Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 A BIOLOGIA FORENSE NO JOGO DIDÁTICO: UMA FERRAMENTA MOTIVACIONAL PARA O ENSINO DE GENÉTICA EM UMA ABORDAGEM INVESTIGATIVA1 Marina Amaral Neves (Aluna PROMESTRE – UFMG) Maria Luíza Rodrigues da Costa Neves (Faculdade de Educação – UFMG) RESUMO O presente trabalho apresenta resultados de uma pesquisa em andamento e tem como objetivo verificar se a aplicação de um jogo com o caráter investigativo da Biologia Forense no ensino de Genética, desperta e mantém a motivação de estudantes do ensino médio. Sustenta-se nos referenciais teóricos de Ensino de Ciências por Investigação, utilização de jogos didáticos, à luz da Teoria da Autodeterminação de Deci e Ryan (2000). A metodologia de cunho qualitativo utilizou como instrumentos de coleta de dados, diário de bordo, filmagens e questionários. Neste artigo, apresentamos alguns resultados preliminares e já concluímos que a utilização do jogo como ferramenta pedagógica com carater investigativo aumenta a motivação dos alunos e possibilita a reconstrução de conceitos de genética. Palavras-chave: Ensino por Investigação, Jogo Didático, Biologia Forense, Ensino de Genética INTRODUÇÃO A tendência de organização do currículo de Biologia passa por uma organização do conhecimento científico sistematizado (classificação dos seres vivos, corpo humano, genética, etc.) como se a natureza e os seus eventos fossem sistematizados. Então, podemos nos perguntar se a organização do currículo e das aulas por temas ou fenômenos do cotidiano, utilizando uma abordagem investigativa, não tornariam o ensino de biologia mais atrativo, ou se um currículo aliado a recursos pedagógicos mais dinâmicos não promoveria uma melhor aprendizagem com aplicação prática na sociedade. Segundo Cachapuz et. al, (2005), para uma renovação do ensino de Ciências precisamos não só de uma renovação epistemológica dos professores, mas que essa venha acompanhada por uma renovação didático-metodológica de suas aulas. Agora não é só uma questão de tomada de consciência e de discussões epistemológicas, é também necessário um novo posicionamento do professor em suas classes para que os alunos sintam uma sólida coerência entre o falar e o fazer. Este é um ponto bastante complexo, pois os professores para 1 Apoio: FAPEMIG SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 3704 Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 o desenvolvimento de suas aulas necessitam de materiais instrucionais coerentes com um ensino por investigação, o que implica uma mudança no currículo e em propostas de atividades didáticas. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 2000) estão tentando incorporar essas novas tendências em educação, visando uma metodologia mais investigativa. “Propõe-se, no nível do Ensino Médio, a formação geral, em oposição à formação específica; o desenvolvimento de capacidades de pesquisar, buscar informações, analisá-las e selecioná-las; a capacidade de aprender, criar, formular, ao invés do simples exercício de memorização. A aprendizagem de concepções científicas atualizadas do mundo físico e natural e o desenvolvimento de estratégias de trabalho centradas na solução de problemas é finalidade da área, de forma a aproximar o educando do trabalho de investigação científica e tecnológica. (PCNEM, 2000) Nesta perspectiva, o objetivo deste presente trabalho foi analisar a eficácia de uma abordagem investigativa ao trabalhar os conceitos de genética por meio de um jogo didático com práticas de biologia forense. REVISÃO DA LITERATURA A justificativa pela escolha da Biologia Forense se deve ao fato de que essa área da Ciência tem grande influencia da Biotecnologia e uma enorme aplicação social. Além disso, há um aumento do interesse dos jovens pelo “universo das perícias criminais”, o chamado “efeito CSI (do inglês: Crime Scene Investigation)”. Existe uma curiosidade social em saber como ocorre uma investigação criminal na identificação dos autores dos crimes, que tem sido cada vez mais aguçada pelas várias séries televisivas que retratam o cotidiano de