Digo-vos tudo isto para que vós, Senhora minha mãe e toda a família aceiteis a minha morte como um dom precioso da graça. A vossa bênção de mãe me assista e me ajude a alcançar com felicidade o porto dos meus desejos e esperanças.»64 Entretanto, veio visitá-lo o seu superior. Quando S. Luís Gonzaga o viu, exclamou: “Vamos com alegria para a casa do Senhor! O Deus que me chama é um Deus de Amor!” S. João da Cruz afirma que a alma enamorada por Deus, não morre de velhice, nem de enfermidade. Morre de amor. Foi o que aconteceu com S. Luís Gonzaga: subiu ao Céu nas asas do desejo apaixonado e ardente porque amava Jesus com todo seu coração; repetia sem cessar as palavras do Apóstolo S. Paulo: “Desejo morrer para estar com Cristo!” (cf Fil 1,23) Com serenidade afirmou que morreria nessa noite. Pediu os Sacramento. Ao anoitecer, pediu ao padre que o assistia, S. Roberto Belarmino, que fizesse a encomendação da sua alma: “Parte, alma cristã ao encontro do Senhor que te criou! Recebam-te os Anjos no Paraíso!” Então, docemente, nas mãos de Deus entregou o seu espírito. Existe um quadro que representa a morte de S. Luís Gonzaga, rodeado pelos santos Anjos. Também Frederic de Lama, falando da morte deste santo, escreveu: “O seu quarto estava cheio de Anjos. Jesus e a Virgem Maria estavam junto do seu leito. Quando Deus o chamou pelo seu nome, entregou a sua alma nas mãos de Jesus.” (Frédéric de Lama, “Les anges”, Ed. Christiana, Suiça, pág. 81) A sua morte foi a recompensa de uma existência que reuniu «a prática da penitência e uma admirável pureza de vida»65. Assim se confirma a verdade da Sagrada Escritura: Pela minha inocência me sustentaste, Senhor: Vós me estabelecestes para sempre na vossa presença!66 (Ano Cristão, 21 Junho. Se desejar ler mais acerca da morte deste santo ver na internet: São Luís Gonzaga: “O Deus que me chama é Amor”) 2. Sem calmantes No seu livro “O Pai-nosso”, o bispo húngaro Tihamer Toth conta o diário de um médico que assim nos revela o caso de uma rapariga doente, de 12 anos: A mãe morrera e o pai era lenhador. A filha mais velha fazia as vezes de dona de casa. Apesar de viver ali um rancho de crianças, nota-se um extremo asseio, uma satisfação silenciosa, no meio da maior pobreza. A família vive uma vida cristã, feliz, com toda a naturalidade. E ali está a menina doente. Tuberculosa, em estado grave, há muito que jaz de cama, com febre. O médico vai visitá-la, e a menina, saudando-o com meigo sorriso, diz-lhe: - Mesmo que tenha de morrer, não estou com medo. - Mas que lembrança, menina. Tu vais curar-te. - Gostava muito. Seria tão bom. Mas ainda que tenha de morrer, estou sossegada. O médico vê o termómetro. A temperatura coninua elevada. - Vou dar-te uma aspirina para não teres tanto calor. 64 Liturgia Das Horas, Ofício de Leituras de 21 Junho. Oração da Missa. 66 Sal 40,13. 65 27 - Não, senhor doutor. Não me agrada a aspirina. Mais vale sofrer cá na terra. Se eu morrer e tiver uma temperatura muito alta no Purgatório, quem é que ali me dá aspirina? Que profunda ciência da vida cristã a desta maravilhosa criança! Rezemos: Deus, nosso refúgio e nossa esperança, lembrai-vos da vossa misericórdia e admiti ao convívio dos vossos Santos os nossos familiares, amigos e benfeitores defuntos. Palavra de Deus para meditar: S. Paulo recomenda a seu discípulo Timóteo: Conserva-te puro. (1Tim 5, 22) S. Pedro pede-nos: Caríssimos, rogo-vos que, como estrangeiros e peregrinos, vos abstenhais dos desejos carnais, que combatem contra a alma. (1Ped 2,11) Supliquemos com o salmista: Compadece-Vos de mim, ó Deus pela vossa bondade, pela vossa grande misericórdia, apagai os meus pecados. Lavai-me de toda a iniquidade e purificai-me de todas as faltas. Criai em mim, Ó Deus, um coração puro e fazei nascer dentro de mim um espírito firme. (Salmo 50 (51)) 8. O pecado do rei David «Arrependei-vos para que sejam perdoados os vossos pecados!» (Act. 3,19) S. Paulo, escrevendo aos Romanos ensina que “a nossa justificação vem pela fé em Jesus Cristo” (Rom 3, 22), mas isso não quer dizer passividade ou quietismo. Isso também implica uma responsabilidade pessoal, porque a fé sem obras está morta! (Tiago 2,26) Para nos reconciliarmos com Deus temos de manifestar arrependimento e reparar as consequências dos nossos pecados. Consideremos este texto do 2º livro de Samuel: Natã foi ter com David e disse-lhe: - Em certa cidade viviam dois homens, um rico e o outro pobre. O rico tinha grande quantidade de ovelhas e bois. O pobre nada possuía além duma ovelhinha que tinha comprado. Foi-a criando e ela cresceu junto dele com seus filhos… Chegou um dia um hóspede a casa do rico, mas este não quis tocar nas suas ovelhas, nem nos seus bois para dar de comer ao hóspede que chegara. Tomou a ovelha do pobre e mandou-a preparar para o seu hóspede. David inflamou-se de cólera contra aquele homem e disse a Natã: - Tão certo como o Senhor estar vivo, aquele que assim procedeu é digno de morte. Pagará quatro vezes a ovelha, por ter feito semelhante coisa e por não ter tido coração. Natã disse a David: - Esse homem és tu! Como ousaste desprezar a palavra do Senhor, fazendo o que é mal a seu olhos? Mataste à espada Urias, o hitita; tomaste por esposa a sua mulher, depois de o teres feito passar à espada pelos amonitas. Então David disse a Natã: 28 - Pequei contra o Senhor! Natã respondeu-lhe: - O Senhor perdoou o teu pecado: não morrerás. Mas porque tanto ofendeste o Senhor com esta acção, o filho que te nasceu vai morrer. 67 David pecou gravemente. A repreensão do profeta Natã provocou nele um sincero arrependimento. Deus perdoou-lhe, mas não o livrou do castigo. «Estas ideias descobrem-nos a possibilidade de que alguém possa ter morrido sem ter alcançado o grau de maturidade espiritual requerido para viver na comunhão imediata com Deus, o que acarretaria consequentemente um suplemento de purificação ultraterrena. À luz desta possibilidade deve ser contemplada a prática da oração pelos defuntos a que se refere a Sagrada Escritura.»68 Uma maneira de reparar os nossos pecados é fazer penitência! Meditemos na força exortativa destas frases bíblicas: Se não fizerdes penitência morrereis.69 Eu corrijo e castigo aqueles que amo; sê, pois zeloso e arrepende-te.70 Pela impenitência do teu coração juntas um tesouro de cólera para ti, no dia da manifestação do juízo de Deus.71 Façamos penitência, agora, ou teremos um Purgatório longo, depois da morte! Em Fátima, Nossa Senhora convidou-nos com insistência: «Rezem, rezem muito! Rezem o terço todos os dias!»72 A mensagem de Fátima resume-se em duas palavras: penitência e oração. Quem reza salva-se!73 Exemplo: Purgatório na mensagem de Fátima. No dia 13 de Maio de 1917, Nossa Senhora apareceu aos três pastorinhos e disse-lhes. - Não tenhais medo. Eu não vos faço mal. - De onde é Vossemecê? - Sou do Céu. - E que é que Vossemecê me quer? - Vim para vos pedir que venhais aqui seis meses seguidos, no dia 13, a esta mesma hora. Depois vos direi quem sou e o que quero. - E eu vou para o Céu? – Perguntou a Lúcia. - Sim, vais. - E a Jacinta? - Também. - E o Francisco? - Também, mas tem que rezar muitos terços. Lembrei-me de perguntar por duas raparigas que tinham morrido há pouco. Eram minhas amigas e estavam em minha casa a aprender a tecedeiras com minha irmã mais velha. - A Maria das Neves já está no Céu? - Sim, está. 67 2 Sam 12,1-13. RUIZ DE LA PENA, La Otra Dimension, 311. 69 Lc 13,5. 70 Ap 3,19. 71 Rom 2,5. 72 IRMÃ LÚCIA, o.c., 154. 73 S. AFONSO MARIA DE LIGÓRIO, Prática de Amar Jesus Cristo, ed. Perpétuo Socorro, Porto, 219. 68 29 - E a Amélia? - Estará no Purgatório até ao fim do mundo74. Num diálogo com uma prima, a Jacinta disse: «Perguntámos a Nossa Senhora pela Maria das Neves. Ela disse assim: - Esteve no Purgatório dois meses e já está no Céu. Também perguntámos pela Amélia. - Está no Purgatório até ao fim do mundo e depois também vai para o Céu.» A família chorou e veio pedir aos pastorinhos, que aconselharam: «Vocemecês mandem dizer missas e pode ser que saia de lá.» 75 2. Santa Joana princesa de Portugal A princesa Santa Joana, filha do rei Afonso V, revelou desde muito tenra idade uma grande vocação religiosa. Esta filha primogénita, apesar de ser obrigada a viver na Corte, afastava-se o mais possível de festas e convívios e passava grande parte do seu tempo a rezar e a meditar. Com a autorização real, entrou para o convento de Odivelas, mudando-se mais tarde, para o de Santa Clara de Coimbra, mas acabando por professar no convento de Jesus, em Aveiro. Esta última decisão foi contestada tanto pelo rei, como pelo povo, dado que o Convento de Jesus era muito pobre e, na opinião geral, indigno de uma princesa. Perante tanta discórdia, a princesa declarou que usaria o véu de noviça para sempre e insistiu em ingressar no convento de Jesus, vivendo na humildade e na pobreza e aplicando as rendas que possuía no socorro dos pobres. A sua caridade era tão grande, que depressa ficou conhecida como santa. Passado algum tempo, a bela princesa adoeceu e morreu em grande sofrimento. Quando o seu enterro passou pelos jardins do convento deu-se um facto maravilhoso: as árvores, que ela havia tratado, deixavam cair as folhas e as flores sobre o seu caixão, prestando-lhe uma última homenagem. A natureza parecia, assim, chorar também a morte da Princesa Santa Joana. 3. Beato Domingos Collins Domingos Collins (1566-1602) entrou na Companhia de Jesus e foi missionário na Irlanda. Os ingleses prenderam-no e tentaram fazê-lo abjurar a fé católica. Condenado à morte, morreu juntamente com dezasseis companheiros. Foi beatificado pelo Papa S. João Paulo II, em 1992. Conduzido pelos soldados ao local do martírio, deu pelo caminho, sinais de admirável fortaleza. Ao subir os degraus do cadafalso, mostrou grande alegria de espírito e fez uma breve exortação aos presentes, falando da verdadeira fé que a Igreja Católica ensina. Ao ouvirem isto, os inimigos da Igreja não puderam conter-se mais e lançaram-lhe o laço ao pescoço. Manteve-se firme, sereno, com um sorriso de alegria. O capitão inglês perguntou: “Que homem é este, que vai para a morte com a mesma naturalidade com que eu vou para um banquete?” Domingos respondeu: “Por esta causa, sofreria de muito boa vontade, não uma, mas mil mortes.” As suas últimas palavras foram as mesmas de Jesus: “Em Vossas mãos, Senhor, entrego o meu espírito.” (Carta de Ricardo Haries, de 1603, in Liturgia das Horas, Companhia de Jesus, 30 de Outubro) 74 75 IRMÃ LÚCIA, o.c., 146. JOÃO DE MARCHI, o.c.,23-24. Mensagem de Fátima, 30 (Maio/Junho) 1962. 30 Rezemos: Senhor nosso Deus e nosso Pai, concedei o descanso eterno àqueles que exerceram o ministério sagrado e que durante a vida terrena se consagraram a Vós de todo o coração, para que Vos louvem eternamente, no Céu. 9. Os três jovens na fornalha ardente «Surgirão muitos falsos profetas que enganarão a muitos. E por se multiplicar a iniquidade, resfriará a caridade da maioria. Mas quem perseverar até ao fim será salvo! Esta boa Nova do reino será proclamada em todo o mundo para se dar testemunho diante de todos os povos; e então virá o fim.» (Mat 24, 11-14) No tempo do cativeiro de Babilónia, três jovens israelitas foram lançados numa fornalha ardente, porque se recusaram a adorar a estátua de ouro do rei Nabucodonosor. Cheio de cólera, o rei ordenou que a fornalha fosse aquecida sete vezes mais do que o costume. Alguns dos mais fortes guerreiros amarraram Sidrac, Misac e Abdênago. Foram atados, com seus mantos, suas túnicas, seus barretes e suas vestes e lançados na fornalha. As labaredas de fogo mataram os homens que tinham lançado os jovens, mas estes, sem sofrerem dano algum, passeavam no meio das chamas, cantando hinos e bendizendo o Senhor!76 Quem nunca ouviu contar histórias de pessoas queimadas vivas? Ficamos aterrorizados e a tremer de medo. Quem não sabe como foi elevado o número de cristãos, cujos corpos a arder, à maneira de tochas, iluminaram as noites da velha Roma pagã, nos tempos do imperador Nero? Que sofrimento horrível! Contudo, este sofrimento não podia durar mais que umas horas! O sofrimento do Purgatório, incomparavelmente mais temível, pode durar dez, cinquenta, cem anos! Na eternidade não há tempo, mas podemos falar deste modo, porque a Bíblia ensina-nos que “mil anos aos olhos do Senhor são como uma vigília da noite.”77 Há pessoas que têm horror à penitência: pensam que é algo pavoroso, apenas para os santos. Habitualmente, Deus não pede actos heróicos. Mas se pede, dá as forças necessárias, como deu aos mártires! No entanto, pediu-nos a todos: Sede perfeitos, como é perfeito o vosso Pai celeste. 78 A perfeição exige o cumprimento do nosso dever. «A penitência que eu hoje peço é o cumprimento do vosso dever.»79 Santa Teresinha do Menino Jesus ensinou-nos um caminho fácil: praticar as pequenas mortificações e aceitar de boa mente as contrariedades do dia a dia! A isto chama as «flores dos pequenos sacrifícios.»80 Não desperdicemos a oportunidade de cumprir bem os nossos deveres com fidelidade e perseverança, como se fosse a última vez. Pratiquemos actos de paciência 76 Cf. Dan 3,10-24. Sal 89, 4. 78 Mt 5,48. 79 JUNTA DA ACÇÃO CATÓLICA, A Mensagem de Fátima, ed. Logos, Lisboa 1961, 82: “Esta é a penitência que Deus pede: o sacrifício que cada pessoa tem de se impor a si mesma para levar uma vida de justiça na observância da Sua Lei. (…) De quinta para sexta-feira, estando na Capela, com licença das Superioras, às 12 horas da noite, disse-me Nosso Senhor: o sacrifício de cada um exige o cumprimento do próprio dever e a observância da Minha Lei; é a penitência que agora peço e exijo”. 80 SANTA TERESA DO MENINO JESUS, Poesia 34, in Obras Completas, o.c., 772. 77 31 e amabilidade com o próximo. Aceitemos o peso do dia, do frio e do calor, as dores e os sofrimentos da vida com serenidade, com sobrenaturalidade, sem nos queixarmos. “Concede-se indulgência parcial ao fiel que, no cumprimento dos seus deveres e ao suportar as dificuldades da vida, eleve a Deus a sua alma com humilde confiança, rezando, ainda que só mentalmente, alguma piedosa oração.”81 Também o Concílio Vaticano II nos recorda: “Todos os fiéis se santificarão cada vez mais nas condições, tarefas e circunstâncias próprias da vida, recebendo tudo com fé da mão do Pai celeste.” (Lumen Gentium, nº 41) «As angústias e tribulações que por vezes sofremos nesta vida servem-nos ao mesmo tempo de advertência e correcção. A Escritura não nos promete paz, segurança e tranquilidade: anuncia-nos aflições, provas e tribulações.»82 Quer comais, quer bebais, quer façais qualquer outra coisa fazei tudo para glória de Deus.83 Irmãos, sede alegres, procurai a perfeição, consolai-vos uns aos outros, tende os mesmos sentimentos, vivei em paz e o Deus do amor e da paz estará convosco!84 Exemplo: Martírio de S. Policarpo Quando ficou pronta a fogueira, Policarpo desfez-se de todas as vestes. Quando o quiseram pregar ao poste ele disse: Deixem-me assim. Aquele que me concedeu a graça de morrer no fogo, também me concederá que permaneça imóvel no meio dele, mesmo sem a caução dos vossos cravos. Então não o pregaram, mas limitaram-se a amarrá-lo. Com as mãos atrás das costas e amarrado era como um cordeiro escolhido de entre um grande rebanho para o sacrifício, um holocausto agradável, preparado para Deus. Levantando os olhos ao céu disse: Senhor Deus omnipotente, (…) eu Vos bendigo porque Vos dignastes, neste dia e nesta hora, incluir-me no número dos vossos mártires, fazer-me tomar parte no cálice do vosso Ungido e pelo Espírito Santo, alcançar a ressurreição na vida eterna, na incorruptibilidade da alma e do corpo. No meio dos vossos mártires Vos peço que eu hoje seja recebido na vossa presença. Por todas as coisas Vos louvo, Vos bendigo, Vos glorifico, agora e pelos séculos que hão-de vir. Ámen. Depois de ter dito «Ámen» e terminado a prece, os verdugos acenderam o fogo. Levantou-se uma grande labareda; então nós vimos o milagre: o fogo tomou a forma de uma abóbada, como a vela de um navio enfunada pelo vento e rodeou o corpo do mártir; este estava posto no meio, não como carne que é queimada, mas como um pão que coze, ou como ouro ou prata incandescente na fornalha. E sentíamos um odor de tal suavidade que parecia que se estava queimando incenso ou outro perfume precioso.85 81 Manual das Indulgências, 1ª Concessão S. AGOSTINHO, in Liturgia das Horas, vol. 4, 192. 83 1 Cor 10,31. 84 2 Cor 13,11. 85 Carta da Igreja de Esmirna sobre o martírio de S. Policarpo, cap. 12, 2-15.2, in Liturgia das Horas, vol. 2, 1463. 82 32 Santa Clara de Assis Santa Clara nasceu em Assis, no ano de 1193. A exemplo de S. Francisco, seguiu o caminho da pobreza evangélica e fundou a ordem monástica das Irmãs Clarissas. A sua vida foi de grande austeridade e rica de caridade. Morreu a 11 de Agosto de 1253. Eis um pequeno resumo dos seus últimos dias, extraído do livro Fontes Franciscanas II, Santa Clara de Assis, pag. 270-276: Depois de ter corrido cerca de quarenta anos, no estádio da altíssima pobreza, agora aproximava-se a hora de colher o prémio do chamamento divino. Experimentou múltiplos sofrimentos, suportados com paciência. Teve a consolação de ser visitada pelo Papa Inocêncio IV, que a abençoou e lhe concedeu a absolvição geral de todos os pecados. Cheia de gratidão, Santa Clara chamou as irmãs e disse-lhes: - Louvai o Senhor! Foi-me permitido ver o Seu representante sobre a terra! A agonia foi-se prolongando. Ao longo de dezassete dias não tomou qualquer alimento, mas cheia de fortaleza divina, encorajava quantos a visitavam a perseverar no bom serviço de Jesus Cristo. Por fim, pediu a presença de sacerdotes e irmãos espirituais para lhe recitarem a Santa Paixão de Jesus. A dada altura, Clara disse para si mesma: “ Vai em segurança, que boa escolta levas para a viagem. Aquele que te criou, também te santificou. Bendito sejas meu Senhor, porque me criaste.” Eis o testemunho da Irmã Benvinda, a quem foi dado contemplar com os olhos da alma o trânsito de Santa Clara: “Vi surgir uma multidão de virgens, vestidas de branco e coroadas com diademas de ouro. Uma delas, de aspecto deslumbrante, irradiava um tal esplendor, que a escuridão da noite se transformou em claro dia. Aproximou-se do leito, debruçou-se carinhosamente e abraçou Clara com ternura. As outras virgens cobriram o corpo de Clara com um manto de esplendorosa beleza.” Santa Clara deixou esta morada do exílio terrestre para receber o prémio eterno na casa de Deus, nosso Pai. Bendito este êxodo do vale de misérias, que conduziu Clara à vida bem-aventurada. Depois do jejum na terra foi partilhar a mesa dos manjares do Céu. Louvado seja o Senhor pela irmã morte, que em troca das pobres vestes terrenas, introduziu santa Clara, na Jerusalém celeste, para ser revestida com o manto da glória. Oremos: Senhor, fogo ardente de eterna caridade, Vós sois um Deus clemente e compassivo: usai de misericórdia para com os fiéis defuntos e abri-lhes as portas do Paraíso. 10. Felizes os misericordiosos Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia. (Mt 5,7) Leituras patrísticas: 1. “Dulcíssima é esta palavra misericórdia. E se é tão doce o nome, quanto mais não será a própria realidade? Todos os homens querem misericórdia, mas infelizmente nem todos procedem de modo a merecê-la; todos a desejam receber, mas poucos a querem praticar! 33 Ó homem, com que coragem ousas pedir o que recusas dar aos outros? Quem deseja alcançar misericórdia no Céu, deve praticá-la na terra. É através da misericórdia praticada nesta terra que se chega à misericórdia do Céu. Existe a misericórdia terrena e a misericórdia celeste e divina. Qual é a misericórdia humana? A que atende à miséria dos pobres. E qual é a misericórdia divina? Sem dúvida, a que te concede o perdão dos pecados. Tudo o que dá a misericórdia humana durante a nossa peregrinação sobre a terra, a misericórdia divina o retribui na pátria. Deus, neste mundo, tem fome e frio na pessoa de todos os pobres, como Ele mesmo disse: Tudo o que fizestes a um dos meus irmãos mais pequeninos foi a mim que o fizestes.86 O mesmo Deus que se digna recompensar no Céu, quer receber na terra. Que espécie de gente somos nós? Quando Deus dá, queremos receber; mas quando pede, não queremos dar. Quando um pobre tem fome é o próprio Cristo que passa necessidade, como Ele disse: Tive fome e não me destes de comer.87 Não desprezes, portanto a miséria dos pobres, se queres esperar confiadamente o perdão dos pecados. Agora, irmãos, Cristo passa fome; é Ele que se digna passar fome e sede na pessoa de todos os pobres; e restitui no Céu o que recebe cá na terra. Dai a misericórdia terrena e recebereis a misericórdia celeste. O pobre pede um pouco de pão, tu pedes a vida eterna. Dá ao pobre para receberes de Cristo. Ouve as suas palavras: Dai e dar-se-vos-á.88 Não compreendo como te atreves a esperar receber aquilo que não queres dar. Portanto, quando vens à Igreja, dá esmola para os pobres.”89 2. «Vinde, benditos de meu Pai, recebei em herança o reino que vos está preparado.» (Mateus 25,31) “Se prestarmos bem atenção, irmãos, o facto de Jersus Cristo sentir a fome dos pobres é-nos favorável. [...] Olhai: de um lado, é uma moeda, do outro é o Reino. Qual a comparação? Tu dás uma moeda ao pobre e de Jesus recebes o Reino; tu dás um pedaço de pão e de Cristo recebes a vida eterna; tu dás abrigo ao pobre e de Cristo recebes a remissão dos teus pecados. Então, não desprezemos os pobres, porque a miséria dos pobres é o medicamento dos ricos, como disse o próprio Senhor: «Antes, dai de esmola o que está dentro do copo, e para vós tudo ficará limpo», e ainda: «Vendei os vossos bens e dai-os de esmola.» (Lc 11, 41; 12, 33) E o Espírito Santo proclama através do autor sagrado: «A água apaga o fogo ardente, e a esmola expia o pecado.» (Ben-Sirá 3,30) Tenhamos misericórdia, irmãos. Com a ajuda de Cristo, seguremos o vínculo da Sua garantia, pois Ele diz: «Dai e dar-se-vos-á.» (Lc 6, 38) «Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia.» (Mt 5,7) Que cada um se aplique, de acordo com os seus meios, em não vir à Igreja de mãos vazias: aquele que deseja receber, deve efectivamente oferecer alguma coisa. Aquele que pode, cubra o pobre com uma veste nova; aquele que não pode, ofereça ao menos uma velha. Quanto àquele que julga não ter o suficiente, que ofereça um pedaço de pão, que acolha um viajante, que prepare um leito, que lhe lave os pés, para merecer ouvir Jesus dizer-lhe: «Vinde, benditos de meu Pai! Recebei em herança o Reino; tive fome e destes-Me de comer; era peregrino e recolhestes-Me». Ninguém, 86 Mt 25,35 . Mt 25, 37 88 Luc 6,38 89 CESÁRIO DE ARLES, Sermão 25, in Liturgia das Horas, vol. 3, 555. 87 34 irmãos muito queridos, poderá desculpar-se de não dar esmola, quando Cristo prometeu dar uma recompensa em troca de “um copo de água fresca.” (cf Mt 10, 42; S. Césario de Arles) 8 De que nos aproveitou o nosso orgulho, e de que nos serviu a riqueza e a arrogância? 9Tudo isso desapareceu como a sombra, como uma sombra que passa, 10 como um navio que vai cortando as ondas agitadas, sem deixar rasto da sua passagem, nem vestígio da sua quilha nas ondas. 11Ou como a ave que voa pelos ares, sem deixar sinal do seu voo; bate o ar com as asas, fende-o com a força do seu impulso, atravessa-o com o mover das suas asas, sem deixar rasto da sua passagem. 12 Ou como a seta atirada ao alvo, que fende o ar, mas este logo se une, ignorando-se, depois, a trajectória seguida. 13Assim também nós: mal nascemos, logo desaparecemos, sem poder mostrar rasto de virtude. Fomos consumidos pela nossa própria maldade.» 14*Sim, a esperança do ímpio é como poeira levada pelo vento, como leve espuma espalhada pela tempestade, como fumo dissipado pela aragem e como lembrança do hóspede de um dia que passa. 15*Mas os justos viverão eternamente, o Senhor os recompensará e o Altíssimo cuidará deles. 16*Por isso, receberão um reino de glória e um diadema brilhante da mão do Senhor; com a sua direita os protegerá e com o seu braço os defenderá. (Sabedoria 5, 8-16) Cântico: Eu sinto que vem do céu um sopro leve, Um vento quente que nos aquece, Um sopro vivo que vem de Deus. Um vento que acalma o ser e envolve a alma Do mesmo modo que o mar se acalma, Logo que as ondas se vão deitar. Eu sinto que vem do céu um amor imenso Que se transforma em nuvens de incenso Um amor suave que vem de Deus. Um amor que nos transforma e alumia Tal como a noite dá a vez ao dia, Quando as estrelas se vão deitar. (Youtube Sopro leve) S. Domingos e a esmola Viviam os frades Dominicanos no convento de S. Sisto, em Roma, numa situação de extrema pobreza. S Domingos ordenou a dois irmãos que fossem pela cidade pedir esmola. Eles assim fizeram, mas sem resultado, até que ao tornarem para o convento, encontraram uma senhora muito devota da Ordem; esta, vendo que não levavam nada, deu-lhes um pão, acrescentando: «Não quero que volteis com as mãos vazias.» Um pouco mais adiante, encontraram um pobre homem que lhes pediu esmola. Desculparam-se de não lha dar, explicando que nada tinham para si mesmos. Contudo, o pobre insistiu até que os irmãos decidiram dá-lo, por amor de Deus! Quando chegaram ao convento, o Santo Patriarca a quem o Espírito Santo revelara o que se tinha passado, veio-lhes ao encontro e perguntou com ar prazenteiro: “Não trazeis nada, meus filhos?” Eles contaram o que se tinha passado. 