pesquisadores forenses. Estas séries vêm atingindo principalmente o público adolescente, o que torna uma justificativa importante para o uso da prática forense na sala de aula, substituindo as atividades tradicionais por novos métodos para o ensino e a aprendizagem de genética. De acordo com Funkhouser e Deslich (2000), estudantes do ensino médio não têm um conhecimento básico do processo científico. Para resolver este problema, os autores utilizaram a ciência forense para motivar positivamente os estudantes e aumentar o seu nível de interesse. “Algumas das vantagens deste método são: a ciência forense é multidisciplinar; aulas de ciências forenses podem integrar várias ciências para resolver um problema específico, o qual é na maioria dos casos um crime; a ciência forense apela para o detetive natural em pessoas e também para aqueles que gostam de resolver quebra-cabeças; a ciência forense é adequada para todas as idades e permite às crianças serem ensinadas a pensar criticamente e resolver problemas e mostra como a ciência pode ser útil e agradável.” (FUNKHOUSER; DESLICH, 2000) SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 3705 Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 Conceitos e técnicas da Biotecnologia, utilizadas pelas Ciências Forenses, tais como estrutura do DNA e marcadores moleculares, reação em cadeia da polimerase (PCR) e impressões digitais do DNA (DNA finger printing), apresentam uma variedade de aplicações de extrema importância para a sociedade, como os testes de paternidade, criminalística, identificação de restos mortais humanos ou animais, arqueologia e biologia conservacionista. Na sala de aula, a aplicação desses conceitos e práticas poderia aumentar o interesse dos alunos pelos conteúdos da Genética, uma vez que os conceitos abordados no ensino deste conteúdo são, geralmente, de difícil assimilação, sendo necessárias práticas que auxiliem no aprendizado dos alunos. A genética é vista pelos alunos como um dos conteúdos mais difíceis de biologia, o que se deve ao fato dessa área exigir que o aluno possua conhecimentos prévios de outras áreas, como citologia e biologia molecular e que ele seja capaz de relacionar esses conhecimentos com os conteúdos de genética que são apresentados (CARBONI; SOARES, 2007). Uma explicação para o mau aproveitamento apresentado pelos alunos pode ser a maneira como a aula é ministrada, normalmente de forma tradicional, em que os alunos são passivos e devem decorar toda a informação transmitida pelo professor. Assim, Campos et al (2003), sugerem que o professor deve adotar em suas práticas medidas que preencham as lacunas deixadas pelo ensino tradicional, em que prevalece a transmissão/recepção de conhecimentos. Por esse motivo, optou-se nessa pesquisa pelo desenvolvimento de um jogo didático. “O jogo pedagógico ou didático é aquele fabricado com o objetivo de proporcionar determinadas aprendizagens, diferenciando-se do material pedagógico, por conter o aspecto lúdico, e utilizado para atingir determinados objetivos pedagógicos, sendo uma alternativa para se melhorar o desempenho dos estudantes em alguns conteúdos de difícil aprendizagem.” (CAMPOS et. al., 2003) Por fim, a escolha das autoras por uma abordagem investigativa justifica-se não apenas na própria temática da Biologia Forense que é investigativa per si, como também em diversos trabalhos que apontam a eficácia dessa abordagem. De acordo com Hodson (1992), uma atividade investigativa não necessariamente de laboratório, é, sem dúvida, uma importante estratégia no ensino de Ciências em geral. É preciso que sejam realizadas diferentes atividades, que devem estar acompanhadas de situações problematizadoras, questionadoras e de diálogo, envolvendo a resolução de problemas e levando à introdução de conceitos para que os alunos possam construir seu conhecimento. No Brasil, os estudos sobre ensino de ciências por investigação cresceram muito na última década (e.g. AZEVEDO, 2004; CACHAPUZ et. al., 2005; MUNFORD & LIMA, SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 3706 Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 2007; SÁ, 2009). Segundo Azevedo (2004), utilizar atividades investigativas como ponto de partida para desenvolver a compreensão de conceitos é uma forma de levar o aluno a participar de seu processo de aprendizagem, sair de uma postura passiva e começar a perceber e agir sobre o seu objeto de estudo, relacionando o objeto com acontecimentos e buscando as causas dessa relação. A situação problemática deve ser interessante para o aluno e, de preferência, envolver situações cotidianas para que o ensino seja contextualizado. Segundo Sá (2009), esse tipo de atividade é significativamente diferente das atividades de demonstração tradicionalmente realizadas nas aulas de Ciências, pois faz com que os alunos participem mais, elaborem hipóteses sobre o fenômeno em foco, analisem os resultados obtidos, discutam com os colegas, façam conexão entre as novas “descobertas” e os conhecimentos anteriormente adquiridos e se posicionem em face desses “avanços” alcançados. Tudo isso confere caráter investigativo a tal atividade. De acordo com Neves e Talim (2013), os alunos perdem a motivação e o interesse à medida que avançam em idade e escolaridade e um dos fatores pode estar associado ao tipo de estratégia metodológica adotada pelos professores. No ensino médio, já foi observado que há uma desmotivação dos alunos em aprender Genética. Os estudantes apresentam dificuldades em se envolver com tarefas que envolvem conceitos de natureza mais abstrata como os de Genética e isso acarreta geralmente uma desmotivação em se manter na tarefa até o fim. Nesta perspectiva, estamos verificando se uma estratégia metodológica que utiliza o jogo como ferramente pedagógica pode envolver os alunos e mantê-los motivados até o final da tarefa melhorando a aprendizagem. Para verificar se a aplicação do jogo com caráter investigativo com a temática da Biologia Forense no ensino de Genética desperta e mantém a motivação de estudantes do ensino médio, essa pesquisa sustenta-se na Teoria da Autodeterminação de Deci e Ryan (2000) que postula que as necessidades psicológicas básicas precisam ser satisfeitas para designarmos que o objeto é de interesse do sujeito. “Nossa abordagem se concentra principalmente em necessidades psicológicas, as necessidades inatas para competência, autonomia e relacionamento, mas nós, é claro, reconhecemos que a satisfação das necessidades básicas advém, em parte, de se envolver em atividades interessantes.” (DECI; RYAN, 2000) METODOLOGIA A metodologia é de cunho qualitativo com observação participante. A pesquisa foi realizada com 47 estudantes do 3o ano do Ensino Médio de uma escola da rede privada de ensino da cidade de Belo Horizonte, Minas Gerais. Os dados, por ora analisados neste artigo, SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 3707 Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 são da primeira fase da pesquisa, quando da aplicação do jogo com uma abordagem investigativa na temática da Biologia Forense para estudar alguns conceitos de genética. A metodología de aplicação do jogo na escola passou por algumas etapas como será descrito a seguir. Após a elaboração e confecção do jogo com tabuleiro e instruções para uma investigação criminal com atividades experimentais relacionadas ao mesmo, o jogo foi aplicado na escola. Os estudantes foram divididos em seis grupos, cada qual recebendo um desenho da cena do crime e objetos da cena para analisarem. Os estudantes deveriam desvendar o crime observando a cena com a realização das atividades experimentais indicadas pelo jogo, como: teste presuntivo e confirmativo de sangue humano utilizando reagente Kastle-Meyer e tiras imunocromatográficas, análises comparativas utilizando fotos, caligrafia, digitais e leitura de bandas de DNA. Cada objeto analisado indicava uma pista diferente para desvendar o caso e solucionar o suposto crime. Assim, o jogo visava à aprendizagem de conceitos de Genética e das práticas das Ciências Forenses, além de proporcionar discussões, elaboração de hipóteses e fomentar a curiosidade dos alunos, estimulando-os