35 - Esse mendigo era um Anjo de Deus. O Senhor providenciará para com os que lhe pertencem. Vamos rezar. Entraram na Igreja. Depois mandaram chamar a Comunidade para o refeitório. - Meu Pai, – disse o Padre Procurador – para quê chamar os frades se nada temos para lhes dar de comer? S. Domingos insistiu, mandando entrar a comunidade para o refeitório. Prepararam-se as mesas, deu-se o sinal e a Comunidade entrou. S. Domingos deu a bênção, todos se sentaram e Frei Henrique Romano começou a ler. Durante esse tempo, S. Domingos rezava, com as mãos juntas, postas sobre a mesa. Eis que de repente, dois formosíssimos jovens, ministros da divina Misericórdia, apareceram no meio do refeitório. Traziam pães apetitosíssimos que começaram a distribuir pelos irmãos. Ao chegarem diante de S. Domingos puseram também um pão e, curvando a cabeça, desapareceram sem que ninguém soubesse donde tinham vindo ou para onde haviam ido. Então o Santo afirmou: - Meus Irmãos, comei o pão que o Senhor vos mandou. Comeram nesse dia, no seguinte e no outro. Depois, S. Domingos mandou repartir pelos pobres o que havia ficado. Graças a Deus, que por meio dos seus Anjos, mandara pão em abundância.”90 S. Luís Orione e as almas do Purgatório Na vida de S. Luís Orione (1872-1940) lê-se o seguinte caso prodigioso: Este homem de Deus, a certa altura, viu-se obrigado a pagar uma grande dívida que tinha contraído para pagar a factura do padeiro. O director do banco, seu amigo, chamou-o e disse-lhe que precisava urgentemente do dinheiro. Era um fim-de-semana e, na Segunda-feira, tinha que ficar liquidada a conta. S. Luís Orione passou o Domingo a rezar, mas, sentindo que Deus não respondia, virou-se para nossa Senhora. Contudo, também lhe parecia que Ela Se fazia surda. Teve então uma ideia. A sua mãe tinha-lhe dado os brincos, que utilizou no casamento. Lembrou-se de os pendurar nas orelhas da imagem de nossa Senhora da Divina providência que tinha na capela. Assim, a Mãe do Céu ver-se-ia obrigada a escutá-lo. Sem desanimar, continuou a oração com grande fé. Mas nossa Senhora punha à prova a sua paciência. “Ela tinha-Se tornado tão surda – pensou o nosso santo – que nem sequer notou que lhe furei as orelhas.” Como agir? Teve a inspiração de se dirigir às Almas do Purgatório. Mais tarde, ele assegurava: “Recordai sempre isto: quando o Senhor não vos escutar imediatamente, recorrei à Santíssima Virgem. Se também Ela não fizer caso, invocai a intercessão das benditas Almas do Purgatório e recebereis a graça desejada.” Alguma coisa lhe dizia interiormente que a sua oração seria atendida. Antes dos empregados do banco baterem à porta, foi uns momentos à capela para rezar. Ao chegar ao quarto, o porteiro disse-lhe: “Chegou uma senhora que deseja, com insistência, encontrar-se consigo o mais depressa possível. Vem vestida de luto mas não me indicou o nome. Disse simplesmente que é uma benfeitora da casa.” D. Orione desceu imediatamente. A tal senhora vinha entregar o produto da venda do seu restaurante. E explicou: “Padre, oiça. Tomei bilhete para Turim porque pensava levar este dinheiro a D. Bosco. No comboio pus-me a rezar o terço pelas Almas do Purgatório, pedindo-lhes que me ajudassem e defendessem de qualquer Santa Catarina de Sena, Diálogos. O’ SULLIVAN (E.D.M.), Os Santos Anjos, ed. Corpo Santo, Lisboa 1945. 90 36 perigo de roubo. Enquanto eu demorava nestas considerações, o comboio chegou a Pontecorone. Parecia-me ouvir uma voz interior que me dizia: “Porquê ir a Turim? Podias descer em Tortosa e dar o dinheiro ao pobre Orione.” Ao aproximar-se a estação de Tortosa, a voz tornou-se mais insistente e parecia que uma mão invisível me forçava a descer da carruagem. Pensei para comigo que se Vossa Reverência, que anda por todo o mundo, não estivesse em casa, eu continuaria viagem para Turim.” O homem de Deus ficou tão comovido que começou a soluçar. Vieram-lhe dizer que os empregados do banco tinham chegado. Disse então: -Vamos primeiro rezar uma Salve Rainha e o Salmo 129, pelas Almas do Purgatório. O lema sacerdotal de S. Luís Orione era: "Renovar tudo em Cristo". S. Luís Orione a fim de aliviar as misérias humanas, fundou a Congregação da Pequena Obra da Divina Providência, tendo desenvolvido o carisma de cuidar dos órfãos, enfermos, pobres e crianças abandonadas. Em 1940, atacado por graves doenças, foi enviado pelos médicos para Sanremo. Foi para lá contrariado: "Não é entre as palmeiras que eu quero viver e morrer, mas no meio dos pobres, que são Jesus Cristo." Três dias depois de ter chegado, ali morreu no dia 12 de Março, sussurrando: «Jesus! Jesus, estou indo.» O corpo foi sepultado devotamente na cripta do Santuário e encontrado incólume vinte e cinco anos depois. Em 16 de Maio de 2004, foi solenemente canonizado pelo Santo Padre S. João Paulo II. 3. O Venerável Luís de Blois (1506 - 1566) era pobre materialmente falando, mas de uma riqueza espiritual sem limites. Tinha o zelo pela glória de Deus e pela salvação das almas. Um dia, tendo comungado muito fervorosamente por um amigo que sofria no Purgatório, recebeu a sua visita, com estas palavras: "Graças, mil graças, meu amigo. Vou contemplar a face do meu Deus para sempre.” (Internet) Oremos: Senhor Jesus Cristo, que passastes pela terra fazendo o bem e destes a maior prova de amor, morrendo pele redenção de todos homens, nós pedimos cheios de confiança: acolhei os defuntos na cidade santa da Jerusalém celeste. Para meditar, guardar no coração e pôr em prática: Dai e ser-vos-á dado: uma boa medida, cheia, calcada a transbordar será lançada no vosso regaço. A medida que usardes com os outros será usada convosco.» (São Lucas 6,38) Cântico Os justos viverão eternamente a sua recompensa está no Senhor. Justos, aclamai o Senhor; os corações rectos devem louvá-Lo. 11. S Martinho É boa a oração feita com verdade e a esmola, acompanhada pela justiça. Melhor é pouco com justiça, do que muito com iniquidade. Melhor é dar esmolas do que acumular tesouros, pois a esmola livra da morte e limpa de todo o pecado. Os que praticam a misericórdia e a justiça serão cumulados de vida. Aqueles que cometem o pecado e a injustiça são inimigos da sua própria vida. (Tob 12,8-10) 37 S. João Crisóstomo fala-nos em cinco caminhos da penitência: Acusação dos pecados; perdão das ofensas do nosso próximo; oração; esmola e humildade. “O primeiro caminho da penitência é a acusação dos pecados. Condena as tuas culpas e a confissão te alcançará o perdão do Senhor. E se te confessas serás mais cauteloso para não voltares a cair. Habitua a tua consciência a ser a tua acusadora familiar, para que mais tarde ninguém te acuse diante do tribunal do Senhor. Há outro, não inferior ao primeiro, que consiste em perdoar as ofensas que recebemos dos inimigos, dominar a ira, esquecer as faltas dos nossos irmãos. Assim nos serão perdoadas também as ofensas que praticámos contra Deus: «Se perdoares a quem te ofendeu, também o Pai celeste te perdoará.»91 Terceiro caminho: É a oração fervorosa e assídua que brota do íntimo do coração. Quarto caminho da penitência: esmola. É grande e poderosa a sua eficácia. Dá esmolas e não sejas mesquinho! Se tens muito dá muito; se tens pouco não tenhas receio de dar conforme esse pouco. Quem dá esmola, apresenta uma boa oferta ao Altíssimo! Reparte o teu pão com o faminto e os indigentes e agasalha com as tuas vestes os que não têm com que se cobrir.92 Se procederes com humildade e modéstia, será este um modo não menos eficaz que os outros para destruir pela raiz os teus pecados. Disso é testemunha o publicano, que, não podendo recordar diante de Deus as boas acções, ofereceu o humilde reconhecimento das suas culpas e assim se libertou do grave peso que tinha na consciência: O publicano ficou à distância e nem sequer se atrevia a levantar os olhos ao Céu, mas batia no peito, dizendo: Meu Deus, tende piedade de mim, que sou pecador! Eu declaro-vos que voltou para casa justificado. Pois quem se humilha será exaltado!93 Humilhai-vos diante do Senhor e Ele vos exaltará!94 «Não fiques ocioso, mas procura seguir todos os dias estes caminhos tão fáceis. Não podes desculpar-te com o impedimento da tua pobreza, pois ainda que leves uma vida de extrema penúria, podes sempre depor a ira, ser humilde, orar assiduamente, confessar os pecados. A pobreza não oferece obstáculo algum a estes caminhos de penitência, nem sequer àquele que consiste na distribuição de bens, isto é, a esmola. Para cumprir este mandamento lembra-te da viúva que deu as duas pequenas moedas.”95 A caridade “Perto da minha casa, mora, sozinho, um velho doente, que treme todo o dia e fala pouco. Como não tem família, são os vizinhos que o trazem ao colo e o sentam à porta nos dias de sol. Chora sem lhe fazerem mal e sem dizer porquê. Gosto muito deste pobrezinho. Quando lhe levo alguma coisa que o consola, vou tão depressa que nem sinto os pés tocar no chão. Ando sempre contente, nos dias em que posso visitá-lo e dar-lhe esmola. Não há alegria tão grande como a de fazer bem. Nosso Senhor ensinou que a maior de todas as virtudes é a caridade” (O Livro da Terceira Classe, ed. Ministério da Educação, 62) 91 Mt 6,14-15; Mc 11,25. Cf. Tob 4,7-11.16-17 93 Lc 18,13-14 94 Tgo 4,10 95 Lc 21,2-4; S. JOÃO CRISÓSTOMO, Homilia 2,6; PG 49, 263-264, Liturgia das Horas, vol. 4, 215 92 38 Os sufrágios pelos mortos beneficiam aqueles por quem rezamos e aqueles que rezam. Quem sufraga as almas do purgatório cumpre os dois grandes preceitos, amar a Deus e o próximo, que resumem todos os mandamentos. Como é bela a devoção às almas do Purgatório! Agradável a Deus, proveitosa às pobres almas, e utilíssima para nós. Não fechemos os nossos ouvidos aos gemidos dos que padecem no Purgatório, suplicando o nosso auxílio. Talvez seja um pai amoroso, que nos dedicava os seus cuidados, dia e noite; talvez uma mãe, que nos amava ternamente; talvez irmãos, cuja morte tanto nos entristeceu; talvez filhos, que eram o encanto de toda a família; ou o esposo, sempre tão dedicado e fiel cumpridor dos deveres; ou a esposa, a fiel companheira desde a juventude, o anjo do lar, “o sol da casa”. No purgatório os defuntos sofrem penas amargas... A nós se dirigem suplicantes: Compadecei-vos de mim, ao menos vós, que sois meus amigos, porque a mão do Senhor me tocou (Job. 19, 21). Irmãos, seja a vossa caridade sem fingimento! Amai-vos uns aos outros com amor fraterno. Não sejais indolentes no zelo, mas fervorosos no espírito! Sede perseverantes na oração!96 Que linguagem tão apelativa e que forte censura nos revela esta passagem de S. Paulo, escrevendo aos cristãos de Roma! Quem se atreve a ficar indiferente, sabendo que os nossos irmãos, que se purificam, estão na máxima penúria e já nada podem por si mesmos? Não esqueçamos os nossos defuntos. Mandemos celebrar a Missa por eles. Façamos pequenos sacrifícios; dêmos esmolas; rezemos o terço, tão recomendado por Nossa Senhora. Procuremos ganhar indulgências; ofereçamos os nossos trabalhos do dia a dia97. Façamos o chamado “Acto heróico”: o oferecimento a Deus de todas as nossas boas obras em favor das Almas do Purgatório. Em virtude deste acto generoso ser feito uma vez para sempre, para o tempo e para a eternidade, chama-se voto heróico, porque quem o faz, cumpre um acto prodigioso de abnegação: esquecer-se de si mesmo e sacrificar-se para socorrer os outros. Não há nenhuma fórmula prescrita: basta fazer esta oferta no íntimo do coração, ou podemos rezar com estas palavras: “Pai Santo, pelas mãos imaculadas da Virgem Maria, consoladora dos aflitos e Mãe de Misericórdia, eu Vos ofereço as minhas orações e as minhas obras de misericórdia pelas Almas do Purgatório. Ofereço-Vos também os sufrágios que por mim venham a ser feitos, após a minha morte!” Exemplo: S. Martinho e a sua capa. S. Martinho era oriundo de uma família nobre; nasceu no ano de 316, na Hungria. Seus pais eram pagãos. Aos 12 anos, contrariando a vontade da família, tornou-se cristão. Seu pai era tribuno de uma legião do exército de Roma, no tempo dos imperadores Constâncio e Juliano, o Apóstata. Martinho foi alistado na cavalaria do Imperador. Debaixo da farda militar ocultavam-se as virtudes de um monge! A sua virtude de predilecção era a caridade pelos pobres. Entrando certo dia na cidade de Amiens, encontrou um pobre tremendo de frio, que lhe pediu esmola. Que faria? A caridade é fértil em expedientes: puxa da espada, corta a sua capa e dá metade ao 96 97 Rom 12,9-12. Cf. OLIVEIROS,Purgatório, 7. 39 pobre transido de frio. À noite, sonhou e viu Jesus envolto naquele pedaço da capa, dizendo: "Martinho, ainda não baptizado, deu-me este vestuário". Posteriormente, abandonou o Exército e fez-se baptizar por Santo Hilário de Poitiers. Entregou-se à vida de eremita, fundando um mosteiro em Ligugé, onde viveu sob a orientação de Santo Hilário. Ordenado sacerdote, foi mais tarde aclamado bispo de Tours (371). Tornou-se um grande evangelizador da França, verdadeiro pastor, fundando mosteiros, instruindo o clero, defendendo a causa dos oprimidos e deserdados deste mundo. “Martinho soube com muita antecedência o dia da sua morte e comunicou a seus irmãos que a separação do seu corpo estava iminente. Reuniu os irmãos e participou-lhes que ia morrer. Então começou o pranto, a consternação e o lamento unânime de todos: «Pai, porque nos abandonas? A quem nos confias na nossa orfandade? Lobos ferozes assaltam o teu rebanho; quem nos defenderá das suas mordeduras, se nos falta o pastor? Sabemos sem dúvida que suspiras por Cristo, mas a tua recompensa está assegurada e não será diminuída se for adiada. Antes de mais, compadece-te de nós, que nos deixas abandonados». Então, comovido por estes lamentos e transbordando da terna compaixão que sempre sentia no Senhor, assim falou diante daqueles que choravam: «Senhor, se ainda sou necessário ao vosso povo, não me recuso a trabalhar; seja feita a vossa vontade». Oh homem extraordinário, que não fora vencido pelo trabalho, nem o haveria de ser pela morte e que, igualmente disposto a uma ou outra coisa, nem temeu morrer nem recusou a vida!” Morreu no ano de 397, aos oitenta e um anos de idade. (Internet. Santos do dia, Secretariado de Liturgia) 2. Amor verdadeiro “Um famoso professor encontrou-se com um grupo de jovens que falavam contra o casamento. Argumentavam que o que mantém um casal é o romantismo e que é preferível acabar com a relação quando este se apaga, em vez de se submeter à triste monotonia do matrimónio. O mestre disse-lhes que respeitava as suas opiniões, mas contou-lhes a seguinte história: “Meus pais viveram 55 anos casados. Numa manhã, minha mãe descia as escadas para preparar o café e sofreu um enfarte cardíaco. Meu pai correu até ela, levantou-a e dirigiu-se a toda velocidade até ao hospital; mas quando chegou, infelizmente, ela já estava morta. Durante o velório, meu pai não falou. Ficou todo o tempo olhando para o nada. Quase não chorou. Eu e meus irmãos tentámos, em vão, quebrar a nostalgia, recordando momentos engraçados. Na hora da despedida, meu pai, já mais calmo, passou a mão sobre o caixão e falou com sentida emoção: - Meus filhos, foram cinquenta e cinco bons anos. Ninguém pode falar do amor verdadeiro se não tem ideia do que é compartilhar a vida com alguém, por tanto tempo. Fez uma pausa, enxugou as lágrimas e continuou: - Ela e eu estivemos juntos em muitas crises. Mudei de empregos, renovámos toda a mobília quando vendemos a casa e mudámos de cidade. Compartilhámos a alegria de ver nossos filhos concluirem a Faculdade; chorámos um ao lado do outro quando entes queridos partiam. Orámos juntos na capela de alguns hospitais. Sempre nos apoiámos na hora da dor, trocámos abraços em cada Natal, perdoando nossos erros. Filhos, agora ela partiu e eu estou contente, porque ela morreu antes de mim e 40 não teve que viver a agonia e a dor de me enterrar, de ficar só, depois da minha partida. Sou eu que vou passar por esta situação, e agradeço a Deus por isso. Eu amo-a tanto, que não gostaria que ele sofresse assim... Quando meu pai terminou de falar, estávamos todos com lágrimas nos olhos. Abraçámo-nos e ele consolou-nos dizendo: - Está tudo bem, meus filhos, podemos ir para casa. E, por fim, o professor concluiu: - Naquele dia, entendi o que é o verdadeiro amor. O verdadeiro amor está muito para além do romantismo, vincula-se ao trabalho e ao cuidado a que se entregam duas pessoas realmente comprometidas. Quando o mestre acabou de falar, os jovens universitários não puderam argumentar, pois esse tipo de amor era algo que não conheciam. Entenderam: o verdadeiro amor revela-se nos pequenos gestos, no dia-a-dia, ao longo da vida. O verdadeiro amor não é egoísta, não é presunçoso, nem alimenta o desejo de posse sobre a pessoa amada. Quem caminha sozinho pode até chegar mais rápido, mas aquele que vai acompanhado, com certeza, chegará mais longe.” ( internet) 2. Noivos: Juramento Lembras-te, meu amor? No alvor do casamento, baixou sobre nós dois a luz dos céus. Nossos olhos beijaram-se um momento; e fizemos, então, o juramento: - “Só um do outro, e os dois de DEUS!” Lutei para cumprir o prometido. Meu corpo e a minha alma são só teus. Quando a voz das paixões me traz vencido, A voz do amor segreda-me ao ouvido: - “Só um do outro, e os dois de DEUS!” À minha volta soa, noite e dia, A risada escarninha dos ateus... Cravam-me os estiletes da ironia; Eu calo e rezo a minha litania: - “Só um do outro, e os dois de Deus!” Cerca-me a tentação, velha serpente! Escondem-me o horizonte negros véus, Que importa, meu Amor? Teimosamente, Hei-de gritar à vida, frente a frente: - “Só um do outro e os dois de Deus!” E amanhã, quando a morte, de mansinho, Vier pedir ao mundo o nosso adeus, Hão-de os anjos cantar, devagarinho: - Terão na eternidade um só caminho, Pois são só um do outro e os dois de Deus! (Miguel Trigueiros, Internet) 41 7* Dá esmolas, conforme as tuas posses. Nunca afastes de algum pobre o teu olhar, e nunca se afastará de ti o olhar de Deus.8Filho, procede conforme as tuas posses: se possuíres muita riqueza, dá esmola em proporção da mesma; se, porém, dispuseres de pouco, dá em proporção desse pouco. Nunca tenhas receio de dar esmola. 9Assim, acumularás em teu favor, um bom depósito para o dia da necessidade. 10De facto, a esmola liberta da morte e não permite que a alma desça para as trevas. 11A esmola é, aos olhos do Altíssimo, uma dádiva sagrada, que aproveita a todos os que a oferecem. 16*Reparte o teu pão com os famintos e as tuas vestes com os nus. Tudo quanto te sobejar, dá-o de esmola. (Tobias 4, 7-11;16) Vindo um lavrador da arada Encontrou um pobrezinho E o pobrezinho lhe disse: - Leva-me no teu carrinho. Deu-lhe a mão o lavrador, E no seu carro o metia; Levou-o para a sua casa, P’rá melhor sala que tinha. Mandou-lhe fazer a ceia Do melhor manjar que havia; Sentou-o na sua mesa, Mas o pobre não comia. As lágrimas eram tantas Que pela mesa corriam; Os suspiros eram tantos Que até a mesa tremia. Mandou-lhe fazer a cama Da melhor roupa que tinha Por cima damasco roxo, Por baixo cambraia fina. Lá pela noite adiante O pobrezinho gemia: Levantou-se o lavrador A ver o que o pobre tinha. Deu-lhe o coração um baque; Como ele não ficaria! Achou-o crucificado Numa cruz de prata fina. - Meu Jesus, se eu tal soubera, Que em minha casa vos tinha, Mandara fazer preparos Do melhor que encontraria. - Cala-te aí, lavrador, Não fales com fantasia. No céu te tenho guardado Cadeira de prata fina. Tua mulher a teu lado, Que também o merecia. (Tradição popular. Joaquim Alves Ferreira, o Romanceiro, vol 5) 42 Irmãos, esforçai-vos cada vez mais por assegurar com boas obras a vossa vocação e eleição, porque deste modo não pecareis jamais. E assim vos será largamente oferecida a entrada no reino eterno de Nosso Senhor Jesus Cristo. (2 Pedro 1, 10-11) Oração: Pai santo, Vós que ressuscitastes maravilhosamente a Cristo, Vosso Filho, fazei que os nossos defuntos cheguem a plenitude da vida. 12. Oração, jejum, esmola. É boa a oração feita com verdade e a esmola, acompanhada pela justiça. Melhor é pouco com justiça, do que muito com iniquidade. Melhor é dar esmolas do que acumular tesouros, pois a esmola livra da morte e limpa de todo o pecado. Os que praticam a misericórdia e a justiça serão cumulados de felicidade. (Tob 12, 8-9) “Há três coisas pelas quais se confirma a fé, se fortalece a devoção e se mantém a vontade: a oração, o jejum e a misericórdia. O que pede a oração, alcança-o o jejum e recebe-o a misericórdia. Oração, jejum e misericórdia: três coisas que são uma só e se vivificam mutuamente. O jejum é a alma da oração e a misericórdia é a vida do jejum. São inseparáveis. Quem pratica apenas uma das três, ou não as pratica todas simultaneamente, na realidade não pratica nenhuma delas. Portanto, quem ora jejue; quem jejua, pratique a misericórdia. Quem deseja ser atendido nas suas orações, atenda as súplicas de quem lhe pede, pois aquele que não fecha os ouvidos às súplicas alheias, abre os ouvidos de Deus às suas próprias súplicas. Quem jejua seja sensível à fome dos outros, se quer que Deus seja sensível à sua. Seja misericordioso se espera alcançar misericórdia; compadeça-se se pede compaixão; dê generosamente se pretende receber. Muito mal suplica quem nega aos outros o que pede para si! Homem, sê para ti mesmo a medida da misericórdia! Deste modo alcançarás misericórdia como quiseres, quanto quiseres e com a prontidão que quiseres! Façamos, portanto, destas três virtudes - oração, jejum e misericórdia - uma única força mediadora junto de Deus em nosso favor! O jejum não dá fruto se não for regado pela misericórdia. Por muito que cultive o coração, purifique a carne, extermine vícios e semeie virtudes, nenhum fruto recolherá quem jejua, se não abrir os caudais da misericórdia. A liberalidade da tua misericórdia encherá de bens os teus celeiros. Portanto, distribui aos outros para que venhas a recolher; dá a ti mesmo, dando aos pobres, porque o que deixares de dar aos outros também tu o não possuirás!”98 Dai e dar-se-vos-á: Uma boa medida, cheia, a transbordar. Com a medida com que medirdes, vos será medido.99 Exemplo: 1. Santa Teresa e o jovem fidalgo 98 99 Cf. S. PEDRO CRISÓLOGO, Sermão 43, PL 52, 320-332, in Liturgia das Horas, vol.2 , 214-215 Lc 6,38. 43 Santa Teresa de Jesus conta-nos que um jovem fidalgo, D. Bernardino Mendoça, lhe ofereceu uma casa que tinha uma horta boa e espaçosa para fundar um mosteiro. Quis fazer imediatamente a doação da propriedade, que era de grande valor e ela, vendo tão boa vontade, aceitou. Entretanto, este cavalheiro adoeceu gravemente, perdeu a fala e não pôde confessar-se. Contudo, deu muitos sinais de que pedira perdão ao Senhor. Morreu dentro de poucos dias. O Senhor disse-lhe que a salvação deste homem correra grande risco e que tinha usado de misericórdia com ele por causa do obséquio feito a sua Mãe, dando aquela casa para mosteiro da sua ordem. Contudo, não sairia do Purgatório enquanto não se celebrasse a primeira Missa nesse convento. Santa Teresa procurou fundar em Valhadolid o Mosteiro da Conceição de Nossa Senhora do Carmo o mais rapidamente possível, mas não foi tão depressa como desejava. Estando um dia em oração, em S. José de Medina del Campo, disse-lhe o Senhor que se apressasse, pois aquela alma estava padecendo muito. A Santa meteu mãos à obra e entrou em Valhadolid, no dia de S. Loureço. Passados dias, obteve licença para celebração da missa no lugar destinado à igreja. Escutemos o que ela nos escreveu: «Estava bem longe de supor que então se havia de cumprir o que me tinha sido dito acerca daquela alma. Quando o sacerdote, com o Santíssimo nas mãos, chegou ao lugar onde devíamos comungar, vi junto dele, no momento em que eu ia receber a Comunhão, o cavalheiro de que falei, com rosto resplandecente e alegre. De mãos postas agradeceu-me o que fizera para que saísse do purgatório e lá partiu aquela alma para o Céu.» «Muito grande é o agrado de Nosso Senhor por qualquer serviço que se preste a Sua Mãe e a Sua Misericórdia não tem limites!»100 2. Morte de Santa Teresa de Jesus No dia 15 de Outubro de 1582, Santa Teresa de Jesus voou para o Céu, ao encontro da felicidade dos Santos. Em jovem, entrou no convento das Irmãs Carmelitas em Ávila. Foi aí que, muitos anos mais tarde, se sentiu abrasada no fogo do amor divino: um Serafim trespassou-lhe o coração com um dardo inflamado. A sua fé tornou-se tão grande, que a fazia exclamar: “Por qualquer verdade da Igreja ou da Sagrada Escritura, eu daria mil vidas.” O mesmo afirmava em relação à conversão dos pecadores: “Por uma só destas almas que se perdem daria eu mil vidas, se as tivesse.” Foi na Eucaristia que ela encontrou a fonte e o alimento da sua fé inquebrantável. Acerca deste mistério divino, escreveu: “Oh, quão doce é ver o Pastor convertido em Cordeiro. É Pastor porque nos apascenta, é Cordeiro porque Ele mesmo é alimento.” Não tinha medo de morrer. Quando ouvia o sino tocar, dizia como quem reza: “Senhor, já são horas de nos vermos!” Também afirmava com convicção: “Ó morte, não sei quem possa temer-te porque em ti está a Vida.” Depois de muitos trabalhos, exausta e cansada, deixou a cidade de Burgos onde fundou um novo Carmelo e regressava a Ávila, para o convento de S. José, o primeiro dos muitos, que fundou. O Padre Provincial pediu-lhe que se dirigisse a Alba de Tormes, onde chegou, no dia de S. Mateus, 21 Setembro de 1582, às 18 horas. Chegou tão cansada, que se foi deitar. Exclamou: “Deus me assista, minhas filhas. Sinto-me completamente extenuada. Há mais de 20 anos que não me deitava tão cedo.” Um pouco mais tarde, chegou o Provincial que a ouviu de confissão e lhe deu a 100 S. TERESA DE JESUS, Fundações, o.c., cap.10,1-5. 44 Santa Unção. No seu último discurso, disse às Irmãs: “Senhoras e minhas filhas, perdoai os maus exemplos que recebestes desta má freira.” Perguntaram-lhe se queria ser enterrada em Ávila. Respondeu com bom humor, perguntando: “Mas aqui não terão um pouco de terra que me emprestem até ao Dia do Juízo?” Estas foram as suas derradeiras palavras ditas antes de comungar, pela última vez: “Ó Senhor e Esposo meu, é chegada a hora, há tanto desejada. Já é tempo de caminhar. Em boa hora seja. Agora começa o tempo em que nos veremos face a face. Enfim, Senhor, morro filha da Igreja.” Foi então que às Irmãs lhes pareceu ver Jesus, Maria e José acompanhados de uma multidão de Anjos e de Santos que receberam a alma puríssima de Teresa de Jesus, que voou para o Céu, como uma pomba branca. Entretanto, o seu corpo exalava um perfume virginal que se fazia sentir em todo o convento. Até a natureza deu testemunho da santidade desta mulher admirável: uma amendoeira, que estava no claustro e tinha secado há muito tempo, cobriu-se de flores! (conf. Música calada em oração, ed. Padres carmelitas descalços de Portugal) Oremos: Deus nosso Pai, conduzi os defuntos à luz em que habitais para que possam contemplar-Vos eternamente no Céu. Irmãos, não tenhais qualquer dívida a ninguém, senão a de vos amar uns aos outros, pois quem ama o próximo cumpre a lei. A caridade é o pleno cumprimento da lei! (Rom 13,8.10) 13. Reparte o teu pão com o faminto «Reparte o teu pão com o faminto e dá pousada aos pobres sem abrigo.» (Is.58,7) “Imita a terra, ó homem! Produz fruto como ela para não pareceres inferior às coisas inanimadas. A terra produz os seus frutos não para usufruir deles, mas para teu proveito. Tu, porém, podes recolher os frutos da tua beneficência, uma vez que a graça e o prémio das boas obras revertem em benefício dos que as fazem. Se deste ao faminto, volta para ti o que deste e volta com acréscimo. Assim como o grão de trigo, ao cair na terra, produz fruto em favor de quem o lançou, também o pão que dás ao faminto te proporcionará, no futuro, grandes benefícios. Virá o momento em que terás de abandonar as riquezas, quer queiras quer não; e levarás, então, à presença do Senhor a glória adquirida com tuas obras. Quando te apresentares diante do Juiz Universal, todo o povo proclamará a tua generosidade, beneficência e liberalidade. Há quem desbarate as suas riquezas nos teatros, nas comédias, nos cinemas, no desporto e tudo isso por uma glória momentânea, pelo ruído do aplauso do povo! E tu serás avaro quando se trata de despesas que te podem alcançar tão grande glória? Receberás a aprovação de Deus, o louvor dos Anjos e a bênção de todos os homens; em recompensa pela administração de bens corruptíveis, receberás a glória eterna, a coroa de justiça, o reino dos Céus. Será possível que fiques indiferente ante estes bens imortais e prefiras a avidez dos bens terrestres? Vamos! Reparte generosamente as riquezas, sê generoso e magnânimo em fazer despesas a favor dos pobres. Não digas, não tenho nada, não posso dar nada, porque sou pobre. És pobre e indigente de todo o bem: pobre de amor, 45 pobre de humanidade, pobre de fé em Deus, pobre de esperança nas realidades eternas.”101 Assim se manifestou o amor de Deus para connosco: Deus enviou ao mundo o seu Filho Unigénito como vítima de expiação pelos nossos pecados!102 “Deus entregou o Seu Filho; e nós nem sequer damos pão Àquele que por nós se entregou à morte? O Pai, por nosso amor, não poupou o seu próprio Filho; e nós vendo-o desfalecer de fome não O socorremos? Haverá maior iniquidade do que esta? Por nosso amor foi entregue; morreu por nós; por nosso amor anda faminto; o que damos pertence-lhe, mas o ganho é nosso. Nem assim nos resolvemos a dar?”103 Nisto conhecemos o amor de Deus: Ele deu a vida por nós e nós devemos também dar a vida pelos nossos irmãos. Se alguém possui bens deste mundo e ao ver seu irmão passar necessidade lhe fecha o coração, como pode estar nele o Amor de Deus? Meus filhos, não amemos com palavras e com a língua, mas com obras e em verdade.104 Quem se compadece do pobre empresta a Deus!105 Jesus identifica-se com os pobres. Ao rezarmos pelos pobres irmãos defuntos, consolamos o coração de Deus. Podemos repetir muitas vezes esta oração: “Dai-lhes, Senhor o eterno descanso, entre os esplendores da luz perpétua. Que descansem em paz. Amen.” Como pode um Rei esquecer alguém que tirou do cárcere o seu filho? Não somos nós filhos de Deus? Que recompensa para aquelas pessoas que cheias de compaixão, procuram socorrer os filhos de Deus que se purificam no Purgatório, a fim de os colocar nos braços de Deus Pai!106 Exemplo: 1. Chiara Lubic, Palavra de Vida “Nunca lhe aconteceu receber um presente de um amigo e sentir a necessidade de retribuir? Provavelmente sim. Se isto acontece connosco, imaginemos como será com Deus, que é Amor (1 João, 4,8). Deus retribui todo bem que fazemos ao nosso próximo, em seu nome. É uma experiência que os verdadeiros cristãos fazem constantemente. Eu poderia citar mil exemplos a este respeito. Então perceberíamos melhor como é verdadeiro este ensinamento de Jesus (Lucas 6,38): “Dai e ser-vos-á dado: uma boa medida, cheia, calcada, a transborda.» Já anoitecera na cidade de Roma. E num apartamento, um pequeno grupo de moças, que queriam viver segundo o Evangelho, preparava-se para dormir. Mas a campainha soou. Quem seria àquela hora? Era um homem em pânico, desesperado: no dia seguinte, seria despejado de casa com toda a família, porque não tinha como pagar o aluguer. As jovens entreolharam-se e, de comum acordo, abriram a gaveta onde guardavam o que tinha sobrado de seus ordenados e uma reserva para pagar as contas do gás, do telefone e da luz. Deram tudo àquele senhor, sem raciocinar. Naquela noite, dormiram felizes. Alguém haveria de pensar nelas. O dia ainda não tinha clareado, 101 S. BASÍLIO MAGNO, Homilia sobre a caridade, 3,6; PG 31 31,266-267,275, in Liturgia das Horas, vol. 3, 558. 102 Cf. 1 Jo 4, 9-11 103 S. JOÃO CRISÓSTOMO, Homilia15,6: PG 547-548, in Liturgia das Horas, Vol. 4, 1740. 104 1 Jo 3,16-18. 105 Prov 19,17. 106 Cf. OLIVEIROS DE JESUS REIS, Purgatório, 7. 46 quando o telefone tocou: Era a voz daquele senhor da noite anterior, dizendo que ia apanhar um táxi e que chegaria em breve. Surpreendidas com o facto de ele vir de táxi, as jovens ficaram à sua espera. Então o homem contou o que tinha acontecido: - Ontem à noite, logo que cheguei a casa, entregaram-me uma pequena herança que nunca imaginaria receber. O meu coração diz-me que devo dividi-la ao meio convosco. A importância correspondia exatamente ao dobro do que generosamente haviam dado. Já alguma vez teve essa experiência? Se ainda não, lembre-se de que é preciso dar desinteressadamente, a quem quer que lhe peça, sem esperar nada em troca. Experiente, não para ver o resultado, mas sim para amar a Deus. Alguém poderá dizer: “Mas eu não tenho nada”. Não é verdade. Se quisermos, temos tesouros inesgotáveis: nosso tempo livre, nosso coração, nosso sorriso, nosso conselho, nossa cultura, nossa paz. Outros dirão ainda: “Mas não sei a quem dar”. Olhe ao seu redor: lembra-se daquele doente no Hospital, da senhora viúva sempre só, daquele amigo desanimado e sem rumo; lembre-se daquele jovem desempregado, sempre triste; daquele amigo na prisão; daquele aprendiz hesitante… É neles que Jesus Cristo espera por si. Assuma o comportamento novo do cristão. Renuncie a depositar a sua segurança nos bens terrenos para se apoiar em Deus. Muitos outros, vendo os pequenos milagres que a nossa caridade desencadeia, farão o mesmo. Deus age assim para que, quanto mais tivermos, mais possamos dar; para que, como verdadeiros administradores dos bens de Deus, se possa dizer de nós o que se dizia da primeira comunidade de Jerusalém: “Não havia necessitados entre eles.”(Act 2,24) Não sente que, agindo dessa forma, estaremos a dar um espírito seguro à revolução social que o mundo espera? Dai e darse-vos-á! (Luc 11,9) Certamente Jesus pensava, acima de tudo, na recompensa que teremos no Paraíso: «Serás feliz por eles não terem com que te retribuir; ser-te-á retribuído na ressurreição dos justos.» (Luc 14,14) O que acontece agora na terra, já é prelúdio e garantia da vida eterna, no Céu. ("Palavra de vida", Out 2008, Movimento dos Focolares.) 2. A conversão de Pranzini Santa Teresinha do Menino Jesus manifestou uma grande caridade para com os defuntos. Já no fim da vida, quando a dispensaram de vários exercícios de piedade, por causa do agravamento da doença e das contínuas hemoptises, pediu como uma graça que, ao menos, lhe dessem licença para continuar rezando pelas almas do Purgatório: «Não me impeçam de dizer os meus pequenos ofícios pelos mortos. É tudo o que posso fazer pelas irmãs que estão no Purgatório! É tão pouco o que posso fazer por elas!” No Carmelo, devido ao voto de pobreza, não podia dispor de dinheiro, mas sempre que a família lhe oferecia algum, pedia licença para o aplicar, mandando celebrar a Santa Missa pelos defuntos, especialmente pelo célebre assassino Pranzini, que ela por suas orações e sacrifícios converteu, arrancando-o ao inferno e reconciliando-o com Deus, no momento em que a sua cabeça ia ser cortada pela guilhotina. Eis o que ela escreveu: «Tudo levava a crer que morreria impenitente. Quis a todo o custo impedi-lo de cair no Inferno… Empreguei todos os meios imagináveis. Sabendo que por mim mesma nada podia, ofereci a Deus todos os méritos infinitos de Nosso Senhor, os tesouros da Santa Igreja. Sentia no fundo do coração a certeza de 47 que os meus desejos seriam satisfeitos. Disse a Deus que estava bem certa de que Ele perdoaria ao infeliz Pranzini e que acreditaria, mesmo que ele não se confessasse; eu tinha uma confiança sem limites na misericórdia de Jesus! Pedia-Lhe apenas um sinal de arrependimento, a fim de obter coragem para continuar a rezar pelos pecadores e para minha consolação. “No dia imediato ao da execução do réu, abro sofregamente o periódico La Croix… Ah! As lágrimas traíram-me a emoção… Pranzini não se tinha confessado. Subira ao cadafalso e preparava-se para meter a cabeça no macabro buraco, quando de repente, levado por uma súbita inspiração, volta-se, agarra o Crucifixo que o sacerdote lhe apresentava e beija por três vezes as suas sagradas chagas! Depois a sua alma foi receber a sentença misericordiosa d’Aquele que declara que no Céu haverá mais alegria por um só pecador que se arrepende do que por noventa e nove justos que não têm necessidade de se arrepender. (Luc 15, 7) Obtivera o sinal pedido: os lábios do «meu primeiro filho» foram colar-se sobre as sagradas chagas! Que resposta inefavelmente doce!”107 3. Santa Catarina de Sena Pela sua grande caridade Santa Catarina converteu uma pecadora chamada Palmerina, a quem dedicara uma terna e caritativa protecção e ajuda. No entanto, esta mulher concebeu uma secreta aversão pela sua benfeitora, que degenerou num ódio implacável. A ingrata Palmerina chegou ao ponto de levantar calúnias acerca da boa reputação da santa, que, entretanto, fez tudo para a reconciliar. Vendo que a sua amabilidade, humildade e bondade apenas serviam para excitar a fúria da desafortunada mulher, começou a implorar a Deus que Se encarregasse Ele próprio de converter tão obstinado coração. Entretanto, aproximava-se o fim e a doente não dava sinais de arrependimento. Sabendo disto, Santa Catarina derramou uma torrente de lágrimas. Estava inconsolável e não cessava de suplicar a Deus rezando e jejuando: “Ó Senhor, permites que esta alma se perca por minha causa? Por favor, salva-a a qualquer preço. Não é ela, mas eu que mereço o castigo. Pela Vossa Bondade e Misericórdia, meu Salvador, não permitais que morra fora da Vossa graça.” A sua oração foi atendida. A agonia prolongou-se por mais três dias e três noites. Durante este tempo, a santa continuou a interceder, ganhando a vitória. Deus enviou um raio de luz celeste, que penetrou o coração da moribunda, fazendo-a ver o seu pecado, movendo-a ao arrependimento. Santa Catarina apressou-se a visitá-la. Ao vêla chegar, a doente mostrou-se amável, respeitosa, pediu perdão das suas faltas, recebeu com devoção a Unção dos Doentes e morreu na graça de Deus. Esta pecadora tinha escapado ao Inferno, mas teria que sofrer um severo Purgatório. Sana Catarina fez tudo quanto estava ao seu alcance para apressar a sua entrada na glória do Paraíso. Em recompensa o próprio Salvador mostrou à sua serva a gloriosa conquista da sua caridade: era tão brilhante a beleza dessa alma que não há palavras para a descrever! Jesus acrescentou: “Vê como é bela e preciosa. Se Eu, que sou a beleza suprema, fiquei deslumbrado pela beleza das almas ao ponto de descer à terra e morrer para as salvar, não deveríeis vós trabalhar uns pelos outros a fim de ninguém se perder?” (Purgatory, p 268-270) 107 S. TERESA DO MENINO JESUS, História de uma Alma. Manuscritos Autobiográficos, ed. Carmelo, Paço de Arcos 1996, 135-137. 48 Nenhuma palavra má saia da vossa boca, mas somente a palavra boa que possa edificar na fé e fazer bem aos que vos ouvem. Não contristeis o Espírito de Deus que vos assinalou para o dia da redenção. Seja eliminado do meio de vós tudo o que é azedume, cólera, indignação, maledicência e toda espécie de maldade. Sede misericordiosos e compassivos uns para com os outros, perdoando-vos mutuamente, como Deus também vos perdoou em Cristo. (Efésios 4, 29-32) Em vida, irmão, em vida... Se queres feliz fazer Alguém a quem queiras muito... Diz-lhe, hoje, o teu querer Fá-lo em vida, irmão, em vida... Se desejas dar uma flor, Não esperes que ela murche Manda-lha hoje, com amor... Fá-lo em vida, irmão, em vida... Se desejas dizer "gosto de ti" À gente da tua casa, que te é querida, Ao amigo perto ou longe, Fá-lo em vida, irmão, em vida... Não esperes pela sepultura Das pessoas, para as amar E dar-lhes a sentir a tua ternura Fá-lo em vida, irmão, em vida... Ser venturoso mereces Se aprenderes a fazer felizes A todos os que conheces Em vida, irmão, em vida... Nunca visites panteões Nem enchas tumbas de flores Enche de amor corações Em vida, irmão, em vida... (Anamaria Rabatté, poetisa mexicana) Oremos: Eterno Pai, pela dolorosa Paixão de Vosso Filho, tende misericórdia das almas do purgatório. Dai-lhes, Senhor o eterno descanso. 14. O caminho da luz Em Vós, Senhor está a fonte da vida na vossa luz veremos a luz! (Sal 35,9) 49 “O caminho da luz é este: se alguém quiser chegar ao lugar determinado, esforce-se por atingi-lo com as suas obras. O conhecimento que nos foi dado para andar este caminho é o seguinte: ama aquele que te criou; adora Aquele que te formou; dá glória Àquele que te remiu da morte. Sê simples de coração e rico de espírito; não te juntes com os que seguem o caminho da morte; odeia tudo o que não é agradável a Deus; despreza toda a hipocrisia; não abandones os mandamentos do Senhor. Não te exaltes a ti próprio, mas sê humilde em tudo; não atribuas a glória a ti mesmo. Não maquines o mal contra o teu próximo; não admitas a arrogância no teu espírito. Ama o teu próximo mais que a tua própria vida. Não cometas o aborto, nem mates o recém-nascido. Não descuides a educação dos teus filhos, mas ensina-lhes desde a infância o temor de Deus. Não cobices os bens do teu próximo, nem sejas avaro; não te juntes com os soberbos, mas frequenta a companhia dos humildes e dos justos. Aceita como um benefício tudo o que te acontece na vida, consciente de que nada acontece sem a permissão de Deus. Não sejas inconstante, nem hipócrita, porque a hipocrisia é um laço mortal. Põe à disposição do teu próximo todos os teus bens e não consideres coisa alguma exclusivamente tua. Pois se todos sois comparticipantes dos bens incorruptíveis quanto mais deveis sê-lo dos bens corruptíveis. Não sejas precipitado no falar, porque a boca é um laço mortal. Com toda a diligência procura ser casto para bem da tua alma. Ama como a pupila dos teus olhos aquele que te anuncia a palavra de Deus. Recorda dia e noite o juízo final. Procura constantemente a companhia dos santos, quer tenhas de conversar, ou exortar, ou reflectir como poderás salvar uma alma com a tua palavra, quer tenhas de trabalhar com as tuas mãos para expiar os teus pecados. Não hesites em dar, nem dês de má vontade: recorda quem é aquele que dá a justa recompensa. Guarda os mandamentos! Odeia o mal! Julga com justiça! Não provoques desavenças! Restabelece a paz, reconciliando os adversários. Confessa os teus pecados! Não vás para a oração de má consciência! Este é o caminho da luz!”108 Mestre, que hei-de fazer para alcançar a vida eterna? Cumpre os Mandamentos se queres entrar no caminho da vida!109 Façamos o mesmo: Amar a Deus com todo o coração e ao próximo como a nós mesmos, é o pleno cumprimento da lei, é o caminho rápido, certo e seguro para a Pátria celeste! Exemplo: Estando Santa Margarida Maria em orção, diante do Santíssimo Sacramento, apareceu-lhe uma pessoa, toda em fogo, cujos ardores a penetraram profundamente. O seu lastimoso estado mostrava que estava a sofrer no Purgatório. Disse-lhe que era o religioso beneditino que a tinha ouvido de confissão e a tinha mandado comungar. Depois explicou as razões do seu sofrimento. A primeira razão de suas grandes penas era o ter preferido o próprio interesse à glória de Deus, com o demasiado apego à reputação. A segunda razão era a falta de caridade com seus irmãos. A terceira era a 108 109 Epistola de Barnabé, cap. 19,1-3.5-7.8-12: Funk 1,53-57; in Liturgia das Horas, vol. 4,143. Lc 18,18-22 50 demasiada afeição natural que tinha às criaturas, dando mostras disso no trato espiritual, o que muito desagrada a Deus. É impossível explicar o que a Santa teve de sofrer! A sua Superiora, cheia de compaixão impunha-lhe boas penitências. No fim de três meses viu-o ir inundado de alegria e glória gozar da eterna felicidade.110 2. Morte de S. João da Cruz S. João da Cruz nasceu em Fontiveros, perto de Ávila, em Espanha, no seio de uma família pobre, mas muito cristã e cheia de muito amor. Em pequeno, ficou órfão de pai, o que obrigou sua mãe a peregrinar de terra em terra, acabando por se fixar em Medina del Campo. Certo homem rico, vendo as qualidades de João, deu-lhe a possibilidade de estudar e de trabalhar no hospital. Aos 21 anos de idade, entrou no convento dos carmelitas, como prova do seu amor e gratidão à Virgem Maria, que o livrou de alguns perigos de morte, na sua infância. Em 1567, conheceu Santa Teresa de Jesus, que o convidou para ser o primeiro carmelita descalço. No Verão de 1568, vestindo já o hábito de carmelita descalço, dirigiu-se para Duruelo, onde preparou o primeiro convento da nova família. Passou a chamar-se Frei João da Cruz. Em 1585, esteve em Lisboa onde, pela primeira vez, contemplou o mar que o encantou e atraiu profundamente. Em Junho de 1591, frei João parte para o convento de La Peñuela, pensando que seria enviado para as missões no México, como desejava, mas uma perna inflamou-se-lhe a tal ponto que adoeceu gravemente. Era a cruz preparada para o final do caminho, que o devia conduzir "a outras Índias melhores e mais ricas de tesouros eternos", dizia ele. De La Peñuela passou para Ubeda. A doença agravou-se, provocando dores atrozes nos seus últimos dias. Antes de uma operação dolorosíssima, comentou: "Cortem quanto for preciso; em boa hora a Vontade do meu Senhor Jesus Se faça." No dia 7 de Dezembro, a febre aumentou e o seu estado de saúde agravou-se. Perguntou: "Que dia é hoje?” Ouvida a resposta, o doente voltou-se para uma imagem de Nossa Senhora e exclamou com entusiasmo: “Bendita sejais, Senhora, que no vosso dia, Sábado, quereis que eu parta desta vida!” Os que estavam presentes ficaram a saber que morreria no Sábado seguinte, dia de nossa Senhora. A partir desse dia, perguntava diariamente: "Que dia é hoje?" No dia 10, teve a visita do médico; conhecendo a gravidade da situação pediu que informassem o doente de que a morte se ia aproximando, que a sua vida se estava a apagar. Frei João, juntando as mãos, exclama cheio de alegria: “vou morrer? Que alegria quando me disseram vamos para a casa do Senhor!” (salmo 121) Aproxima-se a hora da partida. Mais uma vez, como nas outras manhãs, fez a pergunta e responderam-lhe: "Dia 13, Sexta-feira". Durante o dia perguntou insistentemente as horas, dizendo que nesse dia tinha de ir cantar matinas no Céu. O superior veio visitá-lo. Quando chegou, Frei João da Cruz pediu perdão por todos os incómodos que a sua doença causou à comunidade e acrescentou: "Nosso Padre, está ali o hábito da Virgem que eu usei. Sou pobre e nada tenho. Suplico-lhe, por amor de Deus, que mo dê, por esmola, para o meu corpo ser nele amortalhado." À uma hora da tarde, justificou a razão da pergunta habitual: "Perguntei porque Deus quer que eu vá cantar as matinas ao Céu". Às cinco da tarde, ouvindo o sino 110 S. MARGARIDA MARIA ALACOQUE, Autobiografia, nº 98. Braga. 51 chamar para a oração, diz: "Ditoso sou eu, Senhor, que sem o merecer, quereis que esta noite Vos vá ver ao Céu." Recebeu a Unção dos Doentes com alegria e devoção, na presença dos religiosos e seculares. Às dez horas, disse com entusiasmo: "Pela bondade do Senhor tenho de ir hoje rezar matinas com a Virgem Nossa Senhora, ao Céu." Depois das onze horas, os religiosos vão entrando na cela e, às 11.30, frei João, com o rosto radiante de alegria, diz a frei Pedro: "Chama os Padres porque já se aproxima a hora." Cantados os salmos, frei João pediu para comungar. Adorando profundamente Jesus no Santíssimo Sacramento, declarou: "Senhor, já não tenho porque voltar a ver-Vos com os meus olhos mortais." Quiseram rezar a encomendação dos moribundos, mas S. João da Cruz interrompeu: “Por amor de Deus, isso não é preciso. Leiam antes o livro do Cântico dos Cânticos.” Começada a leitura, o santo exclamou: "Oh que preciosas margaridas tem o Céu." O sino toca as doze badaladas da meia-noite e frei João pergunta: "Porque toca o sino?" Ouvindo a resposta, abriu os olhos como que a despedir-se de todos e disse com voz alegre e gozosa: "Glória a Deus. Vou rezar matinas para o Céu. Nas Tuas mãos, Senhor, entrego o meu espírito." Beijou o crucifixo que tinha nas mãos e, sorrindo, no primeiro minuto do dia 14 de Dezembro de 1591, Sábado, dia de Nossa Senhora, chegou ao fim da “Subida do Monte Carmelo”. Foi cantar matinas para o Céu, aos 49 anos de idade. Uma voz percorreu a cidade gritando: "Morreu Frei João da Cruz." Uma multidão de gente entrou no convento para venerar o corpo que, entretanto, ficara rosado, luminoso, e exalando um aroma precioso. Oração: Senhor Jesus, que vos compadecestes dos que choravam e enxugastes as suas lágrimas, salvai os nossos irmãos defuntos e dai-lhes a plenitude da redenção. Eclesiástico (11, 26-28) No dia da morte, é fácil a Deus dar a cada um segundo as suas obras. Na morte do homem serão conhecidas as suas obras. Um homem conhece-se pelo seu fim. 15. O Purgatório é doutrina de fé na Igreja católica. Deus dará a cada um segundo as suas obras! (Rom 2,6) O cristão que une a sua morte à de Cristo encara o termo da sua vida como uma entrada na eternidade. Deixa este vale de lágrimas para poder «estar com Cristo». São cheias de suavidade e consolação estas palavras da Liturgia: «Parte ó alma cristã, em nome do Pai todo-poderoso que te criou, em nome de Jesus Cristo, Filho de Deus Vivo, que sofreu por ti; em nome do Espírito Santo que sobre ti foi derramado. Toma hoje o teu lugar na paz, fixa a tua residência com Deus na santa Sião, com a Virgem Maria, Mãe de Deus, com S. José, com os anjos e todos os santos de Deus (…) Volta para junto do teu Criador que te formou do pó da terra. Na hora em que a tua alma sair do corpo, venham ao teu encontro Maria, os Anjos e todos os santos de Deus (…) E possas ver o teu Redentor face a face.”111 111 Catecismo da Igreja Católica, 1020. 52 Os que morrem na graça e amizade de Deus, perfeitamente purificados vivem para sempre com Cristo, vêem a Deus face a face numa comunhão de vida com todos os eleitos: É a felicidade suprema e definitiva do Céu. Os que morrem na graça de Deus, mas não de todo purificados, embora seguros da salvação eterna, sofrem depois da morte uma purificação, a fim de obterem a santidade necessária para entrar na alegria da pátria celeste. A Igreja chama Purgatório a esta purificação final dos eleitos, que é absolutamente distinta do castigo dos condenados. Por isso vos digo: Todo o pecado ou blasfémia será perdoado aos homens, mas a blasfémia contra o Espírito não lhes será perdoada. E, se alguém falar contra o Filho do Homem, há-de ser-lhe perdoado; mas, se falar contra o Espírito Santo, não lhe será perdoado, nem neste mundo nem no futuro.» (Mt. 12,31-32). Com esta afirmação de Jesus podemos deduzir que certas faltas podem ser perdoadas neste mundo e outras no mundo que há-de vir.”112 O Purgatório não é um castigo, mas uma manifestação da misericórdia divina, que nos dá a possibilidade de uma purificação depois da morte: “Da parte de Deus, o Paraíso está sempre aberto. Deus é todo misericórdia: os Seus braços estão sempre abertos para nos receber na Sua glória. Por outro lado, a essência divina é de uma tal pureza e claridade que ultrapassa quanto possamos imaginar. A alma que tenha uma imperfeição, mesmo minúscula, prefere atirar-se em mil infernos para se purificar do que aparecer na presença de Deus. Assim, a alma lança-se no Purgatório, pois compreende que o Purgatório foi feito para tirar essas manchas. A alma compreende ainda que o Purgatório é uma manifestação da Misericórdia divina, oferecendo-lhe um meio de retirar tudo quanto a impede de estar na presença de Deus.” (Santa Catarina de Génova, Tratado sobre o purgatório, nº 9) Exemplo: Pai-nosso e Frei Conrado Nas Florinhas de S. Francisco de Assis vem contado um exemplo de oração por um frade jovem que se portava desordenadamente, cuidando pouco do Ofício Divino e demais observâncias regulares. Pouco depois de ter sido convertido pela caridade de Frei Conrado, este dito jovem morreu. Um dia, estando Frei Conrado em oração, apareceu-lhe a alma do jovem frade. Frei Conrado, cheio de alegria, confortou os irmãos, contando-lhes minuciosamente toda aquela visão: - Filho caríssimo que é feito de ti? - Caríssimo padre, pela graça de Deus e pelos vossos ensinamentos, estou bem, pois não fui condenado; mas por causa dos meus pecados, que não tive tempo de expiar suficientemente, padeço grandíssimas penas no Purgatório. Por isso, rogo-te, que, assim como por piedade, me socorreste quando era vivo, assim agora, te dignes socorrer-me em minhas penas, dizendo o Pai-Nosso por mim, algumas vezes. Então, Frei Conrado, cedendo benignamente aos seus rogos, recitou uma vez o Pai-nosso e o “Dai-lhes, Senhor o descanso eterno”. Disse-lhe aquela alma: - Ó caríssimo Padre, quanto bem e quanto alívio eu sinto! Peço que o digas mais uma vez. Frei Conrado assim fez e a alma lhe disse logo: Santo Padre, quando tu oras por mim, sinto um grande alívio; por isso, não cesses de rogar por mim. 112 S. GREGÓRIO MAGNO, in Catecismo da Igreja Católica, 1031. 