a aprender e aplicar os conceitos na vida cotidiana, uma vez que investigações criminais estão diretamente relacionadas com a vida em sociedade. Os conceitos de Biologia envolvidos no jogo foram: sangue, DNA, genes, especificidade antígeno-anticorpo, biotecnologia (DNA fingerprint, eletroforese, análise papiloscópica), e também conceitos de Química como densidade e pH. Desse modo, o jogo pode também possibilitar um trabalho interdisciplinar, podendo inclusive na aula de química os próprios alunos fabricarem o Reagente de Kastle-Meyer. Tais conceitos são referendados pelo Conteúdo Básico Comum (CBC, 2013) e precisam ser previamente estudados em sala de aula para a realização do jogo, caso contrário diversas dúvidas poderão surgir nos alunos, impossibilitando sua execução correta e o aproveitamento do jogo. Abaixo um trecho o Conteúdo Básico Comum de Biologia em que os conteúdos trabalhados no jogo estão destacados. “Tecnologias na genética: avaliar textos e discutir sobre patentes e tecnologias do DNA; posicionar-se criticamente sobre as questões que envolvem o uso de biotecnología; reconhecer os benefícios da biotecnologia na saúde, na produção de alimentos e outros.” (CBC, 2013) Para a coleta de dados foram utilizadas filmagens, questionário pré-teste e pós-teste e diario de bordo. SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 3708 Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 RESULTADOS Antes da aplicação do jogo, foi realizado um questionário que levantou informações sobre as dificuldades dos alunos na aprendizagem de Genética. Os alunos também responderam sobre seu interesse por Biologia Forense e séries televisivas de investigação criminal e se gostariam que este tipo de abordagem compusesse o currículo de biologia. As respostas encontram-se tabuladas nos gráficos 1 e 2. O total de estudantes que respondeu a esses questionários foi 47. Na legenda, M sexo masculino e F sexo feminino. Gráfico 1 - Dificuldades no processo de aprendizagem de Genética. Nota-se que as principais dificuldades no processo de aprendizagem de Genética estão na falta de práticas e dificuldade de visualização, 70,2% e 40,4% dos alunos respectivamente, seguidas da complexidade do conteúdo (29,8%), falta de jogos e falta de softwares (23,4% ambas). Gráfico 2 - Justificativa sobre a Biologia Forense para compor o currículo de Biologia. Nota-se que há um resultado interessante. A maioria dos estudantes afirma que o tema biologia forense como abordagem investigativa poderia motivar o aprendizado e que é uma aplicação prática do conteúdo e ajuda na visualização, o que corrobora com os resultados do gráfico 1 sobre a falta/dificuldade em aprenderem sobre tais conteúdos. Além disso, declararam que biologia forense gera interesse e motiva os alunos, pois atrai a atenção e incentiva/facilita a aprendizagem, por relacionar seriados investigativos da TV. SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 3709 Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 Após o pré-teste, o jogo foi então aplicado na turma. Seguinte à realização do jogo, os alunos foram convidados a responder um novo questionário. Foram levantadas as concepções dos mesmos acerca do jogo e sua aplicabilidade como recurso didático em sala de aula em uma abordagem investigativa. Foi verificado que 68,8% declararam que a atividade foi muito boa e 29,2% avaliaram como boa e 85,1% dos alunos declararam que gostariam de um currículo com atividades investigativas e contextualizadas. Sobre a Biologia Forense, para contextualizar o conteúdo de Genética, como fator motivacional para o aprendizado, 91.5% responderam que sim, como vistos no gráfico 3. Gráfico 3 – Justificativa sobre a Biologia Forense como motivadora do aprendizado. Estas justificativas corroboram as respostas do questionário em que os alunos afirmaram que o tema biologia forense como abordagem investigativa poderia motivar o aprendizado porque é uma aplicação prática do conteúdo, que gera interesse, envolve os alunos e estimula a aprendizagem, por estar ligada ao cotidiano e remeter aos seriados televisivos, agradando assim à maioria dos estudantes. Além dessas análises, as pesquisadoras realizaram também uma análise comparativa quantitativa e qualitativa das respostas abertas dos alunos sobre os conceitos envolvidos no jogo, tais como: O que é DNA?; Qual a função do DNA?; Do que o DNA é constituído?; O que são genes?; Quais as vantagens para a sociedade da decodificação do DNA?; O que é Biotecnologia?; De que é composto o sangue?; Qual o modelo utilizado para explicar a ligação específica de proteínas como enzimas e anticorpos? O total de estudantes que respondeu a esses questionários foi 47. As respostas foram agrupadas em 4 grupos diferentes e categorizadas. Segundo Bardin (1977), a categorização é um processo do tipo estruturalista, que comporta duas etapas: (1) o inventário: isolar os elementos; e (2) a classificação: repartir os elementos e procurar ou impor uma certa organização às respostas. SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 3710 Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 A categorização pode empregar dois processos inversos: (1) é fornecido o sistema de categorias e repartem-se da melhor maneira possível os elementos, à medida em que vão sendo encontrados. Esse procedimento é aplicável no caso da organização do material decorrer diretamente dos funcionamentos teóricos hipotéticos; e (2) o sistema de categorias não é fornecido e resulta da classificação analógica e progressiva dos elementos. O processo de categorização aplicado nesta pesquisa foi o primeiro, pois a pesquisadora conhecia de antemão – a partir de uma leitura prévia sistemática das respostas dos alunos aos questionários – quais as categorias e as dimensões sobre as quais buscaria quantificação de freqüências. No grupo C foram agrupadas as respostas consideradas corretas, no grupo MN as respostas consideradas mais ou menos certas, no grupo I as respostas consideradas incorretas e no grupo NB as respostas nulas ou em branco. Primeiramente será explorada no quadro a seguir a análise comparativa quantitativa. Quadro 1 – Análise quantitativa comparativa da categorização dos questionários QUESTÕES O que é DNA? Qual a função do DNA? Do que o DNA é constituído? O que são genes? Quais as vantagens para a sociedade da decodificação do DNA? O que é Biotecnologia? De que é composto o sangue? Qual o modelo utilizado para explicar a ligação específica de proteínas como enzimas e anticorpos? TOTAL C 33 16 14 14 31 PRÉ-TESTE MN I 3 6 22 7 24 7 8 13 8 3 NB 5 2 2 12 5 C 38 25 30 20 33 PÓS-TESTE MN I 1 6 16 4 10 6 10 12 7 3 NB 2 2 1 5 4 26 46 6 13 0 15 0 1 1 8 0 25 21 47 8 16 0 17 2 0 21 8 0 1 49,5% 24,7% 10,1% 15,7% 59% 20,5% 14,4% 6,1% Categorizando as respostas em 4 grupos – corretas (C), mais ou menos (MN), incorretas (I) e nulas ou em branco (NB) – foi possível observar que um maior número de alunos se encaixou na categoria que enquadravam as respostas corretas, considerando o questionário pós-teste em relação ao pré-teste, exceto pela questão sobre a definição de biotecnologia em que, após o jogo, um menor número de estudantes se encaixou na categoria C e houve um aumento dos grupos MN e I. Há que se perguntar o motivo desse resultado uma vez que o jogo lida diretamente com a biotecnologia. Talvez o fato de que ao lidarem diretamente com essa área da Genética, que não têm contato no dia-a-dia da sala de aula, isso provocou confusão em suas concepções prévias. Porém, isso não corrobora com os demais resultados, uma vez que dentre todos os conceitos perguntados aos alunos esse foi o único que obteve resultado desfavorável após o jogo. SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 3711 Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 Com relação à porcentagem total de respostas, houve um aumento de 9,5% de respostas no grupo C e 4,3% de respostas no grupo I no questionário pós-teste em comparação ao questionário pré-teste, enquanto que nos grupos MN e NB houve diminuição de 4,2% e 9,6% respectivamente. Por meio desses resultados, supõe-se que os alunos que se enquadravam na categoria mais ou menos no