53 Frei Conrado, vendo aquela alma tão favorecida pelas suas orações, rezou por ela cem vezes o Pai-nosso. - Eu te agradeço, Padre caríssimo, a caridade que usaste comigo. Pelas tuas orações vejo-me livre de todos os tormentos e vou para o reino celestial. (Fontes Franciscanas, 1100) 2. Pai da Beata Arcangela A beata Arcangela nasceu em 1460 em Trino, (Monteferrato-Itália). Foi Prioresa das Carmelitas em Parma e em Mântua. Consolava as irmãs enfermas com carinho maternal, animando-as a sofrer com resignação. Depois de penosa enfermidade, sentindo que ia morrer, reuniu as suas monjas para as exortar e lhes dar seus últimos conselhos. Expirou dizendo: “Jesus, tem piedade de mim”. Foi beatificada pelo Papa Pío IX. Esta santa carmelita tinha um extraordinário zelo pela libertação das almas do Purgatório, rezando por conhecidos e desconhecidos. Entretanto, seu pai, a quem amava ternamente, morreu. Desconsolada, percebeu que o seu querido pai precisava mais das suas orações do que das suas lágrimas. Decidiu-se a fazer especiais sufrágios e recomendações a Deus. Mas, na realidade, esta mulher tão piedosa e afeiçoada ao seu pai fez pouca coisa pela sua alma, porque Deus permitiu que ela se esquecesse dele. Na festa dos Fiéis Defuntos, rezando na sua cela, ela percebeu a razão do seu involuntário esquecimento: o seu Anjo apareceu-lhe, pegou-lhe na mão e conduziu-a, em espírito, ao Purgatório. No meio de muitas almas reconheceu a de seu pai, mergulhada num lago de água gelada. Ao ver a sua filha, aproximou-se dela, repreendeu-a pelo seu triste abandono nas suas orações e sufrágios. Arcangela ficou confundida com esta merecida repreensão; derramando uma torrente de lágrimas, replicou: “Meu querido pai, que Deus escute favoravelmente as minhas súplicas e o liberte do seu sofrimento.” O Anjo, trazendo-a de volta, disse-lhe que o seu esquecimento tinha acontecido por disposição divina: “Deus permitiu tudo isso para punir o pouco zelo que durante a vida ele tinha manifestado por Deus e pelos outros. O lago de gelo era o castigo pela sua frieza no serviço de Deus e pela indiferença pela salvação das almas. Este é um castigo que a Divina Justiça inflige àqueles que foram pouco fervorosos na caridade.” (Purgatory 266-267) Eis a verdade que Jesus, nosso Salvador, estabeleceu no Evangelho: Com a medida com que medirdes, sereis medidos. (Mt 7, 2) Oração: Senhor, Vós que permitis a destruição da nossa morada terrestre, concedei-nos a eterna morada do reino dos Céus. 16. Socorramos os defuntos O meu Redentor vive. Na minha carne verei a Deus. (Job 19,25) 1. “Segundo a fé católica, o Purgatório é um estádio de purificação dos restos de pecado, por que passam as almas dos que morreram na graça de Deus, até entrarem no Céu. Dizem-se benditas as “Almas do Purgatório” porque têm a salvação garantida, 54 aceitando com alegria a purificação total que compreendem necessária para a visão de Deus, face a face. Faz ainda parte da fé católica que as almas do Purgatório podem beneficiar dos sufrágios dos que ainda vivem, pelo que a Igreja recomenda que se reze por elas, se ofereça a missa por sua intenção e se alcancem indulgências em seu proveito. Tais recomendações encontram normalmente bom eco no povo de Deus, que até costuma elevar, pelos caminhos, pequenos monumentos a recordá-las, a que chama “Alminhas”. A doutrina católica sobre o Purgatório foi definida especialmente nos concílios de Florença e de Trento, com base no Antigo Testamento (II Macabeus 12,42-45) e no Novo Testamento (1Cor 3,15) (cf. Catecismo 1030-1031. D. Manuel Franco Falcão, Enciclopédia Católica Popular) 2. Quem pode calcular o número e a malícia dos nossos pecados, as manifestações de egoísmo, as palavras e os actos de sensualidade, de maledicência, de ira, de inveja, de preguiça e de outros pecados? E as omissões dos deveres que não cumprimos? Que dizer acerca da falta de zelo pela glória de Deus? E a nossa indiferença pelos que sofrem à nossa volta? Lembremo-nos do rico avarento que se banqueteava esplendidamente e nem sequer se apercebia do pobre Lázaro, que mendigava umas migalha à sua porta!113 Morre um doente. Nunca precisou tanto do nosso auxílio. E nós dizemos que não temos disposição para rezar, porque estamos alucinados pela dor. A Bíblia diz que Jesus chorou junto ao túmulo de seu amigo Lázaro. Jesus tinha um coração compassivo. Jesus orou pelo seu amigo, sepultado há quatro dias. “Pai, dou-te graças, por me haveres ouvido. Eu bem sei que sempre me ouves, mas eu disse isto por causa da multidão que está em redor, para que creiam que tu me enviaste. (João 11, 41-42) Um Pai-nosso rezado com devoção e humildade por quem morreu, vale mais que muitas coroas de flores; uma santa Missa celebrada pelo defunto, aproveita-lhe imensamente mais que um sumptuoso monumento no cemitério, porque a Eucaristia renova e actualiza para nós o santo sacrifício do Calvário. O espírito de um certo paganismo infiltrou-se na nossa sociedade. Hoje, há muitas coroas de flores e poucas orações. Muitas pessoas nem sequer guardam o silêncio religioso desse momento de despedida. Os primeiros cristãos sepultavam os defuntos, cantando salmos e recitando orações; os cristãos de hoje participam nos funerais por simples formalidade. Os nossos antepassados confiavam os defuntos com muito carinho à terra, como uma semente preciosa que havia de germinar, na futura ressurreição. Hoje, muitos enterros são quase destituídos de tudo que possa lembrar a vida eterna. Como nos deveria interpelar a pergunta de Jesus: O Filho do Homem, quando vier, encontrará a fé sobre a terra? (Lc18,8) 3. Devemos interceder sempre pelos nossos defuntos, sem nos persuadirmos de que “já estão no Céu”. Só Deus é juiz dos vivos e dos mortos; só Ele conhece se os nossos irmãos merecem ou não ser admitidos na Sua Presença. Portanto, não canonizemos depressa os mortos, mas sejamos solícitos em sufragá-los. S. Francisco de Sales tinha medo dos seus admiradores. Dizia ele: “essas pessoas, imaginando que depois da minha morte fui logo directo para o Céu, far-me-ão sofrer no Purgatório.” O Beato Frederico Ozanam, depois de passar uma dolorosa enfermidade, morreu, no ano de 1853. Foi beatificado em 1997, pelo Papa S. João Paulo II, durante o encontro mundial da juventude, em Paris. Este homem da caridade fraterna, fundador das conferências vicentinas, pedia a todos que rezassem por ele depois da 113 Lc 16, 19-31 55 sua morte: “Não vos deixeis levar por aqueles que dizem: ele já está no céu! Rezai por aquele que muito vos amou, mas que muito pecou. Com as vossas orações eu deixarei a terra com menos temor.” A Bíblia sublinha a importância da hora da morte. No dia da morte, o autor sagrado espera confiadamente um julgamento no qual serão revelados os méritos e as faltas, bem como a recompensa de todos os trabalhos, renúncias e mortificações: É fácil para o Senhor no dia da morte retribuir a cada um segundo as suas obras. Antes da morte não beatifiques ninguém, pois é no seu fim que se conhece o homem!114 Oração de Santa Gertrudes: Eterno Pai, eu vos ofereço o preciosíssimo sangue de Jesus, vosso divino Filho, em união com todas as Missas, que hoje são celebradas em todo o mundo, por todas as santas Almas do Purgatório e pela conversão dos pecadores. Exemplos: 1. Pai de S. Luís Beltrão Morreu com sentimentos de verdadeiro cristão o pai de S. Luís Beltrão. Este santo Dominicano rezou por ele durante muito tempo; depois, tranquilo, pensou que já estaria no Céu e deixou de rezar por ele. Imagine-se a dor do santo quando o pai lhe apareceu, suplicando-lhe que continuasse os sufrágios interrompidos. Oito anos depois, apareceu-lhe, resplandecente de glória, agradecendo-lhe os sufrágios! 115 S. Luís Beltrão nasceu em Valência, em 1526. Caracterizou-se pela humildade e obediência. Aos 18 anos ingressou na Ordem do São Domingos. Como professor dos noviços, São Luís ensinava os seus alunos a renunciar ao mundo para se unirem perfeitamente a Deus. Em 1562, foi enviado a pregar o Evangelho aos indígenas da América, na Colômbia. Só falava espanhol, mas Deus concedeu-lhe o dom das línguas, da profecia e dos milagres. Durante seu trabalho converteu milhares de indígenas. Depois de uma dolorosa enfermidade, morreu em Outubro de 1581 e foi canonizado em 1671. 2. Morte de Santa Mónica “Ao aproximar-se o dia em que ela ia partir desta vida - dia que Vós conhecíeis, mas nós ignorávamos - sucedeu que nos encontrávamos sozinhos, eu e ela, encostados a uma janela, cuja vista dava para o jardim interior da casa que nos hospedava, em Óstia, onde, afastados das multidões, depois da fadiga de uma longa viagem, retemperávamos as forças, antes de embarcarmos. Conversávamos a sós muito suavemente e interrogávamo-nos mutuamente, à luz da Verdade que sois Vós, qual seria a vida eterna dos Santos, que «nem os olhos viram, nem os ouvidos escutaram, nem jamais passou pelo pensamento humano»116. (…) Minha mãe acrescentou: «Filho, quanto a mim, já nada me dá gosto nesta vida. Não sei o que faço ainda aqui, porque já nada espero deste mundo. Havia só uma razão pela qual eu desejava prolongar um pouco mais esta vida: ver-te cristão católico, antes de eu morrer. Deus concedeu-me esta graça de modo superabundante, pois vejo que já desprezas a felicidade terrena para servires o Senhor. Que faço eu aqui?» 114 Ecl 11, 26.28. O’ SULLIVAN (E.D.M.), Como evitar o Purgatório, 3-4.9, ed. Corpo Santo, Lisboa, 1936. 116 1 Cor 2,9. 115 56 Não me lembro bem do que lhe respondi a respeito destas palavras. Entretanto, passados poucos dias, ela caiu doente com febre. (…) Perdeu os sentidos e não dava acordo dos presentes. Acorremos logo e depressa recuperou os sentidos; disse-nos como quem procura alguma coisa: «Onde estava eu?» Depois vendo-nos atónitos e cheios de tristeza disse: - Sepultareis aqui a vossa mãe. Eu estava calado e tentava conter as lágrimas. Meu irmão proferiu algumas palavras, mostrando a preferência de que ela não morresse num país estranho, mas na sua pátria. Ouvindo isto, censurou-o por pensar assim e, olhando para mim, disse: - Repara no que ele diz. E voltando-se para ambos disse: - Sepultai este corpo em qualquer lugar e não vos preocupeis com ele. Só vos peço que vos lembreis de mim diante do altar do Senhor, onde quer que estejais. Tendo feito estas recomendações o melhor que pôde, calou-se. Finalmente, no nono dia da sua doença, aos cinquenta e seis anos de idade e no trigésimo terceiro da minha vida, aquela alma piedosa e santa libertou-se do corpo.”117 A recordação deste pedido, vinte anos depois da morte, inspirou ao filho esta ardente oração: «Eis porque te peço, ó Deus do meu coração, pelos pecados de minha mãe. Que ela repouse na paz com o seu esposo. Inspira, Senhor aos teus servidores, meus irmãos, a quem sirvo pela pregação e pela escrita e que lerão estas linhas, que se recordem ao altar da tua serva Mónica.»118 3. Santo Inácio de Antioquia Santo Inácio foi o sucessor de S. Pedro no governo da Igreja. Condenado às feras, foi conduzido a Roma e aí, no tempo do imperador Trajano, recebeu a gloriosa coroa do martírio, no ano 107. Durante a viagem escreveu sete cartas a várias Igrejas: “Escrevo a todas as Igrejas e asseguro a todas elas que estou disposto a morrer de bom grado por Deus, se vós não o impedirdes. Peço-vos que não manifesteis por mim uma benevolência inoportuna. Deixai-me ser pasto das feras, pelas quais poderei chegar à posse de Deus. Sou trigo de Deus e devo ser moído pelos dentes das feras, para me transformar em pão limpo de Cristo. Rezai por mim a Cristo, para que, por meio desses instrumentos, eu seja sacrifício para Deus. Para nada me serviriam os prazeres do mundo ou os reinos deste século. Prefiro morrer em Cristo Jesus a reinar sobre todos os confins da terra. Procuro Aquele que morreu por nós; quero Aquele que ressuscitou por nossa causa. Estou prestes a nascer. Tende piedade de mim, irmãos. Não me entregueis ao mundo, a mim que desejo ser de Deus, nem penseis seduzir-me com coisas terrenas. Deixai-me alcançar a luz pura. Não queirais ter ao mesmo tempo o nome de Jesus Cristo na boca e desejos mundanos no coração. Estou a escrever-vos enquanto ainda vivo, mas desejando morrer. O meu Amor está crucificado e não há em mim fogo que se alimente da matéria. Mas há uma água viva que murmura dentro de mim e me diz interiormente: «Vem para o Pai». Não me satisfazem os alimentos corruptíveis nem os prazeres deste mundo. Quero o pão de Deus, que é a Carne de Jesus Cristo, nascido da linhagem de David, e por bebida quero o seu Sangue que é a caridade incorruptível. (Liturgia das Horas, IV, 17 Outubro) Uma lágrima pelos que morrem evapora-se. Uma flor sobre a campa logo murcha. 117 118 SANTO AGOSTINHO, Confissões, Livro 9,11. Ibidem, livro 9,13. 57 Uma oração, Deus a recolhe. (S. Agostinho) Oremos: Senhor Jesus, que vos compadecestes dos que choravam e enxugastes as suas lágrimas, salvai os nossos irmãos defuntos e dai-lhes a plenitude da redenção. Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: «Em verdade, em verdade vos digo: Se o grão de trigo, lançado à terra, não morrer, fica só; mas se morrer, dará muito fruto. Quem ama a sua vida, perdê-la-á, e quem despreza a sua vida neste mundo conservá-la-á para a vida eterna. Se alguém Me quiser servir, que Me siga, e onde Eu estiver, ali estará também o meu servo. E se alguém Me servir, meu Pai o honrará». Jo 12, 24-26 17. Jesus Cristo está presente nos pobres Vós, irmãos, fostes chamados à liberdade. Não abuseis, porém da liberdade como pretexto para viverdes segundo a carne, mas pela caridade colocai-vos ao serviço uns dos outros, porque toda a lei se encerra nesta palavra: Amarás o próximo como a ti mesmo. (Gal 5,13-14) Se alguém possui bens deste mundo e ao ver e ao ver seu irmão passar necessidade, lhe fecha o coração, como pode estar nele o amor de Deus? Meus filhos não amemos com palavras, nem com a língua, mas com obras e em verdade.119 S. João Crisóstomo escrevia assim aos cristãos do seu tempo: “Cristo não se contentou com sofrer a Cruz e a morte: quis também ser pobre e peregrino, andar errante e padecer no cárcere e suportar a enfermidade: tudo isso para nos chamar. Se não te sentes obrigado pelo que Jesus sofreu por ti, compadece-te da sua pobreza, da sua enfermidade ou da sua prisão. O que te pede não te custa muito: pão, abrigo, palavras de conforto. Decide-te ao menos pelos prémios que nos são oferecidos: O Reino dos Céus. Deixa-te comover pelo sentimento natural ao veres um nu e lembra-te da nudez que sofri na cruz por teu amor. Se não te comove a nudez do teu próximo, compadece-te ao menos, vendo nele a minha nudez e pobreza. Estive outrora preso por causa de ti e também agora o estou para que tu, movido por aquelas ou estas cadeias, tenhas por mim algum sentimento de compaixão. Jejuei por causa de ti e de novo passo fome por causa de ti. Tive sede quando estava suspenso na cruz e agora tenho sede na pessoa dos pobres: oxalá o meu passado ou o meu presente pudesse atrair-te a Mim e tornar-te compassivo para bem da tua alma! Obrigado assim por mil benefícios, peço-te que mos pagues; pelo pouco que me deres, dar-te-ei o reino. Não te digo: «Põe fim à minha pobreza!» Só te peço algum pão, alguma roupa e um pouco de consolação na minha necessidade. Este pouco bastará para que Eu te conceda o Reino dos Céus.»120 O Amor consiste nisto: não fomos nós que amámos a Deus, mas foi Ele que nos amou primeiro e enviou o Seu Filho como vítima de expiação pelos nossos 119 1 Jo 3,17-18. S. JOÃO CRISÓSTOMO, Homilia sobre a Epístola aos Romanos, Homilia 15,6: PG 60,547-548; in Liturgia das Horas, vol. 4, 1740. 120 58 pecados. Caríssimos, se Deus nos amou assim, também nós devemos amar-nos uns aos outros!121 “Ama e faz o que quiseres. Se calares, calarás com amor; se gritares, gritarás com amor; se corrigires, corrigirás com amor; se perdoares, perdoarás com amor. Se tiveres o amor enraizado em ti, produzirás frutos de amor.” (Santo Agostinho) Exemplos: 1. S. João Crisóstomo (crisóstomo significa “boca de ouro”) São João Crisóstomo, Doutor da Igreja, nasceu em Antioquia, no ano 348. Na sua juventude, sentiu forte atracção pela vida monástica; por duas vezes passou alguns anos no silêncio do deserto, mas por causa da falta de saúde teve de deixar a vida religiosa mais retirada. Famoso devido ao seu dom de comunicar a Palavra de Deus, foi eleito bispo de Constantinopla. Neste cargo de sentinela, revelou um grande zelo pela competência e formação do clero, exigindo vida de pobreza e simplicidade evangélica àqueles que deviam ser modelos e exemplos para o rebanho. Por causa da reforma dos costumes, tanto do clero, como dos fiéis e por causa das suas fervorosas e ardentes pregações contra o luxo e contra a imoralidade da vida social, São João Crisóstomo teve de partir para o exílio. Dizia ele: muitas vagas e fortes tempestades nos ameaçam, mas que havemos de temer? A morte? Para mim viver é Cristo e morrer é lucro (Fil 1,21). O exílio? Do Senhor é a terra e o que nela existe (salmo 23,1). Não recuso partir, hoje mesmo, para qualquer lugar! Sempre estou dizendo: Senhor, seja feita a vossa vontade (Mat 6,9) A confiscação dos meus bens? Nada trouxemos para este mundo e também nada daqui podemos levar (1 Tim 6,7). Jesus Cristo está comigo, a quem temerei? Os furores dos príncipes? Tudo isso é para mim mais desprezível que uma teia de aranha. Que diz a Escritura? Eu estou sempre convosco, todos os dias, até ao fim do mundo (Mat 28, 20) Os sofrimentos da longa viagem, feita debaixo de um sol escaldante e os maus-tratos recebidos, foram mortais! Cansado, desfalecendo de fome e de sede, São João Crisóstomo morreu no dia 14 de Setembro de 407. Eis as suas últimas palavras: "Glória seja dada a Deus, em tudo!". 2. S. Isabel da Hungria (1207-1231) Testemunho do director espiritual de Santa Isabel: “Santa Isabel começou muito cedo a distinguir-se na virtude. Em toda a sua vida foi a consoladora dos pobres. A dada altura, dedicou-se inteiramente aos famintos e junto de um seu castelo, mandou construir um hospital onde recolhia muitos enfermos e estropiados. Distribuiu largamente os dons da sua beneficência, não só a quantos ali acorriam a pedir esmola, mas em todos os territórios da jurisdição de seu marido, chegando ao ponto de gastar nessas obras de assistência todas as suas rendas e vendendo por fim, para utilidade dos pobres, todos os objectos de valor e vestes preciosas. Costumava visitar duas vezes por dia, de manhã e à tarde, todos os seus doentes, ocupando-se pessoalmente dos que apresentavam aspecto mais 121 1 Jo 4, 10-11. 59 repugnante. Dava de comer a uns, deitava a outros na cama, transportava outros aos ombros e dedicava-se a todo o género de serviço humanitário. Em Marburgo, construiu um hospital para receber doentes e aleijados dos quais sentou à mesa os mais miseráveis e desprezados. Apesar de todas estas actividades caritativas, raras vezes encontrei mulher mais dada à contemplação. Algumas religiosas e religiosos viram muitas vezes que, quando voltava do recolhimento da oração, o seu rosto resplandecia e os seus olhos brilhavam como raios de sol. Antes de morrer ouvi-a de confissão. Perguntando-lhe o que se devia fazer dos seus haveres e mobiliário, respondeu-me que tudo quanto parecia possuir era já dos pobres, desde há muito tempo e pediu-me que distribuísse tudo por eles, excepto a pobre túnica com que estava vestida e com a qual desejava ser sepultada. Depois recebeu o Corpo de Cristo e, até à hora de vésperas, falou do que mais a tinha impressionado na pregação. Por fim, encomendou devotamente a Deus os que lhe assistiam e expirou como quem adormece suavemente.”122 A sua misericórdia também se estendia aos fiéis defuntos. Conta-se que na sua oração, uma noite, viu em sonhos o infeliz estado em que se achava a rainha, sua mãe; levantou-se da cama, e pôs-se em oração, pedindo ao Senhor pelo seu descanso eterno. Algum tempo depois, numa segunda visão, apareceu-lhe, agradecendo, por a haver libertado das penas que padecia e assegurou-lhe que as suas orações eram sumamente agradáveis aos olhos de Deus. (Ano Cristão, vol XI, Sta Isabel, pág. 210) Aos vinte e quatro anos, Santa Isabel subiu ao céu para receber o prémio merecido por ter dado pão aos que tinham fome, dado água a tantos lábios sedentos, curado tantas feridas aos doentes e consolado tantos corações oprimidos. A Bíblia ensina . Dar esmola vale mais que juntar tesouros; a esmola livra do inferno; apaga os pecados; faz encontrar a misericórdia junto de Deus e alcança a vida eterna! (Tob 12,8-9) O fim de todas as coisas está próximo. Sede prudentes e vigiai. Mantende entre vós mútua e constante caridade porque a caridade cobre a multidão dos pecados! Exercei a hospitalidade sem murmuração.” (1 Ped 4,7-9) Oração: Senhor, que, pela vitória de Jesus Cristo, vosso Filho sobre a morte, O exaltastes no reino da glória, concedei aos nossos irmãos defuntos que, libertados desta vida mortal, possam contemplar-Vos para sempre como seu Criador e Redentor. 18. O dogma do Purgatório «É um santo e piedoso pensamento orar pelos defuntos para que sejam libertos dos seus pecados!» (2 Mac 12,45) A morte confirma a nossa última e definitiva decisão: quem viveu em comunhão com Deus e com os homens viverá a plenitude da alegria na casa do Pai celeste. Mas só os que estão completamente inflamados pelo fogo do amor divino serão capazes da comunhão com Deus. 122 CONRADO DE MARBURGO, Carta ao Sumo Pontífice, in Liturgia das Horas, Vol. 4, 1442. 60 «Deus concede a possibilidade de uma purificação depois da morte. É uma graça. Sem ela teríamos de permanecer para sempre no estado em que terminou a nossa vida. Em linguagem eclesiástica, chama-se Purgatório a esta purificação. Existe um Purgatório em que são purificados os que têm pecados veniais ou devem cumprir alguma pena temporal devida aos seus pecados.»123 No Concílio de Lião (1274), a Igreja professou a fé num estado de purificação depois da morte.124 O Concílio de Florença (1439) ensina: «Se os verdadeiros penitentes saírem deste mundo antes de terem satisfeito com frutos dignos de penitência pelas faltas cometidas, suas almas sofrerão as penas purificadoras depois da morte.»125 O Concílio de Trento (1546) declarou: «Existe o Purgatório; as almas ali detidas são ajudadas pelos sufrágios dos fiéis, de modo particular pelo sacrifício do altar. Manda o santo Concílio aos bispos para que a sã doutrina sobre o Purgatório, ensinada pelos Santos Padres e Sagrados Concílios seja acreditada, mantida e pregada por toda a parte aos fiéis cristãos.»126 O Antigo Testamento faz alusão à purificação dpois da morte. Segundo a descrição feita por 2 Mc12, 40-45, a fé na possibilidade de um perdão dos pecados depois da morte era um dado comum da comunidade pré-cristã: «É um santo e piedoso pensamento orar pelos mortos!» Judas Macabeu obteve uma admirável recompensa pelos sacrifícios que mandou oferecer pelos soldados mortos. A Bíblia diz que lhe apareceu Jeremias e Onias. Ganhou uma brilhante vitória, vencendo e matando o general inimigo, Nicanor. Exemplo: 1. Visão de Judas Macabeu Judas Macabeu contou aos seus soldados uma visão que teve durante um sonho, enchendo-os de alegria. Sua visão foi esta: Vira Onias, que fora sumosacerdote, homem valente e bondoso (…) estendendo as mãos, orando pela comunidade dos judeus. Depois apareceu outro homem, distinto em seu aspecto senil, nimbado por uma majestade veneranda. Era Jeremias, o profeta de Deus. Jeremias estendeu a direita para entregar a Judas uma espada de ouro. Ao entregá-la pronunciou estas palavras: Toma a santa espada, presente de Deus; com ela desbaratarás os inimigos!127 2. Sacrifício pelos pecados dos que tinham morrido Depois da festa de Pentecostes, Judas e os seus companheiros marcharam contra Górgias. Este saiu a campo com três mil soldados de infantaria e quatrocentos de cavalaria. Travou-se combate e morreram alguns judeus. Judas suplicou ao Senhor que fosse seu aliado e guia naquele combate. Depois de ter entoado na sua própria língua um canto de guerra, caiu inesperadamente sobre as tropas de Górgias e pô-las em debandada. Então Judas, reagrupando o exército, dirigiu-se para a cidade de Odolão. 123 M. SCHMAUS, o.c., 474. Dz 464. 125 Dz 693. 126 Dz 983. 127 2 Mac 15,11-30. 124 61 No sétimo dia, purificaram-se e celebraram o sábado. No dia seguinte, os soldados de Judas foram recolher os corpos dos que tinham sido mortos, para os sepultar com seus parentes nos túmulos de seus pais. E encontraram debaixo das túnicas dos mortos objectos que eram consagrados aos ídolos de Jâmnia, que a Lei proíbe aos Judeus. Assim se tornou claro para todos o motivo por que tinham perecido. Todos glorificaram o Senhor, justo juiz, que manifesta as coisas ocultas. Depois fizeram preces para que o pecado cometido fosse completamente perdoado. O valoroso Judas exortou a multidão a conservar-se sem pecado, vendo diante de seus olhos as consequências da falta dos que tinham morrido. Depois fez uma colecta de cerca de duas mil dracmas de prata e enviou-as a Jerusalém, para que se oferecesse um sacrifício pelos pecados dos que tinham morrido, praticando assim uma acção muito digna e nobre, inspirada na esperança da ressurreição. Se não esperasse que os que tinham sucumbido haviam de ressuscitar, teria sido em vão e supérfluo orar pelos mortos! Além disso pensava na magnífica recompensa que está reservada àqueles que morrem piedosamente. Era um santo e piedoso pensamento. Por isso mandou oferecer um sacrifício de expiação pelos mortos, para que fossem libertos do seu pecado!128 Oremos: Recebei, Senhor, as almas dos nossos irmãos defuntos, concedei-lhes o perdão e a vida eterna. 19. Podemos ajudar os irmãos que se purificam no Purgatório Graças ao Senhor pela sua misericórdia, pelos seus prodígios em favor dos homens: Tirou-os das trevas e da sombra da morte e despedaçou as suas cadeias! (Salmo 106,14-16) Chegará um dia, em que em que cessará para nós a luta terrena. Sabemos que podemos ajudar os irmãos que sofrem no Purgatório: «Creio na comunicação dos Santos»129, ou seja, confesso que há uma misteriosa influência e relação de auxílio entre os membros da Igreja que vivem na terra, os que estão na Pátria da felicidade e os que sofrem no Purgatório. Podemos aproveitar a força do amor, a Santa Missa, a oração e as obras de misericórdia para ajudar as almas que se purificam. Os filhos da Igreja peregrina na terra têm uma constante comunicação com as ondas da eternidade. Escreveu S. Bernardo: “O que nos falta podemos ir buscá-lo confiadamente ao coração misericordioso do nosso Salvador, porque é imensa a sua misericórdia. O nosso mérito está na misericórdia de Deus. Nunca seremos pobres de méritos enquanto Ele for rico de misericórdia: se são abundantes as misericórdias do Senhor, também são muitos os nossos méritos. “Cantarei eternamente as misericórdias do Senhor!”130 Enviar coroas de flores é uma atenção delicada, uma bela expressão de compaixão e de solidariedade para com os familiares dos defuntos. Mas que ninguém se iluda: de nada serve tudo isso para quem morreu. Mais cristão é o costume de rezar 128 2 Mac 12, 32-45. Catecismo da Igreja Católica, 957. 130 Cf. S. BERNARDO, Sermão 61,3-5, in Liturgia das Horas,Vol. 3, 191-192. Sal 88, 2. 129 62 pela pessoa falecida. Quem assim procede, dá provas de uma fé viva e sabe que “Junto do Senhor está a misericórdia. Junto do Senhor existe a abundância da redenção.131 Exemplo 1. Exigências do amor cristão «Certa mãe, inconsolável pela morte de seu filho, chorava constantemente, sem, contudo, lhe assistir com os meios que a religião dá. O Senhor teve piedade do seu erro e concedeu-lhe uma visão. Era uma procissão de jovens vestidos com roupas brancas, ricamente adornadas, que se dirigiam alegremente para uma magnífica cidade. A cidade era o Céu, as roupas a fé, os ornamentos representavam a caridade. Aquela mulher que trazia sempre no coração o filho que tinha perdido, procurava-o com ansiedade nesta falange escolhida; viu-o no fim da fila, atrás de todos, miserável, cansado: era o último e a sua roupa, diferente dos outros, estava molhada e gasta. Ao vê-lo, as lágrimas da mãe aumentaram e com voz sufocada exclamou: - Porque vais triste e atrás de todos? O jovem respondeu: - Veja, minha mãe, estas roupas tristes e húmidas – eis para que servem as lágrimas da sua sensibilidade puramente natural, que tem derramado sobre mim. Se me tem verdadeiro amor, se deseja ver-me feliz, auxilie-me com a sua oração e com as suas obras de misericórdia. Imite as mães dos que seguem à mnha frente.» 132 Desde aquele dia, a pobre mãe compreendeu que mais importante que o luto humano é o amor cristão. 2. O Santo Cura d’Ars 1786-1859 O Santo Cura d’Ars, depois de uma vida de intenso apostolado, tinha atingido uma serenidade que lhe permitia situar as misérias humanas no devido lugar. A sua vida era marcada por um zelo ardente: os sofrimentos do dia oferecia-os pela conversão dos pecadores. Os da noite pelas almas do Purgatório. Era esta a sua razão de viver sobre a terra. Antes de partir para a eternidade, (morreu aos setenta e três anos, no dia 4 de Agosto de 1859), recebeu a Sagrada Comunhão. Sentou-se na cama sem a ajuda de ninguém, juntou as mãos e as lágrimas correram com abundância: - É triste comungar pela última vez! - Disse o santo. À noitinha veio vê-lo o bispo de Belley. O santo agradeceu a visita. Pelas duas da noite, «sem espasmos, sem agonia, sem violência, adormeceu no Senhor», no momento em que o P. Monnin recitava a oração de encomendação da alma: “Vinde em seu auxílio santos de Deus; vinde ao seu encontro anjos do Senhor! Receba-te Cristo que te chamou; conduzam-te os Anjos ao Paraíso!”133 O exemplo desta morte santa ajuda-nos a compreender o que o salmista canta: É preciosa aos olhos do Senhor a morte dos seus fiéis. (Salmo 116,15) Acto de amor do Santo Cura d’Ars. 131 Sal 129,7. FRANCISCO SPIRAGO, Catecismo Popular, 6ª ed.,Vol 1, 405. 133 HENRI GHÉON,O Santo cura d’Ars,Ed. Quadrante, S. Paulo,1986,163.167.169. 132 63 “Amo-Vos, ó meu Deus e o meu único desejo é amar-Vos até ao último suspiro da minha vida. Amo-Vos, ó meu Deus, infinitamente amável, e prefiro morrer amando-Vos do que viver um só instante sem Vos amar. Amo-Vos ó meu Deus e só temo o Inferno porque nele nunca mais haverá consolação de Vos amar. Ó meu Deus, se a minha língua não pode dizer a todo o momento que Vos amo, quero que, ao menos, o meu coração vo-lo repita em cada uma das suas palpitações. Concedei-me a graça de sofrer amando-Vos, de Vos amar sofrendo, e de expiar amando-Vos, e sentindo que Vos amo. Quanto mais me aproximo do fim, tanto mais Vos peço que aumenteis e aperfeiçoeis o meu amor. Amen.” Oremos: Senhor Jesus, Vós sois o Caminho, a Verdade e Vida, Vós sois o nosso Salvador. Acolhei os defuntos na glória do Vosso reino eterno e glorioso. 20. Quanto a nós, a nossa pátria está nos Ceús! (Fil 3, 20) Deus não é um Deus de mortos, mas de vivos! Mt 22,32 Cristo morreu e ressuscitou para ser o Senhor dos vivos e dos mortos! Rom 14,9 O dogma da comunicação dos santos é uma consolação maravilhosa, nos dias de luto. A fé ensina-nos que os nossos defuntos vivem em Deus: «Para os que crêem em vós, Senhor a Vida não acaba apenas se transforma e desfeita a morada deste exílio terrestre adquirimos no Céu uma habitação eterna!»134 Pela fé, acreditamos que não perdemos os nossos mortos. Deixaram este vale de lágrimas, mas continuamos unidos. Quando chegar a hora da nossa morte, tornaremos a ver-nos: viveremos juntos numa união indissolúvel e eterna! Em todas as culturas do mundo, o sono é uma imagem da morte. Esta simbologia é doce e reconfortante, pois quando alguém dorme, sabemos que há-de acordar. 1. “Jesus Cristo ressuscitado é a esperança de todos os crentes. Ele chama adormecidos, e não mortos, àqueles que partem deste mundo. Anime-nos, portanto, a esperança da ressurreição: os que perdemos neste mundo, havemos de os tornar a ver, no outro. Basta, para isso, acreditar no Senhor com verdadeira fé, obedecendo aos Seus mandamentos. Ele é Omnipotente. Para Ele é mais fácil despertar os mortos do que para nós acordar os que dormem.” (Carta de S. Bráulio, século VII, Liturgia das Horas, Ofício de Leitura de Defuntos) 2. «Acolhamos com júbilo o dia em que a cada um de nós se indicará a sua própria morada, o dia em que libertos das cadeias deste mundo, entraremos no paraíso e no reino eterno. Quem não tem saudades de regressar à pátria, quando longe dela? Para nós a pátria é o Paraíso. Lá nos espera um grande número de entes queridos, lá nos aguardam os nossos pais, os nossos irmãos, os nossos familiares em festiva e alegre companhia, seguros já da própria felicidade e solícitos da nossa salvação. Que alegria, tanto para eles como para nós, poder vê-los e abraçá-los a todos! Que felicidade, naquele reino celeste, nunca mais haverá morte, mas gozaremos da vida para sempre! Ali está o coro glorioso dos Apóstolos, a milícia exultante dos Profetas, a multidão inumerável dos mártires, coroados de glória pelo triunfo do combate e dos tormentos. Ali estão as virgens triunfantes, que venceram a concupiscência da carne e 134 Prefácio de Defuntos I. 64 do corpo com a virtude da continência. Ali são recompensados os misericordiosos, que praticaram obras de justiça, alimentando e socorrendo com seus bens os pobres, transformando os bens terrenos em tesouros celestes! Apressemo-nos com todo o entusiasmo a juntarmo-nos à companhia destes bem-aventurados. Veja Deus este nosso propósito (…) porque tanto maior será a recompensa quanto mais ardente for o desejo de chegarmos à sua presença.»135 Exemplos 1. Papa S. João XXIII Depois da morte de Pio XII, foi eleito Sumo Pontífice a 28 de Outubro de 1958 e assumiu o nome de João XXIII. O seu pontificado durou apenas cerca de cinco anos. Foi um Papa empreendedor e corajoso: convocou o Concílio Ecuménico Vaticano II. Praticou as obras de misericórdia corporais e espirituais, visitando os encarcerados e os doentes, recebendo homens de todas as nações e crenças, cultivando um extraordinário sentimento de paternidade para com todos. O povo viu nele um reflexo da bondade de Deus, uma autêntica imagem de Jesus, o Bom Pastor e chamouo “ O Papa da bondade”. Sustentava-o um profundo espírito de oração e irradiava a paz de quem confia sempre no Senhor. Já nos últimos dias da sua existência, escreveu no seu diário: «Tenho podido acompanhar a par e passo a minha morte. Agora estou suavemente chegando ao fim.» Olhava com serenidade para a morte, porque sabia que ela o unia a Jesus. Por isso, repetia docemente: «Desejo morrer para estar com Cristo. Estou contente porque vou para a casa do Senhor. A morte não é o fim. Com a morte principia uma nova vida: a glorificação em Cristo. Portanto estou tranquilo. Sempre desejei cumprir a vontade de Deus, sempre, sempre!” Esta fé levou-o a suportar o sofrimento com santa alegria: «Sofro com amor, mas com muita dor. Ofereço a minha vida pela Igreja, pelo Concílio, pela paz.» Pouco antes de exalar o último suspiro, pronunciou estas derradeiras palavras, como uma oração confiante e amorosa à Mãe de Jesus, nossa Mãe Santíssima: «Continuaremos a amar-nos no Céu. Desejo partir. Desejo voltar para o meu Deus. Virgem Santíssima, minha Mãe!»136 Faleceu na tarde do dia 3 de Junho de 1963. O Papa João Paulo II beatifica-o a 3 de Setembro de 2000. Foi canonizado no dia 27 de abril de 2014, pelo Papa Francisco. DECÁLOGO DA SERENIDADE (composto pelo Papa S. João XXIII) 1. Hoje, apenas hoje, procurarei viver pensando apenas neste dia, sem querer resolver todos os problemas da minha vida de uma só vez. 2. Hoje, apenas hoje, procurarei ter o máximo cuidado na minha convivência, serei cortês nas minhas maneiras, a ninguém criticarei, nem pretenderei melhorar ou corrigir à força ninguém, senão a mim mesmo. 3. Hoje, apenas hoje, serei feliz na certeza de que fui criado para a felicidade, não só no outro mundo, mas também já neste. 135 136 S. CIPRIANO, Tratado sobre a morte, cap. 18.24.26: Liturgia das Horas, 4, 583-585. Cruzada Eucarística, (Nov 1963). 65 4. Hoje, apenas hoje, adaptar-me-ei às circunstâncias, sem pretender que sejam todas as circunstâncias a adaptarem-se aos meus desejos. 5. Hoje, apenas hoje, dedicarei dez minutos do meu tempo a uma boa leitura, recordando que assim como o alimento é necessário para a vida do corpo, a boa leitura é necessária para a vida da alma. 6. Hoje, apenas hoje, farei uma boa acção, e não direi nada a ninguém. 7. Hoje, apenas hoje, farei ao menos uma coisa que me custe fazer, e, se me sentir ofendido nos meus sentimentos, procurarei que ninguém o saiba. 8. Hoje, apenas hoje, executarei um programa pormenorizado, talvez não o cumpra perfeitamente, mas ao menos escrevê-lo-ei, e fugirei de dois males: a pressa e a indecisão. 9. Hoje, apenas hoje, acreditarei firmemente, embora as circunstâncias mostrem o contrário, que a Providência de Deus se ocupa de mim, como se não existisse mais ninguém no mundo. 10. Hoje, apenas hoje, não terei nenhum temor, de modo especial não terei medo de gozar o que é belo, e de crer na bondade. 2. A uma pequenita morreu-lhe a irmã. Uma vez, em que ela a chamava entre soluços, seus pais mostram-lhe o céu azul, para a consolar e dissera-lhe: a tua irmã já está no Céu! Certo dia, iam pela rua, quando a pequena viu um homem que vendia balões de vistosas cores. A menina suplicou aos pais que lhe comprassem um. A mãe comprou-lho. Logo que puseram o brinquedo nas mãos da criança, esta soltou-o alegremente, depois de o ter beijado e seguiu com os olhos a sua ascensão para o alto. - Cabeça no ar, diz-lhe a mãe, já o perdeste! - Mamã, não o perdi, mandei-o à minha maninha!137 As almas que partiram vivem e nós podemos enviar-lhes, não balões ou flores, mas o nosso amor fraterno. Acreditemos na força das palavras de S. Paulo: A caridade nunca desaparece!138 3. Entrevista com Deus Sonhei que tinha marcado uma entrevista com Deus. - Entre! Então, gostaria de Me entrevistar? - Sim, se tiver um tempinho. Deus sorriu e disse que o seu tempo é eterno, suficiente para fazer todas as coisas. - Por favor, Meu Deus, quais as coisas que mais O surpreendem na humanidade? - Que se aborreçam de ser crianças e queiram crescer depressa para depois desejarem ser crianças outra vez. Que desperdicem a saúde para fazer dinheiro e depois gastem o dinheiro para recuperar a saúde. Que pensem ansiosamente sobre o futuro, esqueçam o presente e, dessa forma, não vivam nem o presente, nem o futuro. Que vivam como se nunca fossem morrer e que morram como se nunca tivessem vivido. Deus colocou minha mão na sua e ficámos em silêncio durante algum tempo. Então perguntei novamente: 137 138 TIHAMER TOTH, A Igreja Católica, ed. Livraria Apostolado da Imprensa, Porto 1957, 328. 1 Cor 13,8. 66 - Como um Pai, quais seriam as lições que gostaria que seus filhos aprendessem? - Que eles aprendessem que não podem obrigar ninguém a amá-los, mas que se deixem amar; que não é bom comparar-se com os outros, mas que aprendam a perdoar, praticando o perdão. Que eles aprendessem que são necessários apenas poucos segundos para abrir feridas profundas naqueles que eles amam, mas podem ser necessários muitos anos para as cicatrizar. Que eles aprendessem que uma pessoa rica não é aquela que tem mais, mas é aquela que necessita menos. Que eles aprendessem que duas pessoas podem olhar para a mesma coisa e vê-la diferentemente. - Obrigado pelo seu tempo. Há ainda mais alguma coisa que gostaria que seus filhos soubessem? Deus sorriu e disse: - Saibam que eu estou SEMPRE aqui. (Youtube, entrevista com Deus) Oração: Senhor nosso Deus, pela Vossa infinita Misericórdia, admiti ao convívio dos vossos Santos os nossos familiares e benfeitores defuntos. 21. Nossa Senhora socorre seus filhos no Purgatório Salve Rainha, Mãe de misericórdia… Esses vossos olhos misericordiosos a nós volvei! No dia 21 de Novembro, a Igreja celebra a memória da apresentação da Santíssima Virgem Maria, isto é, a oferta pública e solene que fez a Deus, no Templo de Jerusalém. A Igreja aplica a Nossa Senhora estas palavras da Sagrada Escritura: Fui criada desde o princípio e antes dos séculos. Jamais cessarei de existir por toda a duração das idades. No seu templo santo, tenho exercitado diante d’Ele o meu ministério. Desta maneira fui firmada em Sião, encontrei o meu repouso na cidade santa e o meu poder se estabeleceu em Jerusalém. Estabeleci a minha morada na assembleia dos santos.139 Os Santos dizem que são felizes os devotos desta piedosíssima Mãe. Ela vela por nós e socorre-nos; é a consoladora dos aflitos. Pode ajudar-nos, pois tem todo o poder, por ser Mãe de Deus. Ajuda-nos de facto, pois é nossa Mãe. Transcrevo do livro Glórias de Maria de Santo Afonso de Ligório as afirmações seguintes: A Virgem Maria não só socorre os seus filhos neste mundo, mas também no Purgatório os assiste e consola com a sua protecção. Por precisarem mais de socorro empenha-se a Mãe de Misericórdia com zelo ainda mais intenso. As almas do Purgatório padecem muito e nada podem por si mesmas. Maria Santíssima tem pleno poder, tanto para aliviá-las como para livrá-las completamente das suas penas. 139 Ecl 24,14-16. 67 Nossa Senhora revelou a Santa Brígida: «Eu sou a Mãe de todas as almas do Purgatório, pois por minhas orações lhes são constantemente mitigadas as penas que mereceram seus pecados durante a vida.» Santo Afonso escreveu ainda que Santa Brígida ouviu Jesus dizer a Sua Mãe: «És minha Mãe, és a Mãe de Misericórdia, és o consolo dos que sofrem no Purgatório». Oh! Como é boa e clemente a Santíssima Virgem para com as almas do Purgatório! Digna-se essa Mãe piedosa entrar naquela santa prisão para visitar e consolar seus filhos aflitos: Penetrei no fundo do abismo140, isto é, no Purgatório, para consolar com minha presença essas santas almas. Um pobre doente, aflito e desamparado numa cama, alenta-se ao ouvir palavras de conforto. Assim também, as almas do Purgatório enchem-se de alegria, ouvindo pronunciar o nome de Maria. Santo Afonso afirma também que no Natal, na Páscoa e nas festas solenes a Santíssima Virgem desce ao Purgatório acompanhada por muitos Anjos. Exemplo: 1. A protecção da Virgem Santíssima “Contaram a uma senhora da alta sociedade que seu filho tinha sido assassinado, e que o assassino se havia refugiado no seu palácio. Lembrou-se a pobre mãe de que a Santíssima Virgem também perdoara aos que crucificaram seu Filho e em lembrança das dores da Virgem Maria, perdoou generosamente ao criminoso. Além disso, mandou dar-lhe cavalos, dinheiro e roupa, para que se salvasse pela fuga. Algum tempo depois, teve a revelação de seu filho, dizendo-he que, não só se salvara, como também fora livre do Purgatório pela Mãe de Jesus.”141 2. O escapulário de Nossa Senhora do Carmo. No dia 16 de Julho de 1251, nossa Senhora apareceu a S. Simão Stock, superior geral da Ordem do Carmo, e disse-lhe: “Todo o que morrer com este escapulário será livre do fogo eterno. É um sinal de salvação, uma defesa nos perigos, e um penhor da minha especial protecção.” O padre Leblanc, jesuíta, visitava uma noite o dormitório dos alunos de um colégio de Toulouse, França. Com surpresa, viu um rapaz de joelhos junto à cama. Perguntou-lhe porque não estava deitado. O aluno respondeu: - Entreguei o meu escapulário ao porteiro para mo consertar e ainda não mo veio trazer. Não me atrevo a deitar-me, sem ele, com medo de morrer esta noite. - Não tenhas medo. Deita-te. Amanhã terás o teu escapulário. Agora, dorme descansado. - Meu padre, não quero deitar-me. Posso morrer esta noite. Pronunciando estas palavras com emoção, o aluno chorava não sei com que pressentimento. O bom sacerdote, impressionado com tão piedosas disposições, desceu à portaria, tomou o escapulário e levou-o ao estudante que o beijou devotamente e o pôs ao pescoço. Depois, invocando o Nome de Maria, deitou-se logo a seguir. 140 141 Ecl 21,8. Cf. S. AFONSO MARIA DE LIGÓRIO, As Glórias de Maria, 190-194. 68 No dia seguinte, o padre Leblanc faz a costumada visita para averiguar se todos os rapazes estavam levantados. Vê ainda deitado aquele aluno. Aproxima-se da cama, abana-a, mas o estudante não responde. Estava morto, apertando entre as mãos o seu escapulário. Feliz dele por ter expirado com esse sinal de predestinação. (Pe. Fernando Leite, “Mês de Maria Pequenino”) Oração: Senhor, vós que coroastes a Virgem Maria como Rainha do Céu, fazei que os defuntos alcancem com todos os Santos a alegria do vosso reino. 22. O amor é forte como a morte «Para mim viver é Cristo e morrer é lucro!» (Fil 1,21) "Vemos que também a morte pode ser lucro e a vida ser castigo. Morramos com Cristo para vivermos com Ele. Seja nosso exercício diário o amor da morte, a fim de que a nossa alma, pelo afastamento dos desejos corpóreos, aprenda a elevar-se para as alturas, onde o prazer terreno não pode chegar nem atraí-la a si. A lei da carne contradiz a lei do espírito: qual será o remédio par isto? Quem me libertará do meu corpo mortal? A graça de Deus por Jesus Cristo Nosso Senhor. Temos médico, apliquemos o remédio. O nosso remédio é a graça de Cristo. Vivemos no corpo, mas não nos sujeitemos às exigências da natureza. Devemos preferir os dons da graça. O mundo foi resgatado pela morte de Jesus Cristo, que podia não ter morrido se quisesse, mas julgou que não devia fugir à morte, como se fosse inútil; antes, considerou-a como o melhor meio para nos salvar. A sua morte foi vida para todos! Anunciamos a sua morte na oração, proclamamos a sua morte na Eucaristia. A sua morte é vitória, é solenidade anual, em todo o mundo! A sua morte conseguiu-nos a imortalidade! Não devemos chorar a morte que é causa de salvação universal. Não devemos fugir à morte que o Filho de Deus não evitou nem desprezou. Sem dúvida a morte não fazia parte da natureza, mas tornou-se natural: Deus não institui a morte ao princípio, mas deu-a como remédio! Condenada pelo pecado a um trabalho contínuo e a lamentações insuportáveis, a vida dos homens começou a ser miserável. Deus teve de pôr fim a estes males para que a morte restituísse o que a vida tinha perdido. Com efeito, a imortalidade seria mais penosa que benéfica, se não fosse promovida pela graça. A nossa alma deseja partir deste mundo para contemplar as vossas núpcias eternas, ó Jesus! Uma só coisa peço ao Senhor, por ela anseio: habitar na casa do Senhor todos os dias da minha vida, para viver na alegria do Senhor!”142 O amor é mais forte do que a morte “Forte é a morte, que pode tirar-nos o dom da vida. Mais forte é o amor, que pode restituir-nos uma vida melhor. Forte é a morte, que tem poder para nos espoliar das roupagens deste corpo. Mais forte é o amor, que tem poder para arrebatar à morte os nossos espólios e de no-los restituir. Forte é a morte a que nenhum homem é capaz de resistir. Mais forte é o amor, que pode destruir a sua vitória. O amor é forte como a morte; é uma chama ardente, é um fogo divino (Cant 8, 6-7). O amor de Jesus Cristo 142 Cf. S. AMBRÓSIO, Sobre a morte de seu irmão Sátiro, in Liturgia das Horas, vol. 4, 2 Nov. 69 matou a morte. “ Ó morte, Eu serei a tua morte!” Está escrito no profeta Oséias: "Eu os livrarei da mão da morte, eu os resgatarei da morte. Ó morte, eu serei a tua morte! Eu serei a tua mordaça, ó inferno!" (Oseias 13,14). Jesus com a sua ressurreição aboliu a lei da morte, porque nos deu a esperança de ressurgir. Está escrito que “não haverá mais a morte” (Ap 21,4). (S. Balduíno de Cantuária, Of de Leit. Quinta-feira 18ª semana) Victor Hugo: A morte não é o fim de tudo “A morte não é o fim de tudo. Como pode o homem duvidar se vai encontrar a eternidade com a sua saída deste mundo? A alma tem sede do absoluto e o absoluto não é deste mundo. A morte é uma mudança de vestimenta. Na morte o homem fica sendo imortal. A morte é uma continuação. Para além das sombras, estende-se o brilho da eternidade. A morte aproxima-nos cada vez mais de Deus. Muitos consideram que o falecimento de uma pessoa amada é verdadeira desgraça, quando, em verdade, morrer não é finar-se, mas libertar-se. Assim, diante dos que partem na direção da morte, assumamos o compromisso de nos prepararmos para o reencontro com eles, na vida espiritual. Prossigamos a nossa jornada na terra sem adiar as realizações superiores que nos competem, pois elas serão valiosas, quando fizermos a grande viagem, rumo à madrugada clarificadora da eternidade.” (Texto de Victor Hugo (1802-1885) acerca do homem e da imortalidade) Sebastião da Gama: “É que para mim – e espanta-me que os cristãos não pensem deste modo-, a morte é a porta: pela morte ficamos na presença de Deus” (Alexandre F. Santos, Sebastião da Gama, Milagre de vida, em busca do eterno, p 42) «Quanto a mim, morri para a Lei a fim de viver para Deus. Eu vivo, mas já não sou eu que vivo é Cristo que vive em mim! Vivo na fé do Filho de Deus, que me amou e se entregou por mim!»143 Exemplo: 1. O que há do outro lado da vida? No consultório do médico, um homem bastante doente falou, com desespero: - Doutor, tenho medo de morrer! Diga-me, o que há do outro lado? Calmamente o médico disse que não sabia. - Não sabe? E fala assim com tanta tranquilidade? Nesse momento, ouviram o ruído de arranhões do outro lado da porta fechada. Quando o médico abriu a porta, um cachorro entrou e pulou sobre ele, alegremente. Virando-se para o paciente, o médico disse: - Notou o meu cachorro? Ele nunca esteve nesta sala; não sabia o que havia aqui, apenas sabia que seu dono estava aqui. No entanto, quando a porta se abriu, ele entrou sem medo. Não sei quase nada do que há depois da vida. Mas de uma coisa tenho a certeza: Eu sei que o meu Senhor está lá. E isso é suficiente! (Google, O que há do outro lado da vida?) 2. Morte de S. Francisco de Assis 143 Gal 2,19-20. 70 Crucificado com Cristo tanto na carne como no espírito, Francisco ardia em amor seráfico a Deus e como Jesus «tinha sede» da salvação dos homens. Com muita antecedência, foi-lhe revelada a hora da morte. Ao aproximar-se esse dia, anunciou aos Irmãos que não tardaria a abandonar a tenda do corpo. “Tenho por meu dever, enquanto estiver neste corpo, manter-vos vigilantes, com as minhas admoestações. Porque sei que em breve terei de o deixar, conforme Nosso Senhor Jesus Cristo mo deu a conhecer” (conf 2 Ped 1, 13-14). A hora da partida aproximava-se. Pede que o transportem para Santa Maria da Porciúncula. Aí recebera o espírito da graça; aí gostaria de entregar o espírito da vida. Mandou chamar todos os Irmãos que se encontravam no convento. Exortou-os ao amor de Deus; recomendou-lhes a observância evangélica, abençoou a todos e acrescentou: «Adeus meus filhos! Permanecei sempre no temor do Senhor! Eu agora vou para Deus; confio-vos à sua graça!» Concluída esta terna exortação, mandou trazer o Evangelho e pediu que lhe lessem aquela passagem de S. João: «Antes da festa da Páscoa…” (Jo 13,1). Depois recitou o salmo 142 (141): «Em alta voz clamo ao Senhor… Vós sois a minha herança na terra dos vivos; tirai-me desta prisão e darei graças ao vosso nome.» Realizados nele todos os desígnios de Deus, a sua alma santíssima desprendeu-se da carne para ser absorvida no abismo da caridade divina: o Santo adormeceu no Senhor. Frei Tiago de Assis, viu aquela alma bendita, sob a forma duma estrela brilhante, atravessar o azul do firmamento e subir direita ao Céu. Também o bispo de Assis viu este bem-aventurado que lhe apareceu na mesma noite em que falecera, para lhe dar a notícia: «Vou deixar o mundo e partir para o Céu!»144 Da carta de S. Francisco a todos os fiéis: “Façamos frutos dignos de penitência. Amemos o próximo como a nós mesmos. Sejamos caridosos e humildes e dêmos esmola, porque a esmola lava as almas da imundície do pecado. Na verdade, os homens perdem tudo o que deixam neste mundo, mas levam consigo o preço da sua caridade e por ela receberão do Senhor recompensa e digna remuneração.” (Ofício de Leituras, 4 de Out.) Felizes os pobres em espírito, porque deles é o Reino dos Céus! (Mat 5,3) Recomendação aos ricos Aos ricos deste mundo recomenda que não sejam orgulhosos, nem ponham a sua esperança na riqueza incerta, mas em Deus que nos dá tudo com abundância para nosso usufruto; 18que pratiquem o bem, se enriqueçam de boas obras, sejam generosos, capazes de partilhar. 19Deste modo, acumularão um bom tesouro para o futuro, a fim de conquistarem a verdadeira vida. ( 1 Timóteo 6, 7-19) Oremos: Senhor Jesus Cristo, Vós sois a alegria de todos os que em Vós se refugiam. Aos que morreram no Vosso amor, tornai-os participantes da vossa felicidade celeste com a Virgem Maria e todos os Santos. 144 Cf. S. Francisco de Assis. Fontes Franciscanas, o.c., 641-646. 71 23. A Virgem Maria aos pés da Cruz «Estavam junto à cruz a Mãe de Jesus, a irmã de sua mãe, Maria de Cléofas e Maria Madalena. Jesus viu sua Mãe e ao lado dela o discípulo que Ele amava. Então Jesus disse: Mulher eis aí o teu filho! Depois disse ao discípulo: eis aí a tua mãe! E dessa hora em diante, o discípulo recebeu-a em sua casa.» (Jo 19, 25-27) “A Virgem Maria aos pés da Cruz é a nossa mãe espiritual. Pasmavam as pessoas por verem-na quedar-se silenciosa e de pé, sem uma queixa ou lamento, no meio de tão grande dor. Mas se os lábios guardavam silêncio, no seu coração, a Virgem não cessava de oferecer à Divina Justiça a vida do Filho pela nossa salvação. Por aí vemos quanto Ela cooperava através dos seus sofrimentos para fazer-nos nascer para a vida da graça. Certamente, o único alívio, nesse mar de mágoas, que era o coração de Maria, foi o consolador pensamento de que cooperava para a nossa eterna salvação. Jesus revelou a Santa Brígida: «Minha Mãe tornou-se Mãe de todos, no Céu e na terra, por sua compaixão e amor». É esse o sentido das palavras com que Jesus se despediu de sua Mãe: «Mulher eis o teu filho. Filho, eis a tua Mãe.» Desde esse momento, Nossa Senhora começou a exercer para connosco o ofício de mãe estremecida. Nas nossas angústias e especialmente nas da morte, esta nossa boa Mãe obtém-nos um suave e feliz trânsito. Desde esse dia, em que teve a dor de assistir à morte de Jesus, obteve também a graça de assistir e suavizar a morte de todos os membros do Seu corpo místico. Por isso, a Igreja nos ensina a rezar: Rogai por nós pecadores, agora e na hora da nossa morte. São muitas as angústias dos pobres moribundos: remorsos dos pecados cometidos, incerteza da salvação eterna… A Santíssima Virgem, em defesa dos seus moribundos, manda o príncipe S. Miguel com todos os seus anjos para protegê-los contra as tentações do demónio e receber as suas almas.”145 Exemplo: 1. S. João de Deus Nasceu em Montemor-O-Novo em 1495. O seu desejo de perfeição levou-o a entregar-se ao serviço dos enfermos. Fundou um hospital em Granada e associou à sua obra um grupo de companheiros que mais tarde constituíram a Ordem Hospitaleira de S. João de Deus. Aí recebeu doentes de toda a espécie e condições: tolhidos, mancos, leprosos, mudos, dementes, paralíticos, velhos, crianças, muitos peregrinos e viajantes. Numa de suas cartas podemos ler: “Se considerarmos atentamente a misericórdia de Deus nunca deixaremos de fazer o bem: se damos aos pobres por amor de Deus aquilo que Ele próprio nos dá, Ele promete-nos o cêntuplo nesta vida e depois a felicidade eterna. Feliz pagamento, ditoso lucro!” 146 Deus pede-nos que choremos os nossos pecados e tenhamos caridade para com o nosso próximo. Assim como a água apaga o fogo assim «a caridade apaga a multidão dos pecados.»147 Estando para morrer, S. João de Deus esperava a visita de Nossa Senhora de quem era muito devoto. Não a vendo vir, entristeceu-se muito e queixou-se aos Irmãos. Nisto, eis que lhe aparece a Mãe de misericórdia e repreendeu-o da sua falta 145 Cf. S. AFONSO MARIA DE LIGÓRIO, As Glórias de Maria, 88-91. Liturgia das Horas, vol. 2 (8 de Março), 1471-1472. 147 Prov 10,12. 146 72 de confiança, dizendo-lhe estas meigas palavras que devem alentar a todos nós: «João, que estás a pensar? Que eu te tenha abandonado? Não sabes que nunca abandono meus servos à hora da morte? Não vim mais cedo porque ainda não era tempo. Agora, sim, venho buscar-te: Vamos juntos para o Paraíso. Pouco depois, no dia 8 de Março de 1550, voava o santo para o Céu a dar graças a sua amantíssima Rainha, por toda a eternidade.148 S. João de Deus santificou-se praticando as obras de misericórdia para com os pobres e os doentes. Diz a Escritura (Is 58,7-8): «Reparte o teu pão com os famintos e dá pousada aos peregrinos, aos pobres sem abrigo, leva roupa ao que não tem que vestir, não voltes as costas ao teu semelhante. Então a tua luz brilhará como a aurora!» Faz o mesmo e viverás! 2. Na solene entrada dos Reis Católicos numa cidade reconquistada aos mouros, sucedeu um facto curioso: quando a multidão cantava, na rua, o Te Deum, parecia que muitas vozes respondiam, debaixo da terra, ao canto de acção de graças. Ficaram todos muito admirados, porque um pouco depois, mais perto das cadeias da cidade, podiam ouvir, com clareza outro cântico de júbilo: «Bendito, bendito o que vem, em nome do Senhor!» Era o canto triunfal dos cristãos encerrados nas masmorras subterrâneas, que saudavam os que os vinham libertar de suas prisões terrenas!149 3. D. Bosco S. João Bosco nasceu em 16 de Agosto de 1815, perto de Castelnuovo D’Asti, Itália. Morreu com setenta e três anos. Pedia para meditarmos regularmente sobre a morte. Eis algumas frases dos últimos anos de Bosco. Em Abril de 1983, uma senhora convidou-o para almoçar. No jardim, colheu uma violeta e ofereceu-lha, dizendo: - A senhora foi muito amável! Quero recompensá-la com uma flor que é um pensamento. - Que pensamento, D. Bosco? - O pensamento da eternidade, que deve acompanhar-nos sempre! D. Bosco pensava na morte. Um dia, ao saudar um certo homem, pediu-lhe: - Reze por mim. - Oh! Dom Bosco! O senhor não precisa! O padre Luís, que estava presente, testemunhou: “ D. Bosco pôs-se sério, muito sério. Em seus olhos despontaram lágrimas. Com profunda sinceridade disse: - Preciso muito. Em Fevereiro de 1884, apesar da falta de saúde, quis ir a França. O padre Rua procurou dissuadi-lo. O médico afirmou que só por milagre chegaria a Nice. Cheio de determinação ditou o seu testamento e mandou chamar os padres Rua e Cagliero e disse-lhes: - Aqui está o meu testamento… se não regressar, já sabeis como são as coisas. Já estava em Marselha, sul de França, quando foi visitado pelo doutor Combal. Cheio de compaixão por D. Bosco, exprimiu o seu parecer: 148 149 Cf. S. AFONSO MARIA DE LIGÓRIO, As Glórias…, o.c., 94. TIHAMER TOTH, O Redentor, Livraria Apostolado da Imprensa, Porto, 1957, 97-98. 73 - O Senhor é um vestido já gasto… Para conservá-lo por mais algum tempo, a única forma é mantê-lo num guarda-roupa. Certamente já compreendeu que lhe aconselho repouso absoluto! - Agradeço muito, doutor, mas esse é o único remédio que eu não posso tomar! “Os padres descansam no Paríso!” Estando a cear, no final de Setembro de 1887, declarou ao P.Moisés: - Resta-me pouco tempo de vida. Não me dá pena morrer. No próximo ano, já não assistirei aos exercícios espirituais. Em Outubro, voltou a Valdocco. Os rapazes acolheram-no com grande entusiasmo. Ajudaram-no a subir os degraus… Todos se aperceberam que D. Bosco parecia uma candeia que se estava a apagar... Cerca de trinta rapazes esperam para se confessar. - Não me sinto com força, mas que entrem; é a última vez que poderei confessá-los. Em fins de Dezembro, recebeu a Santa Unção, sacramento que nos configura com Jesus sofredor. Pediram-lhe: - Pense em Jesus crucificado! - Sim, é o que eu faço sempre… Dizei aos jovens que os espero no Paraíso... Na véspera da sua partida para a eternidade, alguém lhe diz: - Ânimo! Talvez amanhã esteja melhor… - Amanhã?... Amanhã, farei uma longa viagem… Sim, uma longa viagem que nos leva deste exílio para a Pátria. De facto, no dia 31 de Janeiro de 1888, no seu pobre quartinho de Valdocco, cerca das quatro e meia, D. Cagliero recita, em voz alta esta oração: “Amado Jesus, José e Maria, meu coração vos dou e a alma minha. Amado Jesus, José e Maria, assisti-me na última agonia. Amado Jesus, José e Maria, expira em paz entre vós a alma minha!” E assim, ao ritmo desta prece, D. Bosco partiu deste exílio e entrou na pátria da felicidade eterna. (Teresio Bosco, Dom Bosco) Tenho viagem marcada, Não sei quando embarcarei. Comigo não levo nada. Só levo aquilo que dei. Oremos: Lembrai-Vos, Senhor dos defuntos, remidos com vosso sangue; pela intercessão da Virgem Maria, admiti-os ao banquete das núpcias eternas. 24. Duração do Purgatório «Diante do Senhor um dia é como mil anos e mil anos como um dia!» (2 Ped 3,8) Nada sabemos sobre a duração do Purgatório. O processo de purificação pode ocorrer lentamente, depressa ou instantaneamente. A Revelação nada ensina acerca da duração do Purgatório. As revelações privadas sobre esta questão devem ser aceites com muita precaução. As afirmações dos teólogos acerca deste tema não possuem valor obrigatório. O Papa Alexandre VII condenou a teoria de que ninguém poderia estar mais de vinte anos no Purgatório. Esta condenação não foi por causa da longa 74 duração, mas sim contra a determinação do tempo no processo purificador, depois da morte150. O dogma sobre o Purgatório não fala de tempo. Contudo, a Igreja mostra-nos o que pensa a este respeito, autorizando legados perpétuos, missas de aniversário durante muitos anos. Crê que a purificação pode ser longa, prolongando-se por muito tempo. Mais de vinte anos após a morte de sua mãe, Santa Mónica, S. Agostinho pedia ainda orações por ela. S. Ambrósio empenhou-se publicamente em pedir, toda a sua vida, pela alma do Imperador Teodósio, o Grande151. A Venerável Catarina Emmerich conta nas suas visões que em todos os aniversários da sua morte, Jesus desce ao purgatório para libertar uma ou outra alma daquelas pessoas que foram testemunhas da sua paixão.\152 A nossa linguagem precisa de categorias espácio-temporais para falar das realidades ultraterrestres. Mas quem não sabe que mil anos aos olhos de Deus são como o dia de ontem que passou?153 Quem não fez a experiência do tempo psicológico tão distinto do cronológico? Ao vivermos uma experiência agradável o tempo parece voar; ao contrário, uma experiência dolorosa de uns minutos parece interminável! Todos sabemos como nos parecem curtos os dias felizes e como são intermináveis os dias de sofrimento. Como passam lentamente as horas da noite para os pobres doentes que não podem dormir por causa das dores. Quanto mais intenso for o sofrimento, tanto mais longa nos parece a duração do tempo. Como será o sofrimento de quem espera ansiosamente viver nos átrios do Senhor? O salmista exprimiu o seu sofrimento, provocado pelo seu desejo de contemplar a face de Deus, escrevendo: Senhor, sois o meu Deus, desde a aurora Vos procuro, a minha alma tem sede de Vós. Por Vós suspiro como terra árida, sequiosa, sem água!» E noutro lugar: «Como suspira o veado pelas correntes das águas, assim minha alma suspira por Vós, meu Deus! A minha alma tem sede de Deus do Deus vivo, quando irei contemplar a face de Deus?»154 Se este sofrimento é tão doloroso na terra, qual será a sua intensidade para os irmãos que se purificam no Purgatório, esperando a entrada na glória celeste? Santa Faustina escreveu: «Encontrei-me num lugar nebuloso, cheio de fogo e reparei que dentro das chamas havia uma enorme multidão de almas sofredoras. Rezavam com muito fervor, mas sem nada conseguirem obter para si próprias. Apenas nós as podemos ajudar! Perguntei-lhes qual era o seu maior sofrimento. Responderam-me, unânimes, que o maior tormento que padeciam era o ardente desejo de ver a Deus.”155 «Para o homem será sempre doloroso encontrar-se incompleto diante de Cristo. Será amargo para ele desfazer instantaneamente tudo o que foi retorcendo e enredando durante a sua vida, com os seus pecados. Com esta dor de se ver defeituoso, purgará angustiosamente as suas faltas.»156 150 M. SCHMAUS, o.c., 307. S. AGOSTINHO, o.c., livro 9,13. Cf. BERLIOUX, Mês das almas, 53-54. 152 JOSÉ ALVES TERÇAS, A Paixão Dolorosa. Visões de Catarina Emerich, vol. 5, ed. Cavaleiro, 290. FRANCISCO SPIRAGO, o.c., Vol. 1, 403. 153 Cf. Sal 89,4. 154 Salmo 62, 2; Sal 41, 1-2. 155 Santa FAUSTINA KOWALSKA, Diário, ed. Marianos da Imaculada Conceição, Fátima 1995, 20. 156 Bíblica, 35 (Set-Out/1996). 151 75 Exemplo: 1. Maria Simma Maria Simma (1915-2004) foi uma mística austríaca, favorecida pelo carisma de oração e apostolado em favor das almas do Purgatório. Segundo esta mística, as almas do Purgatório quando aparecem, fazem advertências e pedem sufrágios; falam do sofrimento que passam no Purgatório, embora esperem alegremente encontrar-se com Deus; revelam aos vivos a imensa possibilidade que têm de aliviar os sofrimentos dos defuntos e de receberem em troca inumeráveis benefícios e ajudas para esta vida e para a outra. Ao escrever a sua experiência espiritual, Maria Simma tem como objectivo fazer-nos reflectir sobre as realidades futuras que nos aguardam após a morte, ajudando-nos a mudar os nossos hábitos, para começarmos a viver, segundo a vontade de Deus. «Uma alma pediu-me: - Poderias sofrer por mim? Respondi-lhe que sim. Então, ela acrescentou: - Durante três horas, experimentarás enormes dores no teu corpo. Com isso abreviar-me-ás muitos anos de purificação. Aceitei. Assediaram-me dores tais que eu mal sabia onde estava, embora tivesse consciência de ter aceite estes sofrimentos em expiação por uma alma do Purgatório. Parecia-me que essas três horas já deveriam ter passado há muitíssimo tempo e que seriam três dias ou três longas semanas. Quando tudo terminou, informeime e vi que somente tinham passado três horas! Muitas vezes, apenas tinha de sofrer cinco minutos; contudo, esse tempo parecia-me uma eternidade!” 157 Este testemunho de Maria Simma concorda com o autor do livro Imitação de Cristo: «Será mais grave passar uma hora de pena no Purgatório do que, aqui, cem anos de penitência muito áspera.»158 Maria Simma conta que certa vez viajava de autocarro e ao seu lado sentou-se um jovem, que se dizia ateu e blasfemava contra Deus e contra a Igreja. Ela tentou argumentar, mas ele mostrou-se irredutível. Quando chegaram à paragem, assim que o jovem saiu, Maria Simma fez por ele esta simples oração: “Que Deus tenha pena deste pobre rapaz.” Aconteceu que, 20 anos mais tarde, achava-se ela em oração e de repente viu aparecer diante de si uma alma do Purgatório, que lhe perguntou se a conhecia. Como ela dissesse que não, perguntou se ainda se lembrava de um jovem herege com quem tinha conversado no autocarro, há muitos anos atrás. - Sim, lembro-me muito bem. Perguntou ainda se eu me recordava da frase que tinha pronunciado no silêncio do meu coração, quando desceram do autocarro… - Sim, eu disse: Que Deus tenha pena deste pobre jovem! - Pois bem, este seu desejo foi atendido por Deus e, na hora de minha morte, eu tive a graça da contrição final, sem a qual me teria perdido eternamente. 2. Anjo sedutor 157 158 MARIA SIMMA, Les âmes du purgatoire m’ont dit…, ed. Christiana, Stein Am Rhein, 49-50. Imitação de Cristo, Livro 1, 24, 4 76 Santo Antonino, religioso Dominicano de Florença, faz referência a um doente sujeito aos maiores sofrimentos. Na sua oração pedia a Deus com lágrimas que o livrasse de seus males. Um dia, apareceu-lhe um Anjo que lhe falou assim: - Deus envia-me para te dar a escolha de um ano de sofrimento na terra ou um só dia no Purgatório. O doente não hesitou. Um só dia no Purgatório e veria o termo das suas dores! Expirou logo e começou a expiação. Então, o Anjo compassivo veio visitá-lo para o consolar. - Anjo sedutor, enganaste-me! Asseguraste-me que não estaria senão um só dia no Purgatório e eis já vinte anos que estou entregue aos mais horríveis suplícios! - Alma infeliz, replicou o Anjo! Como estás no erro; o rigor dos teus tormentos faz-te exagerar a sua duração e consideras como vinte anos o que não é efectivamente senão um instante. Desengana-te; decorreram apenas alguns minutos depois do teu passamento e o teu corpo ainda está quente sobre o teu leito de morte. - Então, concede-me que eu volte à terra para aí sofrer, durante um ano, tudo o que agradar a Deus! Tendo-lhe sido concedida essa graça, o doente excitava todos os que o vinham visitar, a aceitarem de bom grado todas as penas deste mundo, de preferência a exporem-se aos tormentos do outro. Suportar com paciência os sofrimentos neste mundo é a chave de ouro para abrir o Paraíso! (cf Purgatory, 47) A verdadeira caridade é a que alcança a eternidade! Rezemos com frequência: Eterno Pai, eu vos ofereço o preciosíssimo sangue de Jesus, vosso divino Filho, em união com todas as Missas que hoje são celebradas em todo o mundo, pelas santas Almas do Purgatório. 25. As almas do Purgatório não podem aliviar-se a si mesmas «Tive fome e deste-me de comer! Tive sede e deste-me de beber!» (Mt 25,35) 1. “Devemos alegrar-nos e não entristecermo-nos, quando prestamos algum benefício aos pobres. Visitemos a Cristo, alimentemos a Cristo, tratemos as feridas de Cristo, vistamos Cristo, recebamos a Cristo, honremos a Cristo, não só sentando-O à nossa mesa como Simão, não só ungindo-O como Maria, não só dando-Lhe sepulcro como José de Arimateia, não só provendo o necessário para a sepultura como Nicodemos, não só finalmente, oferecendo ouro, incenso e mirra como os Magos; mas uma vez que o Senhor do Universo prefere a misericórdia ao sacrifício ofereçamos a compaixão pelos pobres que, hoje na terra, são humilhados, de modo que ao sairmos deste mundo, sejamos recebidos nas moradas eternas pelo mesmo Jesus Cristo Nosso Senhor, a quem seja dada a glória, pelos séculos dos séculos.”159 2. Rezando pelos irmãos defuntos cumprimos todas as obras de misericórdia. Oferecendo por eles os nossos trabalhos e sacrifícios aliviamos suas penas. Nós somos a sua providência libertadora. O céu os consola, nós os aliviamos. O céu lhes dá 159 S. GREGÓRIO DE NAZIANZO, Oratio 14, 38.40: PG 35,907.910, in Liturgia das Horas, 2, 246-247. 77 coragem, nós os libertamos. Os santos lhes abrem os braços, nós os introduzimos na morada da felicidade. Tal é o nosso poder! Tal é o nosso dever! Diz a Sagrada Escritura que “Os olhos do Senhor estão voltados para os justos e os seus ouvidos atentos aos seus rogos: Os justos clamaram e o Senhor os ouviu. (Samo 33,16-18) 3. As almas do Purgatório são impotentes para se aliviarem a si mesmas. O Purgatório corresponde a essa noite de que nos fala Jesus no Evangelho (Jo 12,35): Trabalhai enquanto é dia! Aproxima-se a noite durante a qual ninguém pode trabalhar. Eis porque os nossos queridos defuntos em nada podem suavizar os seus sofrimentos. Em vão do abismo profundo chamam pelo Senhor, lemos no Salmo 129; em vão lhe dizem como David: Meu Deus, meu Deus, porque me abandonastes? Como estais longe da minha oração e das palavras do meu lamento? Meu Deus, clamo de dia e não me respondeis, clamo de noite e não me prestais atenção.160 As nossas súplicas humildes e persistentes chegam ao coração de Deus. À medida que sube ao céu a nossa oração, desce sobre o Purgatório a misericórdia divina em torrentes de graça e de perdão. Exemplo: 1. O santo padre Pio e Pietro di Mauro Numa tarde, o padre Pio estava num quarto, localizado na parte baixa do convento, destinado aos hóspedes. Estava só e descansava sobre o sofá, quando de repente, apareceu um homem envolto numa capa preta. O padre Pio, surpreendido, ergueu-se e perguntou-lhe quem era e o que queria. O estranho respondeu: “Eu sou Pietro di Mauro; morri num incêndio, neste convento, em 18 de Setembro 1908. Morri entre as chamas quando dormia, em meu colchão feito de palha, exactamente neste quarto. Venho do Purgatório: O bom Deus, deixou-me vir até aqui para lhe pedir que celebre para o meu descanso eterno a santa missa de amanhã de manhã. Graças a esta missa eu poderei entrar no Paraíso. Padre Pio disse-lhe que ofereceria por ele a santa missa. Depouis quis levá-lo até à porta do convento para se despedir, quando repentinamente, para sua surpresa, ele desapareceu. Apercebeu-se seguramente de que tinha falado com uma pessoa morta, o que fez com que entrasse no convento bastante comovido. O Superior, Monsenhor Paulino de Casacalenda, notou seu nervosismo, e foi então que Padre Pio contou o que havia acontecido e pediu autorização para celebrar a missa, na manhã seguinte, por aquela alma necessitada. Alguns dias depois, o Superior, despertado pela curiosidade, foi até ao escritório do registo de óbitos da comunidade de S. Giovanni Rotondo; pediu para consultar o livro de óbitos do ano de 1908. Após a consulta, verificou que a história do Santo Padre Pio era verdadeira, pois no livro de registo do mês de Setembro, estava escrito: No dia 18 de Setembro de 1908, no incêndio da casa de repouso, morreu o Sr. Pietro Di Mauro. 2. O paralítico da piscina de Jerusalém Um dia, Jesus encontrou um paralítico junto da piscina de Betsatá, em Jerusalém. Há trinta e oito anos que este homem estava ali! Esperava tristemente a ajuda de alguém que o introduzisse na piscina, para ser curado. O Anjo do Senhor, certos dias, descia à piscina e o primeiro doente que se lavasse ficava curado. 160 Sal 21,2-3. 78 Ao vê-lo estendido, movido de compaixão, Jesus aproximou-se e perguntoulhe porque não ia lavar-se como os outros, para ficar curado. O enfermo respondeu-Lhe: - Senhor, não tenho ninguém que me introduza na piscina, quando a água se agita. E enquanto eu vou, outro desce antes de mim. Foi como se dissesse: “Senhor, eu sou tolhido de pés e mãos e por isso incapaz de qualquer movimento. Não tenho ninguém que me lance na piscina salutar. Assim, a minha cura tão desejada não depende de mim, que sou paralítico, mas tenho necessidade de um amigo generoso que me preste este auxílio.” Disse-lhe Jesus: - Levanta-te, pega no teu catre e anda! Imediatamente o homem ficou são, pegou na sua enxerga e começou a caminhar! (Cf. Jo 5,1-10) Tal é a triste sorte das Almas do Purgatório: incapazes de se socorrerem a si mesmas, incapazes de se lançarem na piscina do sangue preciosíssimo de Jesus Cristo, elas esperam, como o paralítico do Evangelho de S. João, um amigo caritativo que sobre elas lance o sangue do nosso Redentor. Sê tu também um anjo libertador das pobres Almas do Purgatório!161 3. São Vicente Ferrer São Vicente Ferrer nasceu em Espanha (1350-1419). Foi um grande reformador da Ordem de S. Domingos. A sua pregação era tão eloquente e a sua linguagem era de fogo tão ardente que atraía multidões. O tema central das suas catequeses era o Julgamento divino e a Segunda vinda de Jesus. Também os muitos milagres que fazia levavam muita gente a mudar de vida, convertendo-se. Entretanto, sua irmã mantinha uma vida mundana, caminhando rapidamente para a ruína do corpo e da alma, não se deixando influenciar pelo exemplo de santidade de seu irmão. Ao saber que sua irmã tinha adoecido, S. Vicente rezou por ela e obteve de Deus a sua conversão. Alguns dias depois da sua morte, enquanto seu irmão celevrava o Santo Sacrifício da Missa, ela apareceu-lhe envolvida pelas chamas que lhe causavam os mais intoleráveis e horríveis tormentos. - Meu querido irmão, disse ela, estou condenada a suportar estes terríveis tormentos até ao Juizo final. Tu podes ajudar-me. A eficácia da Santa Missa é tão grande que se a ofereceres por mim, poderei esperar o mais feliz resultado. S. Vicente Ferrer começou a celebrar, pedindo por ela. Algum tempo depois, sua irmã apareceu-lhe, de novo, rodeada de Anjos, que a conduziam ao Céu. Graças ao valor da Eucaristia a longa expiação foi abreviada. (Purgatory, p 74-75) Oremos: Senhor Jesus que vos compadecestes dos que choravam e enxugastes as suas lágrimas, salvai os nossos irmãos defuntos e dai-lhes a plenitude da redenção. Cântico: Felizes os mortos que morrem no Senhor, aleluia, aleluia! Felizes os mortos que morrem no Senhor! . Senhor Deus, Senhor do mundo, grandes são as Vossas obras. Justos são vossos caminhos, ó Senhor do universo. (Cantemos todos, 11ª Ed. nº 595) 161 A. BERLIOZ, Mês das almas, 5ª. ed., ed. Machado & Ribeiro, Porto 1946, 61-62. 79 26. A caridade não deve ter limites! «É este o meu mandamento: amai-vos uns aos outros como eu vos amei! (Jo 15,12) Caríssimos, amemo-nos uns aos outros porque o amor vem de Deus! Deus é Amor!» 1 Jo 4,7-8) Se na nossa vida encontramos os frutos da caridade, não duvidemos de que Deus está connosco. Sejamos dignos de tão grande hóspede, perseverando com maior generosidade no exercício das obras de misericórdia. Se Deus é amor, a caridade não deve ter limites! A piedade cristã exorta-nos a uma caridade diligente em favor dos pobres e de todos os que sofrem, para que os nossos jejuns possam mitigar a fome dos indigentes e se multipliquem as acções de graças a Deus! Nenhuma devoção é mais agradável a Deus do que esta solicitude misericordiosa pelos pobres, pois Deus reconhece em nós a imagem da sua própria bondade. “Ninguém receie que estas liberalidades lhe tragam falta de recursos, porque a benevolência já por si é uma grande riqueza e, além disso, nunca os frutos da generosidade escasseiam onde Cristo alimenta e é alimentado. Em tudo isto intervém a mão divina que ao partir o pão o faz crescer e ao reparti-lo o multiplica.”162 Escutemos S. Paulo (2 Cor 9,7): «Dê cada um segundo o impulso do seu coração, sem tristeza, nem constrangimento, porque Deus ama aquele que dá com alegria!» Portanto, quem dá esmola faça-o com alegria e confiança: tanto maior é o lucro quanto menos guardar para si: Dai e dar-se-vos-á: recebereis uma boa medida, cheia, a transbordar! Com a medida com que medirdes vos será medido!163 O grande perigo, hoje em dia, é que tudo vai bem. Preocupamo-nos pouco com a vida eterna e prendemo-nos muito aos bens temporais. No entanto, tudo passa e talvez mais depressa do que nós imaginamos: Insensato! Esta noite virei pedir contas! O que acumulaste para quem será? 164 Cântico: Vinde, benditos de meu Pai! Recebei em herança o reino preparado para vós desde o princípio do mundo, aleluia! . Dai graças ao Senhor porque Ele é bom, porque é eterna a sua misericórdia. (Salmo 117) Exemplos: Três amigos: dinheiro, familiares e boas obras 1. Um homem tinha três amigos; amava com amor de predilecção, sobretudo a dois deles. Um dia foi acusado perante a justiça de um grande crime, embora estivesse inocente. Chamou-os e perguntou: - Quem de vós quer acompanhar-me ao tribunal e protestar energicamente, defendendo a minha inocência? 162 Cf. S. LEÃO MAGNO, Sermões, PL54, 299-301, in Liturgia das Horas, vol. 2, 274. Lc 6,38. 164 Lc 12,20. 163 80 O primeiro escusou-se, justificando as suas ocupações inadiáveis. O segundo acompanhou-o até à porta do tribunal, mas voltou para casa, temendo as consequências da cólera do juiz. O terceiro, aquele com quem menos contava, acompanhou-o, atestou a honradez e a inocência de seu amigo com tal convicção que o juiz não só restitui a liberdade, mas lhe concedeu maiores privilégios. Para reflectirmos: Neste mundo, o homem tem três amigos. Quando Deus nos chamar, o dinheiro, nosso amigo predilecto não nos acompanha: abandona-nos completamente e não nos serve para mais nada. Os nossos familiares acompanhamnos até ao cemitério e voltam tranquilamente para casa. O terceiro amigo (as obras de misericórdia) estará presente e falará em nosso favor. S. João, no livro do Apocalipse, afirma que as boas obras nos acompanharão à presença de Deus: Felizes os mortos que morrem no Senhor! Que descansem em paz, pois as suas obras os acompanham!165 Pensamento do bispo Tihamer Tóth acerca do dinheiro: Quem tem dinheiro tem tudo, afirmam alguns. Contudo, isso não é verdade. Com o dinheiro podemos comprar alimento, mas não o apetite. Podemos comprar remédios, mas não a saúde. Com o dinheiro podemos comprar almofadas, mas não o sono aprazível. Com o dinheiro podemos comprar conhecidos, mas não amigos. Com o dinheiro podemos comprar uma bela sepultura no cemitério para o corpo, mas não um lugar para a alma, na vida eterna. Ponhamos em prática o ensinamento de Jesus: Arranjai amigos com o vil dinheiro, para que quando este vier a faltar, eles vos recebam nas moradas eternas. (Luc16,9) Casa na eternidade: “O homem irá à casa de sua eternidade” (Eccles. 12, 5). Um homem muito rico morreu e foi recebido no céu. O seu anjo da guarda levou-o por várias alamedas e foi-lhe mostrando as moradias que ali existiam. Passaram por uma linda casa com belos jardins. - Quem mora ali, perguntou o homem, admirado. - É o Raimundo, o seu motorista que morreu, no ano passado. O homem ficou a pensar: se o Raimundo tem uma casa dessas, isto aqui deve ser mesmo muito bom! Logo a seguir, surgiu uma outra, ainda muito mais bonita; perguntou entusiasmado: - E aqui, quem mora? - Aqui é a casa da Rosalina, aquela que foi a sua cozinheira. O homem ficou imaginando que, se os seus empregados tinham tão magníficas residências, a sua morada deveria ser, no mínimo, um palácio e estava ansioso por vê-lo. Entretanto, o Anjo que o acompanhava, parou diante de uma barraca construída com tábuas e disse: - Esta é a sua casa. - Como é possível? – Perguntou com tristeza. - Na eternidade, nós construímos com o material seleccionado e enviado por si, durante a sua vida terrena. 165 Apoc 14,13. 81 3. Santa Teresa de Calcutá (1910-1997) Naquele tempo, Jesus estando sentado em frente do tesouro, observava como a multidão deitava as moedas. Muitos ricos deitavam quantias avultadas. Veio uma viúva pobre e deitou duas pequenas moedas, isto é, um quadrante. Chamando os discípulos, Jesus disse-lhes: «Em verdade vos digo: esta viúva pobre deitou no tesouro mais do que todos os outros; porque todos deitaram do que lhes sobrava, mas ela, da sua penúria, deitou tudo quanto possuía, todo o seu sustento.» (S. Marcos 12,41-44) Santa Teresa de Calcutá fez este comentário ao Evangelho da pobre viúva: “É preciso dar o que vos custa um pouco. Não basta dar apenas aquilo sem o qual podemos passar, mas também aquilo sem o que não podemos ou não queremos passar, as coisas a que estamos apegados. A vossa dádiva torna-se então um sacrifício que terá valor aos olhos de Deus. É o que eu chamo o amor em acção. Todos os dias, vejo crescer este amor, nas crianças, nos homens e nas mulheres. Um dia, eu descia uma rua; um mendigo aproximou-se de mim e disse-me: “Madre Teresa, toda a gente te dá presentes; também eu quero dar-te qualquer coisa. Hoje, recebi apenas duas pequenas moedas em todo o dia e quero dar-tas”. Eu reflecti um momento; se recebo estas moedas ele arrisca-se a não ter nada para comer esta noite, e se não as receber, dar-lhe-ei um desgosto. Então, estendi as mãos e recebi o dinheiro. Nunca vi um rosto espelhar tanta alegria como o daquele homem, tão feliz por ter podido oferecer um presente à madre Teresa! Era um enorme sacrifício para ele, que tinha mendigado todo o dia ao sol e adquirido esta pequena quantia com a qual não se podia fazer quase nada. Mas era também maravilhoso, porque estas moedas, a que ele renunciava, tornaram-se uma fortuna, porque foram dadas com muito amor.” Quando a Madre Teresa de Calcutá, “albanesa de sangue, indiana de cidadania”, partiu para a casa de Deus Pai, milhões de pessoas, em todo o mundo, viram o seu funeral, através da televisão. Quem foi esta mulher pobre e pequena de estatura, mas grande de coração e repleta de luz e do amor de Jesus? Madre Teresa nasceu em 26 de Agosto de 1910, na Albania. Aos 18 anos, entrou para as "Irmãs do Loreto", na Irlanda, onde recebeu o nome de Mary Teresa, como Santa Teresa de Lisieux. Pouco depois, partiu para a Índia e chegou a Calcutá, no dia 6 de Janeiro de 1929. Madre Teresa “ouviu a voz de Deus” e sentiu em seu coração o desejo de saciar a sede de Jesus, que lhe pedia para fundar uma comunidade religiosa dedicada ao serviço dos “mais pobres, entre os pobres”. Madre Teresa, vestia um hábito simples, o sári branco bordado de azul e exerceu o seu apostolado junto dos mais abandonados, tornando-se mensageira do amor de Deus em todo o mundo. Algumas frases de Madre Teresa: . O senhor não daria banho a um leproso nem por um milhão de dólares? Eu também não. Só por amor se pode dar banho a um leproso. . A falta de amor é a maior de todas as pobrezas. . O mais importante não é o que se dá, mas o amor com que se dá. . A força mais potente do universo é a fé. . Não importa quantas coisas fazes, mas quanto amor colocas naquilo que fazes. Madre Teresa morreu com oitenta e sete anos, no dia 5 de Setembro de 1997. S. João Paulo II proclamou-a beata, no dia 19 de Outubro de 2003. Foi com grande 82 alegria que assistimos à sua canonização pelo Papa Francisco no dia 4 de Outubro de 2016. Amigos, não sei quais foram as últimas palavras desta santa, mas sabemos o que Jesus dirá aos que foram misericordiosos: “Vinde benditos de meu Pai! Recebei o reino que vos está preparado, desde o princípio do mundo!” Mat 25, 34 Oração: Ó Jesus, Vós dissestes: “Em casa de meu Pai há muitas moradas. Vou preparar-vos um lugar!”(Jo 14,2) Cheios de compaixão, nós vos pedimos para os nossos irmãos defuntos, um lugar de luz e de paz no Céu, nosso eterno lar! 27. Catarina Emmerich e as almas do Purgatório. «Irmãos, seja a vossa caridade sem fingimento. Detestai o mal e aderi ao bem. Amai-vos uns aos outros com amor fraterno. Rivalizai uns com os outros na estima recíproca. Não sejais indolentes no zelo, mas fervorosos no espírito. Dedicai-vos ao serviço do Senhor. Sede alegres na esperança, pacientes na tribulação, perseverantes na oração. (Rom 12, 9-12) Gaudium et Spes, 39 «Ignoramos o tempo da nova terra e de nova humanidade. Também não sabemos o modo como se transformará o universo. Passará a figura deste mundo, deformado pelo pecado, mas sabemos que Deus prepara uma nova terra, onde reinará a justiça e cuja felicidade satisfará e ultrapassará todos os desejos de paz que se levantam no coração dos homens. Então, vencida a morte, os filhos de Deus ressuscitarão em Cristo e o que foi semeado na fraqueza e na corrupção revestir-se-á de incorruptibilidade.” Anna Catharina Emmerich, Religiosa Agostinha, nasceu no dia 8 de Setembro de 1774 e morreu no dia 9 de Fevereiro de 1824, em Dulmen, na Alemanha. Favorecida com muitas graças místicas, via frequentemente o Anjo da Guarda. Aparecia-lhe muitas vezes a Mãe de Jesus e também os Santos a visitavam. Próxima do fim da sua vida, recebeu a Santa Unção dos Doentes e a sagrada Comunhão. Com voz de moribunda pronunciou o nome de Jesus. “Meu Jesus, mil vezes vos agradeço toda a minha vida; não se faça a minha vontade, mas a Vossa. Senhor, eu Vos dou graças. Morro para Vós. Ó Senhor, vinde e socorrei-me.” A Venerável Catarina Emmerich repetia com frequência: “Quão grande é a miséria das almas do purgatório! Nada podem por si mesmas! Mas se alguém sofre por pouco que seja, se rezam por elas, se dão esmola por elas, logo isso lhes aproveita. Ficam tão alegres e felizes, como um homem a morrer de sede, a quem tivessem dado um copo de água fresca! Sofrem por causa do grande abandono em que as deixamos cair, devido ao relaxamento a que chegou a piedade cristã, pela ausência de zelo pela glória de Deus e salvação do próximo. Só a caridade satisfaz por elas, com os mesmos actos de virtude a que foram indiferentes durante a vida. Qualquer boa acção, por mais insignificante, não fica sem efeito! Mas como são poucas as pessoas que delas se ocupam! Os consagrados, rezando com devoção a Liturgia das Horas, na ideia de suprir o que lhes falta, podem levar-lhes consolações 83 incríveis! A virtude da bênção sacerdotal penetra até ao purgatório e refresca, como orvalho celeste as almas para quem é enviada com verdadeira fé. Nada se perde do que na igreja é feito em união com Jesus Cristo: Todo o piedoso desejo, todo o bom pensamento, toda a obra de caridade inspirada no amor de Deus aproveita ao acabamento do Corpo místico da Igreja. Quem não fizer mais do que orar pelos seus irmãos em espírito de caridade, participa já num trabalho grandioso que produz abundantes frutos de salvação! Tudo o que o homem pensa e diz produz efeito para o bem ou para o mal. O que praticou o mal, deve apressar-se a apagar a sua falta pelo arrependimento e pela confissão no Sacramento da Penitência. De outra maneira, é-lhe difícil ou mesmo impossível impedir as consequências do mal que praticou. Sempre me foram postos em evidência os efeitos posteriores, incalculáveis, das faltas que ficaram sem perdão, sem expiação. Vejo estender-se a uma longa posteridade o castigo de muitos pecados como algo natural e necessário.” Exemplos 1. Pintura imodesta Não foi em vão que Jesus Cristo clamou: Ai do mundo por causa dos escândalos! Ai daquele homem que cometeu escândalo! (Mat 18:7) Eis o que o Padre Rossignoli relata no seu livro Maravilhas do Purgatório: “Um pintor de grande talento e de vida exemplar, fez uma pintura que não estava muito de acordo com a lei da modéstia cristã. Foi uma daquelas pinturas que, como tantas outras, sob o pretexto de serem obras de arte, encontramos em casa das melhores famílias, mas que provocam a perda de muita gente. Com o tempo, abandonou este estilo pernicioso e confinou-se à produção de pinturas religiosas e outras, mas completamente irrepreensíveis. Finalmente, estava a pintar um grande quadro num convento de Carmelitas descalços, quando foi atacado por uma doença mortal. Sentindo que estava para morrer, pediu ao Prior para ser enterrado no cemitério do convento, deixando a sua considerável fortuna à comunidade. Pediu que lhe mandassem celebrar a Missa pela sua alma. Pouco tempo depois, morreu piedosamente. Passados alguns dias, quando um religioso estava no coro, depois da oração comunitária, viu-o aparecer cercado de chamas, suspirando por compaixão. - Como pode ser? Tens de suportar tais sofrimentos, tu que viveste tão piedosamente e tiveste uma morte tão santa? - Ah! Isto deve-se a um quadro escandaloso que pintei há alguns anos atrás. Quando compareci diante do tribunal do Supremo Juiz, uma multidão de acusadores veio testemunhar contra mim. Declararam que tinham sido excitados por pensamentos impróprios e maus desejos por causa da obra das minhas mãos. Por causa desses maus pensamentos muitos estavam no Purgatório, outros no Inferno. Por ter sido eu o causador de todas essas más situações, eu merecia, pelo menos, o mesmo castigo. Então a Santíssima Virgem e os Santos que eu também glorifiquei com as minhas pinturas, vieram em minha defesa, dizendo que aquela infeliz pintura tinha sido obra da minha juventude e que já me tinha arrependido e feito reparação com outros trabalhos religiosos que foram uma fonte de santa edificação para muita outra gente. Tendo em conta estes e outros argumentos, o Juiz declarou que devido ao meu arrependimento e às minhas boas obras eu não seria condenado, mas ficaria no purgatório até ao dia em que esse quadro imoral fosse queimado, deixando de produzir escândalo. 84 Se tais são as consequências de uma pintura imodesta, quais serão os castigos dos pecados resultantes dos maus livros, dos maus filmes, das más conversas e dos exemplos escandalosos?” (Purgatory, 95-96) O escândalo 42 E se alguém escandalizar um destes pequeninos que crêem em mim, melhor seria para ele atarem-lhe ao pescoço uma dessas mós, movida por um jumento e lançarem-no ao mar. 43*Se a tua mão é para ti ocasião de queda, corta-a; mais vale entrares mutilado na vida, do que, com as duas mãos, ires para a Geena, para o fogo que não se apaga, 44*onde o verme não morre e o fogo não se apaga. 45Se o teu pé é para ti ocasião de queda, corta-o; mais vale entrares coxo na vida, do que, com os dois pés, seres lançado à Geena, 46*onde o verme não morre e o fogo não se apaga. 47 E se um dos teus olhos é para ti ocasião de pecado, arranca-o; mais vale entrares com um só no Reino de Deus, do que, com os dois olhos, seres lançado à Geena, 48* onde o verme não morre e o fogo não se apaga. (Marcos 9,42-48 2. História de um homem sem tempo para Deus Em criança quiseram ensiná-lo, mas alguém contestou: é muito cedo para pensar em Deus, porque ainda não compreende nada. Quando menino, acharam bem mandá-lo à catequese mas alguém objectou: é muito criança para pensar em Deus. Na juventude, foi convidado para um grupo de jovens. Estava entretido com a namorada, e alguém respondeu por ele: está muito apaixonado para pensar em Deus. Como homem casado, a esposa pedia-lhe que fosse à Missa aos Domingos, mas ele respondia: estou muito ocupado para pensar em Deus. Houve pregações na aldeia. Quiseram convidá-lo, mas os amigos responderam: deixem-no, está muito cansado para pensar em Deus. Uma vez, convidaram-no a fazer a confissão pascal. Ele, porém, ocupado com negócios, respondeu: estou muito preocupado para pensar em Deus. Quando já era idoso, convidaram-no a fazer uma revisão da sua vida. Os netos objectaram: o avô está muito velho para pensar em Deus. Quando estava a ser levado para o cemitério, alguém comentou: agora é tarde de mais para pensar em Deus. Oremos: Pai Santo, Vós que ressuscitastes maravilhosamente a Jesus Cristo, Vosso Filho, fazei que os nossos defuntos cheguem à plenitude da vida. 28. Santa Teresinha e o Purgatório. «Não morro, entro na vida! Oh, Eu amo-O! Meu Deus, eu Vos amo!» (Santa Teresa do Menino Jesus) O fogo do Amor divino Santa Teresinha do Menino Jesus, proclamada Doutora da Igreja pelo Santo Padre S. João Paulo II, no dia 19 de Outubro de 1997, dizia que não devemos temer o Purgatório, nem desejar evitá-lo devido aos sofrimentos que lá se padecem, mas, sobretudo, para agradar a Deus. Se confiamos totalmente em Deus, Ele purifica-nos com o fogo do seu amor divino, não deixando em nós vestígio de pecado. Eis as suas 85 palavras, extraídas de uma circular do Carmelo de Lisieux, assinadas pela Irmã Inês de Jesus, em 17 Fevereiro de 1924: “Por isso, não posso temer o Purgatório. Sei que só as almas santas aí terão acesso, mas também sei que o Fogo do Amor divino é mais santificador que o do Purgatório!” (Conrad de Meester, Dinamique de la Confiance, ed Cerf, 1995, pag. 538) Conhecemos o grande zelo de Santa Teresinha pela conversão dos pecadores, como nos mostra a sua oração pela conversão de Pranzini166. O seu grande amor pelos pecadores fê-la entrar para o Carmelo, com apenas 15 anos, a fim de concretizar o seu objectivo na vida consagrada: «Venho para o Carmelo para rezar pelos pecadores.» No dia 9 de Julho de1895, Domingo da Santíssima Trindade, ofereceu-se como vítima ao Amor Misericordioso: «Ó meu Deus! Trindade Bem-aventurada! Desejo amar-Vos e fazer-Vos amar, trabalhar pela glorificação da Santa Igreja, salvando as almas que estão na terra e libertando as que estão no Purgatório! A fim de viver num acto de perfeito Amor, ofereço-me com vítima de holocausto ao vosso amor misericordioso, suplicando-Vos que me consumais sem cessar, deixando transbordar para a minha alma as ondas de ternura infinita que estão encerradas em Vós!»167 Na poesia 23, dedicada ao Sagrado Coração de Jesus, estrofe nº8, escreveu: «Para poder contemplar a tua glória sei que é preciso passar pelo fogo. Eu escolho para meu purgatório o teu Amor ardente!»168 A Madre Inês tinha a certeza de que sua Irmãzinha fora imediatamente para o Céu: «Punha as mãos no fogo para afirmar que Teresinha foi direitinha para o Céu; nem quero que digam que ela esteve um segundo no Purgatório. Sem esta crença a doutrina da infância espiritual, fica inteiramente destruída; é necessário que tenha esta base!»169 Santa Teresinha sentiu-se particularmente impressionada com a morte de Madre Genoveva. No momento exacto em que a santa Madre nascia para o Céu, sentiu-se cheia de uma grande alegria e de um fervor indescritível. Santa Teresinha estava bem persuadida de que esta Madre tinha ido direita para o Céu. Alguns dias antes, conversando com ela, perguntou-lhe: - Ó minha Madre, vós não ireis para o purgatório! - Assim o espero! - Respondeu com doçura. Acerca da morte de seu pai, Santa Teresinha escreveu: «Sabeis, meu Deus, quanto desejo saber se o Papá foi direitinho para o Céu. Não Vos peço que me faleis, mas dai-me um sinal. Se a Irmã Amada de Jesus, (que se opunha à entrada de sua irmã Celina no Carmelo), não levantar obstáculos será essa a resposta de que o Papá foi direitinho ter convosco». Deus mudou completamente as disposições da Irmã Amada. Santa Teresinha afirmou que a primeira pessoa que encontrou, depois da acção de graças, foi a Irmã Amada, que a chamou com amabilidade e lhe falou da Celina com as lágrimas nos olhos… 166 Cf. Dia 13. S. TERESA DO MENINO JESUS, Obras Completas, o.c., 1075-1078. 168 Ibidem, 736. 169 Madre Inês de Jesus, ed. Livraria Apostolado da Imprensa, Porto 1957, 144. 167 86 Por isso Santa Teresinha podia afirmar: “Ah! Quantas razões eu tenho para agradecer a Jesus, que soube satisfazer todos os meus desejos!”170 Exemplo Morte de Santa Teresinha do Menino Jesus e da Santa Face No dia trinta de Julho, Santa Teresinha do Menino Jesus recebeu a Santa Unção. A hora final viria daí a dois meses de intenso sofrimento. «Nunca pensei que se pudesse sofrer tanto. Só posso explicar este sofrimento pelo grande desejo de salvar almas!» Um dia, teve uma espécie de visão em que lhe apareceu Madre Ana de Jesus, fundadora do Carmelo, em França. Santa Teresinha perguntou-lhe: - Ó minha Madre! Eu vos suplico, dizei-me se Deus me deixará muito tempo na terra… Não virá buscar-me muito em breve? Sorrindo com ternura a Santa Madre respondeu: - Sim, em breve, em breve… prometo-vos. 171 Chegou o dia trinta de Setembro de 1897. Santa Teresinha abandona-se à vontade de Deus: «O que mais me agrada é o que o Bom Deus ama e escolhe para mim!» – confidenciou à madre Inês, sua irmã de sangue. O seu estado de esgotamento era total. Os sofrimentos eram cruéis e constantes. Contudo, o seu rosto permaneceu duma beleza e frescura miraculosas: «Tem uma figura de anjo: a sua face não se alterou, apesar dos sofrimentos! Nunca vi coisa assim! Com o seu estado de emagrecimento geral, isto só se justifica de forma sobrenatural!» – constatou o médico, doutor de Cornière. Teresa está extenuada. Chama a Santíssima Virgem para que venha em sua ajuda. Sofre imenso: «Nunca poderia ter acreditado ser possível sofrer tanto!». As trevas interiores dissipam-se. Pelas cinco da tarde, entra na fase final da agonia. Às sete horas e vinte, a Irmã Teresa do Menino Jesus e da Santa Face expira, deitando um último olhar amoroso para o Crucifixo. Morreu suspirando de amor: «Oh! Eu amo-O! Meu Deus, eu Vos amo!»172 Rapidamente a campainha toca para chamar todas as religiosas, que acorrem à enfermaria. As irmãs ajoelham silenciosamente. Teresa levanta-se, a sua figura animase, os seus olhos reflectem uma felicidade inexprimível; desapareceram todos os sinais de sofrimento. Esta cena durou o tempo de um Credo. Depois fechou os olhos. Acabou. A Irmã Teresa do Menino Jesus tinha deixado a terra para entrar na eternidade. O sorriso, marca da sua vida, ficou estampado no seu rosto, deixando maravilhados todos os que o viram. Curiosamente, dia nove de Junho desse ano, tinha escrito ao abade de Belière: «Eu não morro, entro na Vida!»173 Oferta de Santa Teresinha ao Amor Misericordioso. “Ó meu Deus! Trindade bem-aventurada! Desejo amar-Vos e fazer-Vos amar, trabalhar pela glorificação da Santa Igreja, salvando as almas que estão na terra e libertando as almas que estão no Purgatório! A fim de viver num acto de perfeito 170 S. TERESA DO MENINO JESUS, Manuscritos Autobiográficos, o.c., 229. IDEM, Obras Completas, o.c., 226. 172 Cf. RENE LEJEUNE, La petite voie de S. Thérèse, ed. Parvis, 23-24 S. TERESA DO MENINO JESUS, Obras Completas, o.c., 1259. 173 S. TERESA DO MENINO JESUS, Carta 244 de 9 de Junho de 1887, in Obras Completas, 622. 171 87 amor, ofereço-me como vítima de holocausto ao Vosso Amor Misericordioso, suplicando-Vos que me consumais sem cessar, deixando transbordar para a minha alma as ondas de ternura infinita que estão encerradas em Vós! Quero ó meu Deus, a cada palpitação do meu coração, renovar-Vos este oferecimento um número infinito de vezes, até ao momento em que, desvanecidas as sombras, possa reafirmar-Vos o meu amor num face a face eterno.” Imitemos Santa Teresinha. Rezemos: Virgem Maria, Consoladora dos aflitos, Mãe de Misericórdia, pelas vossa mãos imaculadas, ofereço ao Pai celeste a minha vida, as minhas orações e boas obras pelas almas do Purgatório. Despedida emocionante Em Fevereiro de 1794, durante a revolução francesa foi condenado à morte um soldado católico, chamado Binbenet de la Roche. Antes de morrrer escreveu esta carta de despedida: “Suplico-lhe, querida mãe, que não se inquiete com a minha situação. Dê graças a Deus pelos benefícios que diariamente me concede. Estou onde a Providência quer que eu esteja. Espiritualmente não posso estar melhor. Jesus não subiu ao seu Reino pelo caminho do Tabor, mas preferiu o caminho doloroso do Calvário. Diante deste exemplo, sinto-me feliz por sofrer alguma coisa, com a esperança do Céu. Jesus proclamou no seu Evangelho: Felizes os que sofrem perseguição por amor da justiça, porque deles é o reino dos Céus! Não sou infeliz. Segundo a fé, sou bem-aventurado, por isso, fique tranquila. Binbinet exultou de alegria à vista da guilhotina. Aproximou-se dela, cantando: Louvai o Senhor todas as nações, aclamia-O todos os povos.É firme a sua misericórdia para connosco, a fidelidade do Senhor permanece eternamente! (Salmo 116 (117) Sabedoria 15,1-3: Mas Vós, Senhor nosso Deus, sois bom e verdadeiro, paciente, e tudo governais com misericórdia. Mesmo quando pecamos, somos vossos; pois conhecemos o vosso poder, mas não queremos pecar, sabendo que vos pertencemos. Conhecer-Vos leva à justiça perfeita e reconhecer o vosso poder é a fonte de imortalidade. Oremos: Eterno Pai, eu vos ofereço o Corpo, sangue alma e divindade de vosso muito amado Filho, nosso Senhor Jesus Cristo, em expiação dos nossos pecados e dos pecados do mundo inteiro e pelo descanso eterno das almas do purgatório. 29. Santa Faustina Kowalska: Novena da Misericórdia. «Deus é rico de misericórdia! (Ef 2,4) Dai graças ao Senhor porque Ele é bom, porque é eterna a sua misericórdia!» Salmo 117 (118) Esta meditação é extraída do Diário de Santa Faustina Kowalska, uma religiosa polaca, canonizada por S. João Paulo II, em 30 de Abril do ano 2000. “Disse-me o Senhor: Entra com frequência no Purgatório, porque lá precisam muito de ti.174 174 FAUSTINA KOWALSKA, o.c., nº 1738. 88 Hoje traz-me as almas que se encontram na prisão do Purgatório e mergulha-as no abismo da minha Misericórdia. Que as torrentes do meu sangue refresquem o seu ardor. Está ao teu alcance trazer-lhes alívio. Tira do tesouro da minha Igreja todas as indulgências e oferece-as por elas. Oh! Se conhecesses o seu tormento, incessantemente oferecerias por elas a esmola do espírito e pagarias as suas dívidas à minha justiça175. Misericordiosíssimo Jesus, Vós dissestes que queríeis misericórdia e não o sacrifício, eis que trago à morada do Vosso compassivo coração as almas do Purgatório; estas almas são-Vos muito queridas e devem reparar a vossa justiça; que as torrentes de sangue e água que brotaram do Vosso Coração apaguem as chamas do fogo do Purgatório, para que também ali seja glorificado o poder da Vossa misericórdia. Eterno Pai, olhai com o olhar da vossa misericórdia para as almas que estão no Purgatório e que estão encerradas no Coração compassivo de Jesus. Suplico-Vos pela dolorosa Paixão de Jesus, Vosso Filho: mostrai a Vossa misericórdia às almas que se encontram sob o olhar da Vossa justiça; olhai para elas através das chagas de Jesus, Vosso muito amado Filho, porque nós acreditamos que a vossa bondade e misericórdia são incomensuráveis.176 Exemplo 1. Padre Pio e um noviço O Santo Padre Pio contou a seguinte história ao Padre Anastácio. Uma tarde, enquanto estava rezando sozinho, ouvi um leve sussurro e vi um jovem monge que se mexeu próximo do altar. Parecia que estava espanando os candelabros e regando os vasos das flores. Eu pensei que era o Padre Leone, que estava restaurando o altar. Como era a hora do jantar, aproximei-me e falei-lhe: - Padre Leone, vá jantar, não são horas de consertar o altar. - Eu não sou o Padre Leone. - Então, quem é? - Eu sou um irmão seu que fez o noviciado aqui. Minha missão era limpar o altar, durante o ano do noviciado. Desgraçadamente, durante todo esse tempo, eu não reverenciei a Jesus Sacramentado, Deus todo-poderoso, todas as vezes que passava em frente ao altar. Por este descuido sério, ainda estou no Purgatório. Agora, Deus, com a sua bondade infinita, enviou-me aqui para que reze por mim e para que estabeleça o dia em que eu passarei a desfrutar o Paraíso. Pensava ter sido generoso, prometendo-lhe: “Amanhã, pela manhã, entrará no Paraíso, quando eu celebrar a Santa Missa.” Aquela alma chorou e antes de desaparecer, exclamou: - Ai pobre de mim, como fui irreverente e desleixado. Esta dolorosa exclamação produziu-me uma ferida tão grande no coração, que sentila-ei a vida inteira.”177 2. Pai de Santa Catarina de Sena. 175 Ibidem, 1226. Ibidem, 1279. 177 PADRE PIO DA PIETRELCINA: Epistolário I° (1910-1922), San Giovanni Rotondo. Arni DECORTE, Padre Pio, p 178. 176 89 O pai de Santa Catarina de Sena estava a morrer. A filha, não desejando que o pai sofresse no Purgatório, orou assim: “Ó meu Jesus, como poderei suportar que o meu pai, que me criou com tanto carinho, seja atormentado no Purgatório? Eis-me aqui. Eu me ofereço para sofrer todas as penas que ele deveria suportar na outra vida.” Jesus respondeu-lhe: “Minha filha, aceito a troca. O teu pai não passará pelo Purgatório, mas tu, enquanto viveres, sofrerás no teu corpo as penas que lhe estavam reservadas.” Santa Catarina foi ter com o pai moribundo, consolando-o naquela última hora. O doente expirou na maior paz. Toda a família soluçava. Catarina, de pé, disse: - Meu pai, que felicidade a tua! Quem me dera estar onde tu estás agora! Naquele mesmo instante, sentiu fortes dores que nunca mais a deixaram até ao fim da vida. Eram as que o pai devia padecer no Purgatório. (Purgatory, 242) Oração: Senhor Jesus Cristo, recebei os nossos irmãos defuntos no reino da bemaventurança eterna. 30. A razão confirma a existência do Purgatório. «A caridade nunca desaparece!» (1 Cor 13,8) O Catecismo da Igreja Católica nos números 1030-1032 afirma a existência do Purgatório como dogma de fé e ensina que nós podemos ajudar os nossos Irmãos Fiéis Defuntos. 