questionário pré-teste passaram a se enquadrar na categoria correta no questionário pós-teste e os alunos que deram respostas nulas ou em branco antes da realização do jogo se dividiram entre respostas corretas e incorretas após o jogo. Quanto à análise qualitativa, notamos que há evidências que sugerem que houve um salto qualitativo nas respostas dos alunos referentes aos conceitos estudados, como apresentados no quadro a seguir. Quadro 2 – Análise qualitativa comparativa da categorização dos questionários QUESTÕES O que é DNA? Qual a função do DNA? PRÉ-TESTE “Ácido desoxirribonucleico.”; “Fita dupla de bases nitrogenadas.”; “Material genético.”. “Armazena material genético.”; “Carrega características genotípicas.”; “Passar características adiante.”. Do que o DNA é constituído? “Fosfato, pentose e bases nitrogenadas.” O que são genes? “Fragmentos de DNA.”; “Conjunto codificado de DNA.”. “Descoberta e tratamento de doenças.”; “Evolução dos meios agrícolas.”; “Descobrir a origem da espécie humana.”; “Engenharia genética.”; “Identificação de parentesco.”; “Resolução de crimes.”. Quais as vantagens para a sociedade da decodificação do DNA? O que é Biotecnologia? De que é composto o sangue? Proteínas como a hemoglobina, anticorpos e enzimas se ligam através de uma ligação muito específica. Cite o nome do modelo que utilizamos para explicar essa ligação e explique como ela ocorre. “Tecnologia aplicada à vida.”; “Estudo de organismos que visa auxiliar a medicina.”; “Manipulação da biologia com tecnologia.”. “Glóbulos vermelhos, glóbulos brancos, plaquetas e plasma.”; “Hemoglobina, oxigênio, glóbulos brancos, material genético.”. “Chave-fechadura.” PÓS-TESTE “DNA é uma fita dupla de ácido desoxirribonucleico que traz o material genético e traça o fenótipo de cada indivíduo.”. “Definir a estruturação genética de cada indivíduo por meio de suas ligações de bases nitrogenadas.”; “Codifica nossas características e garante a hereditariedade.”; “Transcreve informação que será posteriormente decodificada na síntese proteica.”. “Fita dupla formada por bases nitrogenadas ligadas por ligação de hidrogênio, pentose e grupo fosfato.”. “Partes codificantes do DNA que identificam e determinam nossas características.”. “O conhecimento do material genético é a base para manuseá-lo, encontrando formas para se curar doenças.”; “Solução de problemas genéticos, desenvolvimento de novos medicamentos, evolução dos meios agrícolas, resolução de crimes, identificação de parentesco, transgênicos, clonagem, entre outras.”. “Estudo da genética para fins de melhorar a vida economicamente, socialmente e ecologicamente.”; Ciência que estuda os genes e busca suas aplicações nos campos da medicina, agropecuária e etc.”. “Plasma (água e sais minerais), hemácias, plaquetas, leucócitos e linfócitos.”. “Modelo chave-fechadura. Cada enzima é específica para cada substrato e cada anticorpo para seu antígeno.”. SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 3712 Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 Assim, podemos inferir que o jogo auxiliou no aprimoramento dos conhecimentos dos estudantes sobre os conceitos envolvidos. Essa análise corrobora com o que os próprios alunos responderam no questionário após a realização do jogo. Quando perguntados ao final desse questionário a respeito dos conteúdos aprendidos com o jogo, 42,5% dos estudantes responderam que foi possível aprender conceitos novos e os demais disseram que, mesmo já sabendo os conceitos, a atividade serviu para acrescentar uma qualidade e aprimoramento aos conceitos que os alunos já possuíam, sinalizando que a ferramenta utilizada pode ser favorável para melhoria do ensino de genética no ensino médio. CONCLUSÕES Nesta pesquisa foi criado e desenvolvido em sala de aula com 47 alunos do 3º ano do ensino médio um jogo investigativo com práticas da Biologia Forense. O jogo pode ser considerado uma atividade de Ensino por Investigação, pois a ação do aluno não se limita apenas ao trabalho de manipulação ou observação, o jogo contém características de um trabalho científico: o aluno