1. “Os que morrem na graça e amizade de Deus, mas não de todo purificados, embora seguros da sua salvação eterna, sofrem depois da morte uma purificação a fim de obterem a santidade necessária para entrar na alegria do Céu. A Igreja chama Purgatório a esta purificação final dos eleitos!” (1030) 2. “A Igreja formulou a doutrina de fé relativamente ao Purgatório, sobretudo nos Concílios de Florença e de Trento. Desde os primeiros tempos, a Igreja honrou a memória dos defuntos, oferecendo sufrágios em seu favor, particularmente o Sacrifício Eucarístico. A Igreja recomenda também a esmola, as indulgências e as boas obras em favor dos defuntos.” (1031-1032) Papa Bento XVI: «O Purgatório se não existisse tinha que ser inventado. As Igrejas evangélicas, em teoria, não admitem o Purgatório e consequentemente, as orações pelos mortos. Na prática, porém, ao menos os luteranos alemães, voltaram a elas, justificando-as com algumas considerações teológicas. As orações pelos nossos mortos são um impulso demasiado espontâneo para que possa ser sufocado. É testemunho belíssimo de solidariedade, de amor, de ajuda, que ultrapassa as barreiras da morte. Da minha lembrança ou do meu esquecimento depende um pouco a felicidade ou a infelicidade daquele que me foi querido e que passou agora para a outra margem, mas que não deixa de ter necessidade do meu amor.»178 178 RATZINGER, Diálogos sobre a fé, ed. Verbo, p. 122. 90 Sabemos que estas almas são santas e que sofrem com resignação e até com alegria, por terem a certeza da salvação. Têm a certeza de que chegarão à visão beatífica; contudo, a privação da vista de Deus provoca nelas grandes sofrimentos. Eis o que afirmam os Santos: «As almas do Purgatório têm simultaneamente uma alegria extrema e um extremo sofrimento. Uma alegria extrema: Não existe felicidade comparável com a dos que se encontram no Purgatório, a não ser a dos santos no Céu. Um extremo sofrimento porque o anelo insatisfeito que devora a alma sem consumi-la é doloroso, para além de toda a medida: é um fogo de amor! A gravidade do Purgatório é de tal ordem que não há palavras para explicar tanto sofrimento, nem a nossa inteligência consegue abarcá-lo. Contudo, sofrem, plenamente entregues à vontade divina. Adoram o mistério da santidade e da justiça de Deus. Querem a sua dor, pois querem ser purificadas para entrar na visão de Deus.»179 «São cheias de prazer pelos sufrágios dos fiéis vivos e dos Santos do céu e pelas visitas dos Anjos. Deus enche essas almas de um grande amor, que lhes torna suportáveis os maiores suplícios. A ideia de que rendem a Deus uma satisfação conveniente e de que sofrem por Deus inspira-lhes a coragem dos mártires.»180 «As penas do purgatório são maiores do que os mais horríveis tormentos dos mártires!»181 «Os mais pequeninos sofrimentos do purgatório são mais cruéis que os maiores da terra!»182 «O fogo da terra é um paraíso em comparação com o do purgatório.»183 Socorrer os irmãos que já partiram é agradável a Deus que quer ver esses seus filhos na sua glória. Proveitoso para eles, que nada podem por si mesmos, visto que já passou o tempo de poderem aumentar os seus merecimentos. Útil para nós, pois eles se converterão em poderosos intercessores! «O Purgatório é a esplêndida doutrina da esperança e da solidariedade cristã. A morte não destrói as relações entre as pessoas, que podem continuar a ajudar-se, mediante actos de amor.»184 O Purgatório é o grito bem claro de que o “Amor é forte como a morte!” e que a “caridade nunca desaparece!”185 Exemplo 1. Purgatório nesta vida Uma senhora, que então contava 40 anos, adoeceu gravemente e ao fim de dois meses estava às portas da morte. Recebidos todos os sacramentos, foi visitada por São João Bosco. Este aproximou-se do leito e afavelmente perguntou-lhe como se sentia. Ela, com toda a lucidez reconheceu-o e agradeceu-lhe. Então, o santo pediu para rezar com ele três Ave-Marias. No fim, voltando-se para as filhas disse-lhes: 179 S. CATARINA DE GÉNOVA, Tratado sobre o Purgatório. Inserido em La Charité envers les âmes du Purgatoire, p. 30-40. 2 Ed Du Parvis, Hauteville – Suisse,1992. 180 S. FRANCISCA ROMANA, in FRANCISCO SPIRAGO, o.c., vol. 1, 401. 181 S. AGOSTINHO, in FRANCISCO SPIRAGO, o.c., 402. 182 S. TOMÁS DE AQUINO, in FRANCISCO SPIRAGO, o.c., 402. 183 S. MADALENA DE PAZI, in FRANCISCO SPIRAGO, o.c., 402. 184 Bíblica, (Out-Nov 96). 185 Cant 8,6; 1 Cor.13,8. 91 - Sosseguem. Vossa mãe não morrerá, agora; vós sois muito novas e precisais dela. Olhando para a enferma acrescentou: - Pedi ao Senhor que a fizesse passar aqui na terra o seu Purgatório. Por isso, não se admire se for muito atribulada. Esta mãe, que era uma santa, respondeu: - Eu quero fazer a vontade de Deus. - Está muito bem! – Respondeu D. Bosco. E abençoou-a. Desde aquele instante, começou a melhorar e no dia seguinte pediu ao médico licença para comer um espargo. Admirado de a ver ainda viva, o médico, respondeu: - Não apenas um espargo, mas um frango! A convalescença foi longa e difícil, mas a cura foi perfeita, de tal modo que durante trinta anos, não mais esteve doente. As tribulações foram abundantes, sobretudo de ordem moral. Todas as vezes que se apresentava algum novo desgosto, dizia: “Cá está mais um cartão de visita de D. Bosco!” Quando chegou o momento da morte, aos setenta e cinco anos, o P. Valimberti, que lhe assistia, sem nada saber do que D. Bosco havia dito, tantos anos antes, consolou a família, dizendo que, pelo que lhe parecia, esta boa senhora tinha já sofrido o Purgatório neste mundo e havia fundamento para esperar que já estivesse no Paraíso.186 2. Protecção das almas. Uma religiosa, natural da Rússia, foi a Roma falar com o Papa Pio IX. Contou este episódio que o Papa mandou escrever para consolação de quem auxilia a Igreja Padecente: “Em 1848, o imperador Nicolau, feroz perseguidor dos cristãos, mandou aquela religiosa e mais 255 companheiras para a prisão. Quanto a comida, apenas um peixe, um arenque, muito salgado para cada uma. Quanto a bebida, nem uma gota de água. Queriam obrigá-las, pela sede, a renegar a fé. O tormento era insuportável. A língua gretava e o estômago parecia um forno. Se renegassem, poderiam beber quando e quanto quisessem e seriam postas em liberdade. Porém, nenhuma delas o fez. Lembraram-se de oferecer aquele sacrifício pelos que sofrem no Purgatório e logo o tormento da sede desapareceu. Ao fim de oito dias, os soldados, vendo que nada conseguiam, puseram-nas em liberdade. Pensavam eles que iriam todas directamente para a fonte, mas nem uma só se adiantou. Devido à protecção dos seus amigos do Purgatório, tinha-lhes passado completamente a sede.187 Oremos: Senhor nosso Deus, Pai de misericórdia e fonte da salvação humana, que perdoais os pecados e quereis a salvação de todos, por intercessão da Virgem Maria e de todos os Santos, dai aos nossos pais, irmãos, parentes, amigos, benfeitores e a todos os que partiram deste mundo, a bem-aventurança na pátria celeste. Por Nosso senhor Jesus Cristo… (Liturgia das Horas, Ofício de Defuntos) Santa Margarida, a confidente do Sagrado Coração de Jesus, exclamava: “Como é doce morrer, quando se teve uma terna e constante devoção ao Coração de Jesus!” Jesus tinha-lhe prometido: “No excesso da misericórdia do meu Coração, eu 186 187 GABRIEL BOSCO, À espera da Felicidade, 23-25. P.BARATA, Nossos irmãos Fiéis Defuntos 2ª ed AO. 92 prometo que concederei a graça da penitência final a quantos comungarem nas primeiras Sextas-feiras de nove meses consecutivos. Não morrerão sem receberem os sacramentos. O meu Coração será um seguro asilo, nesse último momento!” Prostrada por terra, Santa Margarida repetia muitas vezes: «Descarregai, meu Deus; cortai, queimai, consumi tudo o que vos desagrada! Não poupeis o meu corpo, nem a minha vida, contanto que salveis as almas!»188 Santo Agostinho aconselhava: «Descei a miúdo ao Purgatório, durante a vida, para lá não entrardes depois da morte!»189 …………………………………….. 31. Concílio Vaticano II, LG 49-50 «Enquanto o Senhor Jesus não vier, no fim dos tempos, os seus discípulos, uns peregrinam sobre a terra, outros, passada esta vida, são purificados, outros, finalmente são glorificados e contemplam «claramente Deus uno e trino, como Ele é»; todos, porém, comungam, embora em modo e grau diverso, no mesmo amor de Deus e do próximo. Todos os que são de Cristo têm o Seu Espírito e estão unidos numa só Igreja e ligados uns aos outros n’Ele. Não se interrompe a união dos que ainda caminham sobre a terra com os irmãos que adormeceram na Paz de Cristo! Reconhecendo claramente esta comunicação de todo o corpo místico de Cristo, a Igreja dos que ainda peregrinam, cultivou com muita piedade, desde os primeiros tempos do cristianismo, a memória dos defuntos e “porque é um santo e piedoso pensamento rezar pelos mortos para que sejam absolvidos os seus pecados”, por eles ofereceu também sufrágios.» No momento do Juízo Durante a vida, neste mundo, quem será capaz de fazer a vontade de Deus tão perfeitamente que seja em tudo conforme à imagem do seu divino Filho? (Rm 8, 29) No momento do Juízo, Deus mostra à alma o que deveria ter feito e até que ponto ficou aquém da realidade. Devido às suas muitas imperfeições, não poderá viver eternamente nessa Cidade santa, iluminada pela claridade de Deus, e cujo sol é o Cordeiro. (Ap 21, 23) Um cristal sujo não pode reflectir os raios do sol. Para cntemplarmos Jesus, “o sol nascente das alturas” nós necessitamos de uma purificação. A Sagrada Escritura atesta que, depois da remissão do pecado, ainda resta uma pena temporal a sofrer. O livro da Sabedoria diz que Deus tirou Adão do seu pecado (Sb 10,1); no entanto, teve de continuar a cultivar a terra com o suor de seu rosto. (Gn 3, 17) Moisés não entrou na terra prometida, apesar da sua falta perdoada (Num 20, 12; Dt 34, 4). É verdade que em “Cristo temos a redenção e a remissão dos pecados” (Cl 1,14). É verdade que Deus não despreza um coração humilhado e contrito (Salmo 50). Sendo assim, arrependidos, façamos penitência, conformemos a nossa vida com a vontade divina. Purifiquemo-nos dos nossos pecados já na vida presente, e deste modo evitaremos o Purgatório, na vida futura. Que devemos pensar acerca das aparições dos defuntos? Esta pergunta, feita por S. Paulino de Nola (353-431) a seu amigo S. Agostinho (3543-430), mereceu da parte do santo doutor uma resposta longa, desenvolvida num livro chamado «Do cuidado a ter com os defuntos», escrito no ano 188 189 S. MARGARIDA ALACOQUE, Autobiografia, o.c., 99. FRANCISCO SPIRAGO, Catecismo Católico Popular, Vol. 1, 6ª ed., 403. 93 423. Em resumo, o Santo escreveu acerca dos sufrágios pelos mortos, das relações dos vivos com os mortos e das aparições dos defuntos. A dada altura, Santo Agostinho diz: “ Por uma disposição da divina Providência as aparições dos defuntos podem ser permitidas para instruir, para consolar ou para atemorizar os mortais, segundo a cada um permite o juízo d’Aquele a quem a Igreja canta a Sua misericórdia. Contudo, essas aparições não são frequentes! Se dependesse dos mortos, não haveria noite em que não visse aparecer minha piedosa mãe, que durante a sua vida jamais se separou de mim, seguindo-me por terra e por mar até aos países mais longínquos!” ………………………………….. 32. Encomendação Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amen. A graça de Nosso Senhor Jesus Cristo, que por nós se fez homem, que por nós morreu e ressuscitou esteja convosco. Bendito seja Deus que nos reuniu no amor de Cristo. Irmãos, uma saudação amiga para os familiares de … e para todos vós aqui presentes. Nesta hora de sofrimento, a Palavra de Deus que vamos escutar suavize a nossa dor, confirme a nossa esperança. 1ª Leitura - Filipenses 3, 20-21 “ A nossa pátria está nos céus, de onde certamente esperamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo. Ele há-de transfigurar o nosso corpo mortal, conformando-o ao seu corpo glorioso, com aquele poder que o torna capaz de sujeitar a si todo o universo.” 2ª Leitura - Sabedoria 3,1-19 1 A vida dos justos está nas mãos de Deus e nenhum tormento os atingirá. 2 Aos olhos dos insensatos parecem ter morrido; sua saída do mundo foi considerada uma desgraça,3 e sua partida do meio de nós, uma destruição; mas eles estão em paz.4 Aos olhos dos homens parecem ter sido castigados, mas sua esperança está cheia de imortalidade;5 tendo sofrido leves correcções, serão cumulados de grandes bens, porque Deus os pôs à prova e os achou dignos de si. 6 Provou-os como se prova o ouro no fogo e aceitou-os como ofertas de holocausto;7 no dia do seu julgamento hão- de brilhar, correndo como centelhas no meio da palha; 8 vão julgar as nações e dominar os povos, e o Senhor reinará sobre eles para sempre.9 Os que nele confiam compreenderão a verdade, e os que perseveram no amor ficarão junto dele, porque a graça e a misericórdia são para seus eleitos. 3ª Leitura - Apocalipse 14, 13 Depois, ouvi uma voz que vinha do céu e me dizia: «Escreve: Felizes os que, de agora em diante, morrerem em união com o Senhor! Sim, diz o Espírito; que descansem dos seus trabalhos, pois as suas obras os acompanham.» Salmo 23: O SENHOR é meu pastor: nada me faltá. 94 O Senhor é meu pastor: nada me falta. Leva-me a descansar em verdes prados, conduz-me às águas refrescantes e reconforta a minha alma. Refrão Ele me guia por sendas direitas, por amor do seu nome. Ainda que tenha de andar por vales tenebrosos, nada temo, porque Vós estais comigo, o vosso cajado e o vosso báculo me enchem de confiança. Refrão Para mim preparais a mesa, à vista dos meus adversários; com óleo me perfumais a cabeça e o meu cálice transborda. A bondade e a graça hão-de acompanhar-me todos os dias da minha vida, e habitarei na casa do Senhor para todo o sempre. Evangelho 1. Bem-aventuranças, ver 1º dia. 2. São João 14,1-6: Jesus, caminho para o Pai: Naquele tempo disse Jesus aos seus discípulos: 1*Não se perturbe o vosso coração. Se acreditais em Deus, acreditai também em mim. 2*Em casa de meu Pai há muitas moradas. Se assim não fosse, como teria dito que vos vou preparar um lugar? 3 Quando Eu tiver ido e vos tiver preparado um lugar, virei novamente e hei-de levarvos para junto de mim, a fim de que, onde Eu estou, vós estejais também. 4Para onde Eu vou, vós sabeis o caminho.» 5Disse-lhe Tomé: «Senhor, não sabemos para onde vais, como podemos nós saber o caminho?» 6*Jesus respondeu-lhe: «Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém pode ir ao Pai senão por mim.» 3. São João 17,24-26: Que estejam comigo aqueles que Tu me deste Pai santo, quero que onde Eu estiver estejam também comigo aqueles que Tu me confiaste, para que contemplem a minha glória, a glória que me deste, por me teres amado antes da criação do mundo. 25*Pai justo, o mundo não te conheceu, mas Eu conheci-te e estes reconheceram que Tu me enviaste. 26*Eu dei-lhes a conhecer quem Tu és e continuarei a dar-te a conhecer, a fim de que o amor que me tiveste esteja neles e Eu esteja neles também.» Encomendação Pedimos aos Anjos e aos Santos para que venham receber e introduzir o nosso irmão (nome), na alegria eterna do Céu, rezando: Recebei a sua alma, levai-a a presença do Senhor. Vinde em seu auxílio santos de Deus. Vinde ao seu encontro Anjos do Senhor. R. Recebei a sua alma, levai-a a presença do Senhor. Receba-te Jesus Cristo que te chamou, conduzam-te os Anjos ao Paraíso. R. Recebei a sua alma, levai-a a presença do Senhor. Dai-lhe, Senhor o eterno descanso, nos esplendores da luz perpétua. 95 R. Recebei a sua alma, levai-a a presença do Senhor. A água apaga o fogo ardente, e a esmola expia o pecado. (Ben-Sirá 3,30). Nos funerais, utilizamos a água benta, que nos recorda o nosso Baptismo, sacramento pelo qual nos inserimos na grande família dos filhos de Deus. (A água benta alivia as almas em virtude da oração da bênção: como a chuva refresca as flores ressequidas pelo calor, assim a água benta refresca as flores celestes no purgatório.)190 Rezemos a oração que Jesus nos ensinou: Pai-nosso que estais nos Céus… Nas vossas mãos, Pai clementíssimo, encomendamos a alma do vosso servo (nome) … com a firme esperança de que há-de ressuscitar, no último dia, juntamente com todos os que morrem em Cristo. Nós vos agradecemos todos os benefícios que lhe concedeste durante a sua vida terrena, como sinal da vossa bondade e da comunhão dos santos em Cristo. Na vossa infinita misericórdia, Senhor abri-lhe as portas do Paraíso e a nós, que ainda vivemos na terra, dai-nos a consolação das palavras da fé. Por nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho. Se me amas não chores “Se conhecesses o mistério imenso do céu onde agora vivo, este horizonte sem fim, esta luz que tudo reveste e penetra, não chorarias. Se me amas, não chores. Estou já absorvido no encanto de Deus, na sua infindável beleza. Permanece em mim o teu amor e uma enorme ternura que não consegues imaginar. Vivo numa alegria puríssima. Nas angústias do tempo, pensa nesta casa onde, um dia, estaremos reunidos, para além da morte, matando a sede na fonte inesgotável da alegria e do amor infinito. Não chores se verdadeiramente me amas.” (S. Agostinho) ………………………………………………………………………………….. 33. Coroa pelas almas do Purgatório 1. Meu Jesus, pelo abundante suor de sangue que derramastes no Jardim das Oliveiras, tende piedade das Almas do Purgatório (dos meus familiares e amigos) (Rezar: Pai-nosso, Ave-maria. Que as Almas dos fiéis defuntos pela Misericórdia de Deus, descansem em paz. Ámen.) 2. Meu Jesus, pelas humilhações e troças que sofrestes ao seres esbofeteado, maltratado e punido como um malfeitor, tende piedade das Almas dos nossos defuntos que no Purgatório esperam para serem glorificados no Vosso Reino. Que as Almas dos fiéis defuntos pela Misericórdia de Deus, descansem em paz. Ámen. 3. Meu Jesus, pela coroa de espinhos que trespassaram a Vossa Santa Face, tende piedade das Almas mais abandonadas e sem socorro, e daquelas que estão mais longe de ser libertas do Purgatório. Que as Almas dos fiéis defuntos pela Misericórdia de Deus, descansem em paz. Ámen. 4. Meu Jesus, pelos dolorosos passos que destes com a Cruz sobre os ombros, tende piedade da Alma que está mais próxima de ser liberta do Purgatório; pelas dores que sofrestes no encontro com Vossa Santa Mãe, no caminho do Calvário, livrai das penas do Purgatório as Almas que foram mais devotas de vossa Mãe. Que as Almas dos fiéis defuntos pela Misericórdia de Deus, descansem em paz. Ámen. 190 Cf. TEODATO, in FRANCISCO SPIRAGO, o.c., p. 406. 96 5. Meu Jesus, pelo Vosso Santíssimo Corpo estendido sobre a Cruz, pelos Vossos Pés e Mãos trespassados pelos cravos, pela morte cruel e pelo Vosso Santíssimo Lado aberto pela lança, tende piedade das Almas sofredoras e aceitai-as na Vossa doce companhia no Paraíso. Que as Almas dos fiéis defuntos pela Misericórdia de Deus, descansem em paz. Ámen. …………………………………………………………………….. 34. Via-sacra pelas almas do Purgatório Oração Preparatória: Contrito e humilhado, estou aos Vossos pés, ó meu Divino Redentor. Arrependo-me de todo o coração dos meus pecados e prometo emendar-me, meditando nos sofrimentos que padecestes no caminho doloroso do Calvário, que vou percorrer em espírito, com fé e amor. Uno os meus sofrimentos às Vossas imensas dores, suplicando-Vos que as apliqueis às almas dos fiéis defuntos. 1ª. Estação – Jesus, depois de cruelmente flagelado e coroado de espinhos, é condenado à morte. Ó Jesus, para não desagradar aos homens, Pilatos condena-Vos à morte. Ele não conhecia a Vossa divindade, como eu, que creio em Vós, que Vos chamo meu Senhor e meu Deus. Quantas vezes deixei de cumprir os meus deveres, por respeito humano. Tende misericórdia de mim, ó Jesus. E àquelas almas que padecem no Purgatório por terem querido agradar mais aos homens do que a Deus, dai um lugar de refrigério, de luz e de paz. V. Dai-lhes Senhor o eterno descanso entre os esplendores da luz eterna. R. Que descansem em paz. Amen. 2ª. Estação – Jesus leva a cruz aos ombros com paciência e amor Com que alegria Vos abraçais à cruz onde ides morrer, por nosso amor. E eu, pecador, fujo das cruzes amorosas que me enviais para minha santificação. Ó Jesus, tende misericórdia das minhas impaciências com a cruz da minha vida. E às almas do Purgatório que penam por não terem levado com resignação e amor a sua cruz, dai um lugar de refrigério, de luz e de paz. 3ª. Estação – Jesus, desfalecido pelo Sangue derramado na flagelação e atropelado pelos soldados, cai em terra. Ó Jesus, a Vossa cruz foram as minhas iniquidades. O seu peso enorme Vos fez cair, mas levantais-Vos corajosamente e prosseguis até ao Calvário. Ó Deus Omnipotente, quando me virdes caído sob o peso da minha fraqueza, ajudai-me a levantar da culpa e a perseverar na emenda, até à morte. E às almas do Purgatório que penam por terem desanimado no caminho do bem e por não terem confiado em Vós, dai um lugar de refrigério, de luz e de paz. 4ª. Estação – Jesus encontra Sua Mãe Santíssima Ó Jesus, o encontro com Vossa Mãe causou-Vos muita dor, mas também Vos deu muito alento, pois bem sabíeis que dentro do Seu peito materno clamava o Seu Coração: “Coragem, ó Filho! Está próxima a hora do resgate da humanidade.” Ó meu Salvador, quando me virdes desfalecer, alentai-me com a esperança para que não desespere. E às almas do Purgatório que passaram esta vida com frouxidão e tibieza no Vosso serviço e penam por esta culpa, dai um lugar de refrigério, de luz e de paz. 5ª. Estação – Os soldados, temendo que Jesus não chegue vivo ao Calvário, obrigam o cireneu a levar a cruz Sois Deus Omnipotente e necessitais de um cireneu! Como hei-de levar sozinho a cruz, sendo eu pó, cinza e nada? Ó Jesus, sede o meu cireneu, e não deixeis morrer no 97 meu peito a esperança que tenho em Vós. E às almas que penam no Purgatório por não terem ajudado o seu próximo, dai um lugar de refrigério, de luz e de paz. 6ª. Estação – A Verónica, sem medo dos soldados, limpa o Rosto de Jesus, coberto de suor e pó, de sangue e lágrimas. O ânimo da Verónica em Vos servir repreende a minha frouxidão em aliviar e socorrer o meu próximo necessitado, com quem Vos identificais. Tende misericórdia da minha negligência e, às almas que penam no Purgatório por não terem visitado os enfermos, nem consolado os tristes, nem saciado a fome aos pobres, dai um lugar de refrigério, de luz e de paz. 7ª. Estação – Jesus cai pela segunda vez Ó Jesus, ao deixar Jerusalém, caís em terra porque desejais ficar com essa cidade, que Vos condenou à morte. Para resgatá-la do seu crime, levantais-Vos e subis ao Calvário para morrer por ela. A minha alma é essa cidade deicida. Tende piedade de mim e reanimai-me com o Vosso Sangue, sempre que esmoreço sob o peso da fragilidade. E às almas do Purgatório que penam pelas suas muitas recaídas no pecado, dai um lugar de refrigério, de luz e de paz. 8ª. Estação – Jesus consola as santas mulheres: “Não choreis por Mim, chorai pelos vossos pecados e pelos dos vossos filhos” Ó Jesus, ajudai-me a chorar a minha grande fraqueza e a continuar firme no caminho da minha salvação. E às almas do Purgatório que penam pelo pouco arrependimento dos pecados veniais, dai um lugar de refrigério, de luz e de paz. 9ª. Estação – Jesus cai pela terceira vez Ó Jesus, nas Vossas repetidas quedas no caminho do Calvário, eu vejo resumida a história da minha consciência. Dai-me a graça de no futuro não voltar a cair. Que eu reconheça a minha miséria e a minha soberba, e me arrependa de Vos ter ofendido. E às almas do Purgatório, que penam pelo seu porte soberbo e arrogante para com o próximo, dai um lugar de refrigério, de luz e de paz. 10ª. Estação – Jesus é despojada das Suas vestes, reavivando as Chagas Humilhado na Vossa Presença, peço-Vos a graça de me conservardes desapegado das coisas deste mundo e das opiniões humanas. Só em Vós e por Vós quero viver. E às almas do Purgatório que penam porque se apegaram mais ao mundo e à carne do que a Vós, dai um lugar de refrigério, de luz e de paz. 11ª. Estação – Jesus é pregado na cruz Dai-me, ó Jesus, um verdadeiro espírito de penitência, um desejo grande de sofrer por Vós. Cravai-me na cruz da mortificação e conservai-me nela até morrer por Vós. E às almas do Purgatório que penam por terem tratado a sua carne com mimos e vaidades, dai um lugar de refrigério, de luz e de paz. 12ª. Estação – Jesus morre na cruz, depois de uma tormentosa agonia de três horas Bendigo, ó Jesus, a Vossa morte, que nos deu a vida. Louvo e bendigo o Vosso magnânimo Coração por tudo quanto sofreu por nosso amor. Prometo-Vos sofrer todas as provações em união com o Vosso Coração moribundo. E às almas do Purgatório que não ajudaram a bem morrer o seu próximo agonizante, dai um lugar de refrigério, de luz e de paz. 13ª. Estação – O Corpo do Salvador é descida da cruz. Maria Santíssima toma-O no Seu regaço e banha-O com muitas lágrimas Ó Maria, também sou vosso Filho. Tomai-me no vosso regaço e dai-me palavras de esperança e de coragem para que não desfaleça no caminho da virtude, e evite a morte da culpa. E às almas do Purgatório que não evitaram as ocasiões de pecado, dai um lugar de refrigério, de luz e de paz. 14ª. Estação – Maria Santíssima acompanha Jesus à sepultura e fica em dolorosa solidão. Ó Mãe Dolorosa, o Vosso martírio chegou ao extremo, mas vai terminar em menos de três dias. Mas não termina, ó Mãe dos pecadores, o martírio da minha consciência, roída de 98 remorsos, de dúvidas e de ansiedades. Iluminai-me com o clarão da fé e da esperança. Colocai Jesus neste sepulcro gelado do meu coração, para que nele permaneça até à morte e seja a minha ressurreição para a eterna glória. E às almas do Purgatório que foram negligentes em assistir aos funerais dos seus irmãos, dai um lugar de refrigério, de luz e de paz. Amen. Já te foi indicado o que deves fazer, o que o Senhor exige de ti: Pratica a justiça, ama a misericórdia e caminha humildemente na presença do teu Deus! (cf. Miqueias 6,8) "Aqueles que passam por nós, não vão sós, não nos deixam sós. Deixam um pouco de si, levam um pouco de nós." (Antoine de Saint-Exupéry) “A misericórdia do Senhor renova-se todas as manhãs! Não tem fim a sua bondade!” Lamentações 3, 22-23 "Sede misericordiosos como o vosso Pai é misericordioso!" (Lucas 6,36) Cantarei eternamente as misericordias do Senhor!(Salmo 88 (89) Alexandre F Santos, Sebastião da Gama, Roma Editora, 2008 Bíblia Sagrada, Difusora Bíblica; Catecismo da Igreja Católica; Documentos do Concío Vaticano II CONRAD DE MEESTER, Dynamique de la Confiance,ed. Cerf, Paris1995. CROISET, Ano Cristão, ed. Seminário do Porto, Porto. DAVID HUGH FARMER, Dictionnary of Saints, 3ª. ed. Oxford Univeristy Press, 1992. DENZINGER, El magisterio de la Iglesia, ed. Herder, Barcelona. 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