reflete, discute, explica e relata, o que dá à atividade as características de uma investigação científica segundo Azevedo (2004). Além disso, o jogo apresenta aspectos de atividade científica descritos por Pérez e Castro (1996). Dentre eles estão: apresenta situações problemáticas abertas; incentiva a reflexão do estudante sobre a relevância e interesse potencial das situações propostas, o que dá sentido ao seu estudo; fortalece a análise qualitativa significativa, o que ajuda a compreender e limitar as situações; levanta a questão das hipóteses como uma atividade fundamental da investigação científica, capaz de orientar o tratamento de situações e fazer explícitas as pré-concepções dos alunos; ressalta o desenvolvimento de concepções e planejamento de atividades experimentais pelos próprios alunos; considera a análise cuidadosa dos resultados, de acordo com os conhecimentos disponíveis, das hipóteses formuladas e dos resultados das demais equipes de estudantes; garante especial importância para o desenvolvimento de memórias científicas que reflitam o trabalho executado e destaca o papel da comunicação e debate na atividade científica; reforça a dimensão coletiva do trabalho científico, por meio de grupos de trabalho, que interajam entre si. Podemos dizer também que nesse tipo de trabalho há um envolvimento emocional por parte do aluno, pois ele passa a usar suas estruturas mentais de forma crítica, demonstra suas habilidades por conta própria e também interage com seus pares. Por meio das respostas dos estudantes aos questionários concluimos que a maioria dos alunos gostaria de aprender Genética utilizando com mais frequência atividades SBEnBio - Associação Brasileira de Ensino de Biologia 3713 Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016 VI Enebio e VIII Erebio Regional 3 investigativas e contextualizadas com aplicação prática como o jogo de Biologia Forense desenvolvido. Além disso, os estudantes responderam que a temática da biologia forense como abordagem investigativa motivou o aprendizado, uma vez que contextualizou o conteúdo de Genética relacionando-o com o cotidiano e envolveu os alunos de forma mais ativa e dinâmica, gerando um maior interesse que aulas convencionais. Essas análises nos permitem uma discussão à luz da Teoria da Autodeterminação de Deci e Ryan (2000). Considerando que os estudantes julgaram a atividade interessante, que a turma esteve todo o tempo envolvida e se relacionando em grupo e que os alunos demostraram autonomia (auto-iniciativa e autorregulação dos alunos diante de suas ações) e competência (força inerente ao ser humano que o motiva a interagir de forma eficaz/competente com seu entorno) para realização das investigações no jogo, podemos inferir que o jogo de Biologia Forense pode ser considerado uma ferramenta motivacional para o aprendizado. Essa análise corrobora os estudos de Funkhouser e Deslich (2000) que afirmaram que a ciência forense motiva positivamente os estudantes e aumenta o seu nível de interesse. Assim, os resultados do presente estudo indicam que uma abordagem investigativa é necessária em cursos puramente tradicionais e que, portanto, as escolas deveriam incentivar mais abordagens como esta em que a aprendizagem parta de uma questão problematizadora e o conteúdo de ciências seja estudado para solucionar tal questão através da elaboração de hipóteses e discussões. Esta pesquisa aponta a necessidade de mais estudos sobre currículos com abordagem investigativa e sua relação com a motivação dos alunos, buscando respostas para um ensino que seja mais dinâmico, com participação ativa dos alunos e socialmente contextualizado, que venha facilitar o aprendizado, além da possibilidade de usufruir de ferramentas pedagógicas diferenciadas como os jogos, que os alunos parecem apreciar. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AZEVEDO, Maria Cristina. Ensino por investigação: problematizando as atividades em sala de aula. In: CARVALHO et al. Ensino de Ciências: Unindo a Pesquisa e a Prática, p